Acórdão nº 01336/18.0BEPRT-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 08-04-2022

Data de Julgamento08 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão01336/18.0BEPRT-S1
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - RELATÓRIO

AS---, S.A. [devidamente identificada nos autos], Ré na acção que contra si foi intentada pela sociedade comercial AM---, Ld.ª [também devidamente identificada nos autos], inconformada, veio apresentar recurso da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a final da sessão da Audiência final, pela qual foi indeferido o requerimento probatório que a mesma havia enunciado a final da Contestação por si deduzida.
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No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

2. Conclusões.
I. Salvo o devido respeito, a R. discorda em absoluto do despacho proferido na audiência final e que decorre, aliás, da respectiva acta, despacho esse que indeferiu os requerimentos probatórios constantes de A) Prova por documentos na parte final da sua contestação;
II. Aliás, lendo o teor daquele despacho, detecta-se desde logo uma clara omissão de pronúncia, na medida em que é perfeitamente visível que não versam sobre o conteúdo dos requerimentos (das alíneas i) e ii)), já que não é minimamente exacto que a R. tenha requerido apenas “(...) a junção de documentos contabilísticos e das obrigações fiscais da Autora relativos aos custos com a reparação da viatura envolvida no acidente (...)”, omissão de pronúncia que, como sabido, gera nulidade que expressamente se invoca;
III. Mesmo toda a boa vontade interpretativa não é suficiente, por pouco que seja, para que se possa considerar que aquele despacho incidiu, p. ex., sobre a pretensão da R. no sentido de que se verificasse a junção aos autos da “(...) folha de obra (ou equivalente) referente aos mesmo documentos que a A. junta (nºs. 4 e 5) da qual conste por escrito em que data deu entrada naquela(s) oficina(s) o referido veículo, quando iniciou(aram) e quando concluiu(ram) a reparação do veículo e ainda quanto demorou esta em número de horas, em que data foi dada ordem para a sua reparação e por quem, em que data entregou(ram) o veículo reparado (...)” (carregado no original);
IV. Ora, tal matéria e tal requerimento (de contraprova, sublinhe-se) da R., considerando o alegado pela A., nomeadamente em 31º da p. i., reporta-se inequivocamente a uma parte do pedido indemnizatório da A. (vide também a este propósito o artigo 33º do petitório) e tem todo o interesse, não só para a defesa da R., mas especialmente para a boa decisão da causa;
V. Por outro lado, mesmo em relação àquilo que, de acordo com o despacho recorrido, o tribunal a quo já parece estar suficientemente esclarecido (e, salvo um qualquer erro de avaliação, parece que até se pode adivinhar em que sentido), vê-se com muita dificuldade (talvez com toda a dificuldade seja mais apropriado de dizer e não se esquecendo, ademais, a questão/dúvida de saber se o despacho também incide sobre esta parte da alínea ii) do requerimento de prova indeferido) que p. ex. não tenha qualquer relevância/interesse, nomeadamente para a boa decisão da causa, apurar se a A., uma empresa ligada ao transporte de passageiros (táxis), recuperou/deduziu o montante respeitante ao I. V. A. (cfr. artigo 21º nº 1 alínea a) do C. I. V. A., a contrariu sensu), o que, considerando o alegado em 28º e 29º do petitório e os docs. nºs. 4 e 5 juntos, representa a quantia de € 2.225,98 (= € 1.125,70 + € 1.100,28) num montante total peticionado pela reparação do veículo de € 11.904,15 (Ora, esse era o sentido – que bem se percebe, de resto – de uma parte do requerimento que se pode ler na alínea ii) de A) Prova por documentos.);
VI. Mais: ainda em relação à “fundamentação genérica” (e pouco clara, salvo o devido respeito) do despacho em crise que serviu para indeferir toda a pretensão probatória da R. constante de A) Prova por documentos – recorde-se: “(...) a junção de documentos contabilísticos e das obrigações fiscais da Autora relativos aos custos com a reparação da viatura envolvida no acidente (...)” – não só esta não é exacta, dado que são “pedidos” documentos também das oficinas reparadoras (e o despacho nada diz a esse respeito), mas também porque é manifesto que essa prova é de toda a utilidade tanto para a defesa da R., como sobretudo para a boa decisão da lide (não consta alegado, p. ex., que o veículo sofreu danos no pára-brisas em consequência do sinistro, além de que parece muito difícil, para dizer o menos, atento o “tipo” e a descrição do sinistro, bem como a prova produzida, ainda que com base apenas em declarações de parte, que isso possa ter acontecido – e o que é certo é que do doc. nº 4 resulta que terá sido aplicado um pára-brisas com o custo de, pelo menos, € 532,21);
VII. Sobre os documentos contabilísticos e aqueles respeitantes ao cumprimento de obrigações fiscais (declarativas e de pagamento) da A., mas também daquelas oficinas a que se reportam os docs. nºs. 4 e 5 juntos com o petitório, nada melhor que, estes existindo, serem carreados para os autos, posto que isso permitirá muito mais facilmente (para lá de toda a prova testemunhal, portanto), e sendo o caso, naturalmente, estabelecer e perceber, de uma forma mais clara e inequívoca e na sua integralidade (ainda que correndo a R., com esta sua “iniciativa”, o risco de, por assim dizer, auxiliar a A. na sua pretensão probatória), o tráfico jurídico (e a economia) subjacente ao que vem alegado no petitório a este propósito;
VIII. Acresce dizer que tais requerimentos probatórios destinavam-se, como bem se percebe, mormente da sua formulação, a opor contraprova aos factos alegados pela A. no petitório e à prova que esta se propunha fazer sobre eles, sendo, de resto, bem sabido, que consequências se deveriam daí extrair no caso de a R. ser bem sucedida nessa sua pretensão (que dizer, p. ex., e sem prejuízo de se entender que a R. deve ser absolvida dos pedidos formulados pela A., da hipótese de a Autoridade Tributária vir a confirmar que a A. deduziu/recuperou o I. V. A. inscrito nos docs. nºs. 4 e 5?);
Isto posto,
IX. Nada a dizer sobre a questão da repartição do ónus da prova e particularmente sobre a circunstância de estar cometida à A. a prova dos factos constitutivos do seu eventual direito, sendo certo que jamais a R. se quis “substituir” à A. na prova dos factos que a ela, A., está indiscutivelmente cometida, mas antes, e isso sim, opor contraprova a esses factos e à prova que viesse a ser produzida pela A. com esse propósito;
X. Ora, esse – tal como decorre do disposto no artigo 346º do Cód. Civil – é um direito que manifestamente assiste à R. e que o tribunal a quo, sem qualquer motivo válido ou legal, mais que o coarctar a esta R., impediu com este despacho, assim remetendo a R. (e também a Interveniente) para uma posição meramente “passiva” e apenas sujeita ao sucesso ou insucesso da prova que o A. entendesse vir a fazer, o que é, salvo o devido respeito, totalmente inaceitável;
XI. Neste passo, cabe ainda repetir que é inquestionável o interesse, quer para a defesa da R., quer até e sobretudo para a boa decisão da causa, das diligências probatórias requeridas pela R. (sempre – recorde-se – na perspectiva da contraprova);
XII. Por outro lado, é também evidente que com esta decisão de indeferimento dos requerimentos probatórios da R., o tribunal a quo, com este despacho, violou, para além do já mencionado artigo 346º do Cód. Civil, também o disposto no artigo 4º do Cód. Proc. Civil, dado que, mais uma vez sem qualquer razão válida ou legal, negou à R., designadamente, o princípio de igualdade (ou da igualdade de armas) que ali se prevê e que deve ser assegurado ao longo de todo o processo e até mesmo quanto a estas questões de prova (ou contraprova);
XIII. Nessa medida, entende a R. que o despacho de que se recorre deve ser revogado por este tribunal ad quem e substituído por um outro que, para efeitos de contraprova (de harmonia, aliás, com o que decorre daqueles requerimentos), defira todos os requerimentos de prova por documentos da R. que decorrem da parte final da contestação e que, salvo o devido respeito, mormente por melhor opinião, foram indeferidos indevidamente.
Termos em que, e face ao que antecede, se deve dar total provimento ao presente recurso e respectivas conclusões, revogando-se a decisão (despacho proferido na audiência final e que indeferiu os requerimentos de prova por documentos da R.) de que se recorre, substituindo-se por uma outra que defira os requerimentos probatórios constantes da parte final da contestação da R., tudo com as necessárias consequências legais e como é de inteira justiça.
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A Recorrida AM---, Ld.ª, apresentou Contra alegações, sem que tenha enunciado as respectivas conclusões, mas de onde se extrai, de todo o modo, que o recurso deve ser julgado improcedente.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de sustentação da nulidade invocada, assim como de admissão do recurso, com fixação dos seus efeitos.
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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.
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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que a declare nula, sempre tem de decidir “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.” [Cfr. artigo...

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