Acórdão nº 00800/04.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão00800/04.2BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

A FAZENDA PÚBLICA interpõe recurso da sentença que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela «M..., S.A.», contra a liquidação adicional de IVA do ano de 1999 e contra a liquidação de juros compensatórios, por entender que a sentença padece de erro quanto à matéria de facto e de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
CONCLUSÕES
A- Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou totalmente procedente a impugnação deduzida contra o ato tributário de liquidação adicional, respeitante ao Imposto sobre o Valor Acrescentado (doravante IVA), do exercício de 1999, no valor de € 11.332,22 e ato de liquidação de Juros Compensatórios (doravante JC), relativo ao período 9912, no montante de € 2.751,09, perfazendo o montante global de € 14.083,31.
B- As situações apreciadas configuram factos genericamente previstos no nº 4 do artigo 6º do CIVA, uma vez que “são tributáveis as prestações de serviços quando efetuadas por um prestador que tenha no território nacional a sede da sua atividade ou um estabelecimento estável a partir do qual os serviços sejam prestados ou, na sua falta, o seu domicilio”.
C- Em conformidade com o disposto no artigo 1º do CIVA estão sujeitas a imposto as prestações de serviços, desde que realizadas a título oneroso, no território nacional, por um sujeito passivo agindo como tal.
D- As notas de débito não se encontram suficientemente claras, pois no que concerne à descrição precisa de qual a realidade económica que visam retratar, pois apenas se referem a lançamentos de acordo com o previsto no Contrato de Cooperação Comercial nº xxx e relativo a “serviços prestados no período de xxx”.
E- O contrato geral de fornecimento de que procedem os débitos, prevê a existência de descontos sobre as quantidades, mas também contempla, como se pode aferir pela resposta dada pela impugnante à DSPIT, as seguinte obrigações de cooperação e desenvolvimento: proporcionar ao fornecedor o acesso ao programa promocional, através da participação no calendário promocional, promover o acesso à participação nas várias “Feiras nacionais e regionais, preferência na aquisição dos produtos de determinado fornecedor que acorde “cooperação comercial”, tornando evidente a existência de uma previsão contratual da prestação de serviços de cooperação comercial por parte da impugnante aos seus fornecedores, no âmbito do designado contrato geral de fornecimento, prevendo-se autênticos serviços promocionais a favor do fornecedor contraente.
F- Os valores de “cooperação comercial” não constam de qualquer fatura de compra (o que desde logo é indicativo de que não se tratam de descontos), mas sim de notas de débito emitidas pela impugnante que contém a menção: “Comunicamos a V. Exa(s) que nesta data efectuamos na V/conta os seguintes lançamentos de acordo com o previsto no contato de Cooperação Comercial Nº xxx celebrado com a V/ empresa e relativo a serviços prestados no período de xxx (...)” (sublinhado nosso) – facto dado como provado no ponto 3. dos factos provados da sentença proferida pelo Tribunal a quo.
G- Nesse descritivo resulta de forma evidente que a impugnante reconhece a existência de prestações de serviços, a título oneroso, pois através da emissão das notas de débito afirma-se como credora dos seus fornecedores, das quantias aí inscritas, efetivando a prestação de serviços contratualmente prevista e atribuindo-lhe substância económica.
H- Em contradição com as informações que prestou à AT no decurso da inspeção, a impugnante defende que se tratam de descontos de quantidade que incidem sobre as compras, debitados por si aos fornecedores e como tal não há lugar a liquidação de IVA uma vez que encontram enquadramento na alínea b) do nº 6 do artigo 16º do CIVA, uma vez que não existe qualquer prestação de serviços a esses fornecedores, havendo desta forma erro sobre os pressupostos de facto, sem prejuízo de se porventura se vislumbrar qualquer serviço, o mesmo não estaria sujeito a IVA de acordo com o artigo 6º, nº 9, alínea a) do CIVA.
I- Não é o facto de os valores serem calculados através da aplicação de uma percentagem ao volume de compras que os transforma num desconto de quantidade, pois apenas se trata de uma forma estipulada e acordada pelas partes para a remuneração pela prestação de um serviço.
J- A impugnante não demonstra que a fatura quando foi emitida, encontrava-se com o “desconto” efetuado, ou seja, deduzido da base tributável, pelo que a acolher a tese da impugnante o valor referente ao IVA teria que ser entregue nos cofres do estado, caso contrário haveria um benefício daquela.
K- As próprias testemunhas, arroladas pela impugnante, admitiram que estes chamados descontos, não eram totalmente líquidos, pois tinham contrapartidas a fixar logo no contrato, tais como a possibilidade da presença do fornecedor em feiras e campanhas promovidas pela impugnante, proporcionar ao fornecedor o acesso a todos os programas promocionais, preferência na aquisição de produtos a determinado fornecedor, identificação de uma gama de produtos a incluir nas diversas campanhas a ocorrer durante o exercício.
L- Tais serviços apenas ocorrem com os fornecedores em que no contrato outorgado fica acordado “Cooperação Comercial” e os mesmos só serão prestados através do cumprimento deste acordo, nas suas diversas formas, e estas formas não podem deixar de revestir uma prestação de serviços.
M- As notas de débito são contabilizadas numa subconta 73 “Proveitos Suplementares” do POC, e segundo o POC na conta 73 registam-se os proveitos inerentes ao valor acrescentado das atividades que não sejam próprias dos objetivos principais da empresa.
N- Nos termos do POC, os descontos e abatimentos de caráter comercial, como descontos de quantidade, na aceção da impugnante, obtidos fora da fatura, isto é, posteriormente creditados pelos fornecedores, implicam o cumprimento da normalização contabilística, a movimentação a crédito de conta própria, conta 318 – “Descontos e abatimentos em compras.”, o que não ficou demonstrado nos presentes autos, ou seja, que a impugnante tenha procedido à regularização dos alegados descontos numa conta 318 – “Descontos e abatimentos em compras”, desta forma, tais notas de débito consubstanciam receitas obtidas pela impugnante por contrapartida de serviços prestados.
O- O tribunal a quo fundamentou a sua decisão com base na prevalência do contrato geral de fornecimento acordado pela impugnante com os seus fornecedores intracomunitários, e olvidou toda esta factualidade, pois, o contrato aqui em questão será um contrato misto, que comporta o fornecimento ou compra e venda de bens mas também prestação de serviços, e em questões de IVA, não há tributação efetuada com base nos contratos, visto que a tributação é feita operação a operação.
P- E, mesmo em termos civis, no caso em apreço, não poderia haver a absorção de um contrato pelo outro contrato, tal como decidiu o Tribunal a quo, uma vez que estes contratos têm de ser tratados de forma independente um do outro, pois, sempre que o contrato misto se traduza numa simples justaposição ou contraposição de elementos pertencentes a contratos distintos, deve aplicar-se a cada um dos elementos integrantes da espécie a disciplina que lhe corresponde dentro do respetivo contrato típico.
Q- Estamos perante uma efetiva prestação de serviços de cooperação comercial, efetuada pela impugnante aos seus fornecedores, existindo imposto em falta no que concerne aos fornecedores estrangeiros, uma vez que tais operações são tributáveis no território nacional por aí se encontrarem localizadas, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 6º do CIVA.
R- A impugnante não comprova a natureza/substância das operações, como lhe competia, em obediência ao artigo 74º, nº 1 da LGT.
S- Os juros compensatórios encontram-se previstos no artigo 35º da LGT e no artigo 89º, nº 1 (redação à data dos factos, atual artigo 96º) do CIVA, integrando-se na própria dívida do imposto, sendo liquidados conjuntamente com esta, tal como dispõe o artigo 35º, nº 8 da LGT.
T- Não padecendo a liquidação adicional aqui impugnada de qualquer vicio, os juros compensatórios são devidos nos termos legais (artigo 35º da LGT e artigo 89º, nº 1 (redação à data dos factos – atual artigo 96º) do CIVA.
U- A douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento na matéria de facto por errada valoração da prova e de direito, nomeadamente do artigo 1º, nº 1, alínea a), artigo 4º, nº 1, artigo 6º, nº 4, todos do CIVA, e artigo 74º, nº 1 da LGT, pelo que deverá ser revogada a Sentença recorrida e proferido Acórdão no sentido de improcedência total do pedido.
Termos em que,
Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
**
Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se é ou não devido IVA pelas operações realizadas pela Impugnante ao abrigo da designada cooperação comercial.
**

Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT