Acórdão nº 01349/08.0BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 2023-12-14

Ano2023
Número Acordão01349/08.0BESNT
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (1 SECÇÃO)
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

1. AA, inconformada com o acórdão do TCA-Sul, que concedeu provimento aos recursos que a UNIVERSIDADE DE LISBOA e o contra-interessado, BB, haviam interposto do acórdão do TAF de Sintra (TAF) que julgara procedente a acção administrativa especial que contra estes intentara, dele interpôs recurso de revista, para este STA, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões:

(i) Cabimento do recurso de revista

a. Pelo que se alegou nos pontos 2.1 a 2.4 (relevância jurídica de importância fundamental), 2.5. a 2.7. (necessidade do recurso para uma melhor aplicação do direito) e 3. (violação de lei substantiva), verificam-se os pressupostos da admissão do recurso de revista, previstos no nº 1 do art.º 150º do CPTA, e também do pressuposto previsto no nº 2, pelo que o recurso deverá ser admitido.

(ii) Recurso

b. O acórdão reproduz ipisis verbis a decisão sumária e nele se faz, portanto, também um julgamento sumário, que enferma dos mesmos vícios que a decisão, já que a questão a decidir não é simples, desde logo porque não foi apreciada jurisdicionalmente de forma uniforme e reiterada, não cumprindo também o acórdão, por assim dizer sumário, os pressupostos processuais invocados, violando ele próprio os preceitos adjetivos invocados, concretamente o art.º 652, nº 1, alínea c) e o art.º 656º do CPC.

c. Por outro lado, o acórdão carece de fundamentação doutrinal, uma vez que a doutrina em que se apoia não é unanime e, bem pelo contrário, é posta em causa por outra, de igual valia e maioritária onde se entende que a maioria simples equivale a maioria relativa.

d. Também carece de fundamentação jurisprudencial, no que toca à tipologia das formas de deliberação por maioria, visto que cita, sem qualquer referência ou transcrição, apenas um acórdão do Tribunal Constitucional, quando existem acórdãos citados no texto destas, assim como no acórdão recorrido, outras que lhe são contrárias.

e. Em termos substantivos, antes de mais, a interpretação do art.º 52, nº 1 do ECDU, perfilhada na decisão/acórdão, deriva de um pensamento legislativo que não tem na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, nem está a presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, com ofensa, portanto, dos nºs 2 e 3 do art.º 9 do CC;

f. Por outro lado, o contexto do diploma em que esta norma se enquadra não é de molde a que se possa concluir que o legislador não encontrou razões para diferenciar o tipo de maioria adequado a cada uma das situações previstas no ECDU, que elas próprias são de natureza diferente, violando-se, assim, por erro de interpretação e aplicação, as normas atinentes conjugadas entre si: art.º 14 e 15º, art.º 21º e art.º 52º, nº 1.

g. Tanto mais que, a primitiva redação do ECDU pelo DL 448/79, de 13 de novembro, sofreu alterações, até a sua revogação pelo DL nº 205/2009, de 31 de agosto, nada menos que em número de 12, que não atingiram o artigo 52º, nº 1, apesar de terem atingido os art.º 15º, nº 2, e art.º 21º, nº 2., ficando assim reforçada a presunção de que o legislador quis consagrar as soluções que de início consagrou no art.º 52, nº 1, incorrendo a sentença/acórdão também neste aspeto em erro de interpretação e aplicação;

h. Por isso também é que não será correto que o Tribunal, na interpretação do nº 1 do art.º 25 do CPA, exclua da exceção à regra geral, precisamente, a maioria simples prevista em norma especial (art.º 52, nº 1), que, assim, afasta aquela regra geral, devendo considerar-se que a maioria simples equivale a uma maioria relativa e não uma maioria absoluta.

i. Confirmando isto mesmo, deve trazer-se à colação o facto de a norma equivalente ao art.º 25º na versão atual do CPA, o art.º 32º, alarga a exceção a regra da maioria absoluta também a norma estatutária através da qual poderá ser prevista uma maioria qualificada ou uma maioria relativa.

j. A decisão/acórdão recorrida viola, ainda, o art. 116º, nº 2 e 3, da CRP uma vez que (nº 2) as deliberações dos órgãos colegiais são tomadas na presença da maioria do número legal dos seus membros e que (nº3) são tomadas à pluralidade de votos, concluindo a doutrina que a maioria aqui prevista é uma maioria simples (ou relativa).

k. Por fim, a lei refere vários exemplos de deliberações/decisões por maioria simples, como no art.º 66, nº 5, do ETAF, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, e no Estatuto dos Magistrados Judiciais, aprovado pela Lei nº 21/85, de 30/07, onde a regra nos concursos quer para Juízes Desembargadores (art.º 47-A, nº 4), quer para Juízes Conselheiros, (art.º 52, nº 4), é da maioria simples de votos, tendo o presidente voto de qualidade.

A recorrida, Universidade de Lisboa, contra-alegou, concluindo do seguinte modo:

I - O recurso jurisdicional de revista excecional, interposto pela Autora, ora Recorrente, não deve ser admitido, pois não se verificam os pressupostos legais previstos no artigo 150.° do CPTA;

II - Por um lado, o regime legal em causa nos autos, constante do artigo 52.° do ECDU, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 448/79, foi revogado pelo Decreto-Lei n.° 205/2009, pelo que já não está em vigor há mais de 12 anos;

III - Por outro lado, não são conhecidos quaisquer casos, nem os mesmos são invocados pela Recorrente, para além do dos autos, em que esteja em apreciação aquele regime legal;

IV - Assim, julgamos ser manifesto que não se verificam os requisitos previstos no n.° 1 do artigo 150.° do CPTA, de relevância jurídica ou social, devendo, por isso, não ser admitido o recurso de revista excecional;

V - Sem conceder, o recurso deve igualmente improceder pois a decisão recorrida não merece qualquer censura;

VI - A interpretação do artigo 52.º, do ECDU, na redação dada pelo Decreto-Lei n.° 448/79, no sentido de que maioria simples é equivalente a maioria absoluta é a única que se afigura de acordo com o regime legal constante do ECDU bem como das restantes normas do regime legal aplicável;

VI - Não só àquela data havia o entendimento doutrinário de que os conceitos de maioria absoluta e simples eram equivalentes, como era o regime que decorria do ECDU por contraposição a maioria qualificada;

VII - Julgar equivalentes os conceitos de maioria simples do ECDU e de maioria relativa do CPA, entretanto publicado, não tem apoio no regime legal, e seria admitir um menos exigente que o regime geral de decisão dos órgãos colegiais de maioria absoluta, que nada na lei indicia que fosse querido pelo legislador.”

Por sua vez o contra-interessado, BB, também apresentou contra-alegações, onde enunciou as conclusões seguintes:

A. Uma decisão é “tomada por maioria simples dos votos dos seus membros” quando a decisão obtém mais de metade dos votos expressos (maioria simples ou maioria absoluta), e não, como pretende a Recorrente, quando tendo maior número de votos que outras decisões possíveis sem que, no entanto, tenha a maioria dos votos existentes.

B. Neste âmbito e contexto, é consensual na jurisprudência a equivalência entre maioria simples e maioria absoluta.

C. A deliberação final do júri, que graduou o Recorrido em 1.º lugar e a Recorrente em 2.º lugar, é conforme ao disposto no n.º 1 do artigo 52.º do ECDU.

D. Não pode ser assacada qualquer ilegalidade à deliberação que o ordena em primeiro lugar.”

Pela formação de apreciação preliminar a que alude o art.º 150.º, do CPTA, foi proferido acórdão a admitir a revista.

A Exmª. Magistrada do MP, notificada nos termos do art.º 146.º, do CPTA, não emitiu parecer.

Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

2. O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos:

“1) -A Autora [A], AA, é Professora Associada do quadro do Departamento de Ciência do Ambiente, do Instituto Superior de Agronomia [ISA], da Universidade Técnica de Lisboa [UTL] e reside na Rua ..., ..., ..., ....

2) -Em 20/09/2004, pelo Edital nº 1809/2004 (2ª série), do Presidente do Conselho Directivo do ISA, publicado no DR, 2ª série, de 15/10/2004, foi aberto concurso documental para o provimento no quadro do pessoal docente do ISA, de um lugar de Professor Associado do Departamento de Ciências do Ambiente, nas áreas científicas de Agrometereologia e Climatologia e Ciência do Solo, de cujo edital ora se destaca a seguinte passagem:

«III - o Instituto Superior de Agronomia comunicará aos candidatos (…).

Após a admissão dos candidatos ao concurso, deverão estes entregar nos 30 dias subsequentes ao da recepção do despacho de admissão:

a) Dois exemplares de cada um dos trabalhos mencionados no seu curriculum vitae;

b) Quinze exemplares, impressos ou policopiados, de um relatório que inclua o programa, os conteúdos e os métodos de ensino teórico e prático das matérias da disciplina ou de uma das disciplinas do grupo a que respeita o concurso.

IV - Na primeira reunião do júri, constituído nos termos dos artigos 46º e 50º, nº1, do Decreto -Lei nº 448/79, de 13 de Novembro, ratificado pela Lei nº 19/80, de 16 de Julho, que terá lugar nos 30 dias imediatos ao da publicação no Diário da República do referido júri, será analisada e discutida a admissão ou a exclusão dos candidatos.

A ordenação dos candidatos ao concurso fundamentar-se-á não apenas no mérito científico e pedagógico do curriculum vitae de cada um deles mas também no valor pedagógico e científico do relatório referido no nº 2 do artigo 44º do Estatuto da Carreira Docente Universitária.

O preceituado nos capítulos anteriores encontra fundamento legal nos artigos 44º, nº 1, 46º, 47º, 48º, 50º, 51º e 52º do Decreto-Lei nº 448/79, de 13 de Novembro, ratificado pela Lei nº 19/80, de 16 de Julho. (…)» - doc fls 71/ss do PA anexo.

3) -Em 03/12/2004, por despacho do...

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