Acórdão nº 217/21.4T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Outubro de 2023
Magistrado Responsável | ANA CRISTINA DUARTE |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO AA e mulher BB deduziram ação declarativa contra CC e mulher BB pedindo que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos autores sobre o imóvel, fração autónoma identificada sob o artigo 1.º da petição inicial, bem como o direito dos autores à demarcação do seu imóvel do imóvel dos réus, procedendo-se judicialmente à demarcação das áreas comuns e das áreas de uso exclusivo dos logradouros do imóvel, em conformidade com o preceituado no artigo 1354.º, n.º 1 do Código Civil.
Alegaram, para tanto, que são donos e legítimos possuidores de uma fração autónoma ..., destinada a habitação, no ... andar, com logradouro, integrada num prédio urbano, sendo os réus proprietários da Fração ..., também destinada a habitação, sita no ... do mesmo prédio, afeto ao regime de propriedade horizontal, resultando do título constitutivo da propriedade horizontal que o prédio é composto por um edifício de ... e andar destinados a habitação, com a área de 112,70 m2 e uma área descoberta de 465,30 m2, e é composto por duas frações autónomas, independentes, distintas e isoladas entre si, com saída direta para a via pública ou para a parte comum do imóvel e desta para a via pública, tendo as frações a seguinte composição, valor e permilagem:
-
Fração ... – Habitação tipo T-três, no ..., com um alpendre/varanda com 9,30 m2 e um logradouro com 166,00 m2, com permilagem de quinhentos a que corresponde o valor de €50.000,00; b) Fração ... - Habitação tipo T-três, no andar, com varanda escadas com 6,31 m2 e um logradouro com 71,30 m2; Ainda de acordo com o título constitutivo da propriedade horizontal, além do mais, são partes comuns: c) O logradouro comum com a área de 212,40 m2; d) Em geral todas as coisas que não sejam afetas ao uso exclusivo de um dos condóminos; Mais alegaram que, desde o tempo da aquisição, atentas as relações de amizade e familiaridade existentes, AA. e RR. de comum acordo passaram a utilizar as frações respetivas e a área descoberta ou de logradouro, realizando aí diversas benfeitorias, como a pavimentação do logradouro, a realização de passeios, a construção de anexos e uma cobertura/garagem, para automóveis, mas que, em setembro de 2020, os RR. manifestaram o propósito de vender a sua fração e, com tal intuito, passaram a fazer constar, que as áreas do logradouro eram da sua propriedade exclusiva, designadamente toda a área do logradouro situada na parte frontal do prédio, assim como a área de logradouro situada na parte lateral direita e ainda uma área localizada na parte posterior do prédio, o que põe em causa a área que é de natureza ou de uso comum, onde se encontra construído o passeio na parte frontal do prédio e que permite o acesso quer ao arruamento público quer à parte lateral esquerda do prédio onde os AA. têm edificado um anexo e ainda à parte posterior onde se encontra localizado o anexo/coberto destinado ao parqueamento de veículos.
Como no título constitutivo da propriedade horizontal, apesar de se fazer referência à existência de áreas de uso exclusivo das respetivas frações autónomas e áreas de uso comum, tais áreas não se encontram identificadas em planta nem por referência no prédio, ou seja, tais áreas respetivamente, dos prédios dos AA. e dos RR, não estão demarcadas, pelo que se torna necessário proceder à sua demarcação Os réus contestaram, excecionando a ineptidão da petição inicial e, por impugnação. Em reconvenção pediram que seja declarado e reconhecido o direito de propriedade, nos exatos termos constantes da escritura de constituição da propriedade horizontal, no que concerne à fração autónoma dos réus, designada pela letra ... e os autores condenados a absterem-se de usar a área exclusiva afeta ao prédio dos réus localizada na parte frontal da Fração .... Alegaram que os A.A. ao quererem passar na parte frontal do edifício, onde se localiza a área exclusiva dos R.R., estão a violar o direito de propriedade destes, pretendendo apoderar-se da mesma, sabendo que a mesma é pertença exclusiva dos réus Os autores replicaram, respondendo à matéria de exceção e peticionando a improcedência do pedido reconvencional.
Após convite do tribunal, os autores apresentaram nova petição inicial aperfeiçoada onde indicam o modo como deverá ser efetuada a demarcação entre os prédios, tendo-se seguido contestação e réplica nos mesmos termos das primitivas.
Dispensada a audiência prévia, julgou-se improcedente a exceção de nulidade do processo por ineptidão da petição inicial, admitiu-se a reconvenção, fixou-se o valor da ação e definiu-se o objeto do litígio e os temas da prova.
Foi ordenada e realizada perícia singular.
Já após a primeira sessão do julgamento, foi ordenada a notificação das partes para se pronunciarem quanto à eventual nulidade/invalidade do título constitutivo da propriedade horizontal, por este não definir de forma clara as áreas comuns e próprias do imóvel, sendo que as partes se pronunciaram pela não verificação da nulidade.
Foi ainda reiniciada a audiência para prestação de esclarecimentos por parte do perito e, a final, foi proferida sentença cujo teor decisório é o seguinte: “Atento tudo o exposto e nos termos das disposições legais supracitadas: Julgo a ação procedente, e, em consequência:
-
Declaro e reconheço o direito de propriedade dos AA. sobre a FRACÇÃO AUTÓNOMA designada pela letra ..., destinada a habitação Tipo T-Três, no ... andar, com logradouro, integrada num prédio urbano, sito no lugar ..., freguesia ..., do concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...17/..., afeto ao regime de propriedade horizontal pela inscrição AP. ...7 de 2007/11/19, fração essa inscrita na respetiva matriz sob o artigo ...22...; b) Declaro e reconheço o direito de propriedade dos réus sobre FRACÇÃO AUTÓNOMA, designada pela letra ... sita no Loteamento ..., Lote ...5 – ... -, da freguesia ...: FRACÇÃO AUTÓNOMA, designada pela letra ..., destinada a habitação, correspondente ao ..., inscrita na matriz urbana da citada freguesia sob o nº 2022 – “A” e descrita na C. R. Predial ..., sob o nº ...17; c) Julgo não verificada a nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal.
-
Declaro e reconheço o direito dos AA. à demarcação do seu imóvel e do imóvel dos RR.; d) Em consequência, procede-se à demarcação das áreas de uso comum e das áreas de uso exclusivo do logradouro do prédio nos seguintes moldes, com referência à planta que se encontra na contracapa do processo: - Além das duas habitações que se encontram perfeitamente delimitadas e definidas, residindo os autores no ... andar e os réus no ...: - São áreas exclusivas dos autores as identificadas na planta a cor azul; - São áreas exclusivas dos réus as identificadas na planta a cor vermelha e o anexo identificado na planta a cor verde; - São áreas comuns as demais áreas identificadas a cor verde (exceto o anexo que pertence aos réus).
-
Julgo a reconvenção improcedente, por não provada, absolvendo os autores dos pedidos reconvencionais.
-
Absolvo os autores do pedido de condenação como litigantes de má-fé”.
Os réus interpuseram recurso, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes Conclusões: DOS FACTOS: A – A Douta Sentença padece de vícios graves, no que respeita à matéria considerada como provada “Factos Provados” e “factos Não Provadas” e à respetiva “motivação da matéria de facto”, pois o Tribunal “a quo” fez uma incorreta apreciação da prova produzida nos autos, resultante da audiência de discussão e julgamento e dos documentos juntos aos autos, B – Padecendo também de vícios graves no que diz respeito à interpretação e aplicação do direito aos factos que constituem a causa de pedir e o pedido nos presentes autos, C – Violando o disposto nos artº nº 607º, 608º e 615º do CPC e artigos 236º, 237º, 238º, 239º, 286º, 289, 294º, 1353º, 1354º, 1415º, 1416º, 1417º, 1418º, 1419º todos do CC e ainda os artsº 59º e 60º do Código do Notariado.
D - Tais vícios conduzem à nulidade da sentença.
E – Numa apreciação genérica da sentença ora recorrida, verifica-se que as ora testemunhas dos recorridos são consideradas credíveis, descredibilizando-se as testemunhas dos recorrentes incompreensivelmente.
F – Atenta a motivação apresentada, relativamente à prova testemunhal apresentada pelos recorrentes, a mesma não foi valorada, mesmo tratando-se de depoimentos credíveis e isentos, contrariamente à prova testemunhal dos recorridos, que foi atendida como se de única verdade se tratasse.
G – É merecedor de critica, o Tribunal “a quo” na valoração da prova, quer da testemunhal, da pericial e da documental, uma vez que considerou determinados elementos e desconsiderou outros, não fazendo uma correta apreciação dos mesmos, do ponto de vista legal, fazendo juízos de valor e desconsiderando o valor legal e firmeza que sobre os mesmos pende.
H – Durante a audiência de julgamento, foi admitida uma planta, junta pelos autores na Replica aperfeiçoada, que foi impugnada pelos réus, por não retratar a realidade, mas sim a pretensão dos autores.
I – A admissão de tal planta não teve qualquer fundamentação, nem por remissão, baseando-se num mero juízo de valor, sem qualquer suporte legal.
J – A falta de fundamentação, consubstancia uma omissão, não tendo sido respeitado o disposto no 608, nº 2 do CPC, L – Gerando em consequência uma nulidade, nos termos do disposto no artº 615º do CPC, o que se invoca para os devidos efeitos legais.
M – O mesmo se dirá em relação ao relatório pericial, pois não é feita qualquer menção, relativamente à sua admissão e consequente valoração enquanto elemento probatório.
N - Numa apreciação genérica, verifica-se, incompreensivelmente, que as testemunhas e prova documental apresentadas pelos recorridos são considerados credíveis, tendo sido completamente desvalorizada, a prova apresentada pelos recorrentes.
O – À luz das “regras da experiência”, o Tribunal “a quo”, na valoração da prova, quer testemunhal, da...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO