Acórdão nº 01457/21.1BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12-01-2022

Data de Julgamento12 Janeiro 2022
Ano2022
Número Acordão01457/21.1BELRS
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (2 SECÇÃO)
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pelo Representante da Fazenda Pública, visando a revogação da sentença de 30-09-2021, do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a reclamação de A…………, com os demais sinais dos autos, contra o despacho da Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-1 que determinou a inclusão do seu nome na Lista de Devedores, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3069200601102877, originariamente instaurado contra B…………, LDA., para a cobrança de IRS dos anos de 2002 e 2003, e contra si revertido na qualidade de responsável subsidiário.

Inconformado, nas suas alegações, formulou o recorrente Representante da Fazenda Pública, as seguintes conclusões:

I. Veio o Reclamante, acima melhor identificado, interpor reclamação ao abrigo do artigo 276.º do CPPT, do despacho da Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-1 que determinou a inclusão do seu nome na Lista de Devedores publicitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3069200601102877, originariamente instaurado contra B…………, LDA., para a cobrança de IRS dos anos de 2002 e 2003, e contra si revertido na qualidade de responsável subsidiário.
II. Por sentença datada de 30-09-2021, veio o Mm.º Juiz do Tribunal a quo conceder provimento à Reclamação apresentada e, consequentemente, anular o despacho reclamado que determinou a inclusão do nome do Reclamante na Lista de Devedores Tributários.
III. Decorre dos nºs. 1 e 2, do artigo 52º da LGT que a cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que seja prestada garantia idónea nos termos das leis tributárias.
IV. Sendo inequívoco que o nº 1 do artigo 52º tem que ser conjugado com o nº 2 do mesmo preceito, do mesmo modo, também o nº 1 do artigo 169º do CPPT expressamente enuncia a exigência da constituição ou prestação de garantia como condição para a suspensão da execução. Resulta assim inequívoco que a suspensão do processo executivo só ocorrerá nos casos em que tenha sido constituída ou prestada garantia idónea, ou a penhora garanta a totalidade da dívida exequenda e do acrescido.
V. Na presença deste cenário normativo relativo à possibilidade de suspensão da execução fiscal, cumpre atentar que a publicitação dos contribuintes com a situação tributária não regularizada encontra-se prevista na al. a) do n.º 5 do art.º 64.º da LGT, publicitação esta que não contende com o dever de confidencialidade dos funcionários/dirigentes e demais agentes da administração fiscal. Nesta senda o n.º 6 desse mesmo preceito, remetendo para o disposto no art.º 177.º-A do CPPT, considera como situação tributária regularizada, entre outras, a suspensão da execução fiscal nos termos do n.º 2 do artigo 169.º, havendo garantia constituída, nos termos legais (ou dispensa desta).
VI. Perante este contexto normativo, a decisão sub judice escudando-se no princípio da justiça material vem interpretar o direito constituído de forma derrogatória do mesmo, ou seja, criando um quadro jurídico “ad hoc” em posição claramente contrária ao querido pelo legislador conforme se retira do quadro legal acima delineado.
VII. Resulta do art.º 9.º do Código Civil que: “2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. / 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.
VIII. Com efeito, e partindo do axioma de que toda a interpretação deve conter uma mínima correspondência na letra da lei, a sentença ora contestada vem distinguir onde o legislador não distinguiu. Assim, a velha máxima latina, segundo a qual "ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus", não parece autorizar, em nome de uma vaga ideia de justiça material, uma interpretação derrogatória do preceituado quer na alínea a) do n.º 5 do art.º 64.º da LGT quer no art.º 177.º-A do CPPT, aplicável por remissão do disposto no n.º 6 do art.º 64.º da LGT.
IX. Nestes termos, não pode a Fazenda Pública concordar com a apreciação do Tribunal a quo sobre o caso dos presentes autos, no sentido de que não estando ainda definitivamente estabelecida a responsabilidade do Reclamante pelo pagamento da dívida exequenda, seria um imperativo de justiça material que a Administração Tributária se abstivesse de levar a cabo a inclusão do nome do Reclamante na Lista de Devedores Tributários. Ao assim entender, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento da causa, violando o disposto na alínea a) do n.º 5 do art.º 64.º da LGT assim como o disposto no art.º 177.º-A do CPPT, aplicável por remissão do n.º 6 do art.º 64.º da LGT e ainda o disposto no art.º 9º do Código Civil.
TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO RECURSO, DEVE A SENTENÇA RECORRIDA SER REVOGADA COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS. PORÉM, V. EX.AS, DECIDINDO, FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!

O recorrido A………… produziu as seguintes contra-alegações:

O Representante da Fazenda Nacional veio interpor Recurso da douta sentença proferida Processo de Reclamação de Acto de Orgão de Execução Fiscal.
Em conclusões alega o Recorrente:
“1. Veio o Reclamante, acima melhor identificado, interpor reclamação ao abrigo do artigo 276° do CPPT, do despacho da Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-1 que determinou a inclusão do seu nome na Lista de Devedores publicitada pela Autoridade Aduaneira, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 3069200601102877 originariamente instaurado contra B…………, LDA., para a cobrança de IRS dos anos de 2002 e 2003 e contra si revertido na qualidade de responsável subsidiário.
2. Por sentença datada de 30-09-2021, veio o Mm.° Juiz do Tribunal a quo conceder provimento à Reclamação apresentada e, consequentemente, anular o despacho reclamado que determinou a inclusão do nome do Reclamante na Lista de Devedores Tributários.
3. Decorre dos nºs. 1 e 2 do artigo 54º da LGT que a cobrança da prestação tributária suspende-se no processo de execução fiscal em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados Membros, desde que seja prestada garantia idónea nos termos das leis tributárias.
4. Sendo inequívoco que o n° 1 do artigo 52° tem que ser conjugado com o n° 2 do mesmo preceito, do mesmo modo, também o n° 1 do artigo 169° do CPPT expressamente enuncia a exigência da constituição ou prestação de garantia como condição para a suspensão da execução. Resulta assim inequívoco que a suspensão do processo executivo só ocorrerá nos casos em que tenha sido constituída ou prestada garantia idónea, ou a penhora garanta a totalidade da dívida exequenda e do acrescido.
5. Na presença deste cenário normativo relativo à possibilidade de suspensão da execução fiscal, cumpre atentar que a publicitação dos contribuintes com a situação tributária regularizada encontra-se prevista na al. a) do n.° 5 do art.º 64. ° da LGT, publicitação e que não contende com o dever de confidencialidade dos funcionários/dirigentes e demais agentes da administração fiscal. Nesta senda o n.° 6 desse mesmo preceito, remetendo para o disposto no art. ° 177. °-A do CPPT, considera como situação tributária regularizada, entre outras, a suspensão da execução fiscal nos termos do n.° 2 do artigo 169. °, havendo garantia constituída, nos termos legais (ou dispensa desta).
6. Perante este contexto normativo, a decisão sub judice escudando-se no princípio da justiça material vem interpretar o direito constituído de forma derrogatória do mesmo, ou seja, criando um quadro jurídico “ad hoc” em posição claramente contrária ao querido pelo legislador conforme se retira do quadro legal acima delineado.
7. Resulta do art. ° 9° do Código Civil que: “2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. / 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.
8. Com efeito, e partindo do axioma de que toda a interpretação deve conter uma mínima correspondência na letra da lei, a sentença ora contestada vem distinguir onde o legislador não distinguiu. Assim, a velha máxima latina, segundo a qual "ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus", não parece autorizar, em nome de uma vaga ideia de justiça material, uma interpretação derrogatória do preceituado quer na alínea a) do n.° 5 do art.º 64.º da LGT quer no art.º 177.°-A do CPPT, aplicável por remissão do disposto no n.º 6 do art.º 64.º da LGT.
9. Nestes termos, não pode a Fazenda Pública concordar com a apreciação do Tribunal a quo sobre o caso dos presentes autos, no sentido de que não estando ainda definitivamente estabelecida a responsabilidade do Reclamante pelo pagamento da dívida...

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