Acórdão nº 01683/11.1BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Dezembro de 2023

Magistrado ResponsávelPEDRO VERGUEIRO
Data da Resolução13 de Dezembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.RELATÓRIO O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 30-10-2021, que julgou procedente a pretensão deduzida por “A..., S.A.” no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com os actos de liquidação adicional de IVA do ano de 2005 e respectivos juros compensatórios, no montante global de € 165.894,90. Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) I - O presente recurso tem por objeto a douta sentença recorrida, proferida no processo supra referenciado, que julgou totalmente procedente a presente impugnação judicial e, consequentemente, anulou as liquidações adicionais de IVA do ano de 2005, e de juros compensatórios associados, aqui em causa. II - Douta sentença essa que, a nosso ver, e salvaguardado o devido respeito que a mesma nos merece, bem como salvaguardado o devido respeito por melhor entendimento, padece de erro de julgamento, em matéria de Direito, ao olvidar, de forma ostensiva, que o ónus da prova dos factos constitutivos do direito de que se arroga compete à impugnante, nos termos do artigo 19º, nº 2, do CIVA, do artigo 74º, nº 1 da L.G.T. e do artigo 342º, nº1 do Cód. Civil (direito à dedução do IVA suportado a montante, ao abrigo do artigo 20º do CIVA). III - E, concomitantemente, ao ter decidido, exclusivamente à luz dos princípios da descoberta da verdade material, do inquisitório e da colaboração, e à luz, nomeadamente, dos artigos 50º do CPPT e 58º e 59º da LGT, e perante as circunstâncias do caso concreto, que a Autoridade Tributária tinha o dever de realizar diligências junto dos fornecedores da Impugnante com vista à obtenção dos documentos comprovativos das operações em causa, e que a impugnante se viu impossibilitada de obter e, não o tendo feito, tal conduta da Autoridade Tributária configurou um vício autónomo de violação de lei. IV - As liquidações adicionais de IVA e dos juros compensatórios impugnadas foram efetuadas nos termos do artigo 87º do CIVA, com base em correções meramente aritméticas resultantes de imposição legal, alicerçadas no Relatório de Inspeção Tributária referido no ponto 5.do probatório, complementado pela informação prestada pela Inspeção Tributária no âmbito da reclamação graciosa. V - Nessas liquidações de IVA está em questão o direito à dedução do IVA suportado a montante, regulado nos termos dos artigos 19º a 26º do CIVA, em geral e, muito especialmente, o disposto no artigo 19º, nº 2, do CIVA, na medida em que o exercício desse direito à dedução só é conferido desde que o imposto seja mencionado em faturas e documentos equivalentes passadas em forma legal, em nome e na posse do sujeito passivo, ou em recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, bem como em documento emitido por via eletrónica pela Direção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, nos quais conste o número e data do movimento de caixa. VI - Para efeitos do exercício desse direito à dedução, consideram-se passadas em forma legal as faturas ou documentos equivalentes que contenham os elementos previstos no artigo 36º, tal como dispõe o nº 6 do artigo 19º do CIVA e, por sua vez, o artigo 20º, nº 1 do CIVA, dispõe que só pode deduzir-se o IVA suportado na aquisição de bens e serviços necessários para a prossecução de uma atividade que confere o direito à dedução do IVA, isto é, a utilização dos bens e serviços na atividade da empresa. VII - Atento este quadro legal, coloca-se a questão do exercício do direito à dedução do IVA, na medida em que, tendo os elementos da contabilidade da impugnante sido destruídos por um incêndio (cfr. ponto 2.do probatório), e não tendo esta conseguido obter dos seus fornecedores a totalidade das segundas vias das faturas ou documentos equivalentes para documentar o exercício do direito à dedução do IVA, mencionado nas sua declarações periódicas e nos extratos da contabilidade (recuperados), não foi reconhecido pela Administração Tributária, nessa medida também, o direito à dedução. VIII - O nº 2 do citado artigo 19º do CIVA estabelece como formalidade essencial do direito à dedução o facto de o imposto constar de faturas ou documentos equivalentes passados em forma legal, em nome e na posse do sujeito passivo. IX - Ora, estando, assim, em questão um direito da impugnante (direito à dedução do IVA, regulado nos artigos 19º a 26º do CIVA), caberá à mesma o ónus da prova dos factos constitutivos desse direito, nos termos do artigo 74º, nº 1 da L.G.T. e do artigo 342º, nº1 do Cód. Civil. X - Por outra via, importa dizer que os pressupostos legais da correção operada nos termos do artigo 87º do CIVA, que está na base das liquidações adicionais de IVA (objeto da reclamação/recurso hierárquico), estão suficientemente demonstrados pela Administração Tributária através das verificações da Inspeção Tributária vertidas no Relatório de Inspeção Tributária. XI - Não obstante, os invocados princípios do inquisitório (artigo 58º da L.G.T.) e da colaboração (artigo 59º da L.G.T.), a que a Administração Tributária está adstrita - e que, in casu, esta respeitou, tal como resulta, aliás, da análise dos procedimentos inspetivo e de reclamação e recurso hierárquico, - não pode ser imputado à Autoridade Tributária o ónus da prova dos factos constitutivos do direito à dedução que o sujeito passivo pretende ver reconhecido. XII - Na verdade, não pode confundir-se o dever de instruir e o de colaboração, no procedimento tributário, por via dos referidos princípios do inquisitório e da colaboração, com o ónus probatório, próprio do sujeito passivo, extensível ao processo judicial tributário (impugnação judicial, no caso). XIII - Quanto à (concreta) questão do “direito à dedução” – “desaparecimento de facturas em incêndio”, refere o sumário do Acórdão do TCA Norte de 22-06-2006, Processo nº00760/04, expressamente o seguinte: “Não tendo a Administração Tributária considerado a dedução do IVA por o contribuinte não ter apresentado as facturas que conferiam tal direito, cabe a este o ónus de apresentação das facturas ou documentos de substituição das mesmas no caso de extravio involuntário daqueles, não estando a Administração Tributária obrigada a verificar junto dos emitentes das facturas a sua emissão.”. XIV - O artigo 50º do CPPT, invocado pela impugnante (e na douta sentença aqui posta em crise), no sentido de que a Administração Tributária, na instrução do procedimento de reclamação/recurso hierárquico, no caso, deveria “utilizar todos os meios de prova legalmente previstos”, também não colide com o ónus probatório que, na situação em apreço, cabe ao sujeito passivo, aqui impugnante, como vimos. XV - Quanto ao princípio da investigação no processo judicial tributário, consagrado no artigo 99º da L.G.T. e nos artigos 13º e 114º do C.P.P.T., diremos que o poder/dever de investigação do juiz se assemelha ao processo civil, na medida em que as diligências instrutórias estão balizadas pelos factos alegados pelas partes ou que oficiosamente seja lícito ao juiz conhecer (cf. artigos. 264º, nº 1 e 265º, nº 3 do C.P.C. e artigo 99º, nº1 da L.G.T.), o que não ocorre na situação aqui em apreciação. XVI - Entendeu a M. ma Juiz do Tribunal “a quo” na sentença aqui em análise, pura e simplesmente, que os mencionados princípios da descoberta da verdade material, do inquisitório e da colaboração, prevalecem inelutavelmente (e sobrepõem-se) sobre o ónus da prova dos factos (direito à dedução do IVA suportado) que cabe à impugnante. XVII - Ora, tal como lapidarmente vem referido no acórdão do TCA Norte de 27.10.2016, proferido no âmbito do processo nº 00957/09.6BEVIS, disponível em www.dgsi.pt, “O dever de a administração tributária descobrir, por si própria, a verdade factual no âmbito do processo tributário, não se sobrepõe ao ónus da prova dos factos que cabem aos contribuintes, (…)”. XVIII - No mesmo sentido, veja-se, ainda, a Decisão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT