Acórdão nº 01747/22.6T8GRD.S1 de Tribunal dos Conflitos, 27 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução27 de Setembro de 2023
EmissorTribunal dos Conflitos

Acordam, no Tribunal dos Conflitos: 1.

Em 15 de Dezembro de 2017, AA instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco uma acção administrativa comum, contra a Câmara Municipal do Sabugal, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 24.282,34, a título de restituição da “quantia indevidamente locupletada nos termos do art. 37.º, n.º 1, al. m), do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e art. 473.º, n.º 2, do Código Civil”, acrescida de juros à taxa legal e supletiva em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para o efeito, e em síntese, alegou ter sido celebrado um contrato de empreitada entre A..., Lda, e a Câmara Municipal do Sabugal; que, no âmbito desse contrato e para garantia da sua boa execução, A..., Lda, constituiu uma garantia bancária junto do Banco Comercial Português, S.A., tendo a autora assumido a posição de avalista; que veio tomar conhecimento de que o Banco Comercial Português, S.A., tinha executado a garantia; que ela, autora, “procedeu ao pagamento da garantia accionada”; todavia, que, quando a garantia fora accionada, já tinha decorrido o prazo dessa mesma garantia; que houve portanto enriquecimento sem causa por parte da ré.

O Município do Sabugal contestou, excepcionando, além do mais, a ilegitimidade activa e passiva e impugnando os factos. Concluiu pela procedência das excepções ou pela improcedência da ação.

A autora apresentou réplica, pugnando pela não verificação das excepções invocadas.

Por despacho de 15 de Abril de 2021, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco suscitou a excepção da incompetência material da jurisdição administrativa para a causa, oferecendo o contraditório às partes. Em seu entender, “pese embora seja invocado um contrato de empreitada de obra pública celebrado entre o R. e a sociedade A..., Lda (no âmbito do qual a A. não figura, aliás, como parte), o dissenso que anima os autos não brota da interpretação e/ou cumprimento desse contrato, mas antes do acionamento pelo R. (indevido, por extemporâneo, na perspectiva da A.) da garantia bancária ‘on first demand’ prestada pelo Banco Comercial Português por ordem visada sociedade (no âmbito da qual a A. se assumiu como ‘avalista’ e cujos efeitos extravasam esse contrato), accionamento esse que, alegadamente, provocou o locupletamento do R. à custa do património da A.”.

Tratando-se de garantias que são “figuras de direito privado (…) absolutamente autónomas em relação ao contrato-base e estribadas no princípio da liberdade contratual”, os Tribunais Administrativos não são competentes para conhecer da acção.

Notificadas as partes, a autora requereu a realização de diligências necessárias à remessa dos autos para os Tribunais Comuns e o réu pronunciou-se pela competência da jurisdição administrativa.

Por despacho saneador-sentença de 31 de Outubro de 2022, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, atribuindo a competência à jurisdição comum, julgou-se incompetente, em razão da matéria, e absolveu o réu da instância, nos termos constantes do despacho atrás parcialmente transcrito, por não estar em causa uma relação jurídica administrativa.

A requerimento da autora, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco determinou a remessa dos autos para o Tribunal Judicial da Comarca da Guarda.

Por decisão de 21 de Março de 2023, o Tribunal Judicial da Comarca da Guarda – Juízo Local Cível da Guarda – Juiz 2, julgou-se materialmente incompetente, em razão da matéria, para a apreciação da causa, por ser da competência da jurisdição administrativa, e absolveu o réu da instância.

Para o efeito, afirmou que a relação material controvertida, tal como foi configurada pela autora, não se prende exclusivamente com a apreciação civilista do aval prestado, ou com a sua natureza e/ou extensão no caso concreto. Contrariamente, visa-se aqui – precisamente – discutir os fundamentos da quantia que foi exigida por intermédio desse mesmo aval, encetando-se um necessário e profundo debate relativo à obra propriamente dita e ao respetivo enquadramento legal e contratual.

Concluiu que, havendo lugar à interpretação e/ou à análise do cumprimento ou incumprimento do contrato de empreitada celebrado entre...

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