Acórdão nº 00320/21.0BEPNF-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 2022-02-25

Data de Julgamento25 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão00320/21.0BEPNF-A
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Penafiel)
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
Recorrente: R., SA
Recorrido: Município (...)
Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou improcedente o processo cautelar que, entre o mais, visava a suspensão da eficácia da deliberação da Assembleia Municipal de (...), de 18-12-2020, pela qual foi aprovada a suspensão parcial do PDM (...) e respetivas medidas preventivas.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, do seguinte teor:
“A) Vem o recurso interposto da sentença proferida nos presentes autos que julgou “improcedente, por não provado, o presente processo cautelar”;
B) A Recorrente não se conforma com a referida sentença, visto que a mesma padece dos seguintes vícios que determinam a sua invalidade: (i) erro de julgamento da matéria de facto; (ii) erro de julgamento da matéria de direito (I); (iii) erro de julgamento da matéria de direito (II); (iv) nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
Do erro de julgamento da matéria de facto
C) A Recorrente alegou vários factos com interesse para a decisão da causa que deveriam de ter sido considerados pelo Tribunal e que não constam, nem dos factos provados, nem dos factos não provados;
D) Nomeadamente, a respeito do preenchimento do requisito do periculum in mora, a Recorrente alegou que a exploração do Aterro constitui a sua principal atividade (artigo 5 do RI);
E) Por outro lado, de modo a percecionar o impacto que o encerramento do Aterro terá no interesse público, a Recorrente alegou que (i) o Aterro é um equipamento fundamental para a assegurar a deposição de resíduos que não possam ser reciclados, nem valorizados (artigo 105 do RI) e que (ii) os aterros existentes no Norte do país apresentam um tempo de vida útil de apenas 2 anos (artigos 110 e 111 do RI), tendo inclusive carreado, para prova desse facto, um documento da APA (n.º 26);
F) Numa outra perspetiva, e considerando os factos relevantes para a apreciação do requisito do fumus boni iuris, a requerente alegou (e comprovou) os factos relativos à tramitação dos pedidos referidos nos pontos F) e H) da Fundamentação de facto da sentença recorrida, os quais constam, no essencial, dos artigos 18 a 80 do RI;
G) A respeito da ponderação dos interesses, alegou a Recorrente que o Recorrido celebrou um memorando de entendimento do qual resulta que recebe €2 por tonelada de resíduo depositado no Aterro (artigo 19 do RI), tendo carreado para os autos um documento (n.º 4), sendo que este facto foi aceite pelo Recorrido;
H) Ainda a respeito desta ponderação, alegou a Recorrente (e foi aceite pelo Recorrido) que, na exploração do Aterro, cumpre com todas as exigências legais e resultantes das autorizações administrativas concedidas (artigo 20);
I) Ora, os factos acabados de enunciar são, todos eles, independentemente de provados ou não provados, relevantes para a boa decisão da providência cautelar requerida, pelo que o Tribunal, na seleção dos factos relevantes e irrelevantes, ao não considerar os factos alegados nos artigos 5, 19 (documento n.º 4), 20, 21 a 80, 105, 110 e 111 do RI, incorreu em erro no julgamento da matéria de facto, o que determina a invalidade da decisão proferida;
J) Por conseguinte e tendo por base o exposto (nomeadamente, os meios probatórios indicados e a posição assumida pelas partes), requer-se que o Tribunal adite, à matéria de facto dada como provada, os seguintes factos:
a. A exploração do Aterro constitui a principal atividade desenvolvida pela Requerente (artigo 5 do RI; aceite por acordo);
b. A Requerente, na exploração do Aterro, cumpre com todas as exigências legais e resultantes das autorizações administrativas concedidas (artigo 20 do RI; aceite por acordo);
c. O Aterro é um equipamento fundamental para a assegurar a deposição de resíduos que não possam ser reciclados, nem valorizados (artigo 105 do RI; documento n.º 29);
d. Os aterros de resíduos industriais não perigosos existentes no Norte do país apresentam um tempo de vida útil de 2 anos (artigos 110 e 111 do RI; documento n.º 29 e aceite por acordo);
e. O Requerido celebrou um memorando de entendimento do qual resulta que recebe €2 por tonelada de resíduo depositado no Aterro (artigo 19 do RI, documento n.º 4 e aceite por acordo);
f. Os factos relativos à tramitação dos pedidos referidos nos pontos F) e H) da Fundamentação de facto da sentença recorrida, constantes dos artigos 18 a 80 do RI.
Do erro de julgamento da matéria de direito (I)
K) Como referido, a Recorrente alegou vários factos que considera relevantes para a apreciação da causa e que não foram selecionados enquanto tal pelo Tribunal a quo;
L) A não seleção dos referidos factos motivaram a não produção de qualquer prova testemunhal nos presentes autos;
M) A Recorrente considera que constam do processo elementos probatórios suficientes para que o Tribunal considerasse que os requisitos que permitem o decretamento da providência cautelar requerida estão, todos eles, preenchidos;
N) No entanto, assim não entendendo, o que não se concede, cabia ao Tribunal a quo ter considerado como relevantes os factos alegados acerca do preenchimento dos referidos requisitos e, entendendo os mesmos como não provados, determinar a produção da prova requerida pela Recorrente (nomeadamente, prova testemunhal);
O) De facto, a não produção da prova testemunhal no caso sub iudice, porque influiu na boa decisão da causa, determina a invalidade da sentença recorrida por erro de julgamento da matéria de direito na medida em que consubstancia a violação do disposto nos artigos 90.º e 118.º do CPTA, 607.º, n.os 3 e 4, do CPC (ex vi artigo 1.º do CPTA) e 20.º, n.º 1, da CRP, o que acarreta a revogação da sentença e a baixa dos autos para que, no seguimento da correta seleção da matéria de facto relevante, seja produzida prova sobre os factos alegados nos respetivos articulados e que sejam considerados pelo Tribunal ainda como controvertidos.
Do erro de julgamento da matéria de direito (II)
P) O Tribunal a quo julgou “improcedente, por não provado, o presente processo cautelar e, consequentemente, absolveu a Entidade Requerida do pedido”, tendo considerando, para tanto, que “não resultam do processo quaisquer elementos que permitam concluir que o ato suspendendo provocará prejuízos de difícil reparação ou uma situação de facto consumado, irreversível, de impossível reconstituição, pelo que, ter-se-á de concluir que não ocorre uma situação de periculum in mora”;
Q) A conclusão do Tribunal (de não preenchimento do requisito do periculum in mora) assenta, no essencial, em dois pressupostos: primeiro, que “o encerramento do Aterro, por si só, não constitui uma situação de facto consumado”; segundo, que, para efeitos do requisito em questão, “apenas releva a proteção dos direitos e interesses da Requerente […], não relevando os interesses dos terceiros”;
R) Relativamente ao primeiro pressuposto, o entendimento acolhido pelo Tribunal foi de que “a Requerente poderá reabrir o Aterro, dando início ao funcionamento/exploração da 3.ª célula”;
S) Fê-lo, porém, sem ter quaisquer elementos concretos que apontassem nesse sentido, o que é, aliás, assumido pelo Tribunal, mormente, quando justificou a conclusão a que chegou com base nas “regras da experiência comum”;
T) Contudo, tendo em conta as especificidades do caso concreto, as ditas “regras da experiência comum” apontam justamente em sentido contrário;
U) Na verdade, considerando (i) o conteúdo e os efeitos do ato suspendendo, a própria (ii) natureza da atividade de exploração do Aterro, assim (iii) como a complexidade do licenciamento a que este tipo de equipamento está sujeito, não se pode concluir que o Aterro, depois de estar encerrado por um período mais ou menos extenso (mas que se pode prolongar por anos), de ficar sem os seus trabalhadores, de perder os seus clientes (em ambos os casos, como resultado do encerramento do Aterro) e, porventura, como consequência do decurso do tempo, cessada a vigência das licenças que atualmente é titular, possa, simplesmente e como que de forma mágica, retomar a sua atividade, logo que for tomada uma decisão na ação principal;
V) A conclusão, tendo em conta as “regras da experiência comum”, a situação concreta, os elementos carreados para os autos, não pode, pois, deixar de ser outra que não seja de que de que, no caso, o encerramento do Aterro tem de ser visto como algo definitivo ou, pelo menos, que existe o fundado receio de que tal possa acontecer, daí decorrendo que se afigura “efetivamente fundado o receio de que os interesses a acautelar em sede de ação principal – através da anulação do ato – não venham mais a ser repostos, em virtude de a situação não ser já passível de retorno no plano fáctico” (acórdão do TCA-N de 9/06/2017);
W) Independentemente do que se expôs, a verdade é que o encerramento do Aterro constitui, por si, uma situação de facto consumado;
X) Isto porque, se não forem decretadas as providências cautelares requeridas, a Recorrente, com o esgotamento da capacidade do aterro, ficará impossibilitada de continuar a explorar o referido equipamento;
Y) Na verdade, sem o decretamento das providências requeridas, a CCDR-N e o Recorrido não emitirão as licenças solicitadas, fundamentais para que a Recorrente possa terminar a construção da terceira célula e proceder à respetiva exploração, fazendo com que a Recorrente, no limite, até finais do mês de janeiro de 2022, não possa desenvolver aquela que constitui a sua principal atividade (artigo 5 do RI) e, como tal, tenha que ser encerrado o Aterro;
Z) Ora, ficando a Recorrente impossibilitada de explorar o aterro, gerar-se-á uma situação de facto consumado (encerramento do Aterro), visto que, mesmo que o processo principal venha a ser julgado procedente, jamais será...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT