Acórdão nº 00217/22.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 10-02-2023

Data de Julgamento10 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão00217/22.7BECBR
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Coimbra)
EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

S..., Lda. veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra – 1ª Unidade Orgânica -, de 18.11.2022, pela qual foi julgada parcialmente procedente a acção de contencioso pré-contratual intentada pela I..., L.da contra o Instituto Politécnico de ... e em que foram indicadas como interessadas a ora Recorrente e outras empresas concorrentes no procedimento de concurso, em causa, para adjudicação do serviço de limpeza do Lote 1 – Serviços de Higiene e Limpeza Regular, ... (Campus 1, 2, 5, Serviços Centrais, Serviços de Arquivo).

Invocou parra tanto, em síntese, que: a proposta da Autora foi bem excluída por violação de regras do programa do concurso, pelo que sendo a proposta da ora Recorrente a economicamente mais vantajosa de entre as admitidas, e não se verificando qualquer ilegalidade no acto de adjudicação do Lote 1 à ora Contra -Interessada, deve a acção improceder (totalmente) ao contrário do decidido.

A Autora, ora Recorrida, contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

1.ª Decidiu o Tribunal a quo por via da sentença recorrida proferir decisão no sentido de julgar “parcialmente procedente a ação nos seguintes termos:

a. O Tribunal anula o acto de adjudicação do serviço de limpeza do Lote 1 do referido concurso, anulando-se igualmente o contrato celebrado com a contrainteressada S..., Lda, e demais consequências legais;
b. O Tribunal absolve o réu dos demais pedidos.”.

2.ª Sucede, porém, que não pode a ora Recorrente concordar com a decisão quanto ao Lote 1, razão pela qual decidiu, por estar em tempo e ter legitimidade, interpor recurso da referida sentença, nos termos abaixo melhor explicitados.

3.ª Se é verdade que decidiu bem o Tribunal a quo ao ter considerado, como aliás, não poderia deixar de ser, que não houve qualquer violação do direito de audiência prévia, porquanto como invoca e bem “O júri propôs a exclusão da oferta da autora no relatório preliminar, tendo esta exercido o direito de audiência. A lei impõe que, após o relatório final, apenas haverá lugar ao exercício do direito de audiência prévia se houver novas exclusões de propostas. A alteração da base jurídica para a exclusão entre os dois relatórios não introduz qualquer modificação substantivamente inovadora que justifique novo direito de audiência. Nestes termos, o Tribunal julgará não assistir razão à Autora.”, certo é que se considera terem havido claros erros de julgamento de direito.

4.ª No artigo 10.º do programa do concurso, previu a entidade adjudicante que seria “de 90 dias o prazo da obrigação da manutenção das propostas”, em expressa derrogação do prazo supletivo de 66 dias previsto no artigo 65.º do CCP.

5.ª Ora, o que é facto é que a Autora colocou na sua proposta um prazo de manutenção da mesma de 66 dias, em desrespeito manifesto dos termos definidos pelo Programa do Concurso.

6.ª E nem se considere que um prazo de manutenção da proposta estabelecido em clara desconformidade com o prazo exigido pela entidade adjudicante poderia ser “retificado” em sede de esclarecimentos ou retificações oficiosas por parte do júri, como alega a Autora e decidiu o Douto Tribunal, tendo, portanto, errado na apreciação que fez.

7.ª Por isso, é facto que, nos termos do artigo 10.º do Programa do Concurso, o prazo de manutenção das propostas seria de 90 dias, e o prazo apresentado pela Autora foi de 66 dias, pelo que corresponde à verdade que a proposta da Autora não respeitava aquilo que era exigido pelo Programa.

8.ª Ora, se a entidade adjudicante estabeleceu que o prazo de validade das propostas seria obrigatoriamente de 90 dias – cfr. artigo 10.º do PC – e que o prazo de validade da proposta era um documento de apresentação obrigatória sob pena de exclusão – cfr. n.º 1 e n.º 1.5 do PC -, então é evidente que, quer a não apresentação pura e simples do documento com prazo de validade da proposta, quer a apresentação de documento com um prazo de validade diferente do estipulado no artigo 10.º, seriam sempre causas de exclusão das propostas ao abrigo da alínea n) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP.

9.ª Acrescente-se, então, que não é verdade o que alegou a Autora e com o qual o Tribuna a quo concordou quando, no artigo 57.º da PI, diz que “não existe qualquer cominação pela não verificação do referido prazo” (sublinhado nosso) – uma vez que ela existe, e consta, como se pode ver, da leitura conjugada do n.º 1 e do ponto n.º 1.5 do artigo 6.º do PC.

10.ª Nos termos do artigo 146.º n.º 2 alínea n) do CCP não podem, então, deixar de ser excluídas as propostas que violem as regras constantes do artigo 132.º n.º 4, desde que o programa do concurso preveja expressamente que tal violação seja causa de exclusão.

11.ª Assim, o júri do procedimento deve excluir fundamentadamente as propostas que, em violação do programa do procedimento e, consequentemente, da lei, violem as regras específicas que o próprio programa do concurso comina com exclusão caso se verifique o incumprimento.

12.ª O prazo de manutenção da proposta, apesar de não contender com a própria execução do contrato, é uma “pré-condição” da adjudicação – e, por isso, uma condição existencial da execução.

13.ª E não se consegue concordar com as considerações tecidas pela Autora, nem tão pouco com a decisão do Douto Tribunal, o qual, salvo o devido respeito, errou ao ter decidido como decidiu, no sentido de desvalorizar o elemento constituinte da proposta que é o prazo de manutenção da proposta, visto que, como se disse, é manifesto que a Entidade Adjudicante frisou que determinaria a exclusão da proposta não a instruir devidamente quanto, entre outros, à declaração do prazo de manutenção da proposta.

14.ª E veio ainda a Autora – tendo o Tribunal a quo concordado na decisão que proferiu mas que padece de vício de erro de julgamento -, como já se referiu, alegar que o facto de ter mencionado 66 dias de prazo de manutenção da proposta é um facto que perde relevância perante a declaração segundo a qual a mesma se vincula aos termos exigidos, quase que sugerindo que tudo o que compõe a proposta da Autora que não esteja conforme os termos das peças deverá ser interpretado como de acordo com o programa do procedimento e o caderno de encargos.

15.ª Não é aceitável que uma proposta que não cumpra com o Programa de Procedimento e com o Caderno de Encargos seja “retificada” através de uma declaração nos termos da qual “qualquer item que não esteja de acordo com o procedimento e/ou caderno de encargos, deve ser interpretado de acordo com estes”.

16.ª Ou até, como sugeriu a Autora, que tal proposta viesse a ser “ajustada de acordo com eventuais necessidades e ajustes do Cliente” (sublinhado nosso) relativamente a atributos da proposta, uma vez que a proposta tem as caraterísticas que lhe são atribuídas no momento da sua submissão, podendo somente ser clarificada quanto a ambiguidades e erros passíveis de uma correção.

17.ª É responsabilidade dos concorrentes garantir que todos os elementos da sua proposta são compatíveis com os requisitos, condições e exigências da Entidade Adjudicante e que esta expressa nas peças do Concurso, em pleno respeito pelo Concurso, pela Lei e pelos restantes concorrentes.

18.ª Diga-se, aliás, que existe jurisprudência no sentido de que tendo havido por parte de um determinado concorrente comprometimento a manter proposta por período inferior à exigida que tal deveria implicar a exclusão da proposta! (Vide Acórdão do TCA Sul, Proc. n.º 07196/11, de 17.03.2011).

19.ª É manifesto que uma situação nos termos da qual uma desconformidade entre uma proposta e as peças procedimentais que a devem orientar fosse “corrigida” através de uma “declaração” de aceitação dos termos geraria uma profunda desigualdade entre concorrentes, e essa sim seria uma situação eu ofenderia o princípio da igualdade com que a Autora se escuda.

20.ª Assim, todos os concorrentes poderiam, com toda a liberdade, fazer uma proposta que, sendo excluída pelo júri, fosse readmitida na sequência de uma declaração que harmonizasse o conteúdo da proposta e do programa do concurso através de uma “interpretação ab-rogante”, o que de todo se pode conceber, razão pela qual não pode de todo proceder a Sentença ora Recorrida por clara existência de erro de julgamento.

21.ª E mesmo que assim não se entendesse, a verdade é única e resume-se ao facto de a proposta da Autora conter elementos que não se compatibilizam com o exigido pelo programa do procedimento, e que, portanto, nunca poderia ser aceite através de uma declaração de “retificação”, ainda para mais oficiosa - como pretende o Tribunal a quo erradamente - que procure a interpretação de todos os termos da proposta em conformidade com os do programa do concurso.

22.ª Ora, contrariamente ao decidido pelo Tribunal a quo na Sentença ora Recorrida não tem nem tinha o júri que corrigir oficiosamente o prazo de validade da proposta, pois não poderia assumir simplesmente tratar-se de um lapso de escrita, nem poderia o júri solicitar esclarecimentos ao abrigo do artigo 72.º do CCP, pois qualquer esclarecimento a prestar pela Autora no sentido de que, afinal, o prazo de validade da sua proposta seria de 90 dias, consubstanciaria, na verdade, uma alteração à proposta, pois tal esclarecimento contrariaria os elementos constantes da mesma, o que de todo se pode admitir, tendo, portanto, o Tribunal a quo errado na apreciação que fez, razão pela qual, padece a sentença do vício de erro de julgamento.

23.ª O que ora está em causa não é um erro de...

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