Acórdão nº 02328/15.6BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Novembro de 2023

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução03 de Novembro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO «AA», solteiro, maior, residente na Rua ... ..., ex-1.º cabo com o NIM ..., instaurou ação administrativa especial contra o Ministério da Defesa Nacional, com sede na Avenida ... ..., o que faz na sequência do despacho proferido pelo Ex.mo Sr. Chefe do Estado-Maior do Exército de 15.07.2015 que recusou a sua qualificação como deficiente das forças armadas, e em que termina pedindo: “Nestes termos e nos demais de direito, invocando-se o douto suprimento, deve a presente acção administrativa especial ser julgada procedente por provada, anulando-se o despacho do Réu de 15 de Julho de 2015 (e rececionado pelo A. em 24 de Julho de 2015) e condenando-se o mesmo à prolação de novo despacho nos termos melhor descritos nos artigos 52.º e 53.º da presente petição inicial, com o que se fará Justiça.” Por sentença proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: 1ªA sentença de que se recorre padece de erro de julgamento da matéria de facto e de direito que vicia o seu sentido.

Desde logo,2ªDesconsidera factos que deveriam ter sido devidamente apreciados e valorados, nomeadamente a avaliação médica efetuada pelo Serviço de Psiquiatria do (então) Hospital ... 1 de fls. 114 a 117 do P.A., e subscrita pelos médicos especialistas, Drª. «BB» e Dr. «CC», na qual concluíram: “Embora se trate de doença heredo constitucional, se se provarem os acontecimentos traumáticos vivenciados durante a sua comissão de serviço ... podem ter constituído factor precipitante e/ou agravante da sua doença psiquiátrica”.

A qual,3ªConjugada com o Relatório do Oficial Instrutor – que consta do Facto 8 dos Factos provados na qual se concluiu que o A, “esteve exposto a episódios que pelas suas características de contacto com o In, constituíram perigosidade para o requerente”.

4ªAlteraria o sentido da sentença recorrida, dando razão ao Autor! Por outro lado,5ªA consulta de 09 de Maio de 2013 e o relatório que se seguiu de fls. 234 a 249 do P.A. (Facto 9 dos Factos Provados) não teve igualmente em conta o 1° internamento do Autor no Hospital ..., no ... entre 03.10.1963 e 14.12.1963,6ªNem o 2° internamento no Hospital ..., no ... entre 17.11.1994 e 14.07.1965, Sendo que,7ªTal informação já constava do Processo Clínico Militar, nomeadamente da avaliação que consta de fls. 114 a 117 do PA,8ªE que jamais pode ser colocada em crise por não contestada ou impugnada! Pelo que,9ªOs internamentos do Autor não podem deixar de ser dissociados das experiências traumáticas que vivenciou durante a prestação do serviço militar obrigatório e que agravaram consideravelmente o seu estado de saúde (já de si frágil).

Assim,10ªAos factos dados por Provados deverá ser acrescentado um novo Facto, o resultante de fls. 114 a 117 do PA .

Por outro lado,11ªO Autor comprovou, como lhe competia, os factos demonstrativos do seu direito! Com efeito,12ªProvou ter sido um “mal apurado” para o serviço militar,13ªRealidade que o Réu não podia ignorar, porquanto, apresentando o Autor alterações graves de comportamento, as mesmas seriam percetíveis pelos médicos que lhe fizeram a inspeção sanitária.

14ªNão obstante a sua doença, o Autor foi considerado apto para a prestação de todo o serviço militar e foi nomeado para combater na região militar de Moçambique.

15ªA prova testemunhal e documental carreada para os autos confirma que o Autor durante a sua comissão de serviço na ex PU de Moçambique, nomeadamente entre o período de 11Mai1967 e 20Mar1968 esteve exposto a episódios que pelas suas características de contacto com o Inimigo, constituíram perigosidade para si; Por outro lado,16ªAs declarações médicas juntas aos autos pelo Autor com a P.I. são bem demonstrativas das doenças de que o mesmo padece e da influência que o serviço militar teve sobre o seu estado de saúde!17ªHaverá erro crasso e maior do que apurar para o serviço militar obrigatório, em pleno contexto de guerra colonial, um jovem que já padecia de uma esquizofrenia paranoide?18ªSe ainda assim o Réu o fez, tem que se responsabilizar pelas consequências que tal situação acarretou para o Autor: O agravamento da sua doença!19ªA Lei do Serviço Militar, o Regulamento da Lei do Serviço Militar e o Estatuto dos Militares das Forças Armadas garantem o direito à plena reparação dos efeitos de acidentes ou de doenças adquiridas ou agravadas por causa do serviço militar.

Por sua vez,19ªO Decreto-Lei nº 43/76 de 20/01, na redação do seu artigo 1º reconheceu o direito à reparação aos cidadãos portugueses que, sacrificando-se pela Pátria se deficientaram no cumprimento do serviço militar (e em serviço de campanha) vindo a sofrer, mesmo a posteriori, uma diminuição permanente causada por doença adquirida ou agravada, consistindo em prejuízo ou perda de função, Por outro lado,20ªPartindo da constatação de que em qualquer doença agravada em serviço e por motivo do seu desempenho, há sempre uma percentagem desse agravamento que é inequivocamente adquirida em serviço face a circunstâncias ambientais específicas e desde que em grau superior ao que seria de prever pela evolução da doença em condições normais, foi criado o Despacho n° 139/87 de 03NOV do GENCEME, publicado na Ordem do Exército n°8, I Série,21ªLegislação a qual não foi minimamente considerada na decisão recorrida, escudando-se na discricionariedade técnica da Administração Pública.

22ªPara fundamentar a sua decisão, a douta sentença recorrida invoca acórdãos dos Tribunais Superiores, os quais, nada têm a ver com a discricionariedade técnica da Administração Pública e/ou a sindicabilidade das juntas médicas, reportando-se essencialmente a apreciação de decisões de concursos públicos,23ªNão podendo ser levianamente confundidos com o pedido do Autor e com os in quantificáveis e incalculáveis prejuízos causados ao mesmo e à sua saúde! Na verdade,24ªE ao contrário do sustentado pela decisão recorrida, as decisões médicas são sindicáveis contenciosamente no caso de erros e desacertos manifestos ou grosseiros ou se baseadas em critérios ou juízos ostensivamente inconsistentes ou arbitrários.

Nesse sentido:25ªPela relevância e similitude das matérias abordadas com o caso sub judice, confronte-se a fundamentação do acórdão proferido pelo TCA Norte, no Processo n° ...2, de 19-10-2006, “... Ou seja, se a malformação congénita aliada a um qualquer esforço físico, independentemente do local ou circunstâncias em que o mesmo era prestado, seria suficiente para o falecimento do militar, acrescem, no caso, mais duas circunstâncias que são determinantes para estabelecer a conexão a que se refere o dito artº. 22º: - a primeira prende-se com o facto de não ter sido atempadamente detetada tal malformação, como poderia e deveria ter sido (por recurso aos mais simples meios de diagnóstico como a medição da tensão arterial) e por via disso o filho dos recorrentes ter sido incorporado no serviço militar que exige uma atividade física em muito superior àquela que é exigida ao comum dos cidadãos.

- a segunda prende-se com a obrigatoriedade desse serviço militar que o mesmo falecido não podia recusar.

O facto de tal tipo de acidente poder ter origem em qualquer outra circunstância da vida do falecido não faz desaparecer essa mesma conexão que necessariamente tem de ser encontrada no caso concreto que se discute nos autos, desde logo porque não é encontrada qualquer outra causa para o sucedido que não seja o esforço físico acrescido que lhe foi exigido.

Por outro lado, o facto de com a incorporação militar lhe ter sido exigido um risco acrescido para a sua débil condição física é determinante para que se deva considerar que a doença de que era portador foi agravada pelo facto de ter realizado os exercícios físicos que lhe foram impostos e aos quais não se poderia eximir.

Portanto, dependendo o acidente ocorrido de fatores circunstanciais, desencadeantes e/ou precipitantes, que atuam no terreno patológico predisposto, na presente situação, e associados ao desempenho do serviço militar, dever-se-á considerar o exercício físico como factor que convergiu no desencadeamento e precipitação do acidente.

Daqui se pode concluir que a entidade recorrida ao indeferir a pretensão dos recorridos não atendeu no nexo causal existente entre a doença de que o falecido era portador, o esforço físico que lhe foi exigido em sede de recruta militar e o falecimento que lhe sobreveio por tal motivo.

“Com efeito, a autoridade recorrida, na apreciação que fez dos elementos de facto constantes do processo, laborou em erro manifesto, grosseiro, decidindo em sentido oposto ao apontando por tal factualidade e, sendo a exatidão dos pressupostos de facto um momento vinculado dos atos praticados no âmbito da chamada discricionariedade técnica, o erro ora apurado, sendo manifesto, grosseiro e evidente, é sindicável contenciosamente.

O acto recorrido enferma, assim de erro nos pressupostos de faceto, carecendo de ser anulado...” cfr. Ac. Do TCA Sul de 19/05/2005, proc. 0041304.

...”.

25ªViola, pois, a sentença recorrida os artigos 413° e 606, n°4 do C°. Processo Civil, bem como os artigos 44° e 46° da Lei 174/99, de 21SET, artigos 72° e 73° do DL 289/2000, de 14NOV, artigo 160°, a) do DL 197-A/2003, de 30AGO), o artigo 1° do Decreto-Lei n° 43/76 de 20 de Janeiro, do Despacho Conjunto n° 502/2004 de 5 de Agosto e do Despacho n° 139/87 de 03NOV do GENCEME, publicado na O.E., n°8, I Série.

Termos em que, concedendo provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, far-se-á inteira e sã JUSTIÇA.

O Réu juntou contra-alegações e concluiu: A. A. decisão ora recorrida negou provimento à ação administrativa especial intentada pelo Recorrente, e, em consequência, absolveu a entidade demandada dos pedidos formulados.

B. Não assiste razão ao Recorrente no pedido de revogação da sentença recorrida, pois que o...

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