Acórdão nº 01369/12.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução12 de Setembro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1.

A Fazenda Pública (Recorrente) notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a qual julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida por «X, S.A.» (Recorrida), contra as liquidações adicionais de IVA, relativas aos anos de 2008 a 2011, e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 463.711,91, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial, anulando os atos de liquidação adicional de IVA, dos anos de 2008 a 2011 (até 2011/07), bem como das liquidações dos respetivos juros compensatórios.

B. Os atos tributários controvertidos resultaram de uma ação inspetiva levada a efeito entre 11/10/2011 e 11/01/2012, cujo motivo foi a aplicação pelo sujeito passivo da taxa reduzida às prestações de serviços de reparação e manutenção de elevadores (verba 2.27 Lista I CIVA).

C. Na sequência do recurso interposto pela FP da primeira decisão proferida sobre esta mesma impugnação, ordenou o STA a suspensão dos autos, nos termos da parte final do artº 272º, nº 1 do CPC, até que fosse proferida decisão pelo TJUE, em processo respeitante a questão idêntica (processo nº 815/12.7BEPRT).

D. Conforme consta da douta sentença em análise, “[p]or acórdão de 05.05.2022, o TJUE decidiu o seguinte: «O anexo IV, ponto 2, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, deve ser interpretado no sentido de que os serviços de reparação e renovação de elevadores de imóveis afetos à habitação, excluindo os serviços de manutenção desses elevadores, são abrangidos pelo conceito de ‘reparação e renovação em residências particulares’, na aceção desta disposição»”.

E. Nesse sentido, decidiu o STA, no processo nº 1369/12.0BEPRT, por acórdão de 2022/09/07, “conceder provimento ao recurso” interposto pela FP, “revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos para a ampliação da matéria de facto, a aplicação do direito em conformidade com as orientações antes determinadas e o conhecimento das restantes questões que foram consideradas prejudicadas”.

F. Para tal, entendeu o STA que “[a] sentença recorrida considerou que os elevadores são parte integrante dos edifícios e que, por essa razão, a taxa reduzida de IVA há-de aplicar-se aos serviços de reparação e manutenção realizados ao abrigo de um contrato de empreitada e sempre que a taxa abranja apenas a mão-de-obra”.

§ “Com esta interpretação, a decisão recorrida afastou-se da interpretação da verba 2.24 do CIVA fixada pela AT no ofício-circular n.º 30036, de 4 de Abril”.

G. Continuando que, “[o] problema foi enquadrado pelo STA no processo n.º 0815/12.7BEPRT como um problema de interpretação normativa da verba 2.2.4 do CIVA (...) em conformidade com ponto 2 do anexo IV da Directiva IVA, ou seja, com a possibilidade de os Estados aplicarem taxas reduzidas do imposto nos termos do artigo 106.º da Directiva IVA a «obras de reparação e renovação em residências particulares» (...). Nessa medida, optou por um reenvio prejudicial”, sendo que, H. “[n]o acórdão que entretanto proferiu naquele processo (que no processo europeu assumiu o n.º C-218/21), o TJUE esclarece (...) [e]m suma: (...) que no âmbito normativo da taxa reduzida de IVA apenas podem estar incluídos serviços ocasionais de renovação e reparação de elevadores em prédios habitacionais (ou na percentagem correspondente dos mesmos em prédios mistos) e que aquela taxa reduzida nunca se pode aplicar a serviços de manutenção regular”.

I. Continuando que, “[e]m segundo lugar, o TJUE encarrega o STA de averiguar se mesmo no que respeita a serviços ocasionais de renovação e reparação de elevadores em prédios habitacionais, os mesmos se devem considerar excluídos do âmbito de aplicação daquela taxa reduzida por decisão do legislador nacional, i. e., por tal corresponder a um caso de aplicação selectiva da taxa reduzida com respeito pelo princípio da neutralidade. Ora, em relação a esta segunda questão, cabe concluir (...), que não estamos perante um caso de aplicação selectiva. (...) É que (...) a limpeza e a manutenção, por não terem um carácter ocasional, não integrariam, por natureza, o âmbito de aplicação da taxa reduzida, tal como nela igualmente se não integram os serviços de manutenção de elevadores”.

J. Concluiu o STA, “[e]m suma, e porque a matéria de facto assente não esclarece cabalmente se os ditos serviços de reparação e manutenção de elevadores que estão na origem dos actos de liquidação adicional tinham natureza ocasional (... taxa reduzida) ou regular (... taxa normal), impõe-se revogar a sentença e ordenar a baixa dos autos para que a matéria de facto seja complementada e o direito aplicado em conformidade com a orientação aqui determinada”.

K. Após baixa dos autos à 1ª instância e no seguimento de tal decisão, ordenou o Tribunal a quo a notificação da FP, para juntar aos autos “os documentos constantes do procedimento inspectivo, que serviram de suporte às conclusões constantes do relatório de inspecção tributária”, sendo que, uma vez juntos os elementos solicitados, foi proferida a sentença ora em crise, que considerou como assente, tão só, a factualidade elencada nos pontos 1. a 3. dos “Factos Provados”.

L. Para a fixação da matéria dada como provada a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo “baseou-se nos documentos constantes dos autos, bem como do processo administrativo”, considerando que as partes se limitaram a “esgrimir argumentos jurídicos”, não alegando factos relevantes suscetíveis de prova e decidindo, a final, pela procedência dos autos, ordenando a anulação das “liquidações de IVA e de juros compensatórios impugnadas”.

M. Considerou a douta sentença sob escrutínio que, “[a]nalisando o relatório de inspecção (...), vemos que os serviços de inspecção detectaram que a impugnante aplicava a taxa reduzida, relativamente a mão-de-obra, em todas as prestações de serviços de reparação e remodelação de elevadores, o que considerou contrário à lei por entender que a referida taxa não tinha aplicação nos serviços relativos a partes integrantes dos imóveis, como é o caso dos ascensores, pelo que corrigiram a taxa de IVA, passando a aplicar a taxa normal, em todas as facturas emitidas pela impugnante”.

N. Concluiu o Tribunal a quo que os SIT, “nas correcções efectuadas, não distinguiram as facturas referentes a reparações regulares daquelas relativas a reparações e remodelações ocasionais, como resulta do entendimento do TJUE” e que, “[a]nalisando os quadros relativos aos anos de 2008 a 2011, verifica-se que a AT agrupou as facturas relativas a “reparações” e “remodelações”, do Porto, Lisboa e Algarve e corrigiu a taxa, passando a tributar os serviços de mão-de-obra à taxa normal, sem cuidar de distinguir que tipo de reparações ou remodelações estava em causa: se regulares ou ocasionais. Nem, tão-pouco, distinguiu as prestações de serviços efectuadas em prédios habitacionais daquelas efectuadas em prédios destinados a outros fins, procedendo à repartição proporcional, como também refere o TJUE no acórdão citado”.

O. Continuou a sentença em análise que, “[n]a verdade, a AT classificou as prestações de serviços em «reparações» e «remodelações» e, se podemos considerar que as remodelações terão carácter ocasional, beneficiando da taxa reduzida, nada se sabe quanto às reparações, pois estas poderão consistir em meros serviços de manutenção regular ou, ao invés, traduzir verdadeiros serviços de restauro que também cumprem os critérios para a aplicação da taxa reduzida. Importaria que a AT tivesse procedido a uma discriminação mais fina, com recurso, não só à análise das facturas, mas também dos contratos subjacentes, orçamentos e propostas, os quais não constam do processo de evidência de trabalho”.

P. Considerou, ainda, a sentença sob recurso, que “a impugnante, na petição inicial, igualmente não alega quais as facturas que, obedecendo aos critérios avançados pelo TJUE, deveriam ser mantidas e quais as que deveriam ser objecto de correcção”.

§ “Aliás, nem tal questão foi abordada pelas partes, que se limitaram a apontar argumentos jurídicos, no sentido da interpretação por si preconizada quanto à aplicação da verba 2.24 a serviços prestados em elevadores”.

Q. Para concluir que, “[d]este modo, não constam do relatório de inspecção, nem foram alegados factos susceptíveis de permitir aferir quais as facturas que titulam prestações de serviços que cumprem os critérios mencionados no acórdão do TJUE” pelo que, “verificando-se a ausência de factos, no relatório de inspecção, que permitam averiguar quais as operações que podem ser tributadas à taxa reduzida e que tal ónus competia à AT, pois a ela cabia discriminar (e provar) quais as prestações de serviços efectuadas em edifícios habitacionais, com carácter ocasional, terá de proceder a pretensão da impugnante”.

R. Ressalvado o devido respeito com o que desta forma foi decidido, não se conforma a FP, sendo outro o seu entendimento, como se argumentará e concluirá.

S. Importa relevar que o procedimento inspetivo que deu origem às correções ora em crise, remonta ao ano de 2012, sendo que o Acórdão do TJUE, proferido no processo C-218/21, no âmbito de reenvio prejudicial, data de 05/05/2022, tendo a nova interpretação do ponto 2, do anexo IV, da Diretiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de novembro de 2006, a que se refere a verba 2.27 da Lista I anexa ao CIVA, consubstancia questão nova, que não se encontrava definida aquando da concretização das correções em causa nos autos.

T. Conforme consta do ponto 45 do Acórdão do TJUE, “embora em última análise incumba ao órgão jurisdicional de reenvio interpretar o direito nacional e (...), nada no texto da (...) verba 2.24 da lista I...

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