Acórdão nº 2646/21.4T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Setembro de 2023
Magistrado Responsável | MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA |
Data da Resolução | 21 de Setembro de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório AA e mulher, BB, instauraram acção declarativa, sob a forma comum, contra, CC, alegando, em síntese, que são donos e legítimos possuidores da fracção descrita no art. 1.º da p.i., situada no ... andar, que adquiriram através de um contrato de compra e venda, descrito na Conservatória do Registo Predial e inscrito em seu nome, sendo a R. dona da fracção descrita no art. 11º da p. i., localizada no ... direito, e que ambas as fracções integram o prédio urbano constituído em propriedade horizontal.
Invocou que a R. colocou vasos e outros objectos no seu logradouro que invadem o caminho de acesso dos AA. à sua garagem e à sua habitação, tendo no logradouro traseiro, construído uma churrasqueira que produz odores e fumo que enegrecem e sujam a fachada do prédio e penetram na fracção dos AA., prejudicando a sua saúde e do seu agregado familiar e causam danos nas paredes, tecto e mobília da casa dos AA.
Referiu, ainda, que a cobertura das garagens de AA. e R. é comum e, por falta de manutenção e conservação, por recusa da R. em participar nas obras necessárias, está a permitir a entrada nas garagens de água da chuva, o que causou fissuras e sinais de apodrecimento no tecto e nas paredes.
Por outro lado, alegou que o portão de acesso às garagens é comum aos AA. e à R. e que a R. o deixa aberto quando o utiliza, colocando a fracção dos AA. exposta ao perigo de entrada de terceiros.
Por último, invocou que a R. invadiu o logradouro dos AA. e cortou, arrancou e danificou as hortaliças e legumes que eles cultivam, imputando à conduta da R. a causa dos danos não patrimoniais sofridos.
Concluem pedindo que: a-) Seja declarado e reconhecido o direito de propriedade dos AA. sobre a fracção autónoma descrita no artigo 1.º; b-) Seja a Ré condenada a reconhecer o dito direito de propriedade dos AA. e a abster-se da prática de todos e quaisquer actos que turbem ou atentem contra o mesmo; c-) Seja a Ré condenada a retirar os vasos, plantas flores e outros objectos supra descritos sob o artigo 15.º, de modo que o caminho de acesso dos AA. para a sua garagem e habitação fique totalmente livre e desimpedida; d-) Seja a Ré condenada a demolir a churrasqueira e o anexo supra descritos no artigo 16.º, ou, quando assim não se entenda, a abster-se de utilizar aquelas instalações para confecção de alimentos e refeições e, em qualquer caso, de ali desenvolver actividade produtora de cheiros e fumos, sob cominação de sanção pecuniária compulsória no montante de €250,00 por cada violação daquela sua obrigação; e-) Seja a Ré condenada a colaborar com os AA. na realização das obras necessárias à conservação e impermeabilização da cobertura das garagens, de modo que para o seu interior deixem de entrar as águas pluviais, suportando a sua quota parte de responsabilidade no custo das mesmas, sob pena de cominação de sanção pecuniária compulsória no montante de €250,00 por cada dia de violação daquela sua obrigação; f-) Seja a Ré condenada a fechar o portão comum de acesso às garagens, supra descrito no artigo 21.º, sempre que proceda à sua abertura, o que deve fazer de imediato, sob pena de cominação de sanção pecuniária compulsória no montante de €250,00 por cada violação daquela sua obrigação; g-) Seja a Ré condenada a abster-se de entrar e permanecer no logradouro dos AA. sem autorização destes e de, por qualquer forma, danificar os produtos que estes ali cultivam, sob pena de cominação de sanção pecuniária compulsória no montante de €250,00 por cada violação daquela sua obrigação; e ainda h-) Seja a Ré condenada a pagar aos AA., a título de compensação pelos danos não patrimoniais causados, a quantia de €3.000,00, sendo €1.500,00 para cada Autor.
*Regularmente citada, contestou a R., impugnando os factos alegados pelos AA.
*Foi dispensada a audiência prévia e proferido despacho a enunciar o objecto do litigio e a fixar os temas da prova.
*Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, consequentemente, declarou e reconheceu o direito de propriedade dos AA. sobre a fracção autónoma identificada na alínea A) dos factos provados, absolvendo a R. dos demais pedidos formulados.
*II-Objecto do recurso Não se conformando com a decisão proferida, vieram os AA. AA e esposa, interpor recurso, juntando, para o efeito, as suas alegações, e apresentando, a final, as seguintes conclusões:
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Ao abrigo do artigo 644º, nº 1 al. a) do CPC vem a presente apelação interposta da douta sentença de fls. que julgou improcedente a acção; b) Sufraga o Tribunal “a quo” que não se verifica ou não resultou provado a violação do direito de propriedade, do direito de personalidade dos AA. e ainda da existência de danos não patrimoniais; c) Porém, entendem os apelantes que face ao alegado nos Autos, às questões colocadas e à prova produzida, o Tribunal “a quo” decidiu erradamente, tendo incorrido em erro de julgamento da matéria de facto e em erro de direito; d) Ante a prova produzida mostra-se errada a decisão quanto ao facto provado sob a alínea Q) e ainda quanto aos factos não provados sob os pontos 1., 2., 3., 4., 5., 6., 7., 10., 11. e 12.., pois o facto inserto sob aquela alínea, deveria ter sido julgado como “não provado” e os factos insertos sob estes pontos, deveriam ter sido julgados como “provados”; e)Na verdade, dos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pelos AA., designadamente DD, que foi ouvida em audiência de julgamento em 29/09/2022, cujo depoimento encontra-se gravado em sistema digital áudio das11:27:00 às 12:11:09 h, e ainda das testemunhas, EE, com depoimento prestado em 21/10/2022, gravado em sistema digital áudio das 9:47:49 às 10:13:15.h e FF, prestado em 21/10/20222, cujo depoimento se encontra gravado no sistema digital áudio em uso no tribunal, das 10:14:04 às 10:29:53h, supra transcritos quanto a cada uma das matérias ou factos versados naqueles pontos 1, 2., 3., 4., 5., 6., 7., 10., 11. e 12 dos factos não provados e daquela alínea Q), dos factos provados, cuja alteração os apelantes propugnam, que por economia e brevidade se dão aqui por integralmente reproduzidos, também do depoimento de parte da Ré e do auto de inspecção judicial, impõe-se a alteração da matéria de facto; f) Ademais, os factos provados sob as alíneas J), K), L) e P), impunham uma decisão diversa, no sentido de existir quer a violação do direito de propriedade, na medida em que é manifesto o uso de um espaço comum pela R. e não consentido pelos AA., quer ainda a violação do direito de personalidade dos AA., ante a inequívoca entrada de fumo e cheiros na sua fracção autónoma, por acção da R., com a utilização da churrasqueira, que não se encontra edificada em condições e de acordo com a legislação em vigor, pois além de não possuir o afastamento imposto legalmente também não possui qualquer mecanismo e ou estrutura capaz de dirigir o fumo e cheiros produzidos, para além dos vãos existentes na habitação dos apelantes; g)Sendo manifesto que a decisão do Tribunal “a quo”, apesar de ter constatado o facto e este resultar quer da inspecção judicial quer do depoimento das testemunhas e do depoimento de parte da Ré, , ignorou a violação das disposições legais – artigo 113.º e 114.º do RGEU, não se tendo sequer pronunciado ou aludido às mesmas; h)Sendo que, o uso da churrasqueira edificada naquelas condições, emite fumos e cheiros que invadem a habitação dos AA., determinado ou impedindo o uso normal da habitação, o que confere o direito de oposição dos AA. aquela acção ilícita desenvolvida pela R., nos termos do disposto no artigo 1346.º do C.C.., pois estão em causa os seus direitos de propriedade e o direito de personalidade; i) Ademais, verifica-se no entendimento dos apelantes que, as acções e omissões da responsabilidade da R., no que concerne á ocupação de espaço comum, à não realização de obras de reparação e conservação em infraestrutura comum das fracções, atentam contra as regras da propriedade horizontal, regime ao qual estão sujeitas as fracções de AA. e R.
j)Relativamente ao facto inserto sob a alínea Q) dos factos provados, é errada a fundamentação “que da fotografia inserida no auto da inspecção judicial, não há sinais de uma utilização anormal da mesma e nem de um uso intensivo (…)” k)Porém, da prova produzida em audiência de julgamento, a que supra se aludiu e se mostra transcrita, resulta uma utilização frequente e excessiva, o que determina a produção de fumos e cheiros que invadem a habitação dos apelantes, prejudicando-os, pois priva-os da utilização normal da sua habitação e afecta o seu bem-estar.
l) Além disso, da fundamentação aduzida pelo Tribunal “a quo” quanto ao uso da churrasqueira. Na verdade, contrariamente à sustentação documental para a resposta a este quesito, não é válido, pois a inspecção judicial foi feita num momento em que a churrasqueira estava inactiva e em que a R. teve o cuidado de proceder à sua limpeza, pois sabia de forma antecipada que o Tribunal se iria ali deslocar, e, nessa circunstância, a normalidade é de que a churrasqueira não revelasse os fumos e os cheiros e até a intensidade do seu uso. Assim, qualquer fotografia da churrasqueira, naquele momento, em que a R. havia procedido à limpeza e remoção de detritos, nunca poderia evidenciar a realidade da utilização excessiva, pois essa é evidenciada e sentida quando a churrasqueira está activa; m) Pelo que, com o devido respeito, a partir da fotografia não se pode concluir como o Tribunal “a quo” concluiu nesta matéria; n) É de salientar que os fumos e os cheiros provenientes da churrasqueira, atingem uma maior gravidade e são potenciadores das incomodidades sentidas, pelo facto da churrasqueira não estar construída com o afastamento legalmente imposto, pois como resulta dos depoimentos das testemunhas, do depoimento de parte da Ré e ainda da inspecção judicial realizada, esta dista a apenas 5 metros da habitação dos apelantes, quando a...
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