Acórdão nº 00418/18.2BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 16-09-2022

Data de Julgamento16 Setembro 2022
Ano2022
Número Acordão00418/18.2BEPNF
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Penafiel)
Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I. RELATÓRIO
1. AA, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por decesso de BB, residente no ..., 182, ..., ..., inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Penafiel, datada de 15 de Maio de 2020, que julgou improcedente a acção administrativa, interposta contra o MUNICÍPIO de SANTO TIRSO, sendo contra interessado CC, residente no ..., 180, ..., ..., onde peticionava a condenação do Município a determinar a extinção do procedimento de fiscalização e assim anular o acto administrativo, de 6/3/2018, nos termos do qual foi determinada (i) a demolição da garagem construída, sem licença e (ii) ainda a notificação para que procedesse à legalização da vedação executada junto à via pública"
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Nas suas alegações de recurso, a recorrente AA formulou as seguintes conclusões:
"1.1 - O objecto do presente recurso circunscreve-se à decisão que determina a improcedência da ação e consequente demolição da garagem edificada pela Recorrente,
1.2 - E obrigação da mesma em legalizar o muro de vedação existente, mesmo sabendo que tal só é possível com a assinatura do contrainteressado e denunciante de tal situação.
1.3 - A passividade da ora recorrente justifica-se pela falta de solução dada pelo Recorrido para a legalização, porquanto, dita a boa burocracia a que já estão os cidadãos habituados, dita ser necessário o consentimento do contrainteressado,
1.4 - Ainda que as obras não tenham sido feitas em partes comuns, pelo que podia ter o município aceite a legalização sem carecer de autorização do condómino, já que as áreas estão completamente delimitadas e sem qualquer comunicação entre si, inexistindo qualquer parte comum no imóvel em que foi constituída propriedade horizontal,
1.5 - E atendendo que tais obras não vislumbram qualquer alteração do título constitutivo da propriedade, já que a obra não promove qualquer alteração do titular, divisão em mais partes, nem alteração tão pouco da permilagem,
1.6 - Inalterando qualquer finalidade do espaço em crise,
1.7 - Tanto assim é que quando constituída a propriedade horizontal e vendidas as frações ao contrainteressado, o imóvel já se encontrava nas condições que hoje se encontra,
1.8 - E tal não obstou ao interesse e compra pelo mesmo de tal imóvel.
1.9 - Deveria assim, o município, aceite a legalização sem ter condicionado a mesma à intervenção do contrainteressado nestes autos, oferecendo possibilidades de legalização à Recorrente,
1.10 - Já que a demolição é a ultima ratio.
1.11 - Portanto, não pode aceitar a Recorrente que lhe sejam assacadas responsabilidades pela sua inércia, já que o que ditou a mesma foi uma impossibilidade que a mesma, sempre em contato com o município, crê.
1.12 - Ora, o princípio da proporcionalidade demanda que a demolição seja a ultima ratio, o que implica a ponderação da possibilidade de legalização antes da decisão que ordene a demolição, em conformidade com o artigo 106º, n.º 2 do RJUE, cfr. sumaria o acórdão deste TCAN de 19.02.2014,
1.13 - Na fundamentação deste aresto lê-se “De acordo com o disposto no n.º 2 do transcrito artigo 106º do RJUE a demolição de uma obra edificada sem licença de construção apenas deve ser ordenada quando a Administração Municipal verifique que a mesma não é suscetível de legalização, sendo tal medida um ato de “ultima ratio que apenas deve ser utilizado quando se revele o único meio passível de repor a legalidade urbanística (principio da proporcionalidade)” ,
1.14 - Nada disto, na senda desse aresto, não exime o interessado na legalização apresente e despolete o processo.
1.15 - Sucede porém, a Recorrente tem entendimento diferente, já que em casos excecionais como o seu, o procedimento deveria ser instaurado era o da legalização em observância ao princípio da proporcionalidade e na lógica do menor sacrifício exigível aos particulares,
1.16- Sendo que a ponderação conducente ao juízo da demolição, vista como ultima ratio, deveria ser feita oficiosamente pela Administração, que deveria facilitar tal processo, atento o caso em concreto.
1.17 - A demolição de obras não licenciadas configura a última e indeclinável medida sancionatória da ilegalidade cometida, por força dos princípios da necessidade, adequação e da menor ingerência possível, decorrentes do princípio da proporcionalidade, conforme decorre do artigo 106º do RJUE.
1.18 - O Recorrido decidiu pela medida mais gravosa quando sabia que nada poderia fazer a Recorrente nada podia fazer para legalizar a situação em crise.
1.19 - Não oferecendo à mesma solução para proceder a tal legalização das obras ilegais,
1.20 - Que sublinhe-se, não são em área comum do prédio e nem alteram a constituição do titulo constitutivo da propriedade horizontal.
1.21 - Crê a Recorrente que toda esta contenda poderia ter sido evitada, caso lhe dessem uma solução diferente daquela que sempre foi preconizada pelo Recorrido".
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Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra referidas, o R. /Recorrido, Município de Santo Tirso, não apresentou contra alegações.
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O Digno Magistrado do M.º P.º, notificado nos termos do art.º 146.º, n.º1 do CPTA, não emitiu Parecer.
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Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento
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2. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO
A decisão recorrida julgou fixada a seguinte factualidade, que não se mostra questionada nesta sede recursiva:
1) O contra interessado, a 05.01.2009, apresentou participação junto da entidade demandada onde refere que a autora construiu uma garagem ilegal e que quer esta quer o muro que separa a casa desta da rua estão construídos em espaço do domínio público - Cfr. P.A., fls. 1;
2) A 14.01.2009, foi elaborada informação técnica, após fiscalização ao local, que conclui que a autora construiu uma garagem no alçado lateral esquerdo da habitação com uma área de cerca de 30 m2 sem que a mesma estivesse licenciada, e que construiu também muro de vedação à rua mais à frente do local da sua implantação e em desacordo com o estipulado e autorizado pelo loteamento - Cfr. P.A., fls. 4;
3) Sobre a informação técnica referida recaiu informação superior a 20.01.2009 que refere dever-se notificar para «legalizar e corrigir as situações em falta» - Cfr. P.A., fls. 4;
4) A informação referida foi remetida à autora por ofício de 05.03.2009 - Cfr. P.A., fls. 5;
5) A 09.04.2009 o contrainteressado apresentou idêntica participação - Cfr. P.A., fls. 10;
6) Por despacho do Presidente da Câmara Municipal de 27.01.2010 determinou-se a notificação da autora para exercer o direito de audiência prévia quanto à intenção de emissão de «ordem de demolição da garagem construída sem comunicação prévia à Câmara (uma vez que se trata de uma operação inserida em zona abrangida por alvará de loteamento», tendo a autora sido notificada a 04.03.2010 - Cfr. P.A., fls. 12, 16 e 17;
7) A 08.03.2010, a autora solicitou a prorrogação do prazo concedido «no intuito de preparar o processo de legalização de uma garagem» - P.A., fls. 21;
8) O pedido da autora foi deferido por despacho do Presidente da Câmara Municipal de 18.11.2010, tendo sido remetida notificação do mesmo à autora por ofício de 12.01.2011 - Cfr. P.A., fls. 22;
9) A 15.02.2011, a autora apresentou requerimento em que solicita a suspensão do procedimento indicando que se depara «com a impossibilidade de apresentar o pedido de legalização, pois encontra-se a decorrer no Tribunal Judicial de S. Tirso uma acção ordinária movida pelo proprietário das fracções ... e ... [contrainteressado], requerendo a nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal, colocando a legitimidade da requerente em causa» - Cfr. P.A., fls. 25 e ss.;
10) A 25.07.2017, foi elaborada informação dando conta que não se possuía elementos que justificassem a suspensão do procedimento tendo em conta o acordo elaborado na audiência do processo indicado pela autora no requerimento de 9) - Cfr. P.A., fls. 54 e 55;
11) A 14.08.2017, determinou-se a notificação da autora para exercer a audiência prévia relativamente à ordem de demolição da garagem - Cfr. P.A., fls. 54 e 55;
12) A autora foi notificada do despacho supra...

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