Acórdão nº 00691/08.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2022-02-03

Ano2022
Número Acordão00691/08.4BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório
A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação judicial movida por C., S.A., com sede em Avª (…), NIPC (…), relativamente à liquidação adicional de IRC e juros compensatórios do ano de 1996, derrama e respectivos juros compensatórios, no montante total de € 594 827,76.

As alegações de recurso da Recorrente terminam com as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES
A. O presente recurso visa contrariar a decisão que julgou a “impugnação procedente e, em consequência” decidiu anular a liquidação de IRC n° 2007 8310001242, relativa ao exercício de 1996, por considerar decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação do imposto.
B. O julgamento efectuado, salvaguardando o devido respeito por diferente entendimento, padece de erro, uma vez que não foi atentada e valorada a circunstância deste acto tributário revestir a natureza de liquidação meramente correctiva, que apenas visa reflectir as necessárias correcções a liquidação anteriormente emitida e efectuada dentro do prazo de caducidade a que se referia o n.º 1 do artigo 33.° do CPT e art. 79º do CIRC.
C. Efectivamente, a AT praticou legal e tempestivamente o acto tributário em crise na presente impugnação, por consistir numa liquidação de natureza meramente correctiva, e, por tal, não abrangido pelo regime de caducidade do direito à liquidação, visto não se tratar de um novo acto tributário.
D. Ao não ponderar correctamente, nos seus antecedentes e encadeamento sucessivo global, a totalidade da factualidade respeitante à emissão da liquidação aqui impugnada, factualidade essa patenteada nos autos e documentada no processo administrativo, e ao não retirar daí as devidas consequências, a douta sentença incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto, e de direito, por violação do estabelecido no art. 33º do CPT e art. 79º do CIRC.
E. Ainda, sem prescindir, entende a Fazenda Pública que, ao contrário do decidido na sentença, o recurso contencioso de anulação que a Impugnante deduziu, em 21/02/2000, contra o despacho de indeferimento do recurso hierárquico, tem previsão no nº 2 do art. 33º do CPT, como facto suspensivo do prazo de caducidade do direito à liquidação de impostos previsto no nº 1 do mesmo artigo.
F. No caso sub judice o termo inicial do prazo de cinco anos ocorre em 01/01/1997, terminando o decurso do prazo de caducidade, se suspensões não houvesse, em 31/12/2001.
G. Resulta pacífico da sentença sob recurso que a AT esteve impedida de exercer o direito à liquidação na pendência de recurso hierárquico, isto é, até 22/12/1999, por força do efeito suspensivo que, expressamente, lhe atribuía o art. 112º, do CIRC, na redacção à data dos factos.
H. Considera a Fazenda Pública que também o processo judicial referido nos pontos 8 e 9 do probatório fixado teve interferência no prazo de caducidade do direito à liquidação do IRC de 1996, suspendendo-o, de acordo com o disposto no art. 33º, nº 2 do CPT, desde a instauração da acção judicial, em 21/02/2000, e até ao trânsito em julgado da respectiva sentença, em 28/04/2005.
I. O nº 2 do art. 33º do CPT aplica o princípio da suspensão do prazo de caducidade quando a AT, por motivo de acção judicial, estiver impedida de proceder à liquidação do tributo. Materialmente, é uma verdadeira ampliação do prazo de caducidade, justificada pelo justo impedimento do titular do direito de liquidação, no caso, a AT. Como, por motivo da acção judicial – o recurso contencioso em causa –, havia um obstáculo insuperável ao exercício do direito de liquidação, este só podia ser exercido quando o impedimento cessasse.
J. Explica-se, na página 7 da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que o recurso contencioso em causa atacou “o facto de a AT ter efectuado correcções ao lucro tributável com base no pressuposto de que a impugnante tem relações especiais com as sociedades ali mencionadas, sem demonstrar a existência de tais relações”. E continua o Tribunal, “Portanto, esta em causa apenas a aplicação de um pressuposto.”
K. Portanto, o próprio Tribunal a quo verifica e entende que o recurso contencioso de anulação que a Impugnante deduziu em 21/02/2000 contende com a própria ocorrência, ou não, do facto tributário, verificando e entendendo que tal recurso contencioso “visa a anulação ou declaração de nulidade de actos ou negócios jurídicos que integrem factos geradores do imposto”, ou seja, pressupostos da tributação.
L. O efeito suspensivo da caducidade do direito à liquidação, previsto no n.º 2 do art. 33º do CPT, abrange “situações litigiosas” que se relacionam com a própria ocorrência do facto tributário de que depende a relação material controvertida, e tal é o que se verifica na discussão da quantificação do lucro tributável, ou dos pressupostos de aplicação de uma medida como no caso concreto do recurso contencioso de anulação que a Impugnante deduziu em 21/02/2000.
M. “Suspende-se, na verdade, o prazo de liquidação do tributo em caso de litígio judicial de que dependa a liquidação, desde o seu início até ao trânsito em julgado da decisão, que é o previsto na alínea a). Tal doutrina tinha já correspondência, aliás, no artigo 33º, número 1, do C.P.T.. Em parte, o número 2 do presente artigo tem carácter interpretativo, pelo que é de aplicar aos factos tributários ocorridos anteriormente à entrada em vigor da presente lei. (António Lima Guerreiro, em “Lei Geral Tributária”, Anotada, Editora Rei dos Livros, Lisboa, 2000, p. 222)”
N. “Quando a liquidação assentar na ratificação/sanação de acto inválido, que mantenha com o acto tributário uma relação de prejudicialidade, considera-se igualmente suspenso o prazo de caducidade no período entre o início e o termo do litígio judicial de que resultou a referida declaração de invalidade.” (Autor e obra citada).
O. Resultando da matéria assente que a impugnante foi notificada da liquidação controvertida em 6/03/2007, e uma vez que o prazo de caducidade esteve suspenso entre 10/11/1999 e 22/12/1999 (recurso hierárquico) e entre 22/02/2000 e 28/04/2005 (recurso contencioso de anulação do recurso hierárquico), é manifesto que o prazo de caducidade – de 5 anos a contar a partir de 01/01/1997 - não foi excedido, pelo que não havia caducado o direito à liquidação em 06/03/2007, data da notificação da liquidação.
P. Deste modo, entende a Fazenda Pública que o Tribunal a quo não valorizou correctamente a factualidade carreada para os autos, incorrendo em erro de julgamento da matéria de facto e, consequentemente, em erro de julgamento de direito, violando o disposto nos artigos 33º do CPT e art. 79º do CIRC».

Notificada, a Recorrida respondeu à alegação.
«CONCLUSÕES:
i. A questão ora suscitada à apreciação deste Venerando Tribunal, quanto à alegada tempestividade da liquidação contestada por se tratar de uma “liquidação de natureza meramente correctiva”, não foi invocada pela Fazenda Pública em sede de Contestação, pelo que não tendo a questão sido suscitada e alegada pela Fazenda Pública em 1.ª Instância, a Recorrida entende que não poderá ser objecto de conhecimento por este Venerando Tribunal, na medida em que surge pela primeira vez suscitada nesta sede de recurso;
ii. Os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição;
iii. Além de outras excepções (as partes podem acordar, em 2.ª Instância, a alteração ou ampliação do pedido), o Tribunal ad quem apenas pode conhecer de questões novas - ou seja, não suscitadas no Tribunal recorrido -, se as mesmas forem de conhecimento oficioso e ainda não decididas com trânsito em julgado;
iv. Ainda que se entendesse que o acto de liquidação ora contestado seria, efectivamente, uma “liquidação correctiva”, a realidade é que a mesma não poderia vingar na ordem jurídica, porquanto verificando-se que o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.º 3434/00 - onde se discutia a ilegalidade da decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico - transitou em julgado em 28.04.2005, conclui-se que o prazo que a Autoridade Tributária dispunha para emanar (e notificar validamente) a “liquidação correctiva” terminou, nos termos dos artigos 173.º e 175.º do CPTA, em 29.07.2005, pelo que não tendo a mesma sido notificada até essa data, não pode a Autoridade Tributária beneficiar da extensão do prazo de caducidade;
v. A própria actuação da Autoridade Tributária é contrária à sua alegação (em processo administrativo) e à alegação da Fazenda Pública no presente recurso, em manifesto venire contra factum proprium, porquanto da análise do probatório verifica-se que, após a notificação do indeferimento do Recurso Hierárquico - e no decurso do prazo que a Recorrida dispunha para deduzir recurso de anulação da decisão do Recurso Hierárquico - foi emitida uma liquidação de imposto (com o n.º 2000 83100001154, notificada em Fevereiro de 2000), o que significa que a própria Autoridade reconhece (com a prática deste acto de liquidação durante o decurso do prazo que a Recorrida dispunha para deduzir recurso de anulação da decisão do Recurso Hierárquico) que este (eventual) recurso de anulação não constituía facto suspensivo da caducidade do direito à liquidação, porquanto, caso contrário, ter-se-ia abstido de praticar o referido acto de liquidação;
vi. A razão de ser do n.º 2 do artigo 33.º do CPT, ao inutilizar, para a contagem do prazo de caducidade, o período em [que] esteve pendente acção judicial, não pode deixar de ser a...

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