Acórdão nº 01247/23.7BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução11 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida no processo com o n.º 1247/23.7BEPRT Recorrente: AA Recorrido: Administração Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 O acima identificado Recorrente, não se conformando com a sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou improcedente a reclamação judicial que intentou, ao abrigo do disposto no art. 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do órgão da execução fiscal que lhe indeferiu, por intempestividade, o pedido de dispensa de prestação de garantia formulado no âmbito de processo de execução fiscal que, instaurado contra uma sociedade, reverteu contra ele, na qualidade de responsável subsidiário, interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo.

1.2 Apresentou alegações, com conclusões do seguinte teor: «I. Questão decidenda a. O presente recurso tem por objecto a sentença do Tribunal a quo que julgou improcedente a reclamação do acto do órgão de execução fiscal apresentada com o propósito de obter a anulação da decisão de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia; b. A questão decidenda consiste em saber se os prazos previstos nos ns.º 1 e 2 do artigo 170.º do CPPT, em especial e para o que aqui importa, o prazo de trinta dias [(Pensamos tratar-se de lapso: o prazo fixado no n.º 1 do art. 170.º do CPPT é de 15 dias.

)] previsto no n.º 1 do artigo 170.º do CPPT constitui um prazo preclusivo ou meramente ordenador e, deste modo, se decorrido esse prazo o contribuinte pode requerer ou não a dispensa da prestação de garantia; II. Direito c. O Recorrente reitera tudo o que alegou em sede de petição inicial da sua reclamação do acto do órgão de execução fiscal, para onde remete e dá aqui por inteiramente reproduzido; d. O entendimento do Tribunal a quo funda-se na (i) letra da lei que usa a expressão «deve» para supostamente marcar o tempo para a prática do acto, (ii) na natureza urgente do processo de execução fiscal e (iii) no prazo curto de dez dias que o órgão de execução fiscal tem para decidir os pedidos de dispensa da prestação de garantia (artigo 170.º, n.º 4 do CPPT); e. Ora, o verbo «dever» nem sempre é empregue com o sentido preclusivo, onde a inobservância do prazo previsto implica necessariamente a impossibilidade de praticar o acto; f. Também não vemos de que forma o carácter meramente ordenador dos prazos aqui em causa podem prejudicar a celeridade da execução fiscal e colocar em causa a cobrança coerciva da dívida e a protecção dos créditos tributários; g. Se o sujeito passivo não foi suficientemente diligente para requerer a dispensa da prestação de garantia, necessariamente suportará as medidas de cobrança coerciva sobre o seu património (caso exista); h. Não nos podemos esquecer que o direito à dispensa da prestação de garantia constitui uma importante limitação ao princípio solve et repete previsto no n.º 3 do artigo 9.º da LGT; i. O sistema fiscal português não adoptou integralmente o princípio solve et repete e, como tal, admite que o sujeito passivo obtenha o efeito suspensivo da execução fiscal mediante a contestação da dívida e a prestação da garantia ou a sua dispensa, procurando evitar, assim, uma real e provisória amputação do património do sujeito passivo ou prejuízos irreparáveis na sua esfera, até que esteja definitivamente assente a legalidade da dívida tributária; j. Não discutimos a urgência do processo de execução fiscal e as suas razões subjacentes, mas as finalidades pretendidas com tal urgência não ficam frustradas se se admitir o pedido da dispensa da prestação de garantia para além dos prazos aí previstos, pois a execução fiscal só fica provisoriamente suspensa durante o decurso desses prazos e nunca depois; k. Após o decurso dos mesmos, a AT deve iniciar as diligências coercivas, como determinam o n.º 8 do artigo 169.º do CPPT e o n.º 1 do artigo 215.º do CPPT; l. O prazo previsto no n.º 1 do artigo 170.º do CPPT não deve ser considerado como preclusivo, mas antes como meramente ordenador, porquanto (i) o pedido de dispensa de prestação de garantia é, na maioria das situações, apresentado muito antes do termo do prazo de quinze dias a contar da apresentação do meio de reacção para discutir a legalidade ou exigibilidade da dívida ou, (ii) em situações mais raras, verifica-se uma verdadeira impossibilidade de apresentar tal pedido no prazo de quinze dias a contar daquela apresentação; m. Assim sendo, podemos concluir que o prazo previsto no n.º 1 do artigo 170.º do CPPT tem natureza meramente ordenadora e, por conseguinte, o pedido de dispensa da prestação de garantia apresentado pelo Recorrente foi tempestivamente apresentado e a AT tinha o dever legal de decidir sobre o pedido; n. Deste modo, o recurso judicial aqui em causa deve ser julgado procedente, com todas as consequências legais, nomeadamente, a revogação da sentença recorrida e a anulação da decisão de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia aqui em causa; o. Sem prescindir, p. O Tribunal ad quem deve declarar a inconstitucionalidade dos ns.º 1 e 2 do artigo 170.º do CPPT, quando interpretadas no sentido de que o prazo aí previsto para apresentar o pedido de dispensa da prestação de garantia é preclusivo, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP) e do princípio da tutela jurisdicional efectiva (artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP); q. Sem prescindir, III. A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça r. Por mera cautela de patrocínio, o Recorrente vem, desde já, requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, porquanto se encontram preenchidos todos os requisitos para a sua dispensa previsto no n.º 7 do artigo 6.º do RCP; s. Se assim não se entender e sem prescindir, t. O Tribunal ad quem deve declarar a inconstitucionalidade, por violação do direito de acesso aos Tribunais consagrado no artigo 20.º da CRP, conjugado com o princípio da proporcionalidade decorrente do artigo 2.º e do n.º 2 do artigo 18.º, ambos da CRP, das normas contidas nos artigos 6.º e 11.º, ambos do RCP, conjugados com a Tabela anexa ao RCP, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao Tribunal reduzir o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em consideração, designadamente, o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido; u. O Tribunal ad quem deve, assim, dispensar o pagamento de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP e segundo o princípio da proporcionalidade e o princípio da igualdade.

Pedido: Nestes termos e nos mais de Direito que Vs. Exas. doutamente não deixarão de suprir, o recurso judicial aqui em causa deve ser julgado procedente, com todas as consequências legais, nomeadamente, a revogação da sentença recorrida e a anulação da decisão de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia aqui em causa, bem como deve ser dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça. Pois só assim se fará inteira e sã JUSTIÇA!».

1.3 A AT não contra-alegou o recurso.

1.4 O Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso e mantida a sentença recorrida. Isto, após enunciar os termos do recurso e as questões a dirimir, com a seguinte fundamentação: «[…]

  1. Prazo do n.º 1 artigo 170.º, do CPPT 4. O n.º 1 do artigo 170.º (Dispensa da prestação de garantia) dispõe: “Quando a garantia possa ser dispensada nos termos previstos na lei, deve o executado requerer a dispensa ao órgão da execução fiscal no prazo de 15 dias [o Rcte. alude a 30 dias, mas será lapso] a contar da apresentação de meio de reacção previsto no artigo anterior”.

    1. A questão do tipo de prazo assim consagrado na lei deve ser resolvida tal como fez a douta sentença recorrida (n.ºs III e IV) sufragando os fundamentos e o sentido do douto acórdão do STA-2.ª Secção, de 7 de Dezembro de 2022, tirado no processo n.º 02064/21.4BEBRG. Ou seja, o prazo de 15 dias ali previsto é preclusivo, pelo que «Nada autoriza a interpretação da lei no sentido de que o executado pode pedir a todo o tempo a dispensa da prestação da garantia (…)»1 [1 http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/65999512e3bd3e4a80258916004a90bd?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1].

    2. Assim, aqui e agora, convirão apenas alguns argumentos corroborativos, tirados dos critérios hermenêuticos estabelecidos na lei e consagrados no costume judiciário, e que aliás já se encontram, explícita ou implicitamente, contemplados naquele douto precedente jurisprudencial, para refutação dos argumentos segundo a quinto da douta alegação (o primeiro é tirado de espécies jurisprudenciais que, cremos, estão prejudicados com a ulterior doutrina do processo n.º 02064/21.4BEBRG).

    3. Quanto à letra da lei, na previsão legal consta o termo “deve”, mas não estará em causa o sentido de dever jurídico, pois naturalmente não há aqui uma norma imperativa, cuja infracção constitua ilícito jurídico, mas antes um ónus, estabelecido por uma norma técnica, cuja inobservância determina a perda de uma vantagem.

      Portanto, um ónus, estabelecido em favor do interessado, que se resolve nesta alternativa típica: a observância pontual do mesmo constituirá o órgão da execução fiscal no dever jurídico de examinar a pretensão de dispensa da prestação de garantia; a inobservância do mesmo não constitui um ilícito jurídico, mas uma situação desvantajosa para a o interessado, no caso justamente a extinção do poder de pedir dispensa da prestação de garantia.

    4. Por outra parte, ainda segundo a letra e o sistema da lei, o n.º 2 do preceito legal em causa dispõe: “Caso o fundamento da dispensa da garantia seja superveniente ao termo daquele prazo, deve a dispensa ser requerida no prazo de 30 dias...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT