Acórdão nº 00699/12.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-03-02

Ano2023
Número Acordão00699/12.5BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

«Massa Insolvente da X, Lda.», sendo a sede desta sociedade no Lugar ..., ..., ..., pessoa colectiva n.º ..., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 27/10/2022, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa referente às liquidações adicionais de IRC e respectivos juros compensatórios, do exercício de 2007, no valor global de €201.981,40.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“I - Não decidiu bem o Meritíssimo Juiz “a quo”, havendo erro de julgamento.
II - Como tem vindo a decidir o Supremo Tribunal Administrativo, uniforme e reiteradamente, a prescrição da obrigação tributária não é fundamento da impugnação judicial, motivo porque nela não deve ser conhecida oficiosamente, sem prejuízo de aí poder ser conhecida a título incidental, enquanto pressuposto da utilidade (ou inutilidade) superveniente da lide, este sim de conhecimento oficioso.
III - A impugnação judicial não tem como objecto o conhecimento da prescrição da obrigação tributária, porque se trata de um processo que visa apreciar a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação e a prescrição não contende com legalidade da liquidação, mas apenas com a exigibilidade da obrigação tributária por ela criada, motivo porque em sede de impugnação judicial a prescrição não pode ser conhecida senão incidentalmente e como pressuposto da utilidade ou não do prosseguimento da lide, questão esta de conhecimento oficiosa (Cfr. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, sobre a prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª Edição 2010, pag. 23 a 25).
IV - Dispõe o artigo 48º da LGT que as dividas tributárias prescrevem no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos (o que será o caso), a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.
V - Dispõe o artigo 49º da LGT que a citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
VI -A interrupção só tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
VII - Em 10.11.2011, conforme consta dos autos, a ora recorrente apresentou reclamação graciosa nº...92 (da liquidação adicional do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas) junto da Direcção de Finanças ..., o que gerou interrupção da prescrição e reinício da contagem do prazo de 8 anos da mesma.
VIII - No caso concreto, não se verificou qualquer suspensão do prazo de prescrição (artigo 49º nº4 da LGT).
IX - Do presente processo constam todos os elementos que permitem aferir da prescrição da dívida tributária.
X -Na presente data, e na data em que foi proferida a douta sentença de que se recorre, há muito que se encontra prescrita a obrigação tributária.
XI - Prescrição que, desde já, se invoca para os devidos e legais efeitos e que deveria, de acordo com a Jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e da Doutrina, ter sido conhecida oficiosamente pelo Tribunal “a quo”, a título incidental e em ordem a averiguar da utilidade da prossecução da lide.
XII - Existiu, pois, erro de julgamento do Tribunal “a quo” ao não apreciar a prescrição da obrigação tributária, a título incidental e em ordem a averiguar da utilidade da prossecução da lide.
XIII - Violada foi, pois, entre outras a disposição legal inserta no artigo 49º da LGT.”
****
Não houve contra-alegações.
****
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de as conclusões do presente recurso versarem unicamente sobre matéria de direito. Pelo que a competência para dele conhecer caberá à Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, a quem os autos devem ser remetidos, excepcionando a deste Tribunal Central Administrativo Norte.
****
Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento.
****
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao não ter apreciado a prescrição da obrigação tributária, a título incidental, em ordem a averiguar da utilidade da prossecução da lide.
Previamente, haverá, ainda, que tomar posição acerca da questão prévia suscitada pela digníssima Magistrada do Ministério Público quanto à incompetência deste tribunal em razão da hierarquia.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Da sentença prolatada em primeira instância consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Factos provados
É a seguinte a matéria de facto assente com relevância para a decisão da causa:
1. Em 05.10.2007, representantes da impugnante, «X», Lda., subscreveram documento designado “Contrato promessa de compra e venda”, nos termos do qual a impugnante se declara dona e legítima proprietária da unidade industrial sita no Lugar ... e de todos os bens móveis que a compõem, prometendo vender à sociedade «Y, Lda.», essa mesma unidade industrial, pelo preço de € 1.539.000,00 – cf. cópia do contrato celebrado, constante de fls. 55 a 57 da Reclamação Graciosa apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;
2. Em 06.11.2007, a sociedade «Z, S.A.», emitiu, em nome da impugnante, a factura n.º ...42, relativa a 1/5 dos bens móveis provenientes da massa insolvente da «P, Lda.», pelo valor de €59.495,70, incluindo IVA – facto que resulta do RIT, ponto 12 de C3 Factos apurados, página 7 do mesmo, constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo.
3. O pagamento da quantia que antecede foi efetuado através de letras sacadas pela impugnante e aceites pela «Y, Lda.» – facto que resulta do RIT, ponto 12 de C3 Factos apurados, sua página 7, constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado.
4. Em 22.11.2007, a sociedade «L, Lda.», emitiu, em nome da impugnante, a fatura n.º ......, relativa a 1/5 dos bens móveis provenientes da massa insolvente da «P, Lda.», pelo valor de € 59.495,70, incluindo IVA – facto que resulta do RIT, ponto 13 de C3 Factos apurados, sua página 7, constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado.
5. O pagamento da quantia que antecede foi efetuado através de letras sacadas pela impugnante e aceites pela «Y, Lda.» – que resulta do RIT, ponto 13 de C3 Factos apurados, sua página 7, constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado.
6. Em 12.12.2007, a sociedade «F, Lda.», emitiu, em nome da impugnante, a factura n.º ...28, relativa a 3/5 dos bens móveis provenientes da massa insolvente da «P, Lda.» (…), pelo valor de €178.487,10, incluindo IVA – facto que resulta do RIT, ponto 14 de C3 Factos apurados, sua página 7, constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado.
7. O pagamento da quantia que antecede foi efetuado através de letras sacadas pela impugnante e aceites pela «Y, Lda.» (…) – facto que resulta do RIT, ponto 14 de C3 factos apurados, sua página 7 (frente e verso) constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado.
8. A impugnante adquiriu os móveis que compõem a unidade industrial em 06.11.2007, 21.11.2007 e 12.12.2007, pelo valor global de € 297.478,50 – facto confessado pela impugnante, cf. art. 44º da Petição Inicial;
9. Em 14.05.2008, a sócia da impugnante «L, SGPS, S. A.», entregou-lhe, a título de suprimentos, letras no valor de € 93.131,40 – facto que resulta do RIT, ponto 18 de C3 Factos apurados, na sua página 7 (verso) constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado;
10. Em 20.05.2008, a sócia da impugnante «G, SGPS, LDA.», entregou-lhe, a título de suprimentos, letras no valor de € 46.565,70 – facto que resulta do RIT, ponto 19 de C3 Factos apurados, na sua página 7 (verso) constante do apenso de Reclamação Graciosa, fls. 25 e seguintes do mesmo e não impugnado.
11. Em 20.05.2008, o sócio da impugnante «AA», entregou-lhe, a título de suprimentos, letras no valor de € 46.565,70 – facto que resulta do RIT, ponto 20 de C3 Factos Apurados, na sua página 8, constante do apenso de Reclamação Graciosa, e não impugnado.
12. Em 20.05.2008, o sócio da impugnante «BB», entregou-lhe, a título de suprimentos, letras no valor de € 51.720,00 – facto que resulta do RIT, ponto 21 de C3 Factos Apurados, na sua página 8 constante de fls. 25 e seguintes do apenso de Reclamação Graciosa, e não impugnado.
13. Em 02.06.2008, a impugnante entregou ao Banco 1..., para cobrança, letras que incluem as anteriormente recebidas pela impugnante a título de suprimentos dos sócios – facto que resulta do RIT, ponto 22 de C3 Factos Apurados, na sua página 8 constante de fls. 25 e seguintes do apenso de Reclamação Graciosa e não impugnado.
14. A impugnante apenas registou na sua contabilidade os pagamentos da «Y, Lda.» em contas de terceiros – clientes como sendo adiantamentos de clientes - facto que resulta do RIT, ponto 23 de C3 factos Apurados, na sua página 8, constante de fls. 25 e seguintes do apenso de Reclamação Graciosa e não impugnado.
15. No Relatório de Inspeção Tributária, resultante de inspeção realizada à sociedade impugnante, determinada pela ordem de serviço n.º ...32, relativamente à classificação do contrato celebrado em 05.10.2007...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT