Acórdão nº 00374/10.5BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 07-12-2023

Data de Julgamento07 Dezembro 2023
Ano2023
Número Acordão00374/10.5BEVIS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Viseu)
Acordam em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Recorrente (Autoridade Tributária e Aduaneira), interpôs recurso jurisdicional, da sentença proferida em 08.09.2017, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., pela qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra os actos de liquidação de IRC, relativos aos anos de 2007 e 2008, e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 52.790,69 euros, “julgando assistir razão à impugnante, com exceção das correções decorrentes dos serviços prestados pela impugnante à [SCom01...] e [SCom02...]”.
A Recorrente terminou as suas alegações, formulando as seguintes conclusões:
«(...)
A - Incide o presente recurso sobre a sentença proferida em 07/09/2017, que julgou parcialmente procedente a impugnação (deduzida contra as liquidações adicionais de IRC relativas aos anos de 2007 e 2008 e respetivos juros compensatórios, no montante total de € 52.790,69), julgando assistir razão à impugnante, com exceção das correções decorrentes dos serviços prestados pela impugnante à [SCom01...] e [SCom02...].
B - Alicerça o Meritíssimo Juiz a quo a sua convicção (relativamente à apreciação que faz quanto à questão de saber se a impugnante, relativamente à exploração de bares e refeitórios, serviços de limpeza e transporte, beneficia da isenção de IRC decorrente da alínea b) do nº 1 do artigo 10º do CIRC, dado se verificarem os condicionalismos do nº 3 da mesma norma) nos elementos documentais indicados em cada alínea dos factos provados e na parte respeitante ao relatório de inspeção as remissões que se fazem para o mesmo incluem também os respetivos anexos.
C - A impugnante defende, pela positiva, estarem verificados os condicionalismos do nº 3 da supra referida norma, uma vez que está sujeita ao Regime Jurídico das Instituições Particulares de Solidariedade Social e a atividade que desenvolve se situar no âmbito dos seus fins estatutários; enquanto a AT, atentando aos fins estatutários da impugnante, defende deles não fazerem parte as supra referidas atividades, tanto mais que são promovidas por entidades diversas da impugnante.
D - Propondo-se averiguar quais os fins estatutários da impugnante, se as atividades originadoras das correções fazem parte do desenvolvimento daqueles fins, mormente se há óbice à isenção que aquelas sejam desenvolvidas por entidades terceiras, não tem o Tribunal a quo dificuldade em verificar (se bem não descortinemos claramente das razões para tal) que ele se enquadra/conjuga com o objeto da impugnante mormente se considerarmos a alteração verificada no início de 2007; ideia que, na sua ótica, sai reforçada pelo facto de as sociedades em causa (Escola Profissional da Fundação «X», [SCom03...] Unipessoal, L.da e [SCom04...] Unipessoal, L.da) terem sido constituídas exclusivamente pela impugnante.
E - Cogita o Tribunal a quo, que o enquadramento formal pode ser diverso mas verificando-se a mesma substância é esta que predomina, deve predominar, sobre aquele. Na situação em análise a impugnante constituiu algumas sociedades comerciais no cumprimento do seu objeto social. Naquelas em que é única sócia e enquanto assim for a situação substancial não se afigura diversa da que existiria se, em vez de ter constituído as sociedades criasse para cada uma das atividades por elas desenvolvidas, um centro de custos.
F - Concluindo assistir razão à impugnante, por se mostrarem verificados os requisitos das alíneas do nº 3 do artigo 10º do CIRC, sendo indiferente ao Tribunal, para efeito da isenção defendida pela Impugnante (que a enquadra na alínea b) do referido artigo) que ela se verifique nos termos da alínea b) ou c) – não só porque se verificou o reconhecimento ministerial nos termos previstos no nº 2 do mesmo artigo (factualidade dada como provada em B), como decorre dos factos assentes que a impugnante é uma IPSS.
G - Discordamos frontalmente, pois que da factualidade decorrente dos autos, como da legislação aplicável, cremos não poder extrair a mesma conclusão: resulta da factualidade vertida nos autos que a impugnante é uma instituição particular de solidariedade social (IPSS).
H - O artigo 1º do Decreto-lei nº 119/83, de 25/02, que estabelece o regime jurídico das IPSS, define estas entidades como instituições particulares de solidariedade social constituídas, sem finalidade lucrativa, por particulares, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e justiça entre os indivíduos e desde que não sejam administradas pelo Estado ou por um corpo autárquico, para prosseguir, entre outros, objetivos de índole social, mediante a concessão de bens e prestação de serviços, nomeadamente para fins de apoio a crianças e jovens, apoio a família, integração social e comunitária, proteção na velhice e na invalidez, promoção da saúde, educação, formação profissional e habitação social.
I - De acordo com o artigo 2º dos Estatutos da impugnante, na sua redação originária, “a Fundação tem por objetivo promover a assistência no concelho ..., dando prioridade à freguesia ....”, estabelecendo o artigo 3º que os objetivos da instituição serão realizados através das seguintes atividades: “a) Assistência infantil; b) Assistência à terceira idade; c)Outras formas de assistência.”
J - Em 06/03/2007, os mencionados Estatutos foram objeto de alterações, passando-se a inscrever como objetivos da Fundação «X» “a solidariedade social, numa perspectiva cristã, dando prioridade à freguesia ..., o ensino e a cultura portuguesa”, a realizar através das seguintes atividades: “Promoção da assistência infantil; Promoção da assistência à terceira idade; Promoção da assistência médica e medicamentosa; Promoção do ensino; Promoção da cultura e da língua portuguesa; Promoção de outras formas de assistência”.
K - Resulta do nº 1 do artigo 10º do CIR (na redação á data dos factos) que estão isentas de IRC as pessoas coletivas de utilidade pública administrativa, as instituições de solidariedade social e as entidades anexas, bem como as pessoas coletivas àquelas legalmente equiparadas, e as pessoas coletivas de mera utilidade pública que prossigam, exclusiva ou predominantemente, fins científicos ou culturais, de caridade, assistência, beneficência, solidariedade social ou defesa do meio ambiente.
L - No entanto, esta isenção está condicionada à verificação continuada dos seguintes requisitos:
i) Prossecução efetiva e relevante dos fins que justificam o apoio fiscal: exercício efetivo e contínuo, a título exclusivo ou predominante, de atividades dirigidas à prossecução dos fins que justificaram o reconhecimento da qualidade de utilidade púbica;
ii) Afetação significativa dos recursos: afetação a esses fins de, pelo menos, 50% do valor global líquido que seria sujeito a tributação nos termos gerais, até ao fim do 4º período de tributação posterior à sua obtenção, salvo em caso de justo impedimento no cumprimento do prazo de afetação, notificado ao Diretor Geral dos Impostos, acompanhado da respetiva fundamentação escrita, até ao último dia útil do 1º mês subsequente ao termo do referida prazo;
iii) Ausência de fim egoísta e de vantagem pessoal: inexistência de qualquer interesse dos membros dos órgãos estatutários nos resultados da exploração das atividades económicas prosseguidas pela entidade.
M - A isenção das Instituições Particulares de Solidariedade Social opera atualmente de forma automática e com efeitos retroactivos à data da verificação dos respetivos pressupostos, por força da entrada em vigor da Lei nº 60-A/2005, de 30 de dezembro, todavia à data dos factos carecia de reconhecimento pelo Ministro da Finanças, a requerimento dos interessados (o que se verificou, conforme anexo 11 ao relatório inspetivo).
N - Ainda assim, mantém-se, na sua essência, os requisitos necessários para a verificação da isenção de IRC enunciada no nº 3 do artigo 10º do CIRC.
O - Os serviços prestados pela impugnante às referidas sociedades, que originaram as correções determinantes das liquidações impugnadas (exploração de bares e refeitórios, serviços de limpeza e transporte e prestação de serviços), não se enquadram nos seus fins estatutários, pelo que não pode a impugnante beneficiar de isenção de IRC relativamente a estas.
P - De facto, por mais lato que o conceito de assistência possa parecer, a impugnante não podia alargar o âmbito da isenção que lhe foi concedida, especificamente para “rendimentos comerciais e industriais, diretamente derivados do exercício das atividades desenvolvidas no âmbito dos seus fins estatutários” (o sublinhado é nosso), a atividades que, de todo, não podem inserir-se nos seus fins estatutários.
Q - Ou, dito de outra forma, não pode a impugnante beneficiar de isenção de IRC relativamente aos rendimentos provenientes da exploração do bar da Escola Profissional da Fundação «X» Unipessoal, L.da; nem dos serviços prestados à [SCom03...] Unipessoal, L.da e [SCom04...] Unipessoal, L.da; atividades que, de todo, se podem inserir nos seus fins estatutários, de assistência à infância e idosos, ao ensino e demais atividades, por mais lato que o conceito de assistência possa parecer, muito menos sendo essas outras entidades a promover tais finalidades.
R - Apesar da aludida isenção de IRC operar atualmente automaticamente, sem qualquer ato de reconhecimento prévio (como referimos supra, em M), fica afastada quando estejam em causa rendimentos empresariais derivados do exercício de atividades comerciais ou industriais fora do âmbito dos fins estatutários da respetiva entidade, como decorre do nº 3 do artigo 10º do CIRC.
S - Em suma, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, por errónea aplicação da lei, mormente o disposto no artigo 10º do IRC.
Termos em que deve ser dado provimento ao...

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