Acórdão nº 2051/21.2T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução26 de Outubro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. 2051/21.2T8FAR.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1.

AA, casada, residente na Rua ..., ..., instaurou contra BB, com domicílio na Rua ...., em concelho ..., ação declarativa com processo comum.

Alegou ser proprietária da fração autónoma, correspondente ao ... do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Urbanização ..., ... (Edifício ...), freguesia ..., concelho ..., a qual lhe adveio por doação de seus pais, fração que havia sido dada de comodato ao Réu, pelo falecido pai da Autora, e que o Réu habita, sem qualquer título, na sequência da interpelação da Autora para desocupar e entregar a fração.

Pediu a condenação do Réu a reconhecê-la como dona da fração e a restituir-lhe a mesma livre de pessoas e bens.

O Réu contestou e formulou pedido reconvencional; alegou que a fração lhe foi dada de arrendamento pelo falecido pai da Autora, a quem pagou renda e que, após o falecimento dele, continuou a pagar renda a CC, irmão da Autora; prosseguiu alegando que a Autora procedeu ao desligamento da água, luz e gás privando-o, a si e à sua família, destes bens essenciais, causando-lhe prejuízos e que, alterando a verdade dos factos, deduz pretensão cuja falta de fundamento não ignora.

Concluiu pela absolvição do pedido e pediu a condenação da Autora no pagamento da quantia de € 1.750,00, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais e, em multa e indemnização, como litigante de má-fé.

A Autora respondeu por forma a concluir pela improcedência da defesa do Réu e do pedido de condenação como litigante de má-fé e, posteriormente, veio ampliar, com êxito, o pedido com vista à condenação do Réu no pagamento da quantia de € 23.599,92, a título de indemnização pelos prejuízos que lhe advieram com ocupação da fração desde agosto de 2020, acrescida de juros e da quantia de € 983,33 mensais até à efetiva entrega da fração.

  1. Admitida a reconvenção, a instância foi considerada valida e regular, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

    Teve lugar a audiência de discussão o julgamento e depois foi proferida sentença, em cujo dispositivo designadamente se consignou: “(…) o Tribunal decide: 1. Reconhecer o direito de propriedade da Autora sobre a fração autónoma designada pelas letras ..., correspondente ao ..., destinado a habitação, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Urbanização ..., ... (Edifício ...), freguesia ..., concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...39 da freguesia ... (...), e inscrita na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...6 da freguesia ....

  2. Condenar o Réu a entregar a fração referida em 1. à Autora, livre e desocupada de pessoas e bens, em bom estado de conservação e em perfeitas condições.

  3. Condenar o Réu no pagamento de indemnização à autora pelos prejuízos que a sua conduta causou, no montante que se vier a apurar em ulterior incidente de liquidação.

  4. Julgar totalmente improcedente a reconvenção e, consequentemente, absolver a Autora do pedido reconvencional.

  5. Absolver a Autora do pedido de litigância de má-fé.” 3. O Réu recorre da sentença e conclui assim a motivação do recurso: “I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou a ação de reivindicação da propriedade procedente e, em consequência: - Reconheceu o direito de propriedade da Autora sobre a fração autónoma designada pelas letras ..., correspondente ao ..., destinado a habitação, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Urbanização ..., concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...39 da freguesia de ... (...), e inscrita na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...6 da freguesia ...; -Condenou o Réu a entregar a fração referida em 1 à Autora, livre e desocupada de pessoas e bens, em bom estado de conservação e em perfeitas condições; - Condenou o Réu no pagamento de indemnização à Autora pelos prejuízos que a sua conduta causou, no montante que se vier a apurar em ulterior incidente de liquidação; - Julgou totalmente improcedente a reconvenção e, consequentemente, absolveu a Autora do pedido reconvencional; - Absolveu a Autora do pedido de litigância de má-fé.

    1. As questões a decidir eram, portanto, as seguintes: a. Apurar da condenação do Réu na restituição à Autora do prédio identificado nos autos por falta de título legitimador dessa ocupação; b. Apurar se é devida alguma indemnização à Autora a prestar pelos danos advenientes da privação do uso do prédio identificado nos autos e, em caso, afirmativo, qual o seu montante; c. Apurar o valor da renda mensal para um prédio com as características do prédio reivindicado; d. Apurar se o Réu sofreu danos com o desligamento da água, luz e gás e, em caso afirmativo, se lhe assiste o direito ao seu ressarcimento pela Autora; e. Aquilatar do preenchimento dos pressupostos de condenação da Autora como Litigante de Má-Fé.

      III.A convicção do Tribunal a quo quanto à factualidade dada como provada resultou dos depoimentos prestados pelas testemunhas DD e EE, companheira do Réu e marido da Autora, respetivamente, da prova documental junta aos autos e das posições assumidas pelas partes nos articulados.

    2. Não pode o Réu, aqui recorrente, conformar-se com a douta sentença do Tribunal a quo, porquanto, salvo devido respeito por opinião contrária, in casu, foram incorretamente julgados determinados pontos da matéria de facto, pois os meios probatórios impunham decisão de facto diversa da recorrida, verificando-se, ainda, uma incorreta aplicação do Direito aos factos em juízo e, para além disso, teve o Réu, ora apelante, conhecimento em momento posterior à sentença da existência de documento superveniente que poderá impor decisão diversa da tomada pelo Tribunal a quo.

    3. Em primeiro lugar, não pode o Recorrente concordar com a decisão do Tribunal a quo no que respeita aos pontos a), b), c), d) e e) dos factos não provados.

    4. Deveria o Tribunal a quo ter sido considerado provado que: a. O Réu ocupa a fração em causa desde 2007, mediante o pagamento de uma renda, que o valor dessa renda foi fixado em € 150,00, à data em que o Réu passou a residir na referida fração e que atualmente paga o montante de € 300,00, assim como, que após a morte do pai da Autora, e até ao presente, a renda passou a ser sempre paga ao irmão da Autora, CC. (pontos a), b) e c)); b. A Autora sempre teve conhecimento do contrato de arrendamento verbal mencionado em a) e nunca se opôs ao mesmo (pontos d) e e)) VII. Desde logo, os factos a), b) e c) considerados na douta sentença como não provados encontram-se em clara contradição com a motivação da sentença na parte em que, referindo-se ao depoimento da testemunha CC, menciona que: “(…) as negociações terão ocorrido durante os almoços nos quais o mesmo também estaria presente (...)” “Para além da afirmação de que terá ficado estipulado o pagamento de uma quantia mensal de € 150,00, em numerário, pelo Réu ao pai da Autora (…)” “Referiu ainda a testemunha que, em razão do falecimento de seu pai, e até antes, em virtude da situação de doença deste, era o próprio quem recebia o pagamento da quantia de € 150,00, em numerário, e quem continuou a receber a quantia de € 300,00 sem elaborar documento de quitação e sem observância das obrigações fiscais inerentes à celebração do contrato de arrendamento.” “(…) acrescentou que utilizava aquelas quantias para pagamento de despesas associadas às frações autónomas localizadas no prédio identificado em 1), incluindo a fração autónoma em questão nestes autos.” VIII. Ademais, tal factualidade resulta da prova testemunhal e por declarações de parte produzida em sede de audiência de julgamento: a. Declarações de Parte do Réu: (suprimiu-se a transcrição) b. Testemunha CC: (suprimiu-se a transcrição) c. Testemunha DD: (suprimiu-se a transcrição) IX. Não pode igualmente o Recorrente concordar com a decisão do Tribunal a quo no que respeita ao ponto f) dos factos não provados.

    5. Deveria o Tribunal a quo ter sido considerado provado que a Autora nunca se considerou como a real proprietária da fração identificada em 1) por saber que a mesma apenas integrou a sua esfera jurídica para salvaguarda do património conjugal dos seus pais.

    6. Desde logo, importa frisar que, após a audiência de discussão e julgamento dos presentes autos, o Réu, aqui Recorrente, tomou conhecimento de que se encontra em curso no mesmo juízo, ação destinada a obter a nulidade da doação que esteve na base aquisição da titularidade da fração ora em apreço pela Autora, com fundamento na simulação do negócio jurídico – questão prejudicial que deveria ter implicado a suspensão dos presentes autos, pois, a ser procedente, a Autora não será parte legítima para a presente ação, nem sequer parte interessada, porquanto repudiou a herança de seu pai e, portanto, nem sequer é herdeira do imóvel em juízo.

    7. Ademais, a factualidade supra referida resulta da prova testemunhal e por declarações de parte produzidas em sede de audiência de julgamento: a. Declarações de Parte do Réu: (suprimiu-se a transcrição) b. Testemunhas: XIII. A acrescer, há ainda, a pendência no mesmo juízo em que correram seus termos os presentes autos – sob o n.º de processo 1571/22.... – ação destinada a aferir da validade da doação que esteve na base aquisição da titularidade da fração ora em apreço pela Autora, na qual é peticionada a nulidade dessa doação com fundamento na simulação do negócio jurídico, pelo que procede agora, nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 651.º do CPC à junção da Certidão Judicial com o presente recurso sob Doc. 1.

    8. A certidão judicial ora junta, trata-se de documento superveniente, mais concretamente da Contestação à ação de reivindicação de propriedade referente a uma outra fração da qual é também a Autora proprietária, nos exatos moldes em que o é da fração objeto do presente recurso, contra o seu irmão, CC, sendo que nessa mesma...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT