Acórdão nº 01670/15.0BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2022-05-18

Ano2022
Número Acordão01670/15.0BELRS
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Processo n.º 1670/15.0BELRS (Recurso Jurisdicional)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública e “Banco A............, S.A.”, devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 26-05-2021, que julgou parcialmente procedente a pretensão deduzida pelo segundo, determinando a anulação da liquidação na parte relativa a juros de mora cobrados pelo incumprimento de contratos de crédito à habitação, no montante de €38.749,39, e correspondentes juros compensatórios, no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a liquidação de Imposto de Selo n.º 2015 6430000056 e de juros compensatórios n.º 2015 0000000643 a 0000000650, referente ao ano de 2012, no valor global de € 410.238,05.

A Recorrente Autoridade Tributária e Aduaneira apresenta nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

a) O sentenciado considerou que pelo facto de ambas as normas (art. 7º n.º 1 al. l) do CIS e Verba 17.3.1 da TGIS) fazerem referência a “juros …por empréstimos”, sem a especificação ao tipo de juros, gera a “conclusão de que a isenção se reporta aos mesmos tipos de juros que são abrangidos pela norma de incidência, desde que os empréstimos sejam «para aquisição, construção, reconstrução ou melhoramento de habitação própria»”.

b) A sentença impugnada não fez uma correta interpretação das normas em causa, dado que não atentou aos “elementos lógicos” de interpretação da lei, ou seja, aos elementos histórico, sistemático e racional ou teleológico.

c) No que se refere ao elemento histórico da norma de incidência, a tributação destas operações remonta à publicação do Decreto n.º 16732, de 13/04/1929, que introduziu a sujeição dos juros a imposto do selo, “2 por cento sobre a importância dos juros cobrados por desconto de letras e bilhetes do Tesouro, de empréstimos sobre penhores, de contas de crédito e suprimentos, de créditos em liquidação e de todos os juros de mora, de prémios e juros de letras tomadas, letras a receber por conta alheia, de saques nacionais emitidos ou de quaisquer transferências, e em geral de todas as comissões que se cobrarem”.

d) Posteriormente, com o Decreto-Lei n.º 134/81, de 29/05, que alterou a redação do art. 120º-A da então Tabela Geral do Imposto do Selo (Decreto n.º 21916, de 28/11/1932), a indicada norma de sujeição passou a prever “Juros cobrados por instituições bancárias, designadamente por desconto de letras e bilhetes do Tesouro, por empréstimos, por contas de crédito e suprimentos e por créditos em liquidação, sobre a respetiva importância – 3 por cento (selo de verba);”.

e) Atualmente, estando em causa “Operações realizadas por ou com a intermediação de instituições de crédito” (verba 17.3. TGIS), são sujeitos a imposto do selo à taxa de 4% sobre o valor cobrado “Juros por, designadamente, desconto de letras e bilhetes do Tesouro, por empréstimos, por contas de crédito e por crédito sem liquidação” (verba 17.3.1. da TGIS).

f) A norma de incidência sempre ambicionou, num espírito de generalidade e abstração, sujeitar a imposto do selo os juros cobrados, decorrentes da atividade regularmente prosseguida pelas instituições de crédito, independentemente da respetiva natureza e finalidade.

g) A norma de isenção (art. 7º n.º 1 al. l) do CIS) teve origem na alteração que foi feita ao art. 120º-A da Tabela Geral do Imposto do Selo (Decreto n.º 21916, de 28/11/1932, que corresponde à anterior TGIS), pelo Decreto-Lei n.º 119-B/83, de 28 de fevereiro, e as razões que levaram à estatuição da isenção foram:

“Quanto à tributação relativa a operações bancárias, precisa-se, em conformidade com a orientação de há muito seguida pela Administração, que quem suporta o ónus do imposto é quem dá origem à operação, isentando-se, porém, como medida de incentivo à aquisição de habitação própria, os juros dos empréstimos àquela destinados.” (vide preâmbulo).

h) Nesta sequência, o n.º 2 do art. 120º-A da Tabela Geral do Imposto do Selo passou a ter a seguinte redação: “Ficam isentos do imposto os juros dos empréstimos concedidos para aquisição de habitação própria.”.

i) O objetivo prosseguido com a isenção consagrada na al. l) do n.º 1 do art. 7º do CIS foi incentivar a aquisição de habitação própria, pelo que, estamos perante um benefício fiscal, que apresenta carácter excecional.

j) Ou seja, pretendeu o Estado incentivar a contratação de empréstimos à habitação própria e permanente, bonificando com a isenção os “juros dos empréstimos àquela destinados”.

k) Consequentemente, somente pode beneficiar da isenção de imposto do selo os juros cobrados nos empréstimos à habitação, porque o elemento justificador da despesa fiscal do Estado é contraída com a salvaguarda do interesse público de defesa do direito à habitação garantido sob o art. 65º da CRP.

l) Assim, ficando afastado o elemento justificador da despesa fiscal do Estado, ou seja, verificando-se um incumprimento contratual do mútuo para habitação própria e permanente, deixa de haver razão para ser mantido o incentivo fiscal, caso contrário estaríamos perante uma situação de uso e abuso do incentivo fiscal.

m) O incumprimento contratual, gerador de juros de mora, afasta-se largamente do intuito do incentivo fiscal concedido aos titulares do empréstimo à habitação própria e permanente.

n) Nos juros cobrados por força do incumprimento do contrato de crédito à habitação deixa de existir uma constrição à normal tributação, motivada por aqueles outros superiores interesses face aos “da própria tributação que impedem” (art. 2º n.º 1 do EBF).

o) No regime legal da concessão de crédito à habitação própria e permanente (Dec. Lei n.º 349/98, 11/11) ficou, desde logo, afirmado a necessidade de racionalização da despesa do Estado, e a necessidade desta ser adequada às necessidades reais do apoio à habitação, o que bem ilustra a exclusão de incumprimento contratual, com imposição de juros de mora.

p) Assim, intervindo uma instituição de crédito, as operações de cobrança de juros por empréstimos encontram-se sujeitas a tributação de imposto do selo ao abrigo da verba 17.3.1 da TGIS, mas estando em causa a cobrança a tributação dos juros remuneratórios pelo capital mutuado para o crédito à habitação própria e permanente, deve ser aplicada a isenção prevista no art. 7º n.º 1 al. l) do CIS.

q) Por oposição, estando em causa juros de mora, que não são devidos como remuneração pelo capital mutuado à Instituição financeira, mas, isso sim, por um incumprimento contratual, fica afastado o elemento justificador da despesa fiscal do Estado, que o legislador admitiu, única e exclusivamente, na situação do pontual cumprimento das cláusulas contratuais acordadas ao abrigo do produto financeiro de crédito - crédito à habitação própria.

r) Os juros de mora pelo incumprimento no pagamento do crédito à habitação não se encontram abrangidos pela isenção do art. 7º n.º 1 al. l) do CIS, porque jamais quanto aos mesmos o legislador podia, logicamente, estabelecer que os mesmos constituem uma “medida de incentivo à aquisição de habitação própria”, como resulta do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 119-B/83, que alterou o art. 120º-A da Tabela Geral do Imposto do Selo, que no seu n.º 2 passou a prever a isenção em causa, estatuindo “Ficam isentos do imposto os juros dos empréstimos concedidos para aquisição de habitação própria.”.

s) A decisão judicial impugnada fez uma errada interpretação da lei, afastando-se dos elementos de interpretação a que a lei deve obedecer, estando, em consequência, sustentada em erro de direito, por errónea interpretação e aplicação do direito, e, nessa medida, deve ser revogada.

t) A Recorrente deve ser dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que exceda os € 275.000,00, atendendo que, embora a questão em apreciação não seja de complexidade menor, a sua conduta não se afigura merecedora de censura, na medida em que pugna no recurso, de modo fundamentado, pela posição adotada, em conformidade com o direito aplicável, e sem utilizar qualquer meio que possa ser reputado de inútil, desadequado ou dilatório, além de não se afigura que venham a ser apresentados articulados ou alegações prolixas.


III. Pedido:
Requer-se doutamente a este Venerando Tribunal que considere o presente recurso procedente, com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que exceda € 275.000,00.
Visando a useira e acostumada justiça.

A Recorrida “Banco A............, S.A.” apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“(…)

1.ª A sentença recorrida julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o ato tributário consubstanciado na liquidação de Imposto do Selo n.º 2015 6430000056 e de juros compensatórios n.º 2015 00000006493 a 2015 00000006500, datada de 14.01.2015, no montante total de € 410.238,05, por referência ao ano de 2012;

2.ª Em causa nos autos está uma correção ao Imposto do Selo, efetuada pelos serviços de inspeção tributária à esfera do Recorrido, que tem como fundamento o facto de a isenção, prevista na alínea l), do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto do Selo, não abranger os juros moratórios decorrentes do incumprimento pontual do contrato de empréstimo para aquisição, construção e melhoramento de habitação própria, antes e apenas os juros remuneratórios decorrentes daquela operação;

3.ª Decidiu o Tribunal a quo que a interpretação do aludido normativo referente à isenção do Imposto do Selo não conduz ao entendimento segundo o qual o legislador pretendeu excluir os juros moratórios decorrentes do incumprimento do contrato de empréstimo, limitando-se a estabelecer que são isentos os juros relativos a empréstimos para aquisição, construção e...

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