Acórdão nº 00880/14.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-04-13

Data de Julgamento13 Abril 2023
Ano2023
Número Acordão00880/14.2BECBR
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Coimbra)
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
O Recorrente, «AA», contribuinte n.º ..., devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a OPOSIÇÃO à execução fiscal n.º ...18 e apensos, originariamente instaurada contra a sociedade «X, Lda.», contra si revertida, por dívidas de IRC e IVA de 2013, no valor global de € 50.346,96.

O Recorrente não se conformando com a decisão interpôs recurso tendo formulado as seguintes conclusões, que se reproduzem:
“(…)
1. O presente recurso vem interposto de decisão que julgou a oposição apresentada nos presentes autos improcedente.
Recurso da matéria de facto
2. O recorrente entende que, atendendo à prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, bem como à prova documental, ocorreu erro notório na apreciação da prova.
3. O que leva à existência de um erro de julgamento.
4. O meio probatório dos autos que impõe decisão de facto diversa da recorrida é o depoimento de «BB», cujo depoimento se encontra gravado no ficheiro CP_1020095934987_01, na sessão de julgamento de 20-10-2015.
5. A prova testemunhal produzida impõe que seja dado como provado o seguinte facto:“- Não foi por culpa do oponente que o património da sociedade devedora originária se tornou insuficiente para assegurar o pagamento dos débitos fiscais.”
6. Ainda, o recorrente invocou diversos factos na oposição que apresentou, a saber os factos insertos nos artigos 14º, 16º, 19º, 25º e 29º.
7. Tais factos, além de não resultarem da matéria de factos considerada provada, também não resultam da matéria de factos considerada não provada que não existe na sentença.
8. O certo é que, os factos invocados são relevantes para a decisão a proferir porquanto relacionam-se com a verificação ou não dos pressupostos legais da reversão.
9. Em face do exposto, a douta decisão proferida, porque se verifica uma absoluta ausência de discriminação dos factos não provados, é nula, nos termos do disposto no art. 125º do CPPT.
Recurso da matéria de direito
10. A reversão depende da verificação de um conjunto de pressupostos materiais e pressupostos formais.
11. Para que seja possível haver uma assunção da responsabilidade subsidiária em relação a uma concreta dívida societária, é necessário a existência da suscetibilidade legal de o concreto gerente poder ser responsável subsidiário.
12. Não bastando à Administração Tributária invocar a gerência por parte do aqui recorrente.
13. De facto, à Administração Tributária cabe a prova da gerência de facto – neste sentido veja-se a anotação ao art. 24.º da LGT de RICARDO, Joaquim Fernando – Direito Tributário. Colectânea de Legislação. Notas e remissões. 8.ª ed., Porto: Vida Económica, 2009, p. 36.
14. Pode ler-se no sumário do Ac. de 14 de Janeiro de 2010, do Tribunal Central Administrativo Norte, Proc. n.º 00787/06.7BEBRG o seguinte: “III – Não há
presunção legal que imponha a conclusão de que quem tem a qualidade de gerente de direito exerceu a gerência de facto.”
15. Também, o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, a 02-02-2012, no processo 00273/09.3BEPNF, entendeu: “III. È à AT, enquanto exequente, que compete demonstrar a verificação dos pressupostos que lhe permitam a reverter a execução fiscal contra o gerente da sociedade originária devedora e, entre eles, os respeitantes à existência da gestão de facto. IV. Para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efectivamente, dos respectivos poderes, que seja um órgão actuante da sociedade, não podendo a mesma ser atestada pela prática de actos isolado praticados pelo Oponente.”
16. Desde logo, importa referir que compulsados todos os factos provados, não resulta de nenhum deles que o oponente tenha exercido a gerência de facto.
17. O único facto que se refere à gerência de facto, é o facto provado n.º 6, que corresponde a uma transcrição do despacho de reversão, donde a única menção que a AT faz relativamente à gerência de facto reconduz-se ao facto de existir uma remuneração de categoria A. – o que é falso, conforme foi invocado na oposição, e cujo facto não consta nem da matéria de facto considerada provada, nem da matéria de facto considerada não provada.
18. No entanto, diga-se por mera cautela, que, o simples auferir de uma remuneração não significa que gere de facto uma empresa, nem tampouco existe qualquer presunção legal nesse sentido.
19. E, não tendo a Administração Tributária logrado provar a gerência por parte do recorrente no processo, temos de concluir que a douta decisão recorrida tinha de considerar a oposição procedente, por falta de prova da gestão de facto do revertido.
20. Razão pela qual, temos de considerar, salvo o devido respeito, que houve erro na aplicação do direito e na decisão da causa.
21. Já que, deveria ter sido conhecida a ausência de prova da gerência de facto por parte do aqui recorrente.
22. Assim, a presente reversão, além de violar a legislação fiscal, designadamente os artigos 23º, 24º, 58.º, 74º, 77º e 99.º, todos da LGT, art. 342.º do Código Civil (CC) e o art. 13.º, e 153º, ambos do CPPT, está a infringir direitos protegidos constitucionalmente e previstos nos n.ºs 3 e 4 do art. 268º da CRP.
23. Por outro lado, nas palavras de SALDANHA SANCHES, J. L. e BARREIRA, Rui – “Culpa no cumprimento e responsabilidade dos gerentes”, in Fisco n.º 70/1, pp. 98 a 107, “Como condição da reversão é necessário que se tenha verificado um facto ilícito: no caso a violação das normas de protecção dos credores, que tinham como função permitir que, na liquidação das sociedades em benefício dos credores, estes fossem pagos pelo seu património. O gestor não conduziu avisadamente a sua gestão e isso levou a uma diminuição tal do património que não permitiu o pagamento total das dívidas dos credores. Mas em que ponto é que esses erros na condução da sociedade são suficientemente graves para que se recorra ao extremo de executar o património pessoal do gerente?Porque quer na redacção anterior, quer na actual, nenhuma dúvida existe que há responsabilidade se e só se, houver culpa. (…)”.
24. Contudo, e por cautela, sempre se diga que o recorrente logrou ilidir a presunção de culpa, prevista no art. 24º, n.º 1, al. b) da LGT, pela insuficiência do património social para responder pelas dívidas exequendas – tal como advém da alteração à matéria de facto provada que se reivindica.
25. Assim, a douta sentença violou ou deu errada interpretação ao disposto no art. 24º, n.º 1, al. b) da LGT.
26. Dos factos provados resulta claramente a existência de bens penhoráveis, basta atentar ao disposto nos factos provados 3º e 4º.
27. A lei manda que por não se poder determinar a suficiência dos bens penhorados, o processo tinha de ficar suspenso “até à completa excussão do património do executado”,
28. O que não aconteceu.
29. Mais a douta sentença fundamenta a tese da insuficiência de bens no facto da devedora originária ter sido declarada insolvente,
30. Olvidando, conforme advém dos factos provados que aquela foi declarada insolvente a 15.12.2015, e a dívida exequenda em causa é de 2013.
31. A este propósito, entende Vânia Patrícia Filipe Magalhães in “O (des)privilégio do beneficium excussionis do responsável tributário subsidiário”: “Mas a melhor doutrina(41) entende que não basta a fundada insuficiência após a penhora sendo imperioso e imprescindível, para operar a reversão e a legitimidade dos responsáveis como executados no processo de execução fiscal, que após esta fase se efective a venda dos bens nos termos dos art. 248.º do CPPT, até porque através da penhora ainda não se sabe qual o valor pelo qual os bens vão ser vendidos, que poderá ser superior ao valor base do bens inscrito no auto, aferido nos termos do art. 250.º n.º 1 alínea a) e b) do CPPT: nos imóveis valor nunca inferior ao valor patrimonial constante na respectiva matriz e nos móveis aquele que foi atribuído no auto que poderá ser inferior ao seu valor real. Assim, apenas depois de penhorados e vendidos os bens da sociedade que respondem pelo incumprimento da obrigação é que a administração fiscal poderá reverter a execução contra os membros dos órgãos sociais devido à subsidiariedade da sua responsabilidade, sendo que a fundada insuficiência deverá ser compreendida quanto à totalidade da dívida, respondendo os sujeitos do art. 24.º da LGT apenas pela diferença do valor conseguido pela venda dos bens do devedor originário e o montante total da dívida exequenda.”
32. Assim, e por tudo o que se deixa expresso, a douta decisão do Tribunal a quo enferma de diversas nulidades, designadamente de incorrecta apreciação de facto e de direito da presente questão, ao não ter reconhecido os invocados direitos ou interesses e a ignorar os elementos de prova requeridos pelo oponente.
33. E, este, ao decidir desta forma, não admitindo a nulidade da reversão operada incorreu em erro de julgamento, por um lado, violando ou dando errada interpretação ao disposto nos artigos 268º da CRP, 23.º, 24º e 77.º, todos da LGT e 152º e 153.º, ambos do CPA, e por outro, ao ter fundamentado da forma referida anteriormente, peca por falta de fundamentação.
34. É real e efectiva a ausência de indicações ou referências capazes de se terem por justificadas as razões do acto de reversão, que se traduzem na falta, quer dos fundamentos de facto, quer quer dos fundamentos de direito, em violação clara e inequívoca dos artigos 74.º, n.º 1 e 77.º, n.ºs 1 e 2 da LGT.
35. De modo que, a Administração Tributária não actuou em obediência à lei e ao direito, em clara e inequívoca violação dos artigos 74.º, n.ºs 1 e 2, 77.º, n.ºs 1 e 2 da LGT, 152.º e 153.º, ambos do CPA.
36. Consequentemente, a douta...

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