Acórdão nº 4286/20.6T8ALM-B.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelPEDRO DE LIMA GONÇALVES
Data da Resolução16 de Novembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acórdão Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório 1. Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa, que Caixa Geral de Depósitos, S.A.

instaurou contra J..., Lda., veio a Executada deduzir embargos, pugnando para que a execução seja julgada extinta por inexigibilidade da obrigação de pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese e para o que ora releva, que: - a Exequente invoca que a Executada não pagou os montantes previstos no Plano Especial de Revitalização – PER, mas não concretiza no seu requerimento a que prestações desse empréstimo se refere, em que data ocorreram, ou seja, o início da mora, bem como, como foi calculado o valor da dívida exequenda; - limitando-se a alegar, genericamente, que a Executada terá incumprido com o plano estabelecido no âmbito do PER, e a composição do valor total em dívida, não transformou a mora em incumprimento definitivo; - a carta de 12 de dezembro de 2019 não integra os elementos necessários para cumprir com função de interpelação para o cumprimento, com a cominação expressa, que o mesmo a persistir, se transforma em mora definitiva, e desde logo porque não contém toda a informação exigível sobre os montantes globalmente indicados como alegadamente em mora; - impunha-se à Exequente que indicasse à Executada como apurou o montante de juros, e a que se refere a quantia das comissões, bem como o dia em que se iniciava o período prestacional e o da cobrança das prestações.

Conclui, assim, pela incerteza, iliquidez e a inexigibilidade da alegada dívida cujo pagamento coercivo a Exequente pretende obter por via dos presentes autos executivos.

  1. A Embargada/Exequente apresentou articulado de contestação, pugnando pela improcedência da oposição à execução.

  2. Tramitados os autos, foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a oposição à execução mediante embargos de executado e, em consequência, ordenou o normal prosseguimento da execução.

  3. Inconformada com esta decisão, a Executada interpôs recurso de apelação.

  4. O Tribunal da Relação de Lisboa veio a julgar procedente a apelação “e revoga-se a decisão recorrida decidindo-se pela inexigibilidade da quantia exequenda e consequentemente pela procedência dos embargos”.

  5. Não se conformando, a Exequente/Embargada veio interpor recurso de revista, formulando as seguintes (transcritas) conclusões:

    1. O presente recurso vem interposto pela Recorrente do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, mediante o qual foi julgado procedente a Apelação da Executada, julgando-se verificada a inexigibilidade da dívida, e determinando-se, em consequência, a procedência dos embargos de executado.

    2. Na decisão recorrida, de segunda instância, o douto Tribunal a quo, foi alterada a decisão da matéria de facto da primeira instância, o que, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 662.º do CPC, só é permitido se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

    3. Foi alterada a redacção dos factos provados n.ºs 5, 8, 9 e 17, eliminando-se o n.º 10, dando-se como não provados os pontos 11, 12, 13, 16 e 183, e ainda aditado um novo facto, passando a matéria de facto a estabelecer o seguinte: 1 - No exercício da sua actividade creditícia, a Exequente, que é uma instituição de crédito, celebrou com a Executada um contrato de EMPRÉSTIMO sob a forma de ABERTURA de CRÉDITO, ao qual foi atribuído o n.º interno PT ...891, nos termos do qual a primeira emprestou a esta última a quantia de PTE 600.000.000$00/€2.992.787,38 (dois milhões, novecentos e noventa e dois mil, setecentos e oitenta e sete euros e trinta e oito cêntimos) nas condições constantes do instrumento notarial avulso outorgado em 29/04/1999, no Notariado Privativo da Exequente, cuja certidão se junta e cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. doc. 1).

      2 - O contrato de financiamento, acima descrito, foi posteriormente alterado por duas vezes nos termos constantes dos documentos particulares datados de 21/10/2004 e 29/12/2005 cujas cópias se juntam e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. docs. 2 e 3).

      3 - Em 2014, a Executada intentou um processo especial de revitalização, que correu termos no Juiz ... do Juízo de Comércio de ... sob o n.º 663/14.0..., no âmbito do qual foi aprovado um plano especial de revitalização, homologado por sentença proferida em 14/01/2015, transitada em julgado em 10.02.2015 (cfr. docs. 4 e 5).

      4 - Dispõe o plano especial de revitalização, relativamente à dívida objecto da presente execução, que (i) o financiamento aqui em causa seria transformado num empréstimo a quinze anos, a contar da data do trânsito em julgado da sentença de homologação, sendo os dois primeiros anos de carência de capital, com pagamento de juros mensais, e os subsequentes treze de amortização da dívida em prestações de capital e juros, calculados à taxa Euribor a três meses, acrescida de um ‘spread’ de 5,70% e, ainda, (ii) que o plano não configura qualquer novação de dívida nem afasta as garantias reais e pessoais prestadas (cfr. doc. 4 pág. 8).

      5 - Em cumprimento do determinado no supra mencionado plano, a dívida emergente do financiamento descrito no n.º 1 supra – que à data do trânsito em julgado da sentença que o homologou era de € 1.005.686,73, sendo € 632.187,63 de capital, € 359.059,75 de juros, € 74,00 de comissões e encargos e € 14.365,35 de imposto de selo sobre encargos, comissões e juros – foi consolidada na referida quantia de € 1.005.686,73, para ser liquidada no prazo máximo de 180 meses, sendo os primeiros 24 meses de carência de capital, com pagamento mensal de juros a partir de 10/03/2015, e os restantes 156 meses de amortização, em prestações mensais de capital e juros.

      6 - Além de consolidado e restruturado, nos termos referidos no n.º anterior, o financiamento PT ...891, ora em causa, foi renumerado e passou a ter o n.º PT ...991 (cfr. doc. 6).

      7- A dívida emergente do financiamento acima descrito encontra-se garantida por DUAS HIPOTECAS, conforme segue:

    4. ESPECÍFICA, sobre o PRÉDIO URBANO situado na R. ..., R. ... e R. ..., no ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o n.º ...12, freguesia do ..., registada sob a AP....00 de 1999/03/12, com o capital de € 897.836,21, encontrando-se em vigor relativamente às fracções AA, AB, AC, AD, X e Z (cfr. doc. 1 e certidão predial que se junta como doc.7). b) GENÉRICA, sobre o PRÉDIO RÚSTICO situado no ..., descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o n.º ...11, freguesia do ..., registada sob a AP....2de 2005/11/30, com o capital de € 632.187,63 (cfr. Doc. 3 e, ainda, escritura e certidão predial que se juntam como docs 8 e 9).

      8 e 9 – A Executada não pagou à exequente os montantes previstos no plano de revitalização.

      10 – Eliminado.

      11, 12 e 13 – Eliminados.

      14 - Sucede que, na carta em causa, datada de 12.12.2019, estão indicados os valores em dívida, e indicado que os mesmos correspondem às 1ª a 24ª prestações de juros, e às 25ª a 58ª prestações de capital e juros do plano.

      15 - Foi indicado expressamente o valor em dívida relativamente à operação executada nos presentes autos.

      16 - Eliminado.

      17 - A Embargada respondeu à carta da Embargante de 08.01.2020, esclarecendo-a que considerava cumprida a interpelação com a sua missiva anterior.

      18 - Eliminado.

      19 - Foi indeferido pela Infraestruturas de Portugal o pedido de autorização para a operação de loteamento, em 16.08.2018.

      20 - Nessa altura vivia-se uma crise económica.

      21 - Atenta a inexistência de perspetivas de que a Embargante liquidasse /reestruturasse as responsabilidades, e uma vez que não havia sido possível acordar na dação dos imóveis dados em garantia, e uma vez que as diligências efectuadas na área negocial haviam sido inconclusivas, foi remetida a carta à Embargante que ora se junta como doc. n.º 4 e cujo teor se dá por reproduzido para todos os efeitos.

      Novo facto - Só através da carta datada de 31-08-2018, é que a Exequente comunicou à Executada a implementação das condições de regularização das responsabilidades de crédito, no âmbito do plano homologado.

    5. Acontece que, pese embora o tribunal de Revista não possa intervir na valoração da prova feita pelo tribunal da Relação, segundo a sua livre e prudente convicção, pode aferir se o tribunal da Relação observou, quer a disciplina processual aludida nos arts. 640.º e 662.º, n.º 1, quer a análise crítica da prova nos termos ínsitos no art. 607.º, n.º 4 (aplicável ex vi do artº 663º, nº 2, todos do CPC).

    6. Devendo também considerar-se que, em caso de dúvida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, apenas devendo existir alteração caso algo de anormal se tenha verificado na livre convicção formada pelo julgador da primeira instância, ou se houver violação de regras aplicáveis.

    7. Ora, entende a Recorrente precisamente que, no caso sub judice, o douto Tribunal a quo não respeitou as imposições que regem a (re)apreciação da matéria de facto, sendo ademais nula a decisão recorrida.

    8. Concretamente no que diz respeito à alteração do ponto 5.º dos factos provados, em que apenas se retira do texto do facto provado da primeira instância, a data de 10.03.2017 (que correspondia à data do início de pagamento do capital e juros, após o período de carência de capital de 24 meses), verifica-se que a decisão é nula nos termos do disposto na al. c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, violando ainda o disposto no n.º 1 do art. 662.º do CPC, já que a prova produzida não podia impor decisão diversa sobre tal facto, e violando ainda o disposto nos n.ºs 4 e 5 do art. 607.º do CPC, aplicável ex vi art. 663.º, n.º 2 do CPC.

      Senão vejamos h) A nulidade referida verifica-se porque a redacção conferida pelo douto Tribunal a quo é contraditória com a sua fundamentação, e entre si mesma, (e, desse modo, ininteligível), na medida em que: i) na motivação para a decisão da...

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