Acórdão nº 0104/14.2BEMDL-A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução28 de Setembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1. RELATÓRIO AA, e mulher BB, CC e mulher DD, EE e mulher FF, GG e filhas HH e II, devidamente identificados nos autos, intentaram junto do TAF de Mirandela (TAF), contra o Município de Mirandela, ao abrigo do artº 162º, do CPTA, execução, onde pediram que fosse dada execução integral ao Acórdão de 3/6/2014, que havia julgado parcialmente procedente o processo cautelar, condenando o referido Município “a realizar, por si ou por intermédio de empresa com habilitações técnicas para o efeito, a monotorização das estruturas e do talude para verificar se os movimentos estão ou não estabilizados e a elaboração e execução de um plano de intervenção temporária, de modo a evitar o desabamento dos edifícios e de acordo com os resultados do estudo feito”, *O TAF de Mirandela por decisão datada de 24 de Janeiro de 2018 julgou procedente a presente execução e, em consequência, condenou o executado a, no prazo de 120 dias, “proceder à execução de trabalhos que garantam: " i) que o aterro impede os movimentos de deslizamento para Norte do Lote ...7 e o deslizamento na zona Sul do Lote ...5 para Este; ii) que o aterro assegura rigidez e adequado suporte ao talude superior que suporta os edifícios, impedindo a deformação do maciço deslizante quando solicitado; iii) resistência mecânica às sapatas dos alçados posteriores (nomeadamente as de canto), de forma a evitar o seu eventual descalçamento; iv) a protecção do pilar NE do Lote ...7 (…); v) o reforço e/ou contenção do solo, particularmente na zona em que se localiza o pilar NF do Lote ...7 (...)”.

*Em 5 de Julho de 2018, os exequentes, alegaram que a referida sentença não fora devidamente executada, pelo que pediram que “o Tribunal adopte as providências executivas que se tornem necessárias ao cumprimento integral da sentença exequenda nomeadamente a aplicação da sanção pecuniária compulsória e a instauração do respectivo procedimento criminal por crime de desobediência qualificada”.

*Em 23 de Janeiro de 2023, foi proferido despacho que julgou improcedente este incidente, absolvendo-se o executado do pedido condenatório formulado pelos exequentes.

*Os exequentes apelaram para o TCA-Norte, o qual, por Acórdão de 05/05/2023, decidiu “negar provimento ao recurso, embora com fundamentação diferente (designadamente quanto à questão do cumprimento do julgado que se considera incumprido)”.

*É desta decisão que o Município de Mirandela, inconformado, vem interpor o presente recurso de revista, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: «1ª O presente recurso de revista foi interposto contra o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 5 de Maio de 2023, sendo restrito ao segmento em que considera haver um incumprimento do julgado exequendo.

  1. Por força do disposto no artº 671º/3 do CPC, e uma vez que foi aduzida fundamentação diferente, é admissível o presente recurso de revista contra o acórdão do TCANORTE no segmento em que considerou que o julgado exequendo estava incumprido.

    Para além disso, 3ª Estão igualmente preenchidos os pressupostos tipificados no artº 150º do CPTA para a admissão do recurso de revista, uma vez que a decisão consubstanciada no Acórdão em recurso suscita duas questões que carecem em absoluto da revista para uma melhor aplicação do direito e possuem, pelo menos a segunda, uma inegável capacidade expansiva e, por contender com a tutela cautelar, enorme importância jurídica, Na verdade, 4ª Ambas as questões colocadas na revista são absolutamente necessárias para assegurar uma melhor correcta aplicação do direito, desde logo por ser claramente absurdo e errado que um tribunal confirme uma decisão da 1ª instância que considerou que o julgado exequendo de natureza cautelar estava cumprido (e por isso não decretou qualquer providência executiva, como lhe havia sido solicitado) quando toda a sua fundamentação e conclusão são no sentido de considerar o julgado exequendo incumprido.

  2. Acresce que, pelo menos a segunda questão colocada na revista possuiu igualmente uma inegável capacidade expansiva, justamente por se poder voltar a colocar em todas as inúmeras providências cautelares, onde naturalmente se discutirá a sua instrumentalidade e provisoriedade e, portanto, se poderá questionar se tal tutela cautelar apenas é compatível com medidas e soluções provisórias e reversíveis ou se, pelo contrário, em sede cautelar também podem e devem ser impostas medidas e soluções definitivas.

  3. Para além de estarem preenchidos os pressupostos para a admissibilidade da revista, julga-se que o aresto em recurso enferma das nulidades previstas nas alíneas c e d) do nº 1 do artº 615º do CPC, seja por haver uma absoluta contradição entre os fundamentos factuais dados por provados (v. o facto constante do ponto nº 60 e aquele que agora foi aditado no ponto nº 65), seja por haver uma contradição entre a factologia assente e a decisão alcançada (a factologia assente comprova que não há qualquer outra medida provisória e cautelar a adoptar e o aresto em recurso considera incumprido o julgado exequendo, mas confirma a decisão da 1ª instância que entendeu estar cumprido tal julgado e não intimou o Município a fazer qualquer outro trabalho ou obra), seja por se ter, inclusive, pronunciado sobre uma matéria que não fora sequer alegada pelas partes nem conhecida pelo tribunal de 1ª instância.

    Para além disso, 7ª Ao considerar que o julgado exequendo estava incumprido por competir ao Município efectuar as obras independentemente de estas terem um carácter provisório ou definitivo, o acórdão em recurso incorreu em notório erro de julgamento, violando frontalmente o artº 364º do CPC e o carácter instrumental e provisório da tutela cautelar, uma vez que não só estava provado que o Município fez tudo o que provisoriamente se poderia fazer e que agora só são possíveis medidas definitivas (v. pontos 60 e 63 da factologia assente), como seguramente a instrumentalidade e provisoriedade da tutela cautelar determinam que a “…providência cautelar não pode fazer antecipar, a título definitivo, a constituição ou reconhecimento de situações que só a decisão a proferir no processo principal pode determinar a título definitivo…” (v. Ac. do TCA Sul de 209/1/2006, proc. nº 727/06.3BEPRT-A. e, no mesmo sentido, AROSO DE ALMEIDA, Manual de Processo Administrativo, 2016, 2ª Ed., pág. 451 e, no mesmo sentido, ISABEL CELESTE FONSECA, Suspensão da Expropriação da Quinta dos Milagres, CJA, nº 30, pág. 49), razão pela qual jamais poderia o aresto em recurso considerar como não cumprido o aresto exequendo quando estava provado que agora só se poderiam tomar medidas de carácter definitivo.»*Os recorridos contra-alegaram, formulando as seguintes conclusões: «1.

    A intervenção do STA no âmbito de um recurso excecional de revista só pode considerar-se justificada em matérias de assinalável relevância e complexidade, sob pena de se desvirtuarem os fins tidos em vista pelo legislador com esse recurso.

    1. Não estão preenchidos os pressupostos previstos no artigo 150º CPTA, os quais fazem depender a admissibilidade do recurso de revista, de questões que, pela sua relevância jurídica ou social, se revistam de importância fundamental, ou se a admissão do recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, cumprindo ao recorrente alegar e demonstrar que se verificam os referidos requisitos de admissibilidade da revista.

    2. Ora, o aqui Recorrente centra o objeto da revista em questões novas, não discutidas no presente recurso interposto para o Tribunal Central Administrativo, a saber:

      1. Pode o Tribunal de 2.ª Instancia confirmar a sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instancia, embora com uma fundamentação diferente? b) Em sede de tutela cautelar, e por força da instrumentalidade e provisoriedade da mesma, podem ser impostas medidas e soluções definitivas e imodificáveis ou apenas medidas provisórias e reversíveis? 4.

      Assim, não podem ser objeto de revista questões que o Central Tribunal Administrativo não tenha tratado (cfr. art. 150º, nº 1, do CPTA) 5.

      Desde logo, as questões apreciadas pelo Tribunal a quo foram a de saber se o aqui Recorrente, Município de Mirandela, não cumpriu com a decisão jurisdicional de 24/01/2018, e aferir se devem todos ou alguns titulares do órgão responsável pelo cumprimento daqueles ser condenados em sanção pecuniária compulsória.

    3. Sucede que, as questões em controvérsia nos autos, não preenchem tais requisitos, uma vez que não existem questões jurídicas de elevada complexidade ou a necessidade de corrigir qualquer manifesto erro na aplicação do direito, até por a decisão do recurso estar em plena conformidade com a lei e com a posição jurisprudencial dominante.

    4. Para além disso, é por demais inegável que não há qualquer razão para se proceder a uma melhor aplicação do direito, uma vez que se tem por certo que as decisões proferidas pelos Tribunais são para cumprir.

    5. O Acórdão em recurso não é ambíguo e contraditório, pois ao negar provimento ao recurso, nega-o apenas com uma fundamentação diferente do Tribunal de 1ª Instancia, ou seja, não condena os titulares do órgão responsável pelo cumprimento do acórdão tutelar e, subsequentemente, pela sentença proferida nestes autos de execução, em sanção pecuniária compulsória, porque não existe culpa dos titulares da Câmara Municipal de Mirandela no não cumprimento da decisão, embora considerem incumprido o julgado.

    6. O Acórdão em recurso não enferma de quaisquer nulidades e efetuou uma correta interpretação do direito aplicável, não havendo qualquer violação da lei substantiva ou processual que justifique a procedência da revista.

    7. Em todo o caso, ainda que por mera hipótese se viesse a entender estarem preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso de revista, sempre seria manifesto que o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo do Norte não enferma de qualquer erro...

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