Acórdão nº 01116/10.0BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22-03-2023

Data de Julgamento22 Março 2023
Ano2023
Número Acordão01116/10.0BESNT
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo - (PLENO DA SECÇÃO DO CT)
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. Relatório
1.1. A..., Lda., identificada nos autos, invocando o disposto no n.º 3 do artigo 280.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpôs recurso por oposição de acórdãos, do acórdão de 05 de março de 2020, proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul.

Por despacho de 10/09/2020 o senhor Desembargador Relator, depois de identificar os pressupostos da oposição de acórdãos prevista no artigo 284.º do CPPT, determinou a notificação da Recorrente para identificar a questão jurídica em causa e o acórdão fundamento que lhe corresponde.

No cumprimento daquele despacho a Recorrente veio indicar como acórdão fundamento o acórdão da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul de 17/10/2019, proferido no processo n.º 0903/10.4BESNT. E no que respeita à questão de direito referiu:
"Saber se a desconsideração dos custos contabilizados com o pagamento das rendas de um contrato de locação financeira (emitidas à Recorrente por um Banco de referência, como é o Banco 1...) se mostra, ou não compatível com o método directo de correção utilizado pela Autoridade Tributária, sem que:
(i) se questione se os bens objecto da locação financeira são, ou não, estranhos à actividade da contribuinte,
(ii) se questione a indispensabilidade dos custos contabilizados pela contribuinte com as facturas das rendas de locação financeira,
(iii) se questione a credibilidade do Banco emitente (quer como eventual beneficiário de facturação falsa, quer como falso emitente) e se possa das como cumprido pela AT o ónus probatório da recolha de indícios suficientes e objectivos que traduzem uma probabilidade séria de que as facturas em questão (emitidas à Recorrente pelo Banco 1...) não titulem operações reais - o que fará com que fique comprometida a legalidade das liquidações adicionais impugnadas, por não haver indícios de que assentam em faturação relativa a operação fictícia, nem que tal operação de leasing e serviços titulados pelas facturas emitidas por um Banco de referência a operar no sistema financeiro nacional e holístico, correspondam a uma operação simulada.”

Por despacho de 09/10/2020 o senhor Desembargador Relator admitiu o recurso nos seguintes termos:
Recurso de uniformização de jurisprudência (5448/551):
Por estar em tempo, interposto por quem tem legitimidade e observadas as prescrições do artigo 284.º do CPPT, admite-se o recurso em apreço, o qual sobe nos autos, com efeito devolutivo.
Notifique.”

No mesmo despacho foi admitido o recurso de revista interposto também pela Recorrente e determinada a subida dos autos ao Supremo Tribunal Administrativo.

Por despacho de 04/12/2020, o senhor Desembargador Relator determinou a notificação das partes para alegarem nos termos do artigo 282.º, n.º 3, do CPPT, indicando que se tratava da versão anterior à Lei n.º 118/2019, de 17/09.

A Recorrente alegou, concluindo da seguinte forma:
A) O presente recurso tem como objeto o Acórdão de 05-03-2020, proferido nos autos pelo Tribunal Central Administrativo Sul, o qual, com declaração de voto do Exma. Senhora Juiz Desembargadora 2.ª Adjunta, acorda negar provimento ao recurso jurisdicional interposto e confirmar a sentença recorrida do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, proferida a 31-12-2018, que julgara improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IRC e os respetivos juros compensatórios referentes ao exercício de 2005, mantendo-os na ordem jurídica.
B) O acórdão recorrido encontra-se em contradição com o Acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul de 17 de outubro de 2019, proferido no processo n.º 903/10.4BESNT pela Exma. Senhora Juiz Desembargadora Relatora Dra. Cristina Flora - Acórdão fundamento.
C) O acórdão recorrido encontra-se em contradição com o Acórdão fundamento, nomeadamente no que respeita às correções efetuadas pela Autoridade Tributária por desconsideração, por via de correções diretas, dos custos suportados pela contribuinte e por si contabilizados com o pagamento das rendas de um contrato de locação financeira faturadas por uma entidade bancária (no caso, o Banco 1... S.A.) e do IVA declarado aquando da emissão das respetivas faturas, sem que se dê a devida relevância ao conteúdo objetivo do artigo 23.º do Código de IRC, quando dispõe que: "consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora...”, bem como aos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º da Lei Geral Tributária.
D) Na apreciação dos fundamentos do recurso seguiu o acórdão recorrido (cf. fez constar a fls. 89) "de perto a fundamentação constante do Acórdão proferido por este TCAS, no P. 1383/10.0BESNT, em 17.10.2019, por formação parcialmente idêntica (Relator e 1.a Adjunta), incidente sobre o IVA 2005, baseado na mesma matéria de facto em causa nos autos e tendo por base idênticas alegações de recurso”, e em cujo Sumário do Acórdão se pode ler: "Descritores: IVA. Faturas falsas. Existindo indícios sérios e consistentes da falsidade das facturas relativos a rendas pagas no âmbito de contrato de locação financeira, outorgado com vista a encobrir a concessão de empréstimo de um banco ao sócio majoritário do sociedade, impõe-se à impugnante um esforço probatório ordenado à demonstração da materialidade económico-financeira das operações em análise, através de alegação e prova de factos concretos que a sustentem.”
E) Sob escrutínio nos presentes autos estão as facturas das rendas do contrato de locação financeira n.º ...55 celebrado com o Banco 1... S.A. (Banco 1...), emitidas por esta instituição bancária à Recorrente e por esta pagas, na íntegra, cujas custos e deduções de IVA foram desconsiderados pela Autoridade Tributária (AT), não obstante serem documentados por facturas válidas e legais, nunca nenhuma consideração tendo sido tecida sobre as mesmas ou reputadas como sendo "falsas” ou "de favor”, ou invocado qualquer abuso de formas jurídicas, para que tais operações possam ser desconsideradas.
F) Perante tal inconsistência interpretativa e inconformado, reitera a Recorrente a sua discordância relativamente aos termos da decisão e sua contradição com decisões jurisprudenciais anteriores, porquanto, in casu, a AT não agiu, como lhe competia para legitimar a sua actuação, reunindo os requisitos de prova indiciária necessários à afirmação do carácter fictício das operações declaradas nas facturas, tendo em conta que o que se discute nos presentes autos é a veracidade dos serviços titulados pelas facturas emitidas pelo Banco 1... à Recorrente, referente ao período de IRC de 2005, e a sua susceptibilidade de constituírem custos do exercício e de conferir o direito à dedução do IVA suportado nas rendas do contrato de leasing a que essas mesmas facturas respeitam,
G) Com efeito, compulsados os autos, dos mesmos resulta que não logrou a AT demonstrar nem indícios de ser o contrato de locação financeira uma operação simulada, nem a falta de correspondência com a realidade do teor das declarações, contabilidade e da escrita (pelo que deverão estas necessariamente ser consideradas verdadeiras).
H) Os apontados indícios são insusceptíveis para servir de fundamento e suporte à douta decisão recorrida: (i) quer quanto à demonstração da imprescindibilidade dos custos, para efeitos de IRC, constantes das facturas em questão no período em análise (designadamente, facturas das rendas pagas pela Recorrente ao Banco 1... no ano de 2005 no contrato de locação financeira n.º ...55, cf. fls. 67/101 e 73/101 do RIT e Anexo 17 do RIT); (ii) quer quanto à falsidade das facturas em presença — cumpre referir que o contrato de locação financeira n.º ...97 celebrado com o Banco 1... foi pontualmente cumprido pela Recorrente (alínea J) dos factos provados), que suportou o pagamento integral de todas as facturas emitidas pelo Banco 1..., razão pela qual a Recorrente deduziu os respectivos custos (valores questionados pela AT) e IVA suportado e o Banco 1... registou os respectivos proveitos (não questionados pela AT) e entregou ao Estado o IVA liquidado!
I) Face ao exposto, ao contrário do que entende a decisão recorrida, conclui-se que não logrou a AT cumprir com o seu ónus probatório, pois, como se demonstra, não recolheu indícios suficientes e objectivos, os quais traduzem uma probabilidade séria de que as facturas emitidas pelo Banco 1... à Recorrente em questão nos autos não titulam operações reais - carecendo, por conseguinte, a AT de fundamento que a legitime a desconsiderar os custos e dedução de IVA não são aceites apenas porque o valor dos equipamentos se encontra supostamente sobrevalorizado.
J) Assim sendo, feito o devido enquadramento normativo, afiguram-se manifestamente insustentáveis as correcções efectuadas pela AT por desconsideração, por via de correcções directas, dos custos suportados pela contribuinte e por si contabilizados com o pagamento das rendas de um contrato de locação financeira facturadas pelo Banco 1... e do IVA declarado aquando da emissão das respectivas facturas sem que dê a devida relevância ao conteúdo objectivo do artigo 23.º do Código do IRC, bem como aos n.ºs 1 e 2 do artigo 75.º da LGT.
K) Neste sentido decidiu o recurso no Acórdão Fundamento, interposto pela B..., Lda. da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que deu provimento ao recurso, julgando improcedente a impugnação por aquela deduzida contra a liquidação adicional de IRC juros compensatórios de 2005.
L) Os dois arestos em confronto abordam situação de facto substancialmente idêntica. Não obstante, no acórdão recorrido se tratar da impugnação de liquidações adicionais de IVA (mencionado em faturas emitidas pelo banco pelo pagamento das rendas de um contrato de...

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