Acórdão nº 1184/21.0T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelLUÍS CRAVO
Data da Resolução21 de Novembro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelações em processo comum e especial (2013) * Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO AA, NIF ...06, e marido, BB, NIF ...14, residentes na Avenida ..., ..., ...., ..., ..., instauraram ação declarativa comum contra CC, NIF ...53, e esposa, DD, NIF ...12, residentes na Estrada Nacional n.º...33, ..., ..., ..., ..., pedindo: que a Autora seja declarada proprietária o prédio urbano inscrito na matriz predial ...96 da Freguesia ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o artigo ...98º da mesma Freguesia, composto de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, com um pátio; reconhecer que a parte do rés do chão do prédio da Autora é delimitada, no mesmo espaço inferior, ao do primeiro andar do mesmo prédio; condenar o Réu a edificar uma parede divisória do rés do chão, no local da divisão dos dois prédios; condenar o Réu a retirar, da fachada do prédio da Autora, as caixas dos contadores da água e da eletricidade que aí colocou indevidamente; condenar o Réu a retirar os objetos que mantém em frente da fachada do prédio da Autora; condenar o Réu a retirar as tubagens para a canalização de água e as instalações de eletricidade que fez passar pela cave do prédio da Autora; condenar o Réu a não utilizar o pátio do prédio da Autora, dali retirando todos os objetos e bens que aí se encontrem; condenar o Réu a praticar todos os atos acima referidos no prazo de trinta dias e, em caso de incumprimento, na sanção pecuniária compulsória de €50,00 diários por cada dia de atraso; condenar os Réus a indemnizar os Autores por todos os danos decorrentes da sua actuação, sejam eles de natureza patrimonial ou não patrimonial e cuja liquidação relegam para eventual execução de sentença; condenar os Réus em custas e demais encargos legais.

Alegam para o efeito, em suma, que Autora mulher e Réu marido são irmãos, tendo o pai de ambos falecido a 03.03.2003 e a mãe a 02.06.2010. Apesar de fazer parte das heranças um estabelecimento comercial de mini-mercado e mercearia, tal bem nunca foi relacionado pelo cabeça-de-casal, aqui Réu marido, funcionando tal estabelecimento nos prédios urbanos inscritos na matriz predial urbana sob os artigos ...95 e ...96, da Freguesia .... Por escritura pública de patilha dos bens imóveis integrantes do acervo hereditário, à Autora mulher foi adjudicado o prédio urbano inscrito na matriz predial ...96, enquanto que ao Réu marido foi adjudicado o prédio urbano inscrito na matriz predial ...95. Os dois prédios são contíguos e, em vida dos pais de ambos, o estabelecimento comercial ocupava e continua a ocupar, uma parte do rés do chão do prédio inscrito ...96, ficando o Réu obrigado a devolver tal parte do prédio, edificando uma parede na linha divisória dos prédios. No entanto, o Réu tem protelado tal obrigação, inicialmente a pretexto de escoar alguns bens que lhe restavam nessa parte do estabelecimento (eletrodomésticos) e mais recentemente, negando tal obrigação.

Defendem ainda os Autores que, desde 2018 para cá, o Réu tem feito diversas intervenções no prédio da Autora, em clara violação do seu direito de propriedade: colocação de um contador de água na fachada, fazendo passar, pelo mesmo prédio, a tubagem de abastecimento de água para a sua casa (artigo ...95); passagem de tubagem de instalação elétrica, nos mesmos moldes; colocação da caixa vertical da EDP na fachada principal do prédio ...96; ocupação do pátio com estendais de roupa e outros objetos do Réu.

Por fim, alegam os Autor que as supra descritas condutas dos Réus têm-lhe causado danos, pelo que deverão ser condenados a indemniza-los.

* Citados para contestar, vieram os Réus impugnar parte do alegado pelos Autores, defendendo que as moradias, aqui em causa, serviram, em tempos, de habitação e para exploração da atividade comercial dos pais de Autora e Réu, tendo sido os mesmos a edificar a parede divisória no rés-do-chão dos imóveis, em 1990. Em 1993, os pais doaram ainda ao Réu o estabelecimento comercial, dando uma compensação monetária à filha, pelo que a escritura pública celebrada em 2016, mais não foi que uma formalização da partilha que já havia sido efectivada em vida dos pais.

O referido espaço, integrado no estabelecimento comercial, assim como este (estabelecimento comercial) têm sido utilizados pelos Réus nos últimos 25 anos, de forma ostensiva, sem oposição de ninguém, de forma contínua e na convicção de não lesarem quaisquer interesses ou direitos de outrem, na convicção de estarem a exercer sobre os mesmos, um direito próprio e absoluto.

O mesmo defendem quanto à utilização da cave, na parte existente sob o piso do rés-do-chão, quer a parte coberta virada ao exterior, com colocação de sistema de aquecimento e lavandaria, mobílias, arrumos, tomada de refeições e exercício de atividades de lazer e secagem de roupa.

Com base nesses mesmos factos, deduzem reconvenção, pedindo que sejam declarados legítimos proprietários e possuidores do imóvel de natureza urbana inscrito na matriz sob o artigo ...95º, composto por cave, com logradouro com anexo de 150m2 de área, rés-do-chão, que compreende todo o espaço utilizado pelo estabelecimento comercial, e demais divisões que lhe estão anexas no mesmo piso, até à parede colocada a norte pelos pais da Autora mulher e Réu marido, bem como de todo o 1º andar do mesmo imóvel; declarar-se que os Réus são proprietários e legítimos possuidores do estabelecimento comercial destinado a minimercado, mercearia e venda de eletrodomésticos, instalado no rés-do-chão do seu imóvel, compreendidas as suas mercadorias, mobiliário, clientela e aviamento, entre os demais elementos corpóreos e incorpóreos que integram a respectiva universalidade.

* Na réplica, os Autores/Reconvindos, impugnaram a factualidade alegada pelos Réus/Reconvintes, mantendo a posição assumida na petição inicial e pugnando pela condenação dos Réus como litigantes de má fé por pretenderem alcançar um benefício que sabem não ter direito, isto em indemnização adequada, a fixar pelo tribunal.

Marcada audiência prévia, foi tentada a conciliação das partes, dado o contraditório quanto ao pedido de condenação como litigantes de má fé, pedidos esclarecimentos às partes e admitida a reconvenção deduzida.

Em esclarecimentos solicitados aos Autores, foram os mesmos advertidos na eventual condenação por litigância de má fé, quanto ao artigo 12º da contestação que não foi impugnado na réplica, caso faltassem à verdade quanto àquela matéria (entrega de 3.000.000$00 à Autora, para compensação da entrega do estabelecimento comercial ao Réu). Os Autores responderam por articulado de fls. 58 dos autos.

Fixou-se o valor da causa em €15.672,05 (quinze mil seiscentos e setenta e dois euros e cinco cêntimos), proferiu-se despacho saneador, delimitaram-se o objecto do litígio e os temas da prova e admitiram-se os requerimentos probatórios.

Marcada data para a realização da audiência de discussão e julgamento, a mesma decorreu com respeito pelo legal formalismo, com observância do formalismo legal, conforme se alcança das respetivas atas.

Na sentença, considerou-se, em suma, que face ao quadro fáctico apurado, se impunha concluir pela demonstração do direito de propriedade da A. sobre o prédio ...96º, o que incluía a totalidade do respetivo rés-do-chão, já que os RR. não lograram demonstrar que detinham qualquer direito sobre a área ocupada pelo estabelecimento comercial detido pelos mesmos (cuja propriedade também era de reconhecer) e que ocupava o rés-do-chão daquele prédio ...96º, isto é, que o direito de propriedade dos RR sobre o imóvel ...95... não integrava a área até à parede colocada a norte (e o logradouro correspondente), assim improcedendo a reconvenção, ademais se extraindo as consequências de tal em termos de desocupação/entrega pelos RR. aos AA., e bem assim de indemnização por aqueles a estes, sem embargo de ser de concluir pela litigância de má fé dos AA., o que tudo se traduziu no seguinte concreto “dispositivo”: «VI. DISPOSITIVO Por todo o exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e o pedido reconvencional parcialmente procedente e, em consequência:

  1. Declara-se que a Autora é proprietária do prédio urbano inscrito na matriz predial ...96 da Freguesia ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o artigo ...98º da mesma Freguesia, composto de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, com um pátio; b) Reconhece-se que a parte do rés-do-chão do prédio da Autora é delimitada, no mesmo espaço inferior, ao do primeiro andar do mesmo prédio; c) Condena-se o Réu a edificar uma parede divisória do rés-do-chão, no local da divisão dos dois prédios; d) Condena-se o Réu a retirar, da fachada do prédio da Autora, a caixa do contador da água; e) Condena-se o Réu a retirar os objectos que mantém em frente da fachada do prédio da Autora; f) Condena-se o Réu a retirar a tubagem para a canalização da água que fez passar pela cave do prédio da Autora; g) Condena-se o Réu a não utilizar o pátio do prédio da Autora, dali retirando todos os objectos e bens que aí se encontrem; h) Condena-se o Réu a praticar todos os actos acima referidos, no prazo de trinta dias; i) Condena-se o Réu a proceder à reparação dos danos provocados na fachada e placa do seu prédio, decorrentes da remoção do contador e da canalização de água; j) Absolvem-se os Réus do demais peticionado pelos Autores; k) Declara-se que os Réus/Reconvintes são os legítimos proprietários e possuidores do imóvel de natureza urbana inserido na matriz sob o artigo ...95º da matriz urbana da Freguesia ..., composto por cave, rés-do-chão e primeiro andar; l) Declara-se que os Réus/Reconvintes são os proprietários e legítimos possuidores do estabelecimento comercial destinado a minimercado, mercearia e venda de electrodomésticos, instalado no rés-do-chão do seu imóvel, compreendidas as suas mercadorias, mobiliário, clientela e aviamento, entre os demais elementos corpóreos e incorpóreos que integram a respectiva...

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