Acórdão nº 0186/23.6BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24-04-2024

Data de Julgamento24 Abril 2024
Número Acordão0186/23.6BALSB
Ano2024
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (PLENO DA SECÇÃO DO CT)
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa;

[ tramo 1 ]

A..., S.A., …, com apoio no disposto pelos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro ( Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária) (RJAMT). e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, recurso, objetivando uniformização de jurisprudência, da decisão (singular), proferida no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, formulado no processo n.º 245/2023-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (caad) ( Onde, a 20 de outubro de 2023, em primeira linha, se decidiu: «)
(a) Declarar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo o indeferimento parcial da reclamação graciosa oportunamente apresentada e, consequentemente a autoliquidação contra a qual a mesma se dirigia, atos tributários que deverão permanecer na ordem jurídica por estarem em conformidade com a Lei. ».)
Imputa-lhe contradição/oposição, com o decidido no acórdão, do STA, datado de 28 de outubro de 2020, lavrado no processo n.º 306/13.9BELRS.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com estas conclusões: «

A. Verificados os pressupostos previstos nos artigos 25.º e 26.º do RJAT, em observância do regime estatuído no artigo 152.º do CPTA (aplicável, com as devidas adaptações, ex vi n.º 3 do artigo 25.º do RJAT), vem a Recorrente interpor o presente recurso da Decisão Arbitral de 20 de outubro de 2023, proferida pelo tribunal arbitral no processo n.º245/2023-T, que se pronunciou sobre a (im)possibilidade de dedução do crédito de imposto por dupla tributação internacional melhor descrito nos referidos autos e relativo ao exercício de 2019, à derrama estadual do grupo de sociedades, encabeçado pela Recorrente, e tributado ao abrigo do RETGS, quando a sociedade do grupo que suportou o imposto no estrangeiro, gerador daquele crédito, não tenha apurado lucros sobre os quais seja calculada derrama estadual;

B. A Decisão Arbitral recorrida está em oposição quanto à questão identificada com o Acórdão de 28 de outubro de 2020, proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0306/13.9BELRS 0424/17 (Acórdão Fundamento).

C. Com efeito, no que respeita à questão fundamental de direito acima identificada, o Tribunal Arbitral respondeu negativamente, tendo concluído apenas ser possível a dedução de um crédito de imposto de uma sociedade do grupo à derrama estadual “individual” apurada sobre o seu próprio lucro.

D. Já no Acórdão Fundamento, o Supremo Tribunal Administrativo, perante uma factualidade em tudo idêntica à da Decisão Recorrida, inclusive no que diz respeito ao sujeito passivo, mas relativa ao exercício de 2011, e igualmente chamado a pronunciar-se sobre a questão identificada, concluiu expressamente pela possibilidade da dedução do crédito de imposto por dupla tributação internacional (bem como do RFAI) à derrama estadual do grupo, independentemente de as sociedades participantes que suportaram imposto no estrangeiro terem ou não contribuído para essa derrama.

E. Podendo ler-se no sumário de tal acórdão que «[e]stando em causa o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades, deve aplicar-se o disposto no n.º 6 do artigo 90.º do Código do IRC na sua plenitude, efetuando-se as deduções dos benefícios fiscais às colectas de IRC e da derrama estadual».

F. Pelo que estamos em presença de factos que se subsumem às mesmas normas jurídicas, em especial, o artigo 90.º, n.º 6 do Código do IRC, acima referido, e que regula as deduções à coleta nos casos em que seja aplicável o RETGS.

G. Normas essas que não sofreram alterações relevantes entre 2011 e 2019.

H. Não tendo ainda sobrevindo qualquer jurisprudência do STA que ofereça suporte à Decisão Arbitral.

I. Termos em que estão preenchidos os requisitos de admissibilidade do presente recurso previsto no artigo 25.º do RJAT e 152.º do CPTA.

J. Admitido o recurso, caberá apreciar o seu mérito e uniformizar-se a jurisprudência no sentido irradiado no Acórdão Fundamento.

K. Com efeito, a solução oferecida pelo Acórdão Fundamento é não só a solução que resulta da letra da lei, em especial do artigo 90.º, n.º 6 do Código do IRC, que determina expressamente que: «quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções referidas no n.º 2 relativas a cada uma das sociedades são efetuadas no montante apurado relativamente ao grupo, nos termos do n.º 1»,

L. Como é a única posição que se coaduna com a lógica de grupo que subjaz ao RETGS.

M. De facto, resulta do RETGS que a carga fiscal apurada e devida no âmbito deste regime tem por referência, não cada uma das sociedades individualmente consideradas, mas o grupo encabeçado pela sociedade dominante,

N. Sendo o grupo o único que, não só nos termos da lei, mas das próprias instruções de preenchimento da modelo 22, apura coleta à qual possam ser efetuadas deduções,

O. E que é, nos termos da definição legal da Lei Geral Tributária, o sujeito passivo do imposto; de todo ele, incluindo IRC, derramas e tributações autónomas. Aliás, só assim se compreende que a solidariedade passiva de fonte legal consagrada no Código do IRC para os grupos tributados ao abrigo do RETGS.

P. Como ensina a Professora Doutora PAULA ROSADO PEREIRA a «dupla tributação jurídica internacional [é] a incidência, em mais do que um Estado, (i) de impostos equivalentes, relativos (ii) ao mesmo sujeito passivo, (iii) ao mesmo facto gerador de imposto, e (iv) ao mesmo período de tributação» (cf. Princípios do Direito Fiscal Internacional, Coleção: Teses de Doutoramento, Almedina, Coimbra, 2020, pág. 24).

Q. E, portanto, sendo o imposto sobre o rendimento suportado no estrangeiro um imposto equiparável à derrama estadual, porque ambos são impostos sobre os lucros, sendo também o mesmo o sujeito passivo, bem como a fonte geradora do imposto e o período de tributação, há que aplicar o mecanismo convencional e legal de eliminação da dupla tributação, i.e., o mecanismo do crédito de imposto, que, in casu, funciona por crédito de imposto à coleta da derrama estadual do grupo.

R. Assim, e sendo já hoje consensual que a coleta a que se refere no artigo 90.º, n.º 2 e n.º 6 do Código do IRC inclui não apenas o IRC propriamente dito, mas também as derramas, é forçosa a conclusão de que a dedução a essa coleta, no âmbito do RETGS, deve ser efetuada na sua plenitude e, portanto, à derrama do grupo, e não a uma pretensa derrama “individual”, sem prejuízo de, no caso, a sociedade que suportou imposto no estrangeiro não tenha apurado lucros, sobre os quais, nos termos do artigo 87.º-A, n.º 3 do Código do IRC, tenha sido calculada derrama estadual.

S. Sem que a tal obste o facto de, para efeitos de cálculo da derrama estadual do grupo, o legislador tenha estabelecido no artigo 87.º-A, n.º 3 do Código do IRC que «quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as taxas a que se refere o n.º 1 incidem sobre o lucro tributável apurado na declaração periódica individual de cada uma das sociedades do grupo, incluindo a da sociedade dominante».

T. Já que, não só esse preceito se refere apenas ao cálculo do valor da derrama, podendo, o legislador, caso quisesse e tal como fez a respeito de outros aspetos do RETGS (como fez relativamente às tributações autónomas), excecionar da lógica de grupo, as deduções à coleta da derrama estadual, o que não fez,

U. Como tal exceção desvirtuaria e seria contrária à lógica da tributação do grupo como um todo, que concretiza o princípio constitucional de tributação em função da capacidade contributiva ou do luro real dos contribuintes.

V. Pelo que é de sufragar a decisão proferida no Acórdão Fundamento que vai de encontro à letra e ao espírito da lei, e está ainda em linha com outras decisões judiciais, nomeadamente o acórdão arbitral proferido no processo n.º 114/2020-T.

W. Assim, deve a jurisprudência ser uniformizada em conformidade com a decisão do Acórdão Fundamento (transcrito nas presentes alegações de recurso), no sentido de o crédito de imposto por dupla tributação internacional decorrente de imposto pago no estrangeiro por uma sociedade integrada num grupo sujeito ao RETGS poder ser deduzido à derrama estadual desse grupo, independentemente de aquela sociedade apurar resultados fiscais positivos.

X. Devendo a Decisão Arbitral recorrida ser anulada e substituída por outra que acolha a solução do Acórdão Fundamento.

6. DO PEDIDO

Nestes termos e nos demais de Direito, requer-se a V. Exas., ao abrigo do n.º 2 do artigo 25.º do RJAT, e observado o regime regulado no artigo 152.º do CPTA, aplicável ex vi do n.º 3 do artigo 25.º do RJAT, que, considerando verificada a contradição de julgados, se dignem uniformizar a jurisprudência e, consequentemente, anular a Decisão Arbitral recorrida, concedendo provimento ao presente recurso em conformidade com o Acórdão de 28 de outubro de 2020, proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0306/13.9BELRS 0424/17 (Acórdão Fundamento) por ser a decisão que melhor se harmoniza com o sistema jurídico tributário e os seus princípios, tudo com as demais consequências legais. »


*

Por despacho do relator, foi o recurso admitido, liminarmente, com efeito suspensivo, nos termos do art. 26.º n.º 1 do RJAMT.

*

A recorrida (rda) [ autoridade tributária e aduaneira (AT) ] contra-alegou e concluiu: «

1ª) No presente recurso não se verificam os pressupostos, contemplados nos arts. 25º nº 2 do RJAT, 152º nº 2 do CPTA e 27º nº 1, al. b) do ETAF, que permitam a apreciação de recurso para uniformização de jurisprudência interposto por A..., SA.

2ª) Constata-se que não existe uma verdadeira contradição quanto à mesma questão fundamental de direito, uma vez que enquanto que para a decisão arbitral...

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