Acórdão nº 1185/18.5T8CTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Outubro de 2023
Magistrado Responsável | VÍTOR AMARAL |
Data da Resolução | 10 de Outubro de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – Relatório ([1]) AA, com os sinais dos autos, intentou ação declarativa, com processo comum, contra 1.º - BB, 2.ª - CC, 3.º - DD, 4.ª - “A..., LIMITADA”, todos também com os sinais dos autos, pedindo:
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O reconhecimento e declaração de que, na identificada escritura – intitulada de “compra e venda” – datada de 13/10/1998, os respetivos outorgantes não declararam a totalidade do preço estipulado como contrapartida da venda dos imóveis objeto do negócio (foi omitida intencionalmente a quantia de Esc. 4.000.000$00, recebida pela A. aquando da assinatura do contrato-promessa de 01/09/1998; e as 3 frações autónomas que os RR. se obrigaram também a entregar à A. como contrapartida dos prédios prometidos vender); b) O reconhecimento e declaração de que aquela omissão da escritura teve lugar por acordo entre A. e RR., com o intuito de enganar terceiros, ocultando perante terceiros (Fazenda Nacional e Cartório Notarial) o preço total convencionado; c) O reconhecimento e declaração de que a 4.ª R., bem como o 1.º R. e o falecido EE, se obrigaram solidariamente a dar em pagamento à A., como parte integrante do preço dos imóveis objeto da ajustada compra e venda, as três frações estabelecidas na cláusula terceira do contrato-promessa de 01/09/1998 (para além das verbas em dinheiro de Esc. 4.000.000$00, paga na data do contrato-promessa, e de Esc. 36.000.000$00, paga na data da escritura de compra e venda); d) O reconhecimento e declaração de que os RR. faltaram culposamente ao cumprimento dessa sua obrigação de entrega em pagamento à A. das referidas três frações autónomas (do empreendimento previsto para o local, que os RR. não implementaram nem concretizaram); e) A condenação dos RR. a pagar à A., solidariamente, a quantia de € 550.000,00, correspondente ao valor das frações em causa; f) A condenação dos RR., solidariamente, a pagar à A. uma compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, que deve ser fixada no montante mínimo de € 150.000,00; g) O reconhecimento de que os RR. estão obrigados a outorgar a escritura de permuta prevista na carta do 1.º R. datada de 25/09/1998, cedendo os RR. à A. o prédio rústico inscrito na respetiva matriz sob o art.º ...9.º, com área e confrontações devidamente atualizadas após o destaque da parcela prometida vender (o atual art.º 230.º); e cedendo a A. aos RR. (ou a quem estes indicarem) o prédio urbano inscrito na matriz respetiva sob o art.º ...27.º (atualmente, art.º ...74.º); h) Atenta a recusa dos RR. em outorgar a referida escritura, deve ser proferida sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos faltosos (que decrete a permuta, nos termos referidos); i) A condenação dos RR. a solidariamente reconhecer, aceitar e praticar tudo quanto consta das anteriores alíneas, acrescido de juros moratórios à taxa legal, sobre as quantias supra referidas em e) e f), desde a citação e até integral cumprimento; j) A condenação dos RR. a pagar uma sanção pecuniária compulsória consistente em juros à taxa de 5% ao ano sobre o valor em dívida, sanção essa que acrescerá aos juros de mora, nos termos do disposto no art.º 829.º-A do CCiv..
Para tanto, alegou, em síntese: - entre a A. (promitente vendedora) e o 1.º R. (promitente adquirente) foi celebrado contrato-promessa de compra e venda, datado de 01-09-1998, âmbito em que a A., enquanto dona de prédios ali identificados, declarou prometer vender os art.ºs urbanos ...27..., ...26... e ...94.º, bem como uma parcela de terreno a desanexar do prédio rústico inscrito sob o art.º ...9.º, ao 1.º R., que declarou prometer comprar-lhe, pelo preço de 40.000.000$00, e declarando que a A. recebeu já 4.000.000$00, a título de sinal e princípio de pagamento, devendo a parte restante do preço ser paga até 30/09/1998; - para além daquela quantia em dinheiro, e como contrapartida dos prédios prometidos vender, o promitente comprador entregaria à A. três frações autónomas, caso viesse a ser possível construir no espaço físico dos prédios prometidos vender e comprar um número superior a trinta e que, caso viesse apenas a ser possível construir nessa área entre os vinte e trinta fogos, o segundo outorgante apenas entregaria àquela dois apartamentos, e que, não sendo possível a construção de pelo menos vinte fogos, o contrato-promessa seria resolvido de comum acordo entre os outorgantes, deixando de produzir quaisquer efeitos, à exceção da obrigação que decorria para a primeira outorgante em restituir o preço de quarenta milhões de escudos, e, bem assim, que os apartamentos que a A. teria a receber do 1.º R. seriam da tipologia prevista na cláusula 4.ª do contrato-promessa; - a A. obrigou-se a registar a seu favor e a expensas suas os prédios urbanos objeto da promessa, bem como a parcela de terreno que iria ser desanexada do prédio rústico; - por documento particular, outorgado em 18/09/1998, a A. e o 1.º R. fizeram um aditamento ao contrato-promessa, no qual a A. declarou que se obrigava a outorgar a escritura de compra e venda dos imóveis referidos a favor do 1.º R., ou a quem este viesse a indicar, mantendo-se no mais o clausulado do contrato de 01/09/1998; - por não se prever quando poderia ser feita a desanexação da parcela de terreno do art.º ...9.º, o 1.º R. e a A. outorgaram de imediato a escritura de compra e venda dos art.ºs 1.126.º e 494.º e da totalidade do prédio rústico inscrito sob o art.º ...9.º, não sendo incluído na escritura, de imediato, o outro artigo urbano prometido vender (1.127.º), e quando a parcela a desanexar do prédio rústico estivesse efetivamente desanexada, seria outorgada uma escritura de permuta pela qual o 1.º R. cederia à A. “o prédio rústico inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...9º, com área e confrontações devidamente actualizadas após o destaque da parcela prometida vender e, ainda, a contrapartida indicada na cláusula terceira daquele contrato-promessa – três fracções autónomas”; - e a A. cederia ao 1.º R. “o prédio urbano inscrito sob o artigo ...27”, propondo este R. que o pagamento da quantia em falta, de Esc. 36.000.000$00, fosse efetuado na data da escritura, no dia 13/10/1998, acrescida de mais Esc. 474.640$00, procedendo-se, assim, à outorga da escritura, “em simultâneo com o pagamento da quantia em dívida”; - acordou-se que a escritura deveria ser outorgada a favor da 4.ª R., concordando esta com as obrigações assumidas pelo 1.º R.; - porém, os RR. não procederam à outorga da escritura de permuta, nem entregaram à A. as três frações autónomas estipuladas, encontrando-se legalizada a desanexação da parcela de terreno prevista no contrato-promessa de 01/09/1998, tendo sido viabilizada uma operação de loteamento para os prédios em causa; - em conjunto com o 1.º R. e a 4.º R., acordaram declarar um preço na escritura de compra e venda de 13/10/1998 de 40.000.000$00, em dinheiro, mais os três apartamentos acima mencionados, para evitar maiores encargos fiscais e notariais, não tendo incluído no objeto da compra e venda a totalidade do art.º rústico ...9.º, quando o acordo apenas incidia sobre a parcela a destacar deste artigo, tendo ficado acordado entre todos a futura outorga de escritura de permuta quando a parcela a desanexar do prédio rústico estivesse destacada; - a A. contava com três apartamentos para fazer face às despesas da sua velhice, tendo ficado abalada com o incumprimento dos RR., o que lhe causou angústias, incómodos, desgostos e inquietação.
Citados, os RR. apresentaram contestação, defendendo-se por impugnação e por exceção.
O 1.º R. (BB), para além de defesa por impugnação, invocou a ineptidão da petição inicial, excecionando a sua ilegitimidade e, bem assim, a colocação voluntária da A. numa situação de impossibilidade de satisfazer a prestação a que se tinha obrigado, por forma a concluir pela improcedência da ação.
Os demais RR. excecionaram a sua ilegitimidade na ação, por não se terem vinculado ao contrato-promessa referido, bem como o abuso do direito por parte da A., alegando que esta, intentando a ação quase no fim do prazo prescricional de 20 anos, nada tendo feito durante esse tempo para criar a convicção de que poderia exigir aos RR. responsabilidade emergente do aludido contrato-promessa, excedeu os limites impostos pela boa-fé.
Oferecendo ainda impugnação fáctica, esgrimiram não terem assumido as obrigações a que alude a A., pugnando pela improcedência da ação.
Foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedentes as invocadas ineptidão da petição inicial e ilegitimidade passiva, e foram enunciados o objeto do litígio e os temas da prova.
Requerida – e em parte deferida – a ampliação de pedidos e causa de pedir da demandante, foi determinado o seguinte aditamento: «Mais se reconhecendo e declarando que o prédio rústico a ceder pelos R.R. à Autora, mediante permuta, nos termos das anteriores alíneas i), j) e l) é o que constitui o actual artigo 230º da União das Freguesias ... e ..., com a seguinte identificação: Localização: ... / Confrontações: Norte, Ribeiro ...; Sul, Caminho Público; Nascente, Caminho Público; Poente, FF / Área total (ha): 1,258400 / Descrição: Prédio rústico composto por terra de cultivo, lameiro, pastagem e vinha.».
Ocorrido, na pendência da causa, o óbito da A., foram julgados habilitados em seu lugar GG e HH, ambos com os sinais dos autos.
Falecido também o 1.º R., foram julgados habilitados II, JJ, e KK, também com os sinais dos autos.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença, julgando totalmente improcedente a ação, com a consequente absolvição dos demandados de todos os pedidos.
É desta sentença absolutória que vem interposto recurso, pela parte demandante, com apresentação de alegação e as seguintes Conclusões ([2]): «I- O presente recurso versa simultaneamente matéria de facto e matéria de direito. Efectivamente, II- Os recorrentes consideram que diversos pontos de facto foram incorrectamente julgados, na douta sentença recorrida; III- E que...
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