Acórdão nº 063/23.0BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Outubro de 2023

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução11 de Outubro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – O INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, IP, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 9 de maio de 2023, que julgou procedente a reclamação judicial deduzida por AA, melhor identificado nos autos, contra o despacho da Coordenadora da Secção de Processos Executivos de Leiria do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) que considerou não prescrita a dívida em cobrança coerciva nos processos de execução fiscal n.º ...41 e apensos, ...40 e apensos e ...07 e apensos, anulando o acto reclamado e julgando prescritas as dívidas.

O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou a ação totalmente procedente, determinando a anulação do ato reclamado: o despacho do Coordenador da Secção de Processo de Leiria do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. que considerou não prescrita, divida em cobrança coerciva nos PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL N.º ...41 e apensos, ...40 e apensos e ...07 e apensos, revertidos contra o reclamante AA, titular NIF ..., instaurados originariamente contra A... LDA.

  1. A sentença, que se pronunciou relativamente à decisão de não se encontrarem prescritas as dividas relativas às contribuições e cotizações do período de abril de 2010 a fevereiro de 2012, considerou que o despacho reclamado padece de violação da lei, pelo que determinou a sua anulação.

  2. Concretizando: o prazo prescricional iniciou a sua contagem em 21.03.2012 tendo-se suspendido em 05.11.2014, data em que o reclamante foi declarado insolvente (processo 123/14.9TBAVZ que correu termos no Tribunal Judicial de Alvaiázere), quando já tinham decorrido 2 anos, 7 meses e 15 dias do prazo prescricional.

  3. O prazo em causa manteve-se suspenso até ao encerramento do processo de insolvência em 27.12.2017 (e não até ao final do período de cessão, é a posição do I.G.F.S.S., I.P.), data em que retomou a sua contagem, (faltando decorrer 2 anos, 4 meses e 15 dias do prazo prescricional).

  4. Contudo, com o devido respeito, não pode o IGFSS, IP conformar-se com tal entendimento.

  5. Considera o Recorrente que a sentença padece do vício de erro de julgamento, por o tribunal “a quo” ter feito uma incorreta aplicação da lei aos factos apurados, uma vez que por efeitos declaração de insolvência do revertido/reclamante e do consequente período de cessão, os processos executivos ficaram suspensos entre 16 de outubro de 2014 e 12 de abril de 2022 e não apenas até 27 de dezembro de 2017.

  6. A suspensão dos processos determinou a suspensão dos prazos de prescrição, determinado a não prescrição dos valores em divida compreendidos no período de abril de 2010 e fevereiro de 2012.

  7. A suspensão dos processos de execução durante o período de cessão encontra-se determinada no artigo 242º do CIRE: “Não são permitidas quaisquer execuções sobre os bens do devedor destinadas à satisfação dos créditos sobre a insolvência, durante o período de cessão”.

  8. Se não são permitidas execuções durante o período de cessão, significa que os processos se encontram suspensos durante este período, pelo que o decurso do prazo de prescrição – por maioria de razão – também se encontra suspenso.

  9. O regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.

  10. Aliás, como pode a Administração Fiscal tomar atitudes que impeçam a prescrição da divida, se os processos se encontram suspensos durante todo o período em que foi concedido o benefício de exoneração do passivo restante (pelo menos 3 anos).

  11. A suspensão dos processos executivos determina a suspensão dos prazos de prescrição.

    Nestes termos, e nos que mais V. Exc.ªs doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, e consequentemente revogada o Sentença recorrida, mantendo-se o conteúdo do despacho reclamado, com o que se fará a necessária e costumada JUSTIÇA 2 – Contra-alegou o recorrido, concluindo nos seguintes termos: A.

    Salvo o merecido respeito, a argumentação expendida nas alegações recursivas deduzidas pelo Recorrente afigura-se vaga, genérica e conclusiva, na medida em que não mobiliza disposições legais (ou mesmo doutrinais e jurisprudenciais) que permitam extrair a conclusão em que se parece alicerçar o recurso interposto.

    B.

    Alega o Recorrente que o Tribunal a quo “errou na interpretação conferida ao artigo 100.º do CIRE”, embora tal não tenha sido levado às conclusões do recurso, que, como sabemos, delimitam o objecto do mesmo, o que se alega para todos os efeitos legais.

    C.

    Nesta senda, considera o recurso que a douta sentença recorrida (sic) “padece do vício de erro de julgamento, por o tribunal a quo ter feito uma incorreta aplicação da lei aos factos apurados, uma vez que por efeitos da declaração de insolvência do revertido/reclamante e do consequente período de cessão, os processos executivos ficaram suspensos entre 16 de outubro de 2014 e 12 de abril de 2022 e não apenas até 27 de dezembro de 2017”, limitando-se a referir que “a suspensão dos processos de execução durante o período de cessão encontra-se determinada no artigo 242.º do CIRE (...)”. — cfr. recurso a fls...

    D.

    Referindo, uma vez mais, tão-só que que “Se não são permitidas execuções durante o período de cessão, significa que os processos se encontram suspensos durante este período, pelo que o decurso do prazo de prescrição – por maioria de razão – também se encontra suspenso.” — cfr. recurso a fls...

    1. As disposições legais mobilizadas pelo ora Recorrente não permitem – e, diga-se em abono da verdade, nem outra solução legal poderia equacionar-se – concluir que o período de cessão decorrente da exoneração do passivo restante determina a suspensão dos prazos de prescrição. Bem pelo contrário, aliás... Vejamos: F.

      Nos termos do artigo 233.º, n.º 1, alínea a) do CIRE (“efeitos do encerramento”): "Encerrado o processo, e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 217.º quanto aos concretos efeitos imediatos da decisão de homologação do plano de insolvência:

      1. Cessam todos os efeitos que resultam da declaração de insolvência (...)”, entre os quais se encontra, sem margem para dúvidas, a suspensão do prazo de prescrição determinada pela declaração de insolvência.

    2. Leitura que se compagina e resulta expressamente da redação do artigo 100.º do CIRE, nos termos do qual: “A sentença de declaração da insolvência determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pelo devedor, durante o decurso do processo.” H.

      Solução que, além de emergir expressamente das sobreditas disposições legais, sempre se imporia por mor da ratio subjacente ao instituto da prescrição no âmbito das dívidas tributárias, e bem assim dos princípios tributários que conformam o respetivo regime jurídico (mormente dos princípios da segurança jurídica e da legalidade fiscal – cfr. arts. 2.º, 18.º, 103.º e 165.º, n.º 1, al. i) da CRP).

      I.

      Destarte, bem andou – desmerecendo, por isso, qualquer reparo – o Tribunal a quo ao entender que a interpretação que o ora Recorrente pretende fazer valer “não é consentânea com o quadro legal, nomeadamente com o disposto no artigo 100.º do CIRE.” – cfr. decisão recorrida a fls...

      J.

      Devendo, por isso e nos termos da lei, considerar-se que, a partir do encerramento do processo de insolvência do revertido (recorde-se, em 27/12/2017), o efeito suspensivo da declaração de insolvência do revertido terminou.

      * K.

      Ademais, e para além de tudo quanto vimos de referir, não vislumbramos de que forma o artigo 242.º do CIRE possa consubstanciar um argumento a favor da posição sustentada pelo recorrente.

      L.

      Aliás, o Recorrente defende que a decisão levaria a situações inconcebíveis, esquecendo completamente que a prescrição é uma garantia (não do Estado, mas sim do particular - e uma das poucas (!), diga-se de passagem), que visa evitar que a dívida se eternize na esfera do particular.

    3. Diga-se mesmo: é a tese sufragada pelo Recorrente que conduz a situações inconcebíveis à luz do conceito de Estado de direito democrático, pois que, caso o prazo de prescrição se mantivesse suspenso também depois de encerrado o processo de insolvência (leia-se, durante todo o período de cessão), o Estado seria protegido com uma surpreendente suspensão que, as mais das vezes, rondaria 8, 10 anos ou mais...

    4. Suspensão essa que, por um lado, não resulta da lei (violando, por isso, o princípio da legalidade, primacialmente) e, por outro lado, que conduziria a uma eternização da dívida e da possibilidade de o mesmo ser perseguido pelo mesmo Estado que cria as leis (violando, assim, o princípio da segurança jurídica).— cfr. artigos 2.º, 18.º, 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, al. i), todos da CRP.

    5. A este propósito traremos à colação o douto acórdão do TCA Norte, onde se pode ler: «Na verdade, embora não sejamos insensíveis ao facto de que, durante os cinco anos designados por “período de cessão”, apesar de estar encerrado o processo de insolvência da pessoa individual que tenha...

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