Acórdão nº 00228/22.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-12-07

Ano2023
Número Acordão00228/22.2BEMDL
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Mirandela)
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

«AA», contribuinte fiscal n.º ...66, e «BB», contribuinte fiscal n.º ...95, residentes na Estrada Nacional n.º ..., Bairro ..., freguesia ..., em ..., interpuseram recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 10/04/2023, que julgou improcedente a oposição deduzida contra o processo de execução fiscal n.º ...68 e apensos, instaurado pelo Núcleo de Execuções Fiscais da Direcção de Finanças de ..., para cobrança coerciva de IRS, referente aos anos de 2017 e 2018, no montante de €190.559,38.

Os Recorrentes terminaram as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
Primeira: A obrigação de pagamento constante da liquidação, não era certa, pois não estava concretamente determinada em relação à sua qualidade, não se diferenciando do resto das obrigações fiscais dos oponentes, nem líquida, uma vez que os oponentes não conseguiam descortinar quais os exatos valores que constavam da execução e qual o iter cognoscitivo percorrido pela Administração Tributária para a eles chegar, como também ainda não era exigível, por não se encontrar vencida.
Segunda: Não obstante terem sido expressamente suscitadas, o Sr. Juiz do TAF recorrido não se pronunciou sobre essas concretas questões, sobre as quais tinha a obrigação de se pronunciar, apreciando, conhecendo e decidindo, o que não fez, ocorrendo assim ostensiva omissão de pronúncia, que acarreta a nulidade da sentença, que expressamente se argui e invoca.
Terceira: Afirmando a sentença que os então oponentes foram notificados da ordem de serviço que originou a inspeção em 16/09/2021, e que o prazo de caducidade do direito à liquidação esteve suspenso durante vários meses, a mesma não esclarece que prazo de suspensão foi esse, nem se o prazo de liquidação poderia estar eternamente suspenso, nem sequer porque motivo considerou improcedente a exceção de caducidade oportunamente suscitada, pese embora tenha considerado que os opoentes se considerariam notificados o mais tardar no dia 01/04/2022, não explicita, nem conclui porque motivo, nessa data, não havia caducado o direito à liquidação referente ao ano de 2017.
Quarta: Ocorre, de forma ostensiva e manifesta, a falta de atempada notificação, em 01/04/2022, da liquidação de impostos referente ao ano de 2017, face à verificação da exceção de caducidade daquela liquidação, que expressamente se argui e invoca;
Quinta: Os ora recorrentes suscitaram expressamente a ilegalidade do procedimento da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao recorrer a meras presunções, e a métodos indiretos e apenas indiciários, para proceder à liquidação dos impostos de 2017 e 2018, e afirmaram expressamente que a AT se estribara em meras suposições, em realidades que apenas ficcionou, sem que as mesmas se mostrassem devidamente fundamentadas, socorrendo-se de métodos cuja utilização a lei não lhe permite, cabendo-lhe o ónus da prova de que se mostravam verificados os pressupostos da aplicação dos métodos indiretos, o que a Administração Tributária não fez.
Sexta: Não obstante terem sido expressamente suscitadas, o Sr. Juiz do TAF recorrido não se pronunciou sobre essa ilegalidade do procedimento e do recurso a meras presunções e métodos indiretos, questões sobre as quais tinha a obrigação de se pronunciar, apreciando, conhecendo e decidindo, o que não fez, ocorrendo assim ostensiva omissão de pronúncia, que acarreta a nulidade da sentença, que expressamente se argui e invoca.
Sétima: Contrariamente ao que anunciara e comunicara, a Autoridade Tributária não notificou o mandatário constituído pelos ora recorrentes, pese embora o tivesse expressamente advertido de que o iria fazer e preceitua a lei que as notificações aos interessados que tenham constituído mandatário serão feitas, também, na pessoa deste, e no seu escritório, o que no caso concreto não aconteceu, constituindo essa omissão nítida preterição de formalismo legal, que se argui e invoca.
Oitava: Para que as liquidações dos impostos de 2017 e 2018 notificadas aos oponentes fossem julgadas válidas e eficazes, impunha-se que nelas constasse, designadamente, a forma como os ora recorrentes se poderiam opor a tais liquidações e quais os concretos meios de defesa que poderiam utilizar, para desse modo permitir o direito de defesa constitucionalmente garantido, o que não consta, preterição de formalidade que expressamente se argui e invoca.
Nona: Quando apresentaram a petição inicial, os ora recorrentes não tinham conhecimento dos factos alegados na contestação apresentada pela AT, razão pela qual só após este lhes ter sido notificado, e no exercício do seu direito ao contraditório relativamente ao vertido naquele articulado é que os ora recorrentes puderam pronunciar-se sobre aqueles factos, pelo que, contrariamente ao que se considera na sentença recorrida, não existiu qualquer modificação da causa de pedir, tratando-se, tão só, de factos supervenientes, relativamente aos quais foi devidamente explicitada a sua superveniência.
Décima: E mesmo que assim se não entendesse, então deveria o Sr. Juíz a quo, salvo o devido respeito, ter procedido à convolação do processo e ordenado o prosseguimento da ação, dando-se assim cumprimento ao disposto no artigo 208º do CPPT, uma vez que a consequência sempre seria a convolação para a forma processual adequada, uma vez que para tal inexistia qualquer impedimento.
Décima Primeira: O Tribunal recorrido ignorou, positiva e ostensivamente, toda a factualidade alegada pelos opoentes e ora recorrentes para demonstrar a inexistência do imposto face às leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação, bem como a ilegalidade da liquidação, e bem como ignorou, na íntegra, o requerimento probatório apresentado pelos oponentes ora recorrentes, não cuidando de assegurar o efetivo exercício dos direitos de defesa dos opoentes ora recorrentes, escudando-se em questões formais, ao invés de, como deveria, ter procurado alcançar a verdade material.
Décima Segunda: Face ao supra exposto deveria ter sido dado como provado que a liquidação não era certa, liquida e exigível.
Décima Terceira: Deveria ter sido dado como provado que os valores que constam do relatório final são dispares dos valores das liquidações e estes valores.
Décima Quarta: Dar-se como provado que as liquidações não foram notificadas ao mandatário dos oponentes.
Décima Quinta: Que não consta das liquidações a concreta forma como os oponentes se poderiam opor e quais os concretos meios de defesa de que dispunha.
Décima Sexta: Desta forma, também neste ponto, devem ser atendidas as razões dos recorrentes, devendo, em consequência, na procedência do recurso, os autos baixar ao TAF de Mirandela para, aí sim, ser produzida a prova indicada pelos oponentes em sede de oposição, assim permitindo que os mesmos exerçam todos os seus direitos de defesa constitucionalmente garantidos e, após, ser proferida nova decisão, expurgada dos vícios suprarreferidos, de que agora padece a sentença recorrida.
Décima Sétima: Deve dar-se como provado que nunca os opoentes terem falado ou contatado o Sr. «CC», pessoa cuja identidade desconhecem e a frequência com que o oponente «AA» recebe castanhas, desconhecendo em absoluto os produtores das mesmas.
Décima Oitava: Deve dar-se como provado que nunca os opoentes terem pago qualquer quantia ao Sr. «CC», pagando sim aos ditos «ajuntadores», que expressamente identificaram, devendo ser esclarecidos os respetivos procedimentos.
NESTES TERMOS e nos melhores de direito aplicáveis, deve o presente recurso ser admitido e, a final, julgado procedente, determinando-se a baixa dos autos ao TAF de Mirandela para, aí, após produção da prova que ao caso couber, ser proferida nova decisão, expurgada dos vícios de que agora padece a sentença recorrida.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; submete-se o processo à Conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa apreciar se a decisão recorrida incorreu em nulidade, por omissão de pronúncia, e se enferma de erro de julgamento ao considerar que é inviável a invocada ilegalidade da liquidação produzir o efeito pretendido de extinção do processo de execução fiscal e que os oponentes foram notificados das liquidações ainda no prazo de caducidade.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“A. Em 16-09-2021, o Oponente «AA» assinou as ordens de serviço n.ºs ...50 e ...51, pelas quais se procedeu à inspecção de âmbito externo, referente ao IRS dos anos de 2017 e 2018 respectivamente (doc. 3 junto com a contestação - Contestação (120260) Documento(s) (004492447) de 30/09/2022 11:42:18);
B. Em 07-03-2022, o Oponente «AA» recebeu cópia do Relatório Final de inspecção tributária a que se referem as ordens de serviço do ponto A do probatório - Petição Inicial (119360) Requerimento (004486062) Pág. 5 de 18/07/2022 19:47:01;
C. Em 09-03-2022, o mandatário dos Oponentes recebeu cópia do Relatório Final de inspecção tributária a que se referem as ordens de serviço do ponto A do probatório - Petição Inicial (119360) Requerimento (004486062) Pág. 1 de 18/07/2022 19:47:01;
D. Em 17-03-2022, a liquidação de IRS...

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