Acórdão nº 00518/23.7BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 04-10-2023

Data de Julgamento04 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão00518/23.7BEAVR
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Aveiro)
Acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção de Contratos Públicos da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I – RELATÓRIO
1. [SCom01...], LDA., Requerente nos presentes autos de INTIMAÇÃO PARA ABSTENÇÃO DE UMA CONDUTA em que é Requerido o Município ..., vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão judicial do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, editada em 04.08.2023, que rejeitou “(…) liminarmente o requerimento da presente providência (…)”
2. Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
Primeira: A decisão do Tribunal a quo, de rejeição liminar da providência cautelar, assenta apenas na sua convicção de que não é provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal seja procedente, ou seja, conclui pela inexistência do fumus boni iuris, com base no seguinte entendimento:
"Com efeito, a atuação a que a Requerente pretende obstar consubstancia-se numa proposta de atuação, inexistindo, ainda, ato administrativo definidor da situação, mas apenas a comunicação dessa intenção para efeitos de audiência prévia da Requerente, como, de resto, expressamente decorre do teor da respetiva notificação (cfr. doc. ...5 junto com o requerimento inicial).
Segunda: Ora, com a concreta providência cautelar requerida - Intimação para Abstenção de uma Conduta, prevista no artigo 1129 nº. 1 e nº. 2 alínea i) do CPTA, pretende a Recorrente impedir uma atuação do Recorrido, sendo contraditório afirmar que, para tal, este terá de pratear o ato. Ou seja, o entendimento do Tribunal a quo vai no sentido de que apenas se poderia intimar o Município ... para não executar a caução e não comunicar ao IMPIC, depois de tais atos serem praticados, o que é incompreensível, porquanto, a qualquer momento, sem necessidade de qualquer outro ato ou comunicação por parte do Recorrido, pode este executar a caução e/ou comunicar ao IMPIC, atos estes que, precisamente, a Recorrente pretende impedir.
Terceira: Consequentemente, face ao exposto, e a toda a documentação junta à petição inicial, que aqui se dá por reproduzida, existe fumus boni iuris, o que deve ser considerado e a providência cautelar admitida, o que requer a V. Excias. SEM PRESCINDIR,
Quarta: Ao contrário da fundamentação da douta sentença recorrida, já existe uma verdadeira atuação do recorrido Município ..., pois, em 30-10-2020 (doc. Nº. ... junto à PI), e em 14-04-2023 (doc. Nº. ...3 junto à PI), o Recorrido Município ... enviou comunicações à Recorrente, concedendo-lhe um prazo de 30 dias (que já foi ultrapassado) para fazer as obras, sob pena de executar a caução bancária e comunicar ao IMPIC, IP; e em 13-07-2023 (doc. Nº. ...5 junto à PI), comunicou o Recorrido Município ... à Recorrente [SCom01...], Lda., de que, através de reunião de câmara de 04-07-2023 foi deliberado mandar realizar os trabalhos de correção necessários e os trabalhos em falta, diretamente ou com recurso a terceiros, a expensas da vossa sociedade; executar a caução nos termos do artigo 2962 do CCP; e que o facto seja comunicado ao IMPIC.
Quinta: Ou seja, não obstante a Recorrente ter sido notificada para se pronunciar no prazo de 10 dias (o que veio a fazer, conforme se pode verificar do documento junto aos autos em 31-07-2023), certo é que o Recorrido já deliberou, ou seja, já praticou o ato administrativo definitivo e definidor da situação, pelo que, também por este motivo, a argumentação do Tribunal a quo não poderá ser considerada, o que requer a V. Excias, porquanto existe um ato impugnável e uma probabilidade de procedência da pretensão da Recorrente no processo principal a instaurar, verificando-se a existência de todos os requisitos legais necessários à concessão da providência cautelar requerida.
Sexta: Acresce que, no que respeita ao periculum in mora, são requisitos cumulativos para a concessão da providência cautelar conservatória a aparência do bom direito, a ameaça de lesão grave e dificilmente reparável deste direito e a ponderação de interesses, requisitos estes que, em concreto, se verificam - Neste sentido cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo 00064/15.2BEMDL, de 31-08-2015, 1- Secção - Contencioso Administrativo, havendo fundado receio da constituição de uma situação de facto consumada quando os factos concretos alegados pela Requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade.
Sétima: O risco de se constituir uma situação de facto consumado ou de se produzirem prejuízos de difícil ou impossível reparação tem de ser efetivo e não meramente eventual, sendo que só ocorre uma «situação de facto consumado» quando, a não se deferir a providência, o estado de coisas que a ação quer influenciar ganhará entretanto a irreversível estabilidade inerente ao que já está terminado ou acabado - ficando tal ação inutilizada «ex ante». Tal é o que acontecerá com a Recorrente, porquanto a execução da caução bancária implica repercussões financeiras irreversíveis e a comunicação ao IMPIC pode limitar ou exclui-la de concursos públicos, o que a prejudicará irreversivelmente.
Oitava: Por outro lado, a rejeição liminar do requerimento inicial de uma providência cautelar com fundamento na alínea d) do nº 2 do artigo 116º do CPTA, só deve ocorrer quando seja «manifesta» a falta de fundamento da pretensão, exigindo, por um lado, que seja imediatamente detetável perante os termos em que o requerente a formula e delimita no requerimento inicial, e, por outro, que outra conclusão não possa ser alcançada numa subsequente análise, mesmo que perfunctória, própria da decisão cautelar.; e o juízo sobre a manifesta falta de fundamento da pretensão, motivador da imediata rejeição, em sede de despacho liminar, do requerimento da providência cautelar, apela, assim, a um duplo critério: o da evidência, dispensando, assim, mais averiguações ou ponderações; e o da certeza, apoiado na convicção firme e segura de que a pretensão do requerente deverá ser, à luz do direito, indeferida. Neste sentido cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 02-10-2020, Processo 01049/20.2BEBRG, 1- Secção - Contencioso Administrativo. Ora, conforme se pode verificar dos presentes autos, tal duplo critério não se verifica, pelo que deve a providência cautelar ser admitida.
Nona : O Tribunal a quo violou, assim, o disposto nos artigos 51º,78º nº. 2, alínea f), 89º nºs 2 e 4, alínea i), 112 nº. 1 e nº. 2, alínea i), 114º nº 3, alíneas f) e g), 116º n.ºs 1 e 2, alínea d), 120º e 131º, todos do CPTA, e 5º do CPC, o que confere legitimidade à Requerente para a interposição do presente recurso (…)”.
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3. Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Município ..., produziu contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo: “(…)
I - Entendendo a Recorrente que o ato administrativo a ordenar a execução da garantia bancária já foi praticado, não podia fazer uso da intimação para a abstenção de uma conduta, uma vez que a providência cautelar adequada aos fins pretendidos seria a de suspensão da eficácia do ato administrativo praticado.
II - Com efeito, a intimação para a abstenção de uma conduta, sendo um meio de tutela subsidiária, só deve ser utilizado quando outros meios de tutela sejam incapazes de assegurar a tutela...

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