Acórdão nº 0338/16.5BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Dezembro de 2023

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução13 de Dezembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional pelo REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, visando a revogação da sentença de 05-07-2023, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou a impugnação intentada por A... S.A., melhor sinalizado nos autos, procedente, determinando a anulação das liquidações adicionais de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios, referentes ao período de 2010.10, no valor global de € 146.572,33. Irresignado, nas suas alegações, formulou o recorrente Representante da Fazenda Pública, as seguintes conclusões: 1) O presente recurso tem por objeto apenas a parte em que o tribunal a quo condena a AT ao pagamento de juros indemnizatórios a determinar em fase de execução de julgado, porque entende que estão reunidos os pressupostos do art. 43º, nº 1 da LGT. 2) O Tribunal a quo anulou as liquidações adicionais de IVA impugnadas pela ora recorrida, referentes ao período 2010.10, com fundamento, único e exclusivo, no vicio de caducidade do direito à liquidação. 3) O Tribunal a quo também considerou que se encontram preenchidos os requisitos do artigo 43º nº 1 da LGT e decidiu que a impugnante tinha direito a juros indemnizatórios. 4) Em suma, o Tribunal a quo entendeu que o vício de caducidade do direito à liquidação configura um erro imputável à AT para efeitos da constituição do direito a juros indemnizatórios ao abrigo do art. 43° n° 1 da LGT. 5) A Fazenda Pública não concorda com a decisão do Tribunal a quo, porque entende que houve erro de julgamento de direito, por errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 43.º, n.º 1 da LGT. 6) A situação fáctica em apreciação é a seguinte: O tribunal decidiu anular as liquidações fiscais porque o contribuinte não foi notificado dentro do prazo de caducidade. 7) O Supremo Tribunal Administrativo (STA) tem interpretado o artigo 43º nº 1 da LGT no sentido de que os juros indemnizatórios apenas podem ser atribuídos ao sujeito passivo que tenha satisfeito uma obrigação tributária que venha a ser anulada com fundamento em “erro imputável aos serviços”, designadamente, por erro na aplicação do direito. 8) O STA considera que só neste caso, se gera uma efetiva lesão na esfera jurídica do sujeito passivo, decorrente da imposição do cumprimento de uma obrigação tributária que se vem a apurar ser contrária ao direito. Por isso, os juros indemnizatórios devem ser pagos para reparar patrimonialmente o sujeito passivo. 9) Já quando os atos tributários são anulados por vícios de forma (incompetência do autor do ato, vicio procedimental, falta de fundamentação, para referir alguns exemplos) não fica demonstrado que tenha sido exigida ao sujeito passivo o cumprimento de uma obrigação materialmente contrária à lei. Nestes casos, a mera restituição do que foi pago é suficiente para tornar indemne o sujeito passivo. 10) Este entendimento foi sufragado entre muitos outros, no acórdão do STA (Pleno da secção do CT) de 04/11/2020 in proc. 037/19.6BALSB, Acórdão de 23/06/2021 in proc. 480/12.1BESNT, e Acórdão de 08/06/2022 in processo nº 0503/19.3BELRS. 11) Neste sentido realça-se a argumentação do Acórdão do STA de 08/06/2022 in processo nº 0503/19.3BELRS, que apreciou e decidiu um caso idêntico ao aqui em análise; 12) O Supremo Tribunal Administrativo decidiu que um contribuinte não tem direito a juros indemnizatórios quando um imposto é anulado por caducidade do direito à liquidação. O tribunal considerou que a caducidade é um mero facto jurídico que determina a impossibilidade do exercício de um direito num caso concreto e que não implica qualquer juízo sobre a validade da relação material tributária subjacente. 13) O STA considerou que o direito aos juros indemnizatórios previsto no art. 43.º da LGT exige que haja erro imputável aos serviços do qual tenha resultado (à luz de um nexo de causalidade) o pagamento de imposto indevido. O STA considerou que a caducidade não é um erro imputável aos serviços e que, portanto, não permite concluir pela existência de um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito. 14) A interpretação correta do artigo 43º nº 1 da LGT é a que tem sido feita pelo STA, que decidiu que o contribuinte não tem direito a juros indemnizatórios quando um imposto é anulado por caducidade do direito à liquidação. 15) A douta sentença recorrida violou o artigo 43º nº 1 da LGT. TERMOS EM QUE, deve ordenar-se a revogação da douta sentença recorrida, como é de LEI E JUSTIÇA Não houve contra-alegações. Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, apresentou douto parecer nos termos do art. 288, n.º 1, do CPPT, pronunciando-se, no sentido de ser julgado procedente o recurso, com a seguinte fundamentação: I. Objecto do recurso. 1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Aveiro que julgou procedente a ação de impugnação judicial intentada contra os atos de liquidação adicionais de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios, referentes ao período de 2010.10, no valor global de € 146.572,33, na parte em que determinou à Fazenda Pública, «em fase de execução de julgado, verificar o pagamento e, sendo caso disso, determinar o pagamento de juros a que houver lugar, repondo a situação que existiria se a ilegalidade anulada não tivesse sido praticada, nos termos do artigo 102º da LGT». A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, por entender que o tribunal “a quo” incorreu nesta parte em «erro de julgamento de direito, por errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 43.º, n.º 1 da LGT» e por o «entendimento acolhido na douta sentença recorrida está em flagrante contradição com a Jurisprudência consolidada do STA». Para o efeito alegou que de acordo com a jurisprudência deste tribunal «…um contribuinte não tem direito a juros indemnizatórios quando um imposto é anulado por caducidade do direito à liquidação». E que «a caducidade não é um erro imputável aos serviços e que, portanto, não permite concluir pela existência de um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito». E termina pedindo a revogação da sentença recorrida. 2. Para se decidir pela condenação em juros indemnizatórios considerou-se na sentença recorrida que «… tendo-se procedido à anulação das liquidações adicionais nos termos sobreditos, deverá a Fazenda Pública, em fase de execução de julgado, verificar o pagamento e, sendo caso disso, determinar o pagamento de juros a que houver lugar, repondo a situação que existiria se a ilegalidade anulada não tivesse sido praticada, nos termos do artigo 102º da LGT». II. APRECIAÇÃO DE MÉRITO DO RECURSO. Decorre da sentença recorrida que a ação de impugnação judicial intentada contra os atos de liquidação adicionais de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios, referentes ao período de 2010.10 foi julgada procedente pelo tribunal “a quo” por se ter entendido verificada a caducidade do direito de liquidação, atento que «não se tendo verificado qualquer facto determinante da suspensão ou interrupção da caducidade, a mesma ocorreu em 01.01.2015. Nessa medida, é manifesto que tendo a AT notificado a agora Impugnante do início da inspeção em 10.02.2015, tal facto não chegou a ter qualquer efeito suspensivo do prazo de caducidade, dado que nessa altura tal prazo já tinha decorrido completamente». Ora, como refere a Recorrente, é jurisprudência pacífica deste tribunal que nos casos de anulação de um acto de liquidação baseada na caducidade do direito de liquidar o tributo, por a notificação daquele acto não ter sido efetuada dentro do prazo de caducidade, não implica a existência de qualquer erro sobre os pressupostos de facto ou de direito da liquidação, pelo que, ao abrigo do artigo 43º da LGT não assiste ao contribuinte o direito a juros indemnizatórios. Considera a referida jurisprudência que «o direito aos juros indemnizatórios previsto no art. 43.º da LGT exige que haja erro imputável aos serviços do qual tenha resultado (à luz de um nexo de causalidade) o pagamento de imposto indevido. É a existência desse erro que consideramos não poder dar-se como verificada em face da declaração da caducidade do direito à liquidação» -(cfr. acórdão de 30/05/2012, proc. nº 0410/12, citado nos arestos referidos pela Recorrente; cfr igualmente acórdão de 23/06/2021, proc. nº 0480/12.1BESNT e demais jurisprudência ali citada). Este entendimento é sufragado na doutrina pelo ilustre conselheiro Jorge Lopes de Sousa, de acordo com o qual «[a] utilização da expressão «erro» e não «vício» ou «ilegalidade» para aludir aos factos que podem servir de base à atribuição de juros, revela que se teve em mente apenas os vícios do acto anulado a que é adequada essa designação, que são o erro sobre os pressupostos de facto e o erro sobre os pressupostos de direito. Com efeito, há vícios dos actos administrativos e tributários a que não é adequada tal designação, nomeadamente os vícios de forma e a incompetência, pelo que a utilização daquela expressão «erro» tem um âmbito mais restrito do que a expressão «vício». Por outro lado, é usual utilizar-se a expressão «vícios» quando se pretende aludir genericamente a todas as ilegalidades susceptíveis de conduzirem à anulação dos actos, como é o caso dos arts. 101.º (arguição subsidiária de vícios) e 124.º (ordem de conhecimento dos vícios na sentença) ambos do CPTT. Por isso, é de concluir que o uso daquela expressão «erro» tem um alcance restritivo do tipo de vícios que podem servir de base ao direito a juros indemnizatórios» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume I, anotação 5 ao art. 61.º, pág. 531). Em face do exposto e atento que não vislumbramos motivo para alterar o sentido dessa jurisprudência, afigura-se-nos assistir razão à Recorrente no vício assacado à sentença recorrida, a qual não fez a melhor interpretação e aplicação do disposto no artigo...

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