Acórdão nº 0101/20.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão0101/20.9BALSB
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
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A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA interpôs recurso, para uniformização de jurisprudência, dirigido ao Pleno da Secção de Contencioso Tributário do S.T.A., visando o aresto arbitral proferido no âmbito do processo nº.706/2019-T, datado de 2/07/2020, o qual julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, deduzido pela sociedade recorrida, em consequência do que e além do mais, anulou o acto de liquidação adicional de I.V.A. e juros compensatórios, referente ao período de Dezembro de 2008 e no montante total de € 4.663.163,81.
O recorrente invoca oposição com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário deste S.T.A., proferido em 15/11/2017, no âmbito do rec.485/17 (cfr.cópia junta a fls.181 a 195 do processo físico), transitado em julgado.
X
Para sustentar a oposição entre a decisão arbitral recorrida e o aresto fundamento, a entidade recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.4 a 48 do processo físico), formulando as seguintes Conclusões:
A-O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão arbitral e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição pela parte vencida;
B-Nos termos do artigo 25.º/2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (Decreto-Lei 10/2011, de 20 de janeiro), «a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é ainda susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo»;
C-De acordo com o n.º 3 do citado artigo «ao recurso previsto no número anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral»;
D-Quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário que: a) As situações de facto sejam substancialmente idênticas; b) Haja identidade na questão fundamental de direito; c) Se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e d) A oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas;
E-Para que se considere que há oposição de soluções jurídicas, entende a jurisprudência do STA que ambos os acórdãos devem versar sobre situações fácticas substancialmente idênticas;
F-Tal como refere o acórdão do STA proferido a 2010-12-07 no âmbito do processo n.º 0511/06, (1) «Para que exista oposição, não é exigível uma total identidade de factos – que muito raramente se verificará – mas, antes, que eles preencham a mesma hipótese normativa, isto é, concretizem a mesma fattispécie legal.»;
G-A oposição de soluções jurídicas pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida não como uma total identidade dos factos, mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais;
H-Subjacente ao acórdão recorrido, foi dada como provada a factualidade narrada nas alegações, para cuja leitura se remete;
I-Subjacente ao Acórdão Fundamento, foi dada como provada a factualidade narrada nas alegações, para cuja leitura também se remete;
J-Entre o acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto;
K-Em ambos os casos, Autora e a ora Recorrida têm natureza de sujeito passivo misto em sede de IVA, exercendo actividades sujeitas a IVA e actividades isentas de IVA;
L-Ambas consubstanciam instituições de crédito abrangidas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e exercem, entre outras, as actividades de leasing (locação financeira) e ALD (aluguer de longa duração);
M-Ambas corrigiram valores deduzidos ao longo de um período fiscal (2008/12 e 2010, respectivamente), por força do pro rata definitivo determinado para o respectivo ano, dado terem observado as instruções da Autoridade Tributária constantes no Ofício-Circulado n.º 30.108, de 30- 01-2009;
N-Ambas apuraram um montante a deduzir distinto ao apurado por recurso ao pro rata provisório;
O-No acórdão recorrido, a declaração periódica de IVA em causa para o exercício de 2008, a Recorrida incluiu no cálculo do pro rata o valor das amortizações financeiras relativos aos contratos de locação financeira (leasing e ALD), aplicando por essa via uma percentagem de pro rata de 20%, o que se traduziu na regularização mensal a seu favor o montante adicional de € 4.094.627,58, face ao apuramento inicial do pro rata de 6%, que, seguindo as instruções do Ofício-Circulado n.º 31.308, se cifrava num montante de dedução de € 1.769.918,09;
P-No acórdão fundamento, a Autora apurou um montante a deduzir distinto do apurado por recurso ao pro rata provisório, tendo sido calculado um pro rata definitivo para 2010 de 24%, com base em entendimento da AT mencionado na instrução administrativa 30.018;
Q-Ao incluir no cálculo do pro rata o valor das amortizações financeiras para o ano de 2010, o pro rata apurado (provisório) fixava-se em 69%;
R-Ambas imputam aos actos de liquidação de IVA vícios de violação de lei, por entenderem que nos termos do artigo 23.º, n.º 2, 3 e 4 do CIVA, o pro rata de dedução deve considerar no seu cálculo o montante anual da globalidade das rendas de locação financeira e não apenas o montante correspondente aos juros e outros encargos relativos à actividade de leasing e ALD;
S-Enquanto que no acórdão fundamento se entendeu que o decidido pelo TJUE no processo C-183/12, o artigo 23.º, n.º 3 do CIVA constitui a transposição do artigo 17.º, n.º 5, parágrafo 3, c) da Sexta Directiva e que, sendo assim, os Estados membros podem obrigar uma instituição bancária, que exerce actividades de locação financeira, a incluir no numerador e denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos contratos de locação financeira, correspondente aos juros, a decisão arbitral entendeu, por oposição, e remetendo para o decidido nos acórdãos 309/2017-T e 311/2019-T, que a referida norma da Sexta Diretiva não foi transposta para o direito interno e, como tal, deve constar do denominador da fracção a totalidade da renda (juros e capital), bem como que o artigo 23.º, n.º 3 do Código do IVA não contém qualquer menção que permita à Autoridade Tributária impor condições à percentagem de dedução relativamente a um sujeito passivo que opta pelo método do pro rata, para além das instruções objectivas que são fornecidas por aquele artigo, no seu n.º 4, recusando dessa forma a aplicação do Ofício-circulado n.º 30108/2009;
T-Para que haja oposição de acórdãos é ainda necessário que as decisões em confronto se pronunciem sobre a mesma questão fundamental de direito, ou seja, importa que as soluções opostas tenham sido perfilhadas relativamente ao mesmo fundamento de direito;
U-Estava em causa em ambos os processos aferir da determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afectos tanto a operações tributadas como a operações isentas; Aferir se a Autoridade Tributária pode impor a uma Instituição de Crédito que seja sujeito passivo misto em sede de IVA que, na determinação do pro rata dedutível para efeitos do cálculo deste imposto, considere apenas os juros, excluindo da fracção a parte referente à amortização das rendas dos contratos de locação financeira e os valores de alienação/abate por destruição dos bens locados;
V-O acórdão arbitral decidiu por remissão argumentativa ao que foi julgado nos processos 309/2017-T e 311/2019-T, cujos excertos se encontram transcritos nas alegações, para cuja leitura se remete;
W-Os fundamentos que escoram a decisão arbitral e que assentam nos processos 309/2017-T e 311/2019-T saem reforçados, quando, acerca da alegada falta de demonstração dos pressupostos necessários à actuação da Autoridade Tributária, o Tribunal arbitral decide que:
«Mas, mesmo que o método previsto no ponto 9 do Ofício Circulado assegurasse mais eficazmente os referidos princípios, a falta da sua previsão em diploma legislativo nacional, em matéria em que não é directamente aplicável qualquer norma de direito da União Europeia, sempre seria um obstáculo intransponível à sua aplicação, por força do princípio da legalidade, em que se insere o da hierarquia das fontes de direito, à face do qual não é constitucionalmente admissível que seja reconhecido a actos de natureza não legislativa «o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos (artigo 112.º, n.º 5, da CRP), para mais em matéria sujeita ao princípio da legalidade fiscal, em que se está perante matéria inserida na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n 1, alínea i), da CRP] . Na verdade, a força vinculativa das circulares e outras resoluções da Autoridade Tributária e Aduaneira de natureza geral e abstracta, publicitadas circunscreve-se à ordem administrativa, pois resulta somente da autoridade hierárquica dos agentes de onde provêm e dos deveres de acatamento dos subordinados aos quais se dirigem. Por isso, as orientações genéricas da Autoridade Tributária e Aduaneira, nomeadamente quanto à interpretação da lei fiscal, apenas vinculam os...

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