Acórdão nº 00042/22.5BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 2022-07-14

Ano2022
Número Acordão00042/22.5BEBRG
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Braga)
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
I. Relatório
AA, contribuinte n.º ..., com domicílio na ... ..., executada em sede de reversão no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...76, a correr termos no Serviço de Finanças de Braga 1, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 22/02/2022, que julgou improcedente a reclamação do acto do órgão de execução fiscal, proferido pela ... de Finanças de Braga, datado de 02/12/2021, que indeferiu o pedido de nulidade da citação, peticionando a anulação do referido despacho com todas as consequências legais.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
A – Salvo o devido respeito, que é muito, o douto Tribunal a quo lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito.
B – Outrossim, decidindo como decidiu, o Tribunal a quo não apreciou correctamente a prova produzida e que faz parte do processo, fazendo, por isso, errada aplicação das normas legais.
C – Com efeito, a Recorrente apresentou reclamação da decisão de indeferimento do seu pedido de nulidade da citação efectuada no Processo de Execução Fiscal alegando, para tanto, a falta de notificação dos elementos essenciais do pedido de restituição dos fundos comunitários, cujo pagamento lhe está a ser exigido em sede de reversão.
D – Entendeu o doutro Tribunal a quo “... que a citação efetuada à Reclamante observou as formalidades prescritas na lei...” designadamente “que a reclamante foi notificada da declaração fundamentada dos pressupostos e extensão da reversão, assim como dos elementos essenciais da respetiva liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais, a fim de poder reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhe foi atribuída, nos mesmos termos do devedor principal.”
E – Isto porque, no entender do douto Tribunal a quo, “...é manifesto que do ofício de citação endereçado à Reclamante resultam demonstrados os requisitos essenciais enunciados nas alíneas a), c), d) e e) do n.º 1 do art.º 163º do CPPT – o que se infere desde logo da análise do documento em causa, referenciado nos pontos 06) e 07) dos factos considerados provados.”
F – Pelo que, no seu entender, “resultou devidamente comprovado nos presentes autos que a reclamante conhecia, porque tal lhe foi comunicado pela Autoridade Tributária, a declaração fundamentada do pedido de restituição dos fundos comunitários, a natureza das dívidas, a sua proveniência, o período a que respeitam, a data limite de pagamento e o valor.”
G – Sucede que, na verdade, dos referidos pontos 06) e 07) dos factos considerados provados na sentença ora posta em crise, resulta manifesto que a ora Recorrente não foi, de facto, notificada dos elementos essenciais do pedido de restituição dos fundos comunitários cujo pagamento lhe está a ser exigido em sede de reversão.
H – Da informação que esteve na génese do despacho de reversão descortina-se, quanto à decisão de restituição dos fundos comunitários, que se tratariam “Verbas Indevidamente recebidas do Fundo Social Europeu, no âmbito do Pedido de Financiamento n.° 42/0..., Medida 2, Eixo 4, do Programa Incentivos à Modernização da Economia (PRIME)” - Cfr. Ponto 6) do elenco de factos dados como provados.
I – No entanto, não se verifica que tivesse sido dado, à Recorrente, uma cópia da decisão que determinou a aplicação da medida administrativa de reposição do subsídio (a qual terá sido tomada pelo Gestor do PRIME), nem que tivessem sido comunicadas as razões de facto e de direito que levaram à aplicação de tal medida administrativa, nomeadamente, as normas jurídicas violadas e os concretos atos/infrações/irregularidades, cometidos pela sociedade devedora originária.
J – De facto, a Recorrente não foi notificada do concreto acto administrativo que determinou a aplicação da medida de reposição do subsídio.
K – Analisando a citação, o despacho de reversão e a informação que esteve na génese da citação – Pontos 5), 6) e 7) do elenco de factos provados - é manifesto que neles não consta:
- A identificação da entidade autora do acto administrativo que determinou a aplicação da medida administrativa de reposição do subsídio;
- A identificação do órgão da entidade que proferiu a decisão e a respectiva competência para o efeito;
- A data em que a decisão foi proferida;
- A natureza dos subsídios cuja restituição se impôs;
- O período a que se referem os subsídios cuja restituição se exigiu (cujo prazo de restituição terminou em 29 de Março de 2010);
- Os concretos factos praticados pela empresa revertida;
- A identificação das normas violadas;
- A identificação das normas que estatuem as consequências jurídicas produzidas pela verificação dos factos praticados e das normas violadas;
L – Pelo que, é manifesto que os factos dados como provados não permitem retirar a conclusão a que chegou o douto Tribunal a quo.
M - Por outro lado, entendeu o douto Tribunal a quo que “resultou igualmente provado nos presentes autos que a reclamante conhecia/conhece todos os elementos essenciais à sua defesa, tanto assim é que deduziu oposição à execução fiscal no âmbito da qual manifesta um total conhecimento dos factos relevantes”
N - Ora, quanto à lesividade da omissão, o que é relevante para a ocorrência da nulidade da citação é mera possibilidade de prejuízo para a defesa da Recorrente, o que, de facto aconteceu.
O - Isto porque, a circunstância de a Recorrente ter apresentado um processo de oposição à execução não permite considerar sanada a lacuna identificada.
O - É que, as pessoas solidária ou subsidiariamente responsáveis, poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída nos mesmos termos do devedor principal, pelo que, atendendo à natureza da dívida, assiste à Recorrente o direito de intentar uma ação administrativa, o que impõe o conhecimento de tal decisão.
P - A circunstância de a Recorrente poder impugnar o ato administrativo justifica que tenham de lhe ser fornecidos todos os elementos dessa decisão, de modo a permitir-lhe uma defesa cabal.
Q - Acresce que, assiste à Recorrente o direito de invocar, em sede própria, a prescrição do procedimento que impôs a medida administrativa de reposição dos subsídios (prescrição que não é de conhecimento oficioso, devendo ser especificamente invocada pelo interessado).
R - Pelo que, é inequívoco que a omissão provocou um prejuízo para a defesa da Recorrente.
S - Em suma, o facto de a citação da Recorrente não ter comunicado os elementos referidos no artigo 22.º, nº 4 da LGT, nomeadamente, a cópia da decisão contendo a fundamentação da medida administrativa de reposição do subsídio, leva a concluir que a citação da Recorrente não observa as formalidades prescritas na lei, sendo, por isso, nula - cfr. artigo 191.°, n° 1 do CPC, ex vi do artigo 2.°, al. e) do CPPT.
G – Ao decidir diferentemente, o douto Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, violando o disposto nos artigos art.°s. 22.°, n° 4 da Lei Geral Tributária e artigo 191.°, n° 1 do Código do Processo Civil, impondo-se, consequentemente, a revogação da douta sentença recorrida.
TERMOS EM QUE,
Deve ser julgado provado e procedente o presente recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida, e substituindo-se por outra que julgue procedente a Reclamação do acto do órgão de execução fiscal, com todas as legais consequências.
Assim se fazendo JUSTIÇA”
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A Recorrida não contra-alegou.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao manter o acto reclamado de indeferimento do pedido de nulidade da citação.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto:
“1.1) FACTOS PROVADOS
Consideram-se provados, com relevância para a decisão da causa, os seguintes factos que infra se indicam:
1) Em 19/11/2010 foi instaurado no Serviço de Finanças de Braga 1, contra ..., NIPC ..., o processo de execução fiscal n.º ...76, para cobrança coerciva de dívida proveniente de comparticipações financeiras do Fundo Social Europeu e do Estado Português, no montante de € 14.061,45, cujo termo do prazo para pagamento voluntário ocorreu em 29/03/2010 (cfr. fls. 01-29 do PEF).
2) A devedora originária foi citada no âmbito do processo executivo identificado em 1), em 20/12/2010 (cfr. fls. 30-33 do PEF).
3) Por despacho da ... de Finanças de Braga, de 19/07/2021, foi determinada a preparação para reversão da dívida identificada em 1) contra os responsáveis subsidiários (cfr. fls. 267-274 do PEF).
4) Por ofício datado de 21/07/2021 foi a reclamante notificada, por carta registada, para o exercício do direito de audição prévia em sede de reversão do processo executivo identificado em 1) (cfr. fls. 278-316 do PEF).
5) Por despacho da ... de Finanças de Braga, datado de 19/10/2021, foi determinada a reversão do processo executivo identificado em 1) contra a aqui reclamante (cfr. fls. 288 do PEF).
6) O despacho identificado no ponto anterior teve por base informação com o seguinte teor: (cfr. fls. 291-296 do PEF)
“Em 19-07-2021, foi proposta a reversão das dívidas em cobrança nos autos supra, cuja devedora originária é a ...,...

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