Acórdão nº 01927/09.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 2024-02-22

Data de Julgamento22 Fevereiro 2024
Número Acordão01927/09.0BEBRG
Ano2024
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Braga)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário, da Subsecção Comum, do Tribunal Central Administrativo Norte:

1.RELATÓRIO,
[SCom01...], Lda., vem recorrer da sentença do TAF de Braga que julgou improcedente a impugnação da liquidação do IRC de 2005.
*
Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

1.Entende a Recorrente que a douta decisão está deficientemente fundamentada, uma vez que teve em conta importantes factos relativos ao relatório de inspecção e baseia-se muito em remissões para documentos juntos aos autos, o que tem por consequência, salvo melhor entendimento, uma insuficiente fundamentação de facto relativamente à decisão de mérito da causa.
2.Não foi efectuada a necessária destrinça entre os factos considerados provados e os não provados e por outro lado, verificamos uma deficiente fundamentação para a motivação de facto, por remissão geral para meios probatórios em causa, não sendo tal aceitável.
3.A boa decisão da causa e os requisitos da sentença impõem que as sentenças sejam devidamente fundamentadas, sob pena das decisões estarem “vazias” de conteúdo.
4.Deste modo, entendemos que jamais pode conceder beneplácito a actuações do cariz da aprecianda, pelo que a Recorrente argui o vício da nulidade, nos termos do art. 125, n. 1 do CPPT e 668, n.º 1 c) do CPC.
5.No julgamento da matéria de facto a efectuar na sentença, deve o juiz pronunciar-se sobre a factualidade alegada e sobre a que lhe seja lícito conhecer oficiosamente e que se apresente relevante para a decisão a proferir à luz das diversas soluções de direito plausíveis (cf. art. 511.º, n.º 1, do CPC), discriminando também a matéria provada da não provada e fundamentando as suas decisões, procedendo à apreciação crítica e especificando os fundamentos decisivos para a sua convicção (cf. art. 123.º, n.º 2, do CPPT e art. 653.º, n.º 2, do CPC).
6.O incumprimento da prerrogativa em causa, não distinguindo entre factos provados e não provados, não valorando, designadamente, o relatório da fiscalização e não dizendo sequer se estão ou não provados os factos que a AT aí verteu e que a levaram a concluir pela falta de credibilidade da declaração, nem procedendo ao confronto crítico dos meios de prova conflituantes, limitando-se a apresentar como fundamentação do seu julgamento quanto aos factos uma referência genérica aos meios de prova que o terão suportado, fica o Tribunal ad quem impedido de sindicar esse julgamento.
7.O que impõe a anulação da sentença o que aqui se pretende venha a ser conhecido.
Sem prescindir,
8.A Recorrente não pode concordar com o alegado relativamente à excepção de caso julgado invocada no que respeita à caducidade do procedimento de inspecção tributária, considerando existir violação das normas dos arts. 497º e 498º do C.P.C.,
9.Porquanto não estão verificados os pressupostos de que depende, designadamente a identidade do pedido, uma vez que
na oposição intentada pela Recorrente o pedido consistia na extinção da execução, sendo que na impugnação se “ataca” a legalidade da liquidação,
10.Sendo inclusive este o meio adequado a tal pretensão.
11.Pelo que não se conforma a Recorrente com tal excepção, cuja ilegalidade aqui argui, por considerar, que com tal se viola o disposto nos arts. 497º e 498º do CPC.
12.Entende a Recorrente que o procedimento de inspecção caducou, por a inspecção que originou a liquidação ter ultrapassado os 6 meses, a que estava obrigada, sendo que a prorrogação foi notificada à ora Recorrente em momento posterior,
13.Sendo até duvidoso que seja admitida prorrogação em inspecção parcial. Como a dos presentes autos.
14.Termos em que, atenta a documentação junta aos autos, se deve inferir e dar como provado a caducidade do procedimento com posterior anulação da liquidação, na origem da presente impugnação, em violação do disposto no art. 36º do RCPIT.
A isto acresce,
15.Que nos encontramos perante uma errónea valoração da matéria de facto em causa que conduziu,
16.Num manifesto erro de julgamento, senão vejamos:
17.O douto tribunal deu como provado que a Recorrente contraiu diversos empréstimos de financiamento, junto de diversas instituições bancárias, registando-as na conta POC 68 “custos e perdas financeiras”, no valor de € 293 807,02, sendo que considerou não estar provado o nexo de indispensabilidade entre custos e proveitos.
18.Tal afigura-se-nos uma evidente violação da lei uma vez que, quem tinha de evidenciar, para proceder à correcção aritmética sub iudice, a inexistência do nexo de causalidade era a Administração Fiscal, não o Recorrente.
19.Entendemos, sob pena de subverter o sistema fiscal que cabe o ónus de prova da verificação dos pressupostos de facto e de direito que determinaram a AF a efectuar correcções técnicas constantes do relatório dos serviços de fiscalização, cumprindo-lhe demonstrar a factualidade que a levou a considerar determinado custo contabilizado como não indispensável à realização dos proveitos,
20.Devendo tal factualidade ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos documentos de suporte.
21.De acordo com o disposto no art. 89º do CIRC, a liquidação é efectuada pelo sujeito passivo, presumindo-se a sua veracidade.
22.Da prova produzida nos autos pela Administração Fiscal não se pode retirar a prova da não indispensabilidade.
23.É certo que a Recorrente contraiu empréstimos, e efectuou suprimentos à sociedade do grupo [SCom02...], mas da prova produzida não se retira que os suprimentos resultaram desses mesmos empréstimos.
24.Por seu turno, os suprimentos efectuados à sua dominada e o posterior empréstimo desta a uma sociedade estranha ao grupo de montantes pecuniários não pode reflectir o objectivo único de financiamento a terceiras entidades,
25.Não pode também inferir-se que dos empréstimos contraídos não houve contributo para rendimentos sujeitos a imposto.
26.Entende a Recorrente que só uma errónea apreciação da factualidade em causa, pode conduzir à improcedência da legitimidade da Recorrente para deduzir os custos em causa, em clara violação do disposto no.
27.O mesmo se diga quanto às provisões para depreciação de existências, que de acordo com o inventário junto aos autos, em 31/12/2005, foram constituídas da seguinte forma: provisões sobre mercadorias e produtos acabados, sendo que a distinção entre ambas reside na produção dentro do grupo e fora, respectivamente.
28.Respeitam as mesmas aos produtos que não puderam ser vendidos ao cliente que efectuou a respectiva encomenda, por incumprimento dos requisitos contratualmente estipulados,
29.Aos artigos produzidos a mais dos que os encomendados, para fazer face a eventuais pedidos extra do cliente,
30.E os restos peças defeito que são os produtos que não puderam ser vendidos ao cliente que efectuou a encomenda, por terem efectivamente defeitos propriamente ditos,
31.Da análise da contabilidade resulta que as provisões em causa são a diferença entre os custos de aquisição dos produtos, por um lado e os preços d emercado, por outro,
32.Sendo visíveis pela comparação com as facturas juntas aos autos, pelo que outra não poderá ser a solução, para além de que aquelas provisões são efectivamente resultado do deperecimento de produtos, que dada a sua especificidade não podem ser vendidos a preços ditos “normais”,
33.Pelo que a diferenciação de preços de mercado se justifica pelo facto de se atender à situação de cada um dos produtos, apenas comparáveis com idênticos.
34.Parece líquido que atenta a factualidade reportada aos autos as provisões em causa são susceptíveis de ser deduzidas fiscalmente, em cumprimento do disposto no art. 34º e 36º do CIRC, sob pena de com o erro de julgamento violarmos o disposto nos artigos em causa.
35.Considerados os riscos de constituição da provisão, as facturas juntas justificam preço de mercado, por idóneos.
36.Refira-se, que dadas as características únicas das peças, conforme acima referido, a justificação do preço de mercado, basta-se com artigos da mesma categoria.
37.Ora, as provisões constituem pois um custo/encargo destinados a fazer face a prejuízos que necessariamente se esperam mas cujo valor ainda se não conhece com precisão, pelo que, atendendo ao acima exposto, o valor de mercado encontrado já se verifica pelo básico.
NOS TERMOS ASSINALADOS, V. EXAS. ANULANDO A DOUTA DECISÃO, FARÃO A HABITUAL, JUSTIÇA.»

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A recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso: (…)
I- Quanto ao primeiro ponto, entende a aqui Recorrente que a douta sentença enferma de nulidade por falta de especificação dos fundamentos da decisão, referindo que «uma vez que se nos afigura que não existe fundamentação adequada relativamente á motivação da decisão de facto que se limita a enumerar os meios de prova tidos em conta na generalidade, o que, se nos afigura manifestamente insuficiente, tomando a decisão deficientemente fundamentada».
«Afigura-se-nos que na douta sentença não está patente uma correcta descriminação entre matéria de facto provada e não provada, o que se exige, com fundamento no n.° 2 do art. 123° do CPPT».
Não tem, porém, razão a recorrente. Com efeito, na sentença recorrida, o Mmo juiz elabora uma descrição detalhada dos factos que considera provados. Ao contrário do alegado pela recorrente, não se limita a efectuar remissão para os documentos, mas ao invés, isola e especifica concretamente os factos que considera provados e que são preponderantes para a aferição e dilucidação do mérito da causa. Por outro lado, efectua uma correcta fundamentação das motivações de facto com referência especifica em cada facto aos elementos de prova constantes dos autos, nomeadamente à prova documental e testemunhal.
Assim, ao invés do alegado, não se verifica a...

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