Acórdão nº 3136/22.3T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelPAULA DO PAÇO
Data da Resolução14 de Setembro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório AA intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra Serviço De Utilização Comum Dos Hospitais - SUCH, pedindo que o Réu seja condenado a pagar-lhe as seguintes quantias: a) € 3502,44, a título de lucros cessantes; b) € 185,85, a título de compensação por despesas não ressarcidas; c) € 919,12, por férias que deixou de poder beneficiar; d) € 5000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Mais peticionou a condenação do Réu no pagamento dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal.

Alegou, em breve síntese, que, no dia 29 de agosto de 2018, pelas 10h, quando exercia as funções de empregada de balcão de 2.ª, por conta do Réu, na cafetaria do Hospital de Faro, foi vítima de acidente de trabalho que deu origem ao processo de acidente de trabalho com o n.º 2214/20.8T8FAR – J1. Tal acidente consistiu num choque elétrico e o mesmo ficou a dever-se a culpa do Réu, que não observou as regras sobre higiene e segurança no trabalho, pois havia sido alertado para a necessidade de reparar a torradeira e para o potencial perigo que a mesma constituía, e não realizou, atempadamente, a sua reparação. Em consequência do referido evento, a Autora sofreu incapacidades já ressarcidas no processo de acidente de trabalho. Não obstante, sofreu perda patrimonial, porquanto a indemnização por ITA não contemplou toda a retribuição, tendo, por isso, visto os seus rendimentos diminuírem em montante que indicou. Por outro lado, durante o período em que não esteve a trabalhar, deviam ter-se vencido férias - 2019, 2020 e 2021 – que pretende que lhe sejam pagas. Acrescentou, também, que incorreu em despesas de deslocação, medicamentosas e de alimentação, que não lhe foram pagas, e que sofreu danos morais que devem ser ressarcidos.

Citado o Réu, realizou-se audiência de partes, na qual não foi possível obter uma solução conciliatória para o litígio.

O Réu contestou, arguindo a exceção de caso julgado, em virtude de ter corrido termos o processo por acidente de trabalho n.º 2214/20.8T8FAR, no qual só teve intervenção a seguradora para a qual tinha a responsabilidade infortunistica transferida, por o acidente não ter sido causado por si. Subsidiariamente, impugnou os factos e suscitou a litigância de má-fé da Autora, em virtude de, afirmando não ter recebido a remuneração de férias de 2019 a 2021, ter gozado as mesmas em 2019, 2021 e 2022.

Requereu, ainda, a intervenção principal da seguradora Generali – Companhia de Seguros, S.A.

Designada data para realização de audiência prévia, nesta diligência foi debatida a exceção invocada e foi exercido o contraditório quanto à litigância de má-fé.

Após, foi prolatada sentença, que julgou procedente a exceção dilatória de caso julgado e, em consequência, foi o Réu absolvido da instância.

Foi fixado o valor da causa em € 9.607,41.

-Inconformada com a sentença, a Autora veio interpor recurso para esta Relação, rematando as suas alegações com as conclusões que, seguidamente, se transcrevem: «

  1. A responsabilidade regra da entidade patronal quanto aos acidentes sofridos pelos trabalhadores é objetiva, sem embargo do recurso à responsabilidade subjetiva para todas as matérias não especialmente reguladas e, também, nos casos do art. 18.º desse diploma legal.

  2. Contudo, a Autora não teve, sequer, oportunidade de fazer a prova que lhe competia na medida em que a sentença proferida absolveu a Ré por considerar estar perante uma situação de caso julgado.

  3. Salvo melhor entendimento, a decisão proferida no âmbito do processo nº 2214/20.8T8FAR que correu os seus termos no J1 daquele mesmo Tribunal não constitui caso julgado.

  4. O conhecimento do caso julgado tem por finalidade evitar que a relação jurídica material, já definida por uma decisão com trânsito, possa vir a ser apreciada diferentemente por outra decisão, com ofensa da segurança jurídica.

  5. Dito isto, são requisitos do caso julgado, que existam uma mesma identidade quanto aos sujeitos, ao pedido e causa de pedir.

  6. É, pois, nesta matéria que divergimos do douto tribunal, já que, desde logo, esta ação não é idêntica à que se lhe antecedeu, não se verificando os requisitos para o caso julgado.

  7. Com efeito, há identidade de sujeitos quando as partes sejam portadoras do mesmo interesse substancial.

  8. Ora, no caso concreto a Ré não adotou qualquer posição nesse mesmo processo, não estando aqui em causa o interesse substancial que ali se pretendeu fazer valer.

  9. Salvo melhor entendimento, também quanto à identidade do pedido, o mesmo não se verifica, porquanto o que estava em causa no processo anterior era saber se tinha havido um acidente de trabalho e qual a consequência, nos termos legais, para a sinistrada sendo que aqui se pretende coisa diferente, nomeadamente saber se o acidente teve como causa a falta de respeito, por parte da entidade patronal, de obrigações próprias na garantia de segurança da autora, sua trabalhadora.

  10. Por fim, há identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas demandas procede do mesmo facto jurídico, requisito que também não se verifica.

  11. Ainda que subjacente num e noutro processo, esta ação visa um fim distinto e parte de um facto jurídico distinto, já aqui referido.

  12. Em suma, a relação ou situação jurídica material definida pela primeira decisão não ficará, na eventualidade de se obter aqui uma condenação ou uma absolvição do pedido, prejudicada nem será contrariada por esta segunda decisão.

  13. Não comportando, por isso, qualquer risco de vir a decidir de forma diferente do que já foi decidido e não será, igualmente, uma decisão inútil.

  14. Salvo melhor entendimento, desde que respeitado o prazo previsto no disposto no nº 1 do art. 179º da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, a presente ação é válida.

  15. Face ao exposto, deve a sentença ser revogado, prosseguindo o processo os seus normais trâmites.».

-O Réu contestou, pugnando pela improcedência da ação.

-A 1.ª instância admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos, conferindo-lhe efeito meramente devolutivo.

-Após a subida do processo à Relação, foi observado o disposto no n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer favorável à manutenção...

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