Acórdão nº 30/21.9T8LRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução12 de Setembro de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

* Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 04.01.2021, AA instaurou a presente ação declarativa comum contra BB, pedindo que seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 199 605,50, correspondente a metade do montante despendido pelo A. e melhor descrito na petição inicial (p. i.), bem como metade de todas as prestações mensais e respetivos seguros e encargos associados relativas aos financiamentos identificados nos art.ºs 13 e 17 da p. i. e imposto municipal sobre o imóvel identificado em 9 da p. i. que o A. venha a liquidar enquanto os imóveis objeto dos presentes autos se mantiverem em compropriedade.

Alegou, em síntese: em .../.../2002, A. e Ré contraíram entre si casamento civil, no Brasil, sem convenção antenupcial; em .../.../2017, o casamento foi registado por transcrição na Conservatória do Registo Civil ..., não precedida do processo preliminar de publicações perante a autoridade portuguesa, pelo que o casamento considera-se contraído sob o regime imperativo da separação de bens[1]; em meados do ano 2005, A. e Ré tomaram a decisão conjunta de vir morar para Portugal; em 17.8.2006, A. e Ré compraram o prédio urbano mencionado nos art.ºs 9 e 22 da p. i. e contraíram os contratos de mútuo bancário aludidos nos art.ºs 13 e 17 da p. i. para aquisição desse prédio, que destinaram a habitação própria e permanente (do casal), ficando devedores das quantias mutuadas, respetivos juros e demais encargos contratualmente previstos[2]; a titularidade do direito de propriedade sobre o aludido prédio encontra-se inscrita a favor de A. e Ré[3]; apesar de ter sido combinado entre as partes que o pagamento de todas as obrigações pecuniárias emergentes dos mencionados empréstimos seriam suportadas na proporção de metade para A. e Ré, porém, até à presente data, vêm sendo suportadas exclusivamente pelo A.; a Ré, sendo ainda comproprietária do imóvel e mutuária nos aludidos empréstimos, nunca comparticipou no pagamento do imóvel, sendo assim devedora da quantia indicada no art.º 60º da p. i.; a Ré, na qualidade de comproprietária (na proporção de metade), é responsável pelo pagamento de metade do valor dos encargos que o A. vem pagando relativos a tal prédio; o valor aqui reclamado, também é devido a título de enriquecimento sem causa, que residualmente se invoca.

A Ré contestou, alegando, nomeadamente, por exceção, que na constância do casamento o procedimento de vida e aquisição de património pelos cônjuges foi, invariavelmente, o de quem está casado sob o regime de bens da comunhão de adquiridos; pelo menos desde .../.../2017, data em que colheu a certidão de casamento que utilizou para instruir a ação de divórcio, que o A. sabe que o casamento celebrado entre si e a Ré foi averbado em Portugal sob o regime imperativo da separação de bens, pelo que toda e qualquer obrigação de restituição a título de enriquecimento sem causa se encontra prescrita; acresce que prescrevem no prazo de cinco anos quaisquer prestações periodicamente renováveis, com a especial acuidade das prestações reclamadas pelo A. serem deste tipo.

[4] Concluiu pela improcedência da ação, por não provada, e a procedência da matéria de exceção.

Deduziu pedido reconvencional.

Subsidiariamente, a haver consentimento do A. nesse sentido, pediu que seja declarada extinta a compropriedade por renúncia da Ré, com liberação total da mesma de todas e quaisquer responsabilidades, despesas e ou encargos concernentes à coisa comum (bancários, fiscais, etc.), em causa na ação, pretéritos, atuais e futuros.

O A. replicou, pronunciando-se quanto à reconvenção.

Na sequência do despacho de 28.10.2022, o A. manteve o alegado na p. i. e concluiu pela improcedência da exceção da prescrição, alegando que paga (duas) prestações com periodicidade mensal à entidade bancária, que prescrevem no prazo de cinco anos (art.º 310º, alínea g), do CC).

No despacho saneador (de 08.3.2023), o Mm.º Juiz do Tribunal a quo admitiu a reconvenção “quanto ao pedido formulado na alínea c) já que o mesmo emerge de facto jurídico que serve de fundamento à defesa (alínea a) do n.º 1 do art.º 266º do CPC), e bem assim a R. pretende um valor que excede aquele que o A. pretende (alínea c) do n.º 1 do mesmo diploma)” e não admitiu “o pedido reconvencional deduzido na alínea d)”, porquanto “só por acordo entre A. e R. e através da competente escritura ou documento semelhante poderá operar o mesmo”.

Relativamente à matéria de exceção, decidiu: «Prescrição do enriquecimento sem causa.

Em sede de petição inicial o A. reclama da R. determinados montantes, invocando para tanto não só o regime de compropriedade de um imóvel, mas igualmente o enriquecimento sem causa. / Em sede de contestação a R. invoca a prescrição do eventual direito do A. baseado em tal enriquecimento. / O A. não se pronunciou sobre a prescrição sobre a enriquecimento sem causa.

Apreciando: Quanto à matéria atinente ao enriquecimento sem causa não ocorreu a prescrição. / Dispõe o artigo 473º do CC que: “1. Aquele que, sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou. 2. A obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou”.

Por seu turno refere-nos o artigo 482º do CC que: “O direito à restituição por enriquecimento prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do enriquecimento”.

O prazo de prescrição ordinária ainda não ocorreu. / E o mesmo se diga em relação ao prazo de três anos indicado no supra-citado artigo. / É que este só começa a correr a partir da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável. / E este momento no caso concreto é o da data do divórcio, a saber 13.02.2020.

“Como é sabido, as relações pessoais e patrimoniais entre os cônjuges cessam pela dissolução do casamento, conforme disposto no artigo 1688º do CC. / O termo da relação conjugal, com a decretação do divórcio, funcionou, no caso, como evento gerador da perda da causa do enriquecimento do Réu à custa da deslocação...

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