Acórdão nº 00634/23.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 20-12-2023

Data de Julgamento20 Dezembro 2023
Ano2023
Número Acordão00634/23.5BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. O Exmº Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida em 10.10.2023 no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada procedente a reclamação deduzida «AA» contra o ato do Chefe do Serviço de Finanças ..., proferido em 02.02.2023, que indeferiu os pedidos de reconhecimento da falta de citação e da prescrição das quantias exequendas na execução fiscal nº ...35 e apensos, instaurados por dívidas de IVA do período tributário de 1997, dos períodos de 2002/06T, 2003/03T a 2003/12T, de 2004/03T a 2004/12T, 2005/03T a 2005/12T, do período tributário de 2006 e 2007, e retenções na fonte de IRS dos períodos de 2003/12 a 2005/06 e IRC do ano de 2000, 2001, 2004, 2005 e 2006, em nome de “[SCom01...], Lda.”, no valor total de €57.573,47.

1.2. A Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou totalmente procedente a reclamação dos actos do órgão de execução fiscal, interposta nos termos do disposto no art. 276.º do CPPT, do despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças ... (OEF), no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...35 e apensos, anulando o referido despacho.
B. Decidiu o Tribunal a quo pela ilegalidade do despacho reclamado, anulando-o na parte em que não reconheceu a nulidade por falta de citação da reclamante, por entender que “…do supra expendido em conjugação com os pontos 8) e 9) do probatório, conclui-se que ocorreu a falta de citação da Reclamante, enquanto responsável subsidiária, (…)"
C. Foi entendimento vertido na sentença sob recurso, e que fundamentou a decisão de anulação do despacho reclamado, que “…a falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do executado, constitui nulidade insanável do processo de execução fiscal, que tem por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo – cfr. artigo 165.º do CPPT.
Ora, a falta de citação do executado por reversão é susceptível de ter impedido a Reclamante de se ter defendido no processo executivo através da correspondente oposição, fundada no não exercício de facto das funções de gerente na originária devedora, como alega na sua petição de reclamação.
D. Dando assim relevo ao formalismo do acto de citação, concluiu pela falta de citação, nos termos do art. 165.º, n.º 1 alínea a) do CPPT, atentos os pontos 8 e 9 do probatório,
E. desvalorizando por completo o facto de a reclamante, enquanto responsável subsidiária e revertida nos autos de execução, dentro do prazo de 30 dias a contar da data da citação ora colocada em crise, ter subscrito e apresentado no Serviço de Finanças requerimento a solicitar o pagamento em prestações das dívidas em causa (facto 10 do probatório),
F. E o facto de, no âmbito dessas execuções, ter o OEF efectuado compensações sobre os reembolsos de IRS da reclamante, relativos aos anos de 2013 a 2019, sem que esta tenha apresentado qualquer reclamação desses actos (facto 11 do probatório).
G. Pelo que, desde já e em relação ao facto provado 10., por assumir relevo na decisão a proferir, entendemos que deverá acrescer, além da menção de a reclamante ter subscrito e apresentado no Serviço de Finanças ... requerimento a solicitar o pagamento em prestações da dividas exequendas, o facto de no mesmo constar “tendo sido citado nos processos executivos infra identificados”, cfr. págs. 1 a 3 de fls. 108 do SITAF.
H. Donde resulta claro que reconhece ter sido citada, ter tido conhecimento do acto (citação em reversão) e em nada viu prejudicada a sua defesa, uma vez que no prazo concedido para o efeito, optou por requerer o pagamento da dívida em prestações, quando poderia ter utilizado todos os meios de defesa ao seu alcance, como sejam a oposição judicial, a reclamação graciosa ou a impugnação judicial.
I. Nestes termos, não pode a Fazenda Pública concordar com este entendimento, perfilhando a convicção que a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento de facto e de direito, porquanto, o despacho reclamado não padece de qualquer ilegalidade.
J. Pela simples leitura da PI, pode concluir-se que a reclamante formulou o seu pedido no sentido da procedência da reclamação, em virtude da alegada nulidade insanável decorrente da falta de citação como revertida, nos termos do art. 165.º, n.º 1 a) do CPPT e, em consequência, “ser declarada nula a citação”, “ser determinada a nulidade dos processos de execução fiscal” e declarada a prescrição das dívidas.
K. Constata-se, assim, que o pedido formulado resulta do facto de supostamente não ter sido citada como revertida, sem que se encontre fundamentado de facto e de direito qualquer alusão à eventualidade de essa falta de citação, poder “prejudicar a defesa do interessado” e com isso conduzir a uma nulidade insanável no processo de execução fiscal.
L. Constituindo pressupostos cumulativos da ocorrência da referida nulidade (165.º n.º 1 a) CPPT), por um lado, a falta de citação e por outro, o prejuízo para a defesa do interessado, não se vislumbra que prejuízo possa resultar para a reclamante, revertida e citada nos autos executivos.
M. Mais, intervindo a reclamante como revertida nos autos, em requerimento apresentado em nome pessoal e onde consta a menção “citado nos processos executivos infra identificados”, não nos parece resultar do probatório o não conhecimento do acto de citação ou que tenha visto prejudicada a sua defesa, designadamente através da correspondente oposição judicial, na hipótese, que não se concede, de ter ocorrido a falta de citação.
N. Com efeito, a sua defesa, não resultou prejudicada, dado que a reclamante não se viu impedida de requerer o pagamento em prestações da dívida exequenda, conforme resulta do ponto 10. do probatório. Assim,
O. Entende a Fazenda Pública que, o Tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto e na aplicação do direito, porquanto ao conceder provimento ao peticionado, considerou verificada a nulidade insanável por falta de citação da executada em reversão,
P. Apesar de ter ficado demonstrado que o acto de citação chegou ao seu conhecimento,
Q. e sem que tenha ficado demonstrado o prejuízo concreto de defesa do revertido ou sequer a “possibilidade de prejuízo”, em clara inobservância do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 165.º do CPPT.
R. Incorreu, igualmente em erro, ao declarar consequentemente prescritas as dividas exequendas.
S. Decidindo em sentido contrário, a douta sentença recorrida violou o direito aplicável, designadamente o disposto nos artigos 165.º, n.º 1 al. a) e 190.º, n.º 6 do CPPT e 195.º, n.º 1 do CPC, e consequentemente, o disposto nos artigos 48.º e 49.º, n.º 1 da LGT, devendo ser revogada e substituída por outra que declare a reclamação improcedente.

Termos em que, e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida.».

1.3. A Recorrida «AA» apresentou contra-alegações que finalizou nos termos que seguem:
«-A-
Prescreve o art.º 190.º n.6 do CPPT que se verifica a falta de citação quando o destinatário demonstre que, por motivo não lhe é imputável, não teve conhecimento do ato, podendo-se por esse facto, prejudicar-se a defesa do interessado.
-B-
A falta de citação na medida em que possa prejudicar a defesa do executado, configura nulidade insanável, ocorrendo nas situações previstas à data dos factos, podendo ser invocada a todo o tempo, até ao transito em julgado da decisão final. Vide Ac. STA de 30.09.2020; Ac. TCAS de 21.05.2020 e Ac. STA de 21.11.2019
-C-
Provado pelo destinatário de que não foi citado e que a falta citação não se deveu a culpa sua, é suficiente para se verificar a falta de citação, a mera possibilidade de prejuízo para a defesa do executado e não a demonstração ou prova da existência de efetivo prejuízo. Vide Ac. STA de 07.07.2010.
-D-
Segundo o Mm Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa in "Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, Áreas Editora, Vol. III, 2011, pág. 367: "Parece que os princípios da segurança jurídica e da confiança na sua vertente de proibição da indefesa, não permitem que, na dúvida sobre se o executado teve ou não possibilidade de se defender num processo em que são afectados os seus direitos, se ficcione que ele teve essa possibilidade. A ser assim, o destinatário da citação terá o ónus de alegar que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que não lhe foi imputável, mas se o tribunal (ou o órgão da execução fiscal) ficar na dúvida em favor do executado, deverá repetir-se a citação".
-E-
A nulidade insuprível como consequência da falta de citação, nunca poderá considerar-se sanada, pese embora, as intervenções processuais que o citando possa ter efetuado. Vide Ac. STA de 07.07.2010
-F-
Na conjugação do art.º 190 do CPPT e 176.º n.2 e 232.º n.1 do CPC (versão do Dec. Lei n.º 329-A/95 de 12.12) aplicável à data dos factos, a Autoridade Tributária (AT), pode ordenar que a citação seja efetuada mediante contato pessoal, em qualquer lugar onde o citando se encontre.
-G-
A designada citação quase-pessoal (feita em pessoa diversa do citando) só é admitida na citação postal, citação por hora certa ou no caso de incapacidade de facto do citando. Vide arts. 236.º n.2, 240.º n.2 al. b) e 242, n.3 – todos do CPC na versão do Dec.-lei 38/2003 de 08.03
-H-
Conforme o previsto nos artigos 103.º n.1 e 23.º da LGT, e no cotejo do Ac. STA, Recurso n.º 0493/10, de 13/10/2010: "a reversão da execução contra o responsável subsidiário concretiza-se, não através de um acto tributário, mas através do acto processual de citação...

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