Acórdão nº 01936/22.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-04-13

Ano2023
Número Acordão01936/22.3BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. «AA» (Recorrente) notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida no âmbito dos autos de reclamação de acto praticado por órgão de execução fiscal, a qual julgou totalmente improcedente a reclamação que deduziu contra o indeferimento do pedido de aplicação do Regime Excepcional de Regularização de Dívidas (Lei n.º 51/2015, de 08/06) às dívidas exequendas no âmbito dos processos executivos melhor identificados nos autos, inconformado vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«1. Contra o recorrente correm 3 (três) processos de execução fiscal no Serviço de Finanças ..., com os números ...84 e seus apensos, ...49 e ...22.
2. Os processos de execução fiscal referidos no ponto anterior têm como fundamento a falta de pagamento de coimas.
3. As coimas têm origem na falta de pagamento de taxas de portagem.
4. Em 01.08.2015 entrou em vigor a Lei 51/2015 de 08 de junho, a qual veio alterar a Lei 25/2006 e aprovar o Regime Excecional de Regularização de Dívidas de Portagem (RERD).
5. O RERD dispõe de um regime jurídico mais favorável ao recorrente, pois prevê uma redução do montante das coimas aplicadas.
6. O recorrente preenche os requisitos de adesão ao RERD.
7. O recorrente, solicitou, em tempo, a adesão ao RERD.
8. A solicitação foi efetuada junto do serviço tributário competente, no caso, o Serviço de Finanças ....
9. O Serviço de Finanças ... foi o serviço tributário que instaurou os processos de contraordenação, bem como, é também o órgão de execução fiscal.
10. O Serviço de Finanças ... indeferiu o pedido de adesão ao RERD do recorrente, com fundamentação na falta de preenchimento dos pressupostos legais.
11. O recorrente lançou mão da reclamação prevista no artigo 276.º do CPPT.
12. O tribunal a quo improcedeu a reclamação do recorrente, embora com fundamentação totalmente distinta do órgão de execução fiscal.
13. O tribunal a quo refere que, “estando o processo de execução fiscal balizado pelo título executivo e funcionalizado à cobrança da dívida pelo mesmo titulada (...) está fora do âmbito do processo de execução fiscal a discussão sobre a legalidade da dívida exequenda”.
14. Bem como, “nem o órgão de execução fiscal poderia deferir a pretensão formulada pelo reclamante nos termos de 2 dos factos provados, pois não tem competência para tanto...”
15. As coimas aplicadas ao recorrente ainda não se encontram executadas, isto é, pagas (nem voluntariamente, nem coercivamente), pois estão, precisamente, a serem objeto de cobrança coerciva.
16. No momento da entrada em vigor do RERD, as coimas aplicadas ao recorrente já tinham transitado em julgado, embora ainda não executadas.
17. Por tal facto, o RERD é diretamente aplicável ao caso concreto de acordo com o preceituado nos art.º 29.º n.º 4 da CRP e art.º 3.º n.º 2 do DL 433/82 ex vi art.º 3.º alínea b) do RGIT, ex vi art.º 18.º da Lei 25/2006 de 30 de junho.
18. O tribunal a quo emerge de uma errada interpretação jurídica, pois, por um lado, entende que não se deve proceder “a alterações substanciais da dívida exequenda”, e que, por outro, não vislumbra que o serviço tributário competente para apreciação e aplicação da lei mais favorável ao recorrente coincide com o órgão de execução fiscal.
19. A sentença do tribunal a quo deve ser totalmente revogada, ordenando-se a baixa dos autos ao mesmo para decisão do mérito da causa.
20. Ainda que se entenda que o Serviço de Finanças ... não seja o serviço tributário competente para apreciação do pedido efetuado de adesão ao RERD, sempre deverá ser a sentença do tribunal a quo REVOGADA e ordenado ao mesmo que a substitua por outra que ordene a baixa dos autos ao serviço tributário para efeitos de remessa oficiosa ao serviço tributário competente.
21. As coimas estão prescritas.
22. O prazo normal de prescrição acrescido de metade são 90 (noventa) meses, ou seja, 7 (sete) anos e meio, prazo que já foi ultrapassado.
23. A fixação das coimas foi em data anterior a 26.01.2015, data esta que correspondente à instauração dos processos executivos fiscais.
*
TERMOS EM QUE, nos melhores de Direito que V.Exas, dentro da mais alta sapiência jurídica, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser aceite, por tempestivo, e, a final, ser julgado totalmente procedente, por provado, devendo, por conseguinte, ser REVOGADA, a sentença proferida pelo tribunal a quo, ordenando-se a baixa dos autos à 1.ª instância para julgamento do mérito da causa.
Caso assim se não entenda,
Sempre deverá a sentença do tribunal a quo ser totalmente REVOGADA, ordenando-se a baixa dos autos ao serviço tributário para efeitos de remessa dos autos ao serviço tributário competente para apreciação do pedido de adesão ao RERD.»
1.2. A Recorrida Fazenda Pública, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 1013 SITAF, no sentido da improcedência do recurso, no qual conclui:” (...) Resulta, em síntese, que aquando da entrada em vigor do regime excecional de regularização de dívidas os processos de contraordenação que estiveram na base da instauração dos referidos PEFs, os mesmos já se encontravam extintos.
De facto, o ora recorrente poderia usufruir dos benefícios previstos no âmbito do respetivo regime especial, caso tivesse procedido ao pagamento, o que não sucedeu.
Como igualmente, não efetuou o pagamento das coimas até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, de 08.06, ou seja, até 30 de setembro de 2015 (cf. artigo 4º, nº 2 e 3 e artigo 10º).
Daí que, nesta parte, fenecam os argumentos usados pelo recorrente
(...) não tendo sido a prescrição suscitada em sede própria e afastado o seu conhecimento oficioso nestes autos, somos de concluir que improcede, igualmente neste segmento, a sua invocação e apreciação por esta instância.”

1.4. Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo [cf. artigo 36.º, n.º 2, do CPTA, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea d) do CPPT, e artigo 278.º, n.º 3, do CPPT].
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: (i) do erro de julgamento de facto e de direito e, da prescrição.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1.ª instância e respectiva fundamentação:
«Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, dão-se como provados os seguintes factos:
1. Sobre a Reclamante foram instaurados o processo de execução fiscal n.º ...84, ...22 e ...49, nos quais se encontram em cobrança dívidas referentes a coimas e outros encargos de processos de contra-ordenação – cfr. processo de execução fiscal junto aos presentes e docs. de fls. 226 a 833 SITAF.
2. Em 19/07/2022 o Reclamante apresentou junto do órgão da execução fiscal dos processos referidos em 1 requerimento onde peticionava que lhe fosse aplicado o regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06 – cfr. doc. ... junto com petição de reclamação.
3. Por despacho da Chefe de Finanças ... de Gondomar-1, proferido em 17/08/2022, o requerimento referido em 2 foi indeferido – cfr. doc. 1 junto com a petição de reclamação.
4. O Reclamante foi notificado da decisão referida em 3 – cfr. doc. 1 junto com a petição de reclamação e informação do órgão de execução fiscal junta a fls. 839 SITAF.
5. A presente reclamação foi apresentada em 29/08/2022 – cfr. informação do órgão de execução fiscal junta a fls. 839 SITAF.
Factos não provados
Com relevância para a pronúncia a emitir nos presentes autos, inexistem factos que importe dar como não provados.
Motivação da decisão sobre a matéria de facto
A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes dos autos e no processo de execução fiscal apenso, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados, merecendo a credibilidade do tribunal, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova.»

2.2. De direito
As questões que ora cumprem apreciar são (i) a de saber se a sentença decidiu correctamente quando decidiu pela improcedência da reclamação deduzida pelo Executado ao abrigo do artigo 276.º e segs. do CPPT, no entendimento de que aquela incorre em erro de julgamento de direito ao considerar que ao ora Recorrente não assiste o direito a aderir ao regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, e bem assim a que no âmbito da execução se determine a adaptação dos processos de execução fiscal aqui em causa a versão da Lei n.º 25/2006, conferida pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, regime este mais favorável e, (ii) da prescrição das coimas, questão nova suscitada em sede de recurso.
Vejamos.
No âmbito de uma execução fiscal, para cobrança de dívidas referentes a coimas e outros encargos de processos de contraordenação, o executado suscitou junto do órgão de execução fiscal a aplicação do regime extraordinário de regularização de dívidas instituído pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, ou o regime da Lei n.º 25/2006, que lhe fora conferido também pela Lei n.º 51/2015, de 08/06 e, subsidiariamente, a adaptação dos presentes processos executivos aqui em causa à nova versão da Lei n.º 25/2006, conferida pela Lei n.º 51/2015, de 08/06, concretizada pela via do regime mais favorável instituído.
Essas pretensões foram negadas, entendendo o órgão da execução fiscal, em suma, que: a) o mesmo teve a possibilidade de usufruir do Regime Excecional de Regularização de Dívidas de Portagem (RERD) aprovado pela Lei 51/2015 de 8...

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