Acórdão nº 01074/22.9BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução11 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – A..., S.A., melhor identificada nos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 28 de fevereiro de 2023, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida na sequência da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a autoliquidação de Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético (CESE) n.º ...01, referente ao ano 2021, no montante de € 3 995 383,48.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: i) O presente processo de Impugnação Judicial tem por objeto o ato de autoliquidação de CESE n.º ...01, referente ao ano de 2021, no montante de € 3.995.383,48 (três milhões, novecentos e noventa e cinco mil, trezentos e oitenta e três euros e quarenta e oito cêntimos) e, ainda, o Despacho da Exma. Senhora Diretora da Divisão de Justiça Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes, datado de 18 de março de 2022, o qual indeferiu a Reclamação Graciosa deduzida pela ora IMPUGNANTE contra o ato de autoliquidação de CESE (cf. Documentos n.os 1 e 2 juntos à Petição Inicial); ii) A criação da CESE não teve só como objetivo garantir a sustentabilidade sistémica do sector energético, mas também, e cada vez mais evidente, angariar receita para o cumprimento das metas traçadas no programa de assistência financeira, assim onerando especialmente o sector energético, conforme resulta do Relatório de Orçamento do Estado para 2014 (ano de criação da CESE); iii) Destaca-se a ideia de que a lista das entidades isentas de CESE é, porventura, mais extensa do que a lista de entidades sujeitas a CESE, o que levanta questões relacionadas com a violação do princípio da capacidade contributiva e da igualdade fiscal; iv) Ficou demonstrado que a CESE foi criada com o objetivo de arrecadar receita para fazer face à necessidade de consolidação das contas públicas, através da oneração particular das empresas do sector energético e o FSSSE foi criado com vista a assegurar o equilíbrio do sector energético, através do financiamento de políticas de cariz social e ambiental e, também, por forma a reduzir a dívida tarifária do Sistema Elétrico Nacional; v) Até à data, e volvidos nove anos desde a criação da CESE, não existe, ainda, a adoção de uma única política de cariz social e ambiental do sector energético, pelo que, mesmo deste ponto de vista, não existe qualquer cumprimento do objetivo inicialmente traçado para a CESE; vi) Com exceção dos valores cobrados a título de CESE, os quais foram afetos ao FSSSE apenas em 2016 (vide página 110 do Relatório do Orçamento do Estado para 2016, disponíveis em www.dgo.pt), e das receitas resultantes da cobrança de ISP, a partir de 2018, todas as restantes receitas são eventuais não se conhecendo, efetivamente, se alguma vez as mesmas foram obtidas pelo FSSSE; vii) Em face do que antecede, constata-se que, na sua génese, a CESE foi introduzida com um (pretenso) carácter temporário, com vista, não só ao financiamento de políticas de sustentabilidade do sector energético e ao financiamento do défice tarifário, mas também, e principalmente, com o fim de contribuir para o equilíbrio das contas públicas, incidindo sobre os ativos fixos tangíveis líquidos, os ativos intangíveis (com exceção da propriedade industrial) e os ativos financeiros, desde que afetos a concessões ou atividades licenciadas; viii) No seu cômputo global, em 2020, os montantes pagos a título de CESE representam um incremento de cerca de 65% nos montantes pagos pela IMPUGNANTE, a título de impostos e outras prestações de carácter coativo; ix) A CESE não é uma contribuição financeira, uma vez que: (i) não incide sobre um grupo homogéneo de sujeitos passivos, (ii) não existe uma conexão entre a obrigação tributária e as finalidades prosseguidas pela mesma e (iii) não existe uma correspondência entre o encargo suportado e o benefício obtido; x) Não existe uma efetiva correspondência, na exata medida em que a Administração pública não prestará qualquer serviço ou realizará qualquer atividade em benefício das empresas do sector energético sujeitas a CESE, nem se pode afirmar que as empresas do sector energético presumivelmente beneficiarão de eventuais verbas que sejam pagas para garantir a sustentabilidade sistémica do sector energético, além de que várias outras empresas atuantes no sector energético suscetíveis de provocar a referida rutura estão isentas de CESE; xi) Não se compreende, pois, como apenas algumas empresas do sector estão sujeitas a CESE, quando, teoricamente, todas elas seriam suscetíveis de provocar os referidos custos ou beneficiar indevidamente de eventuais prestações. Tal só confirma que não existe efetiva bilateralidade entre a Administração pública e as empresas do sector energético, já que há sujeitos isentos que, alegadamente, também contribuíram para o crescimento do défice tarifário no sector energético, mas não estão sujeitos ao pagamento da (pretensa) contraprestação pelo custo que provocaram, ou benefício, que daí obtiveram; xii) Embora se reconheça a necessidade de a receita gerada pela cobrança de certos tributos – os impostos, nomeadamente – ser utilizada para equilibrar as contas públicas, gerais do Estado, não se pode daí retirar a existência de uma troca entre a Administração pública e as empresas do sector energético, que gere um benefício para essas empresas; xiii) Não só não se verifica qualquer fundamento legitimador do extensíssimo rol de isenções, como também não se pode admitir estarmos perante um grupo homogéneo de sujeitos passivos, porquanto uma grande e considerável parte das empresas que integram o sector estão isentas, sem que exista, pelo menos aparentemente, um racional subjacente; xiv) Não existe, assim, qualquer relação causal entre as finalidades que a CESE (pretensamente) visa atingir e a obrigação tributária exigida aos seus sujeitos passivos; xv) A CESE não se destina a financiar despesas associadas a certos serviços públicos, mas, sim, a financiar as despesas públicas em geral, pois o pagamento da dívida, ou défice tarifário, e a garantia da sustentabilidade sistémica do sector energético, bem como a necessidade de equilíbrio das contas públicas são da responsabilidade do Estado, em geral e aproveitam a todos os cidadãos; xvi) Descarta-se a afirmação segundo o qual a CESE foi criada para financiar “despesas associadas a certos serviços públicos, por cuja execução são directamente responsáveis determinadas entidades públicas”, porquanto, não só não existe, neste caso, qualquer prestação de um serviço público, como a responsabilidade pelas (pretensas) despesas que se visa compensar não são da responsabilidade de determinadas entidades públicas, mas, sim, de todo o Estado, amplamente considerado; xvii) A CESE não pode ser considerada como “taxa”, uma vez que não existe qualquer equivalência entre um qualquer serviço (ainda que hipotético) prestado pelo beneficiário e um suposto benefício ou custo, aproveitado ou causado, pelos sujeitos passivos; xviii) A CESE deve ser considerada um verdadeiro “Imposto”, uma vez que possui as características de um imposto, tendo em conta que não se dirige à compensação de uma qualquer prestação pública e os supostos objetivos de financiamento das políticas públicas de energia e de redução de dívida tarifária irão beneficiar toda a sociedade portuguesa, e não, apenas, algumas das entidades que atuam no mercado energético português, que a suportam; xix) Os beneficiários da CESE não são os seus sujeitos passivos, algumas entidades que atuam no sector energético –, mas, sim, o Estado, em geral, e, em última análise, os consumidores; xx) As entidades oneradas com a CESE são entidades que não beneficiam, diretamente, com as finalidades do FSSSE, o que só vem corroborar a tese sustentada pela IMPUGNANTE de que a CESE prossegue finalidades de carácter geral, associadas às características dos impostos; xxi) Não existe qualquer conexão entre o facto tributário – a mera detenção de ativos pelas entidades do sector energético, sujeitas a CESE – e a atividade financiada – equilíbrio das contas públicas, garantia da sustentabilidade sistémica do sector energético, políticas públicas sociais e ambientais do sector energético (entre as quais a promoção da eficiência energética) e a diminuição da dívida tarifária, concluindo-se, assim, pela inexistência de sinalagma e pela natureza jurídica da CESE como verdadeiro imposto; xxii) O Acórdão do...

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