Acórdão nº 0501/08.2BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução13 de Setembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 501/08.2BEVIS Recorrente: AA Recorrida: Administração Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 O acima identificado Recorrente, notificado do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 14 de Março de 2023 (Não disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf.

) – que negou provimento ao recurso por ele interposto da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu julgou improcedente a impugnação judicial das liquidações adicionais de IVA dos anos de 2004, 2005 e 2006 e respectivos juros compensatórios – dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo ao abrigo do disposto no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Apresentou alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «1- Vem o recorrente apresentar o presente recurso de revista excepcional em virtude da decisão do Tribunal Central Administrativo Norte ter rejeitado o seu recurso sobre a matéria de facto fixada pela primeira instância, no tocante à decisão sobre a comercialização pelo sujeito passivo diversos veículos automóveis por, na decisão daquele Venerando Tribunal, o recorrente não ter cumprido o ónus a que estava obrigado pelo disposto no art. 640.º do CPC.

2- E, com tal fundamentação de não cumprimento pelo recorrente do referido ónus imposto pelo disposto no art. 640.º do CPC, ter concluído o TCAN pela improcedência do referido recurso apresentado sobre a matéria de facto.

3- Mas, o ora recorrente ao recorrer da decisão da primeira instância sobre a matéria de facto dada como provada, especificou os factos sobre os quais pretendia ver a decisão alterada, assim como os fundamentos, a concreta prova testemunhal ouvida e gravada em áudio, que transcreveu, a qual, em seu entender impunha decisão diferente para alguns negócios concretos atribuídos a si.

4-Tendo para o efeito indicado em concreto os veículos automóveis – marca e matrícula, cuja comercialização a 1.ª instância lhe havia atribuído e que o recorrente entendia deviam ter sido considerados como não comercializados por si, considerando os depoimentos que em concreto indicou e transcreveu e que em seu entender impunham, efectivamente, uma resposta negativa quanto a saber-se se aquele veículo foi ou não objecto de negócio por parte do sujeito passivo, 5- Assim fez no âmbito da respectiva motivação, bem como ao nível das conclusões finais apresentadas.

6- E, nos presentes autos a matéria de facto que está em causa está organizada desse modo: identificação dos veículos – marca e matrícula – cuja comercialização o Fisco entende que foram comercializados pelo sujeito passivo com as demais consequências, designadamente em IVA e o sujeito passivo entende que não.

7- Contudo, ainda assim, entendeu o Venerando Tribunal Central Administrativo do Norte, que o recorrente ao apresentar este recurso sobre a matéria de facto não cumpriu o ónus a seu cargo previsto no artigo 640.º do CPC, pois, diz, “impunha-se ao recorrente que, desse cumprimento ao art. 685.º-B do CPC, tivesse indicado os concretos pontos da matéria de facto que considerava incorrectamente julgados e os meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação realizada, que impunham uma decisão diversa daquela que consta da sentença, o que não fez”.

8- Mais acrescentando de seguida que, “Se bem entendemos as alegações de recurso, no que respeita à prova testemunhal, o Recorrente não indica o que pretende que se dê como provado ou não provado”, 9- E, em termos conclusivos, diz: “Pese embora o Recorrente nas conclusões transcreva parcialmente os depoimentos e identifique a gravação, não é suficiente para dar cumprimento ao artigo 685.º-B do CPC (640.º, n.ºs 1 e 2), pois deles não extrai qualquer consequência. Em síntese, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe um ónus de alegação rigoroso, que não se confunde com a manifestação de inconformismo com tal decisão, e cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa”.

10- E, por fim, concluindo como se conhecesse dos fundamentos do recurso, termina decidindo que “Destarte, improcede o erro do julgamento de facto”.

11- Mas, salvo o devido respeito por tal entendimento, esta decisão do Venerando Tribunal, a nosso ver, faz errada interpretação do alegado relativamente à matéria de facto identificada no recurso e viola o disposto no referido artigo 640.º do CPC, traduzindo uma interpretação desses dispositivo legal totalmente discricionária, num apelo ao formalismo puro, quando a justiça e a legislação actual reclamam mais pela verdade material.

12- Pois, o recorrente identificou os factos concretos que considerou incorrectamente julgados e as provas concretas, inclusive transcrevendo as partes dos depoimentos que invocou em seu favor, indicou que tais provas não podiam atribuir a transacção em causa ao recorrente, como são exemplos o depoimento de BB em relação ao veículo ..., matrícula ..-AZ-.., os de CC e de DD em relação ao veículo ... matrícula, ..-..-VT, ou o de EE sobre o veículo ... matrícula ..-..-ZH, o de FF sobre o veículo ... matrícula ..-..-XD, ou o de GG sobre o veículo ... matrícula ..-..-VG, pelo que, ainda assim, considerar-se que não cumpriu aquele ónus é, em seu entender, fazer uma exigência não sindicável, manifestamente desproporcional e sem qualquer razoabilidade em face de um direito de recurso, permitindo uma total discricionariedade na apreciação deste ónus e um completo esvaziamento desta possibilidade legal de recurso da matéria de facto.

13- Violando, pois, esta decisão de não conhecimento e consequente decisão de improcedência sem conhecimento dos fundamentos invocados, a previsão legal do artigo 640.º do CPC e consequentemente o direito de recurso que a mesma admite, 14- Questão esta de enorme importância no âmbito da aplicação do direito, seja em termos de possibilidade de obter uma segunda avaliação dos factos em discussão, seja em termos de previsibilidade no uso desse mesmo direito de recurso e seus requisitos.

15- A qual tem sido colocada muitas vezes em sede de Supremo Tribunal de Justiça por se entender, também aí, a necessidade de se assegurar um efectivo 2.º nível de jurisdição, e que a nosso ver, esta decisão do TCAN de não conhecimento dos fundamentos do recurso da matéria de facto interposto pelo recorrente não assegura.

16- E a esse respeito tem vindo o STJ a defender, assim como este Supremo Tribunal (como aconteceu no douto acórdão proferido em 03/11/2022 no proc. 0118/10.1BEPNF) conforme se pode ler no ponto I do respectivo sumário que “A inobservância dos...

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