Acórdão nº 00061/23.4BEAVR-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Novembro de 2023
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
Data da Resolução | 17 de Novembro de 2023 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO «AA», Requerente no presente processo cautelar, veio deduzir INCIDENTE DE DECLARAÇÃO DE INEFICÁCIA DE ATOS DE EXECUÇÃO INDEVIDA, requerendo que o Tribunal julgue improcedentes as razões aduzidas na resolução fundamentada apresentada pelo CENTRO HOSPITALAR DE ..., EPE, e declare ineficazes os atos de execução identificados no artigo 16.º do seu requerimento e outros que venham, entretanto, a ser praticados.
Por decisão proferida pelo TAF de Aveiro foi julgado procedente o incidente, com a consequente ineficácia dos atos de execução praticados pela Entidade Requerida identificados nos pontos 4 a 9 do probatório.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Requerido formulou as seguintes conclusões: I. Mal andou o Tribunal recorrido ao julgar procedente o incidente de declaração de ineficácia de actos e declarar ineficazes os actos de execução identificados nos pontos 4 a 9 do probatório da decisão a quo.
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Ao contrário do que se afirma na sentença, esses actos, que a decisão em crise julgou ineficazes, não se encontram abrangidos pela providência cautelar. E, saliente-se, também o não se encontram pela acção de impugnação.
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Tratam-se de actos de execução de uma deliberação distinta daquela que é impugnada e de que é requerida a suspensão de eficácia na presente providência; concretamente da deliberação de 22-12-2022 que determinou a abertura do novo concurso, e que constitui um novo e distinto acto administrativo, o qual teria de ser impugnado autonomamente.
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Apesar de a sentença referir que a requerente pretendeu impedir, através da presente providência cautelar, este novo concurso, o facto – inequívoco – é que isso não resulta do seu petitório inicial.
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Em 06.02.2023, na sequência da deliberação do Conselho de Administração do Recorrente de 22.12.2022 e antes de ser citado nestes autos de providência cautelar, foi publicado o Aviso n.º 2570-A/2023 no Diário da República, 2.ª Série, n.º 26, de 6 de fevereiro.
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No seguimento da publicação do Aviso n.º 2570-A/2023, consciente de que havia nova deliberação e de que se encontrava já aberto um outro procedimento concursal, a Recorrida submeteu o requerimento de fls. 429 dos autos, no qual atribui nova interpretação ao pedido formulado em B. no requerimento cautelar, concluindo que o mesmo “[d]eve ser entendido no âmbito do pedido apresentado a impossibilidade de a requerida dar seguimento ao concurso publicado mediante anúncio 2570/-A/2023 de 6 de fevereiro”.
VII.
A proibição de executar o acto administrativo, estabelecida no n.º 1 do artigo 128 do CPTA, apenas opera automaticamente, por efeito da citação, em relação ao acto de que é peticionada a suspensão no requerimento cautelar. E esse consiste in casu exclusiva e tão-somente, na deliberação do Conselho de Administração do Recorrente de 02.12.2022.
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Acresce que o requerimento de fls. 429 dos autos, no qual o Tribunal a quo se ancora na decisão em crise, não mereceu o acordo do Requerido que, em 9.º da Oposição, manifestou que devia ser indeferido; como tal, aguarda ainda despacho sobre a sua admissão e não podia ter sido considerado como fundamento para a decisão do incidente.
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Tendo o Recorrente recebido a citação nestes autos de procedimento cautelar, e vindo a mesma instruída, além do mais, com o requerimento de fls. 429, entendeu, por razões de cautela e segurança, emitir resolução fundamentada, nos termos do n.º 1 do artigo 128.º do CPTA, nela reconhecendo que o diferimento da execução do procedimento concursal aberto pelo Aviso n.º 2570-A/2023 no Diário da República, 2.ª Série, n.º 26, de 6 de fevereiro, seria gravemente prejudicial para o interesse público e determinando o prosseguimento da sua execução.
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Ciente de que apenas a deliberação de 02.12.2022 consistia nestes autos acto suspendendo e sempre acautelado pela resolução fundamentada, o Recorrente, na estrita prossecução do interesse público, prosseguiu com a execução do novel acto administrativo de 22.12.2022 e tramitou o procedimento concursal publicitado através do Aviso n.º 2570-A/2023, do Diário da República, 2.ª Série, n.º 2, de 6.02.2023.
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Os actos praticados pelo Recorrente, como sejam os identificados nos pontos 4 a 9 do probatório da decisão a quo, não o foram ao abrigo da resolução fundamentada, apesar de por ela salvaguardado; esses actos de execução são exclusivamente referentes à deliberação de 22.12.2022, e não ao acto suspendendo de 02.12.2022.
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Estes autos de providência cautelar surgem como preliminar (e na dependência) de acção administrativa destinada a impugnação de AA e condenação ao ato legalmente devido.
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A totalidade dos pedidos formulados na acção administrativa, instaurada em 07.03.2023, quando a Recorrida conhecia há muito a existência da deliberação de 22.12.2022 e a abertura de outro procedimento, são exclusivamente relativos à deliberação do CA do Recorrente de 02.12.2022, que anulou o procedimento concursal, publicada pelo Aviso (extrato) n.º 23287-A/2022 no Diário da República, 2.ª Série, de 7 de dezembro de 2022.
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É inexorável que é essa deliberação de 02.12.2022, e apenas essa, que constitui o acto o suspendendo nestes autos e acto impugnado na acção administrativa.
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A sentença recorrida não atentou em dois princípios: o princípio da auto-responsabilização das partes, de onde decorre que não tendo impugnado nem na PI da providência, nem na PI dos autos principais a deliberação de abertura do novo concurso, não pode decidir-se como se a parte o tivesse feito; e o princípio tempus regis actum, de onde decorre que a sentença não pode se alicerçar sobre algo que não existe ainda nos autos e, aliás, se desconhece se vai ocorrer; apenas podendo ter em consideração «quod est in acta».
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Soçobra, deste modo, a afirmação em que se ancorou o Tribunal recorrido, a fls. 15 da sentença, para considerar verificado o primeiro pressuposto do incidente em análise. Não se verificando o mesmo, deveria ter sido logo indeferido o incidente.
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Por outro lado, ainda, e quanto à verificação do pressuposto do preenchimento do grave prejuízo para o interesse público invocado da resolução fundamentada, entendemos ser merecedora de censura a sentença recorrida, que, ao invés de colocar sobre escrutínio a eventual existência de erro ou inexistência nas razões invocadas na resolução fundamentada, optou por um critério de maior exigência e pretendeu sindicar o mérito, a conveniência e a oportunidade das razões da resolução fundamentada, o que configura manifesta violação do princípio da separação e interdependência de poderes, estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º do CPTA.
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Conforme se ensina, entre outros, no douto ac. TCAS de 10-07-2014 (P. nº 11202/14), disponível in site dgsi.pt, que acompanhamos, “não sendo evidente, manifesto, que as razões invocadas na resolução fundamentada estão erradas ou inexistem, não deve o Tribunal considerá-las improcedentes.” XIX. As razões invocadas in casu existem, são sérias e relevantes, não tendo sido negadas, sequer, pela Requerente, que apenas as tentou desvalorizar.
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Estamos perante um centro hospitalar do SNS, Sistema Nacional de Saúde que se encontra sujeito a uma enorme pressão, e perante uma especialidade – a anestesiologia – que, como é notório, é indispensável no apoio a outras especialidades, ao Serviço de Urgência e a todas as cirurgias.
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O preenchimento da vaga de assistente Graduado Sénior no serviço é muito importante em termos de formação e desenvolvimento profissional dos outros médicos da especialidade, bem como para prosseguir com projectos mobilizadores de desenvolvimento técnico-científico, institucional, de qualidade ou de inovação (único meio de ser feito progresso em termos de científicos no meio hospitalar).
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A sentença incorreu em erro de julgamento ao apreciar a situação como se se tratasse de um normalíssimo concurso para contratação de um médico para o Hospital, para o Serviço de Anestesiologia, quando o que se trata é de capacitar um médico que já é do serviço, com as funções específicas de um assistente graduado sénior, não verificando que o que foi realçado como muito importante, não é uma mera «invocação genérica e conclusiva», mas antes a concretização das funções mais relevantes do assistente graduado sénior para o Serviço, de entre as que integram o conteúdo funcional da categoria previsto no artigo 13º do DL nº 176/2009 de 4 de agosto.
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A sobrevivência do nosso SNS não se pode compadecer com quaisquer atrasos e adiamentos de tudo quanto possa significar uma melhoria do mesmo.
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Face às razões alegadas na resolução fundamentada, sempre o Tribunal a quo deveria, além do mais, ter concluído estar suficientemente demonstrado pelo Recorrido que o diferimento da execução é gravemente prejudicial para o interesse público.
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É manifesto que muito mal andou o Tribunal a quo ao julgar procedente o incidente de ineficácia, posto que, por um lado, os actos identificados nos pontos 4 a 9 do probatório da sentença não respeitam à execução do acto suspendendo – a deliberação do CA de 02.12.2022 – e não se alicerçam na resolução fundamentada, e, por outro lado, ainda que o fossem, sempre o Tribunal recorrido, atenta a existência, seriedade e relevância das razões invocadas na resolução fundamentada, deveria ter julgado improcedente o incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida.
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A sentença recorrida violou, entre outros, o n.º 1 do artigo 3.º e os n.º s 1 e 3 do artigo 128.º, todos do CPTA.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso e revogada a sentença que julgou procedente o incidente, com as legais consequências.
A Requerente juntou contra-alegações e concluiu: 1- A providência cautelar, intentada a 02/02/2023, surge como preliminar de ação administrativa destinada a impugnação de AA e condenação ao ato legalmente devido no âmbito da qual é requerida declaração da legalidade da deliberação da aqui...
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