Acórdão nº 2347/13.7TBFAR-A.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelNUNO ATAÍDE DAS NEVES
Data da Resolução24 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Filiconstruções – Organização de Investimentos, Lda instaurou a presente execução contra AA e BB.

apresentando como título executivo uma letra de câmbio de que consta a data de emissão de 26/09/2011, data de vencimento a de 26/09/2012, pelo valor de €139.600, atribuindo aos Executados as assinaturas na qualidade de aceitantes. Invocou ser dona e legítima possuidora da referida letra, na qual figura como sacadora, e que a letra foi emitida na sequência de uma transação comercial estabelecida entre si e os Executados, concretamente a cessão de quotas do Café ..., Lda., constando do requerimento executivo o seguinte: 1.º - A Exequente é dona e legítima possuidora, de uma letra de câmbio, que se junta como Doc. n.º 1.

  1. - A referida letra, no montante de €139.600,00 foi aceite pelos executados.

  2. - Tendo sido aposta como data do vencimento o dia 26/09/2012.

  3. - A letra foi emitida na sequência de uma transação comercial entre a Exequente e os Executados, concretamente a cessão de quotas da pessoa coletiva "Café ..., Lda".

  4. - Na data do seu vencimento, os Executados não procederam ao pagamento total ou parcial da mesma, nem à sua reforma, situação que se mantém.» Em oposição, e com vista à extinção da execução, foram deduzidos os presentes embargos com os seguintes fundamentos: - a assinatura atribuída a BB não foi aposta pelo seu punho; - é falso que a letra tenha sido emitida no âmbito de uma relação comercial estabelecida entre Embargantes e Embargada, pois as quotas do Café ..., Lda foram adquiridas pelos Embargantes, uma delas, a CC e a DD, e a outra quota a M..., Lda.; - DD é sócio de 2 sociedades proprietárias de M..., Lda., sociedade que é sócia da sociedade Exequente, e é gerente desta; - a letra foi entregue como garantia da dívida perante M..., Lda.; - não foi estabelecido qualquer pacto de preenchimento da letra; - o valor numérico aposto na letra foi rasurado e adulterado.

    Em sede de contestação, a Embargada pugna pela improcedência dos embargos. Impugna as falsidades apontadas ao título. Sustenta que a emissão da letra foi sugerida pelo Embargante a DD para garantir o remanescente do pagamento em falta a título de contrapartida da cessão de quotas, dando o consentimento para preenchimento pelo montante que estivesse em falta. Uma vez que a dívida decorrente do negócio de cessão de quotas ascende a € 139.600, face ao incumprimento do acordo de pagamento em prestações e ao acordo para preenchimento da letra, foi apresentada a pagamento pelo referido valor.

    Foi proferida sentença julgando os embargos totalmente improcedentes, determinando o prosseguimento da execução nos seus precisos termos.

    APELAÇÃO Inconformados, os Embargantes vieram apelar para O Tribunal da Relação de Évora, pugnando pela revogação da decisão recorrida, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: «

    1. O presente Recurso vem interposto da douta sentença de fls. dos autos que decidiu a oposição à execução mediante embargos de executado improcedente por não provada e, em consequência, determinou o prosseguimento dos trâmites normais da execução.

    2. Os recorrentes não se conformam com a sentença proferida, entendendo que a mesma não julgou corretamente os pontos dados como provados e não provados e não ter feito a avaliação correta dos factos ao direito.

    3. Quanto aos factos não provados e provados diga-se que por decisão do Meritíssimo Juiz “a quo” foi por ele consultada e valorada a sentença datada de 22/01/2019, proferida no Processo Comum Singular com o n.º 1927/16.3... em que foi arguido DD, processo referenciado no ponto 10 dos factos dados como provados.

    4. Da leitura atenta dessa decisão penal absolutória resulta ter sido elaborado o Relatório Pericial de fls. 183 e seguintes no qual se concluiu quanto ao valor, que o valor numérico de € 139.600,00 foi rasurado, sendo o valor inicial de € 25.000,00, tendo sido acrescentado o 1, alterado o 2 para 3, alterado o 5 para 9, bem como o 0 das centenas para 6.

    5. Esse Relatório Pericial é conclusivo no sentido de que tal valor foi alterado de €25.000,00 para € 139.600,00, aliás é possível extrair do Relatório pericial que na adulteração foi utilizada tinta diversa da utilizada no primitivo preenchimento.

    6. Face à prova produzida entende-se que o § 3 dos factos não provados “- Que o valor numérico aposto pelo punho de DD no local destinado à importância na presença do embargante AA, que se pensa ter sido de 25.000,00 € também foi falsificado, para se atingir a quantia de 139.600,00 € acrescentou-se um número 1, do número 2 alterou-se para o número 3, do número 5 alterou-se para o número 9, e do número zero alterou-se para o número 6;” foi incorretamente julgado, apresentando-se contraditória e enfermando de obscuridade e ambiguidade quando confrontado com o ponto 10, n.º 8 dos factos provados, deve excluir-se o § 3 dos factos dados como não provados.

    7. É notória a ambiguidade e obscuridade do facto dado como não provado em § 1 que refere “- Que tudo o que consta na letra para além da assinatura do embargante AA, foi forjado e falsificado.”, uma vez, que ficou provado em n.ºs 7 a 10 do ponto 10 dos factos provados que DD, legal representante da recorrida, preencheu o montante por extenso com os dizeres “cento e trinta e nove mil e seiscentos euros” e os campos destinados à aposição da data, ao local e sacador com a indicações Filiconstruções, Lda.

    8. Portanto, face à prova pericial e aos factos dados como provados em n.ºs 7 a 10 do ponto 10, deverá excluir-se o § 1 dos factos dados como não provados.

    9. Por outro lado, a improcedência dos referidos embargos de executado, cujo desiderato foi o prosseguimento dos trâmites normais da execução, tem na sua génese um exercício jurídico formal que, ainda sustentado em factos, parte de premissas erradas e que deturparam gravemente a conclusão do silogismo judiciário da sentença ora em crise.

    10. Exercício que não tomou em consideração que qualquer valor devido pelos recorrentes sempre seria devido à sociedade M..., Lda. e não à Filiconstruções, Lda., com a qual não se demonstrou existir qualquer relação comercial por parte do embargante AA e sua mulher.

    11. Ao invés, o Mmo. Juiz a quo concluiu o contrário.

    12. Tal conclusão, encontrada através de operações aritméticas fundamentadas na matéria assente nos autos e em documentos juntos e que o Mmo. Juiz do Tribunal a quo, encontra-se viciada, por partir de premissas deturpadas.

    13. QUANTO À ALTERAÇÃO DO VALOR NUMÉRICO DA LETRA o Relatório Pericial referido em D) destas conclusões de recurso concluiu quanto ao valor, que o valor numérico de € 139.600,00 foi rasurado, sendo o valor inicial de € 25.000,00, tendo sido acrescentado o 1, alterado o 2 para 3, alterado o 5 para 9, bem como o 0 das centenas para 6.

    14. Esse Relatório Pericial é conclusivo no sentido de que tal valor foi alterado de €25.000,00 para € 139.600,00, aliás é possível extrair do Relatório pericial que na adulteração foi utilizada tinta diversa da utilizada no primitivo preenchimento e verifica-se a inexistência de qualquer semelhança fonética ou caligráfica entre o valor de 25.000,00€ e o de 139.600,00€.

    15. O Tribunal entendeu não se mostrar adequadamente explicada a alteração do valor numérico da letra, alteração que não dúvida de que ocorreu.

    16. Acerca dessa alteração, que vai ao encontro da versão dos aqui recorrentes que o Tribunal referiu que valorou (vide fls. 32 e 33 da sentença) no sentido da entrega da letra com o numerário preenchido por 25.000,00€ (é certo que na NJA que efetuaram os recorrentes referiram que a letra foi entregue em branco, mas note-se que tal notificação não foi subscrita pelos mesmos, mas pelo seu mandatário), o DD que não prestou depoimento de parte nestes autos alegando problemas de surdez, prestou-as no entanto, no processo n.º 1927/16.3... e que são as transcritas em ponto 15 destas alegações, referiu que a rasura na letra deve-se a um engano da pessoa a quem pediu para lha preencher.

    17. A testemunha, EE, que é filho de DD, sócio da sociedade exequente, cujo depoimento o Tribunal valorou (Fls. 34 da sentença) referiu que “… viu a letra em branco que o seu pai tinha guardada em casa e tinha as assinaturas de AA e da esposa e também do pai do depoente e o pai do depoente levou a letra ao Banco onde a mesma foi preenchida pelo valor que ainda estava em divida pela venda do café ... .” R) Ou seja, esta versão do legal representante da recorrida confirmada pelo depoimento do filho (ver ponto 32 deste recurso), suscita estranheza, uma vez que não se explicou porque é que se pediu a um terceiro que lhe preenchesse a letra, igualmente como se referiu verifica-se a inexistência de qualquer semelhança fonética ou caligráfica entre o valor de 25.000,00€ que o alegado funcionário do banco terá percebido e escrito inicialmente e o de 139.600,00€, pelo que não se mostra adequadamente explicada a alteração do valor numérico da letra, alteração que não há dúvidas de que ocorreu.

    18. Acresce que os recorrentes juntaram aos autos uma outra letra de câmbio, no montante de 30.000,00€ (DOC. 13 junto à petição de embargos de executado) que o Mmo. Juiz do Tribunal a quo não valorou, o que reforça a versão do recorrente marido em detrimento de qualquer outra versão.

    19. Sendo aliás de referir que a gerente da M..., Lda., FF, declarou no seu depoimento que o AA, ora recorrente, lhe confidenciou que estaria ainda em divida por conta do negócio do Café ..., Lda cerca de 30.000,00€, e afirmando DD que estava em divida um valor superior, mas não concretizou qual era esse valor (depoimento que o Mmo. Juiz a quo valorou e que consta a fls. 35 da sentença).

    20. Independentemente, da inequívoca alteração ocorrida ao valor colocado na letra de câmbio que constitui título executivo, qualquer valor devido pelos recorrentes sempre seria devido à sociedade M..., Lda. e não à Filiconstruções, Lda., com a qual não se demonstrou existir qualquer relação comercial por parte do embargante AA e sua mulher (vide prova documental...

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