Acórdão nº 6416/21.1T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelCATARINA SERRA
Data da Resolução12 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Recorrente: MEO – Serviços de Comunicações Multimédia, S.A.

Recorrida: NOS Comunicações, S.A.

  1. MEO – Serviços de Comunicações Multimédia, S.A.

    , demandou NOS Comunicações, S.A.

    , pedindo:

    1. A fixação do preço dos serviços de interligação, na componente voz, prestados, em 2001 entre a TMN e a Optimus, e que este seja estabelecido no valor de Esc: 55$00 (€ 0,2743) + IVA por minuto.

    2. Seja declarado, que do encontro de contas dos respectivos serviços de interligação prestados em 2001, entre a TMN e a Optimus, resulta um saldo a favor da autora e que este ascende ao montante de € 14.685.294,00.

    3. Condenação da ré a pagar à autora a quantia de € 19.819.793,25, correspondendo esta ao montante de € 14.685,294,00 referido em b), actualizado à data da entrada da p.i.

    4. Condenação da ré a pagar à autora a quantia de 6 27.317.599,61, a título de danos advenientes do incumprimento contratual, e a quantia em que a autora vier a ser condenada, se o for, no âmbito do processo 26897/18.0...

    5. Condenação da ré no pagamento de juros de mora, à taxa comercial, sobre as quantias de € 19.819.793,61 e de € 27.317.599,61, referidas em c) e d), desde a citação até integral pagamento, e sobre a quantia em que a autora vier a ser condenada, se o for, no âmbito do processo 26897/18.0..., desde o momento em que for efectuado o respectivo pagamento e até integral pagamento.

    Sustentou ser titular de um crédito sobre a ré (Optimus, à época), crédito este respeitante a serviços de interligação, serviços de voz, relativos a 2001, com base no acordo existente entre as partes em facturar tais serviços pelo preço de Esc: 55$00 por minuto acrescido de IVA, e que cedeu à então PTC (hoje MEO) parte substancial desses créditos.

  2. Na contestação, a ré excepcionou a “excepção de autoridade do caso julgado”, alegando, em suma, que a TMN (ora MEO) intentou uma acção contra a ré, acção que correu termos no Tribunal da M... Proc. [72]3/2001, alegando ser credora da OPTIMUS (ora NOS) por força do saldo da prestação recíproca de serviços de interligação em 2001, que, na parte respeitante a serviços de voz, teriam sido facturados pela TMN ao preço de 55$00 por minuto mais IVA, alegadamente acordado com a OPTIMUS, e invocou também ter cedido à então PTC (hoje MEO) parte substancial desses créditos; Nessa acção a OPTIMUS contestou dizendo que esse acordo era inexistente nunca tendo sido celebrado qualquer acordo relativamente ao preço aplicável aos serviços de interligação entre elas (tráfego de voz) a partir de 1 de Janeiro de 2001; A OPTIMUS pediu também a intervenção da PTC, ora MEO, para efeitos desse pedido reconvencional (o que foi deferido), para que pudesse ser oposta a esta última, como cessionária dos créditos, a inaplicabilidade do preço de 55$00 por minuto relativamente aos serviços de interligação prestados pela TMN à OPTIMUS em 2001.

    O Tribunal da M..., concordando com a OPTIMUS quanto ao facto de as partes não terem acordado relativamente ao preço dos serviços de interligação para 2001, mas, porque haviam sido invocados pela TMN, na acção, créditos emergentes dessa prestação de serviços, julgou necessário averiguar se, por aplicação dos critérios supletivos legais, poderia determinar o preço e assim dar resposta à pretensão da TMN.

    Depois de concluir pela inexistência de um acordo entre a TMN e a OPTIMUS quanto aos preços aplicáveis ao serviço de interligação de voz, em 2001, o Tribunal da M... entendeu que ainda havia uma “última questão a decidir”, que se prendia “com a aplicabilidade ou não aos autos da disposição legal constante do art. 1158/2 CC, por via do art. 1156 do CC”.

    O Tribunal da M... considerou que não havia lugar à aplicação de tais critérios porque, no caso, competia à ANACOM a fixação do preço, conforme previsto na lei e porque isso havia sido pedido a essa entidade pela OPTIMUS; Assim, o caso julgado formado no Proc. 723/2001 abrange a questão da competência da ANACOM para a determinação dos créditos.

    Tal foi, aliás, confirmado pelo STJ no Acórdão, de 20.01.2010, que confirmou a decisão.

    A apreciação que foi feita no Proc. 723/2001 relativamente aos poderes da ANACOM para fixar o preço dos serviços de interligação integrou a própria parte decisória da sentença ali proferida, de indeferimento do pedido ali deduzido pela TMN; Daqui se conclui abrangida pelo caso julgado formado na acção da M... a questão de pertencer à ANACOM o poder de determinar a contrapartida que pudesse ser devida pela prestação dos serviços de interligação entre a TMN e a OPTIMUS relativos ao ano de 2001; A apreciação que dessa questão foi feita na acção que correu termos no Tribunal da M... integra a parte dispositiva da sentença: os créditos invocados pela TMN na acção não foram reconhecidos e a OPTIMUS não foi condenada a pagá-los não só porque não havia acordo quanto ao preço mas também porque o Tribunal decidiu que competia à ANACOM determinar esse mesmo preço.

    Por outro lado, correu termos pela Instância Central Cível de ..., J-..., o processo 524/10.1... relativamente à fixação do preço dos serviços de interligação. Tratou-se de acção proposta pela NOS, então SONAECOM, contra a MEO, então PTC, com vista ao pagamento dos Créditos PTC (os créditos da OPTIMUS sobre a PTC relativos à prestação de serviços de interligação entre ambas essas empresas, que tinham sido objecto de declarações de compensação por parte da PTC que a OPTIMUS sempre reputou de ineficazes por assentarem em cessões de alegados créditos da TMN sobre a OPTIMUS que esta não reconhecia, pelo menos como créditos determinados).

    Na contestação que apresentou nesse Proc. 524/10.1..., a MEO invocou que as cessões de créditos e as subsequentes compensações eram válidos e eficazes porque os créditos existiam e resultavam da aplicação aos serviços de interligação prestados pela TMN de um preço de 55$00 por minuto, sendo que deveria ser esse o preço aplicável fosse por força do princípio da não discriminação a que a TMN estava sujeita fosse por aplicação dos critérios estabelecidos no art. 1158 CC.

    A sentença proferida no Proc. 524/10.1... pronunciou-se expressamente sobre os efeitos do caso julgado formado no Proc. 723/2001, relativamente à fixação do preço dos serviços de interligação entre a TMN e a OPTIMUS.

    Aí se afirma que esse caso julgado vincula a MEO e a NOS porque ambas foram partes nessa primeira acção, na qual a MEO interveio, a requerimento da então OPTIMUS, para que lhe pudesse ser posteriormente oposta a inexistência de um acordo entre a TMN e a OPTIMUS de fixação do preço de interligação dos serviços de voz entre elas relativos ao ano de 2001, e isto porque haviam sido cedidos créditos, pela TMN à PTC, referentes à prestação desses serviços Nessa decisão e tendo em conta que o efeito do caso julgado se reporta não somente à parte decisória da sentença mas também à decisão das questões preliminares que sejam antecedente lógico indispensável à emissão daquela, entendeu não haver lugar a nova discussão sobre a questão da fixação do preço da prestação dos referidos serviços de interligação por referência aos critérios do art. 1158 CC, pois ficou estabelecido que, na ausência de acordo entre a TMN e a OPTIMUS, competia à ANACOM a fixação desses preços para 2001.

    Em sede de recurso o acórdão da Relação de ... que decidiu essa apelação aderiu inteiramente ao decidido em Primeira Instância sobre a matéria, afirmando que “a decisão proferida no âmbito do Processo que correu termos na M... sob o n° 723/2001 (...) constitui caso julgado não só no que se reporta à parte decisória da sentença, mas também à decisão daquelas questões preliminares que foram antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado, nomeadamente no que se reporta à fixação do preço dos serviços prestados por recurso às normas do C.C., mormente as constantes do art. 1158, por se entender que na ausência de acordo, competia à Anacom a fixação dos preços de interligação no serviço de voz para vigorar entre as partes no ano de 2001”.

    Assim, não restam dúvidas de que ambas as instâncias, nesse Processo 524/10.1..., se consideraram vinculadas pelo decidido no Processo 723/2001 relativamente ao facto de pertencer à ANACOM o poder de definir o preço dos serviços de interligação relativo a 2001.

    Destarte, é indisputável ter ficado definitivamente decidido nas acções anteriores, com efeitos de caso julgado material, que a competência para fixar o preço dos serviços de interligação de voz entre a TMN e a OPTIMUS relativos a 2001 pertence à ANACOM e não aos Tribunais - tal ficou decidido nos procs. 723/2001 e 524/10.1..., decisões transitadas em julgado.

  3. Foi proferido saneador-sentença onde pode ler-se, entre outras coisas: “Em face do exposto, conjugando as decisões judiciais com a decisão da ANACOM resulta que já está decidido com autoridade de caso julgado que: a) a competência para a fixação do preço dos serviços de interligação entre a TMN e a OPTIMUS relativos a 2001 pertence à ANACOM, e não aos Tribunais; b) os Tribunais deferiram essa competência à ANACOM e esta aceitou-a c) A MEO requereu a intervenção da ANACOM para resolução do litígio relativo à fixação do preço de interligação, que a rejeitou por extemporânea (…).

    Por tudo o que se deixou exposto, julga-se a excepção de autoridade de caso julgado procedente por provada e, consequentemente, absolve-se a Ré da instância. Cfr. arts.577º, al. i) 580º, 581º e 576º, nº2, do CPCivil”1.

  4. Inconformada, apelou a MEO, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa decidido, nos termos do dispositivo do Acórdão: “Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, consequentemente, confirma-se a decisão”.

    O Acórdão foi tirado com um voto de vencido e com a seguinte declaração de voto: “Sob pena de a autoridade do caso julgado se transformar num polvo, «simultaneamente tudo querendo abraçar e lançando uma tinta negra que não deixa ver os contornos» (José Lebre de Freitas, «Um polvo...

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