Acórdão nº 11826/17.6T8SNT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Novembro de 2023
Magistrado Responsável | MARIA JOÃO VAZ TOMÉ |
Data da Resolução | 16 de Novembro de 2023 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, I - Relatório 1.
AA e Mulher, BB, a 13 de junho de 2017, intentaram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra Banco BPI, S.A.
, pedindo: - que o negócio celebrado entre o 1.º Autor e a Ré seja anulado por erro sobre a base do negócio e a Ré seja condenada na restituição do montante de € 140.000,00, acrescido de juros vencidos, no valor de € 7.933,00, e ainda vincendos; - se assim não se entender, deve a Ré ser condenada a pagar aos Autores uma indemnização no valor de € 140.000,00, acrescido de juros vencidos, no montante de € 7.933,00 e ainda vincendos, desde a data da propositura da presente acção até efetivo e integral pagamento, com base no princípio geral que preside à obrigação de indemnizar que é o da colocação do lesado na situação em que se encontraria se não se tivesse verificado o ato lesivo do incumprimento dos deveres a que a Ré estava obrigada, conforme os arts. 304.°, 304°-A, 311.°, 312.°, 312°-B, 312-C a 312°-G, 314.° e ss., do CVM; - na hipótese de assim também não se entender, ser o negócio celebrado entre o 1.º Autor e a Ré resolvido por alteração superveniente das circunstâncias e condenada a Ré na devolução da quantia de € 140.000,00, acrescida de juros vencidos, no valor de € 7.933,00 e ainda vincendos, desde a data da instauração da presente ação até efetivo e integral pagamento.
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Sustentam, para o efeito, que, a 11 de julho de 2012, o Autor marido assinou, numa agência do Ré localizada em ..., uma ordem de subscrição de obrigações no montante de € 140.000,00 que tinham como emitente a Portugal Telecom, SGPS, S.A., as quais foram registadas ou depositadas numa conta de registo e depósito de instrumentos financeiros associada a uma conta de depósitos à ordem sedeada na Ré. O 1º Autor não tinha - nem tem - experiência no mercado de valores mobiliários, tendo sido categorizado pela Ré como investidor não qualificado. Na sequência de uma troca de impressões sobre oportunidades de negócio, o gestor de conta aconselhou o Autor a subscrever aquelas obrigações, dizendo-lhe que não havia qualquer risco de não receber o capital investido no termo do prazo, não o tendo informado de que em caso de perda não existia qualquer fundo de garantia que o ressarcisse. O gestor informou o Autor de que a data de vencimento seria a 26 de julho de 2017 e que o Autor receberia o capital investido acrescido de juros vencidos, depois de subtraída a comissão bancária. Apenas em meados de julho o 1º Autor foi informado de que o pagamento do capital esperado não teria lugar e de que o produto financeiro não se revestia das características de que tinha sido informado.
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Referem também a violação do dever de informação de alteração significativa na informação prestada ao abrigo dos arts. 312°-C e 312°-G do CVM, uma vez que, em outubro de 2013, a PT, a OI, S.A., e outras entidades celebraram um memorando de entendimento, nos termos do qual, convencionaram, inter alia, que a PT seria extinta por incorporação na CorpCo. Assim, a PT anunciou ao mercado que a 18 de março, em reunião da assembleia de titulares das notes, obteve o devido consentimento para substituir o emitente das mesmas, deixando de ser a PT ou Portugal Telecom, SGPS, S.A., para passar a ser a PT Portugal, SGPS. S.A., uma mera subsidiária do Grupo OI. O Autor nunca foi informado desta relevante alteração no investimento que tinha efetuado, como não foi informado de que em virtude de uma permuta e opção de compra acordada no âmbito do referido memorando, a PT Portugal viu diminuída a sua participação de cerca de 38% para 25,6% no capital social da OI, factos que originavam uma alteração significativa no risco do produto, pelo que a Ré deve responder pelos prejuízos decorrentes desta ocultação, indemnizando os Autores, devolvendo o valor investido acrescido de juros.
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Dizem ainda que não foram informados da possibilidade de reembolso antecipado na sequência do acordo celebrado com vista à venda da PT Portugal à Altice, depois do qual a PT Portugal informou o mercado a 2 de junho de 2015 de que a emitente das obrigações tinha sido substituído pela Portugal Telecom International Finance, B.V. (PTIF), que anunciou ao mercado a possibilidade de reembolso das notes desde que o titular, até às 12 h do dia 30 de julho, desse instruções nesse sentido à entidade que tivesse a guarda desses valores. Apesar de ter conhecimento desta alteração da emitente e da antecipação da maturidade do produto financeiro em causa, a Ré não informou o Autor dessas alterações, nem da degradação económico-financeira da OI, que era a garante das obrigações, devendo, por isso, responder pelos prejuízos decorrentes dessa ocultação. Alega, finalmente, que se deve concluir pela alteração superveniente das circunstâncias do negócio, podendo aplicar-se o regime disposto no art. 437.º, n.º 1, do CC, verificando-se os requisitos para a resolução do contrato pelo Autor, devendo a Ré restituir o valor investido acrescido de juros.
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A Ré Banco BPI, S.A.
, apresentou contestação, começando por invocar as exceções de ilegitimidade passiva, por não ser parte no negócio cuja anulação se pretende, a caducidade do direito de arguir a anulabilidade, já que a ação foi proposta a 13 de junho de 2017, tendo o Autor recebido juros semestrais desde 2012 até 2016, e a prescrição do direito indemnizatório, nos termos do art. 324.º, n.º 2, do CVM, por terem decorrido mais de dois anos entre a data de subscrição das obrigações e o início da perceção dos juros de cupão, de um lado e, de outro, a propositura da presente acção.
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Em sede de impugnação, a Ré Banco BPI, S.A.
, refere que foi explicado ao Autor o risco inerente às obrigações e que foi este que pretendeu um produto de rendibilidade superior àquela dos produtos de DP's, tendo-lhe sido prestadas todas as informações e entregue a documentação. Em 2014/2015, perante as notícias sobre o negócio PT/OI, o Autor, tal como os demais clientes detentores das obrigações, foi contactado, e foi-lhe transmitido que o negócio em causa havia suscitado apreensão, não intencionado o Autor alienar esses valores, apesar de a maioria dos clientes ter optado pela venda das obrigações PT. Menciona ainda que o perfil do Autor enquanto investidor não é o alegado, pois sempre conheceu os riscos da sua carteira de títulos e aplicações financeiras, e era o mesmo que solicitava as aquisições de produtos, limitando-se a Ré a executar as suas ordens, sem prestar qualquer serviço de consultoria para investimento.
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Entende que cumpriu todos os deveres de informação a que estava vinculada enquanto intermediário financeiro e que facultou toda a informação de que dispunha. Relativamente aos eventos supervenientes referentes às obrigações, alega que informou o Autor de que a assembleia de noteholders tinha sido convocada para 4 de maio de 2015 e que, nos termos da respetiva convocatória, era proposta uma opção de reembolso antecipado das notes, não tendo o Autor exercido a opção de reembolso antecipado porque assim o entendeu e decidiu.
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Nega existir erro sobre o objeto do negócio, uma vez que o Autor adquiriu as obrigações PT de forma livre e esclarecida, sem qualquer violação dos deveres previstos no RGICSF, ou dos deveres de adequação dos conhecimentos do Autor, nem dos deveres de informação previstos no CVM, não podendo a Ré ser responsabilizada por quaisquer prejuízos. Entende igualmente que o Autor não pode lançar mão do instituto da alteração superveniente das circunstâncias do negócio, uma vez que todos os fatores que afetaram a fase inicial da subscrição não são imputáveis à Ré, inexistindo causa de resolução.
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Por fim, invoca o abuso do direito por parte do Autor, porquanto a alegação de vícios na aquisição das Obrigações PT e de violação dos deveres de informação se encontra em contradição com a sua anterior conduta.
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Conclui pela procedência da exceção dilatória e das exceções perentórias, pugnando, em qualquer caso, pela improcedência da ação, devendo ser absolvido dos pedidos, e caso assim não se entenda, devendo ser julgada procedente a exceção do abuso do direito.
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Notificados para esse efeito, os Autores AA e Mulher, BB, responderam às exceções, sustentando a sua improcedência com as razões que melhor se colhem de fls. 154 e ss..
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Após a realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente, condenando a Ré Banco BPI, S.A.
, a pagar ao Autor AA a quantia de € 140.000,00, acrescida do juro que lhe seria pago caso optasse pelo reembolso antecipado a 2015 (103,975% do montante do capital da note), com dedução dos juros semestrais recebidos pelo Autor a 27 de julho de 2015 e a 26 de janeiro de 2016, acrescendo juros moratórios desde a citação.
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Não conformada, a Ré Banco BPI, S.A.
, interpôs recurso de apelação.
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Os Autores AA e Mulher, BB, contra-alegaram, preconizando a improcedência do recurso e a manutenção da sentença.
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Conforme o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa: “Assim, confirma-se a sentença recorrida, devendo o Banco Réu a pagar ao Autor o montante do capital (140.000,00) acrescido dos juros (103,975% relativamente ao valor da Note), e deduzindo-se os juros das obrigações que se venceriam depois da data do reembolso (30/06/2015). Custas pelo Banco recorrente”.
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Uma vez mais não conformada, a Ré Banco BPI, S.A.
, interpôs recurso de revista, formulando as seguintes Conclusões: “a)- O presente recurso vem interposto do douto acórdão que, no essencial, confirmou “a sentença recorrida” condenando “o Banco Réu a pagar ao Autor o montante do capital (€ 140.000,00), acrescido dos juros (103,975% relativamente ao valor da Note) e deduzindo-se os juros das obrigações que se venceriam depois da data do reembolso (30/06/2015).” fundando-se na violação de deveres de informação pelo Banco R, como intermediário financeiro, não na fase da aquisição/subscrição das Obrigações PT (fase em que considera aliás ter o Banco observado tais deveres), mas...
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