Acórdão nº 0411/23.3BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução29 de Novembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 411/23.3BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada, inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 12 de Setembro de 2023 – que, negando provimento ao recurso por ela deduzido, manteve a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a reclamação, deduzida ao abrigo do disposto no art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) contra a decisão por que a Directora de Finanças adjunta da Direcção de Finanças do Porto indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado pela sociedade enquanto executada –, dele interpôs recurso excepcional de revista, ao abrigo do disposto no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Com o requerimento de interposição do recurso apresentou as respectivas alegações, com conclusões do seguinte teor: «1- A presente Revista deve ser admitida por estarem verificados os respectivos pressupostos (artigo 285.º, do CPPT), porquanto a questão controvertida se reveste de importância fundamental atenta a sua relevância jurídica e social, sendo, ainda, a admissão do recurso essencial para uma melhor aplicação do direito; 2- A questão que está em causa é saber se a prova indiciária de actuação dolosa na insuficiência do património da executada exigida pelo artigo 52.º, n.º 4 da LGT, se satisfaz com a remissão para os factos e elementos alegadamente apurados em sede de inspecção tributária, quando os mesmos foram contestados, com fundamento na sua ilegalidade, em sede de reclamação graciosa e, tendo sido comunicados pela Autoridade Tributária e Aduaneira ao Ministério Público para efeitos de instauração de processo de inquérito, o mesmo veio a ser arquivado, no mais, por inexistência de prova; 3- No caso concreto, a AT fundamenta o indeferimento da dispensa de prestação de garantia por entender que, com base nos factos e elementos apurados em sede de inspecção e na circunstância de os mesmos terem sido comunicados ao Ministério Publico para averiguação da prática de crime de fraude fiscal, recolheu indícios de que a insuficiência de bens para prestar garantia se deveu a actuação dolosa da Recorrente; 4- A respeito desta temática, os Tribunais Centrais Administrativos têm vindo a pronunciar-se no sentido de que a AT não cumpre o ónus de prova de demonstrar que existem fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a actuação dolosa do interessado, se suporta a sua decisão apenas nos factos e elementos alegadamente apurados em sede de inspecção tributária, salientando que os factos e elementos constantes do procedimento inspectivo, não revelam, ainda que indiciariamente, a intenção ou o propósito doloso de se desfazer de património, diminuir a garantia e frustrar a cobrança de créditos fiscais; 5- Na situação sub judice não foi este o entendimento seguido, antes tendo sido considerado que a prova indiciária de actuação dolosa na insuficiência do património da executada, exigida pelo artigo 52.º, n.º 4 da LGT, se satisfaz plenamente com a remissão para os factos e elementos alegadamente apurados em sede de inspecção tributária, nenhuma relevância tendo sido dada ao facto de ter sido deduzida reclamação graciosa em que são contestados, ponto por ponto, os factos e as conclusões da inspecção tributária, e desconsiderando também as razões que presidiram ao despacho de arquivamento do processo de inquérito que foi instaurado, precisamente, por a AT considerar haver indícios de uma actuação dolosa por parte da Recorrente e dos seus representantes; 6- Esta interpretação não acolhe o sentido da norma em questão, a sua ratio, uma vez que esta prova, como vem sendo sublinhado pela jurisprudência, tem que ser adequada à circunstância de não se justificar a isenção de prestação de garantia quando o executado tenha previamente sonegado ou dissipado bens com o intuito de diminuir as garantias dos credores, colocando-se, com essa intenção, em situação de manifesta insuficiência económica para a prestação de garantia; 7- De acordo com a jurisprudência, “O elemento teleológico do artigo 52.º, n.º 4 da LGT mostra que o enfoque se dá na intencionalidade da “insuficiência de bens” para pagamento da dívida, e não apenas e só numa e qualquer situação irregular detectada pela AT na contabilidade da impetrante. É no hiato de tempo entre a detecção da situação irregular na contabilidade e o momento da cobrança da dívida, que haverá que determinar a intencionalidade da actuação da aqui reclamante/executada”; 8- A não ser assim, estaria “encontrada uma forma da AT se desembaraçar do seu ónus da prova indiciária, pois bastaria a detecção de qualquer situação irregular em sede de inspecção tributária para, automaticamente, ficar provado o dolo do executado/interessado na dissipação de bens. Passaríamos de um ónus que sobre ela recai para uma verdadeira presunção”, como se salienta no Acórdão do TCANorte de 30.09.2021, proferido no Processo n.º 0565/21.3BEPRT; 9- Estamos, assim, perante uma questão que vai muito para além da definição concreta da lide em causa, justificando-se a revista porque a questão sub judice se reveste de relevo social fundamental, porquanto a melhor interpretação da parte final do n.º 4 do artigo 52.º da LGT pode ser vista como um “caso-tipo” susceptível de replicação e de manifesto interesse para a comunidade no seu todo; 10- Por outro lado, atendendo aos critérios que devem ser observados na interpretação da lei, as teses defendidas pelas instâncias reclamam a prolação de uma decisão por parte desse Colendo Tribunal, que seja a mais conforme ao direito aplicável, para evitar uma contradição de valoração insanável no âmbito da aplicação do regime da dispensa de prestação de garantia, da relevância dos factos apurados em sede de inspecção tributária para efeitos da repartição da carga probatória ínsita ao artigo 52.º, n.º 4 da LGT e da mens legis que lhe está subjacente, contrária à unidade do sistema jurídico; 11- Por esta razão, deverá ser admitido o presente recurso de revista dada a necessidade de o aresto daqui resultante orientar os Tribunais sobre esta matéria, definindo o sentido que deve presidir à respectiva jurisprudência, em questão que se considera de relevância; 12- Ademais, e considerando o estabelecido no n.º 4 do artigo 285.º do CPPT que determina que “O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de...

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