Acórdão nº 20412/16.7T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2023

Data13 Setembro 2023
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça, I – relatório 1. AA1 instaurou acção declarativa de condenação com processo comum contra o Banco BIC Português, SA, pedindo a condenação da Ré a pagar à herança indivisa, aberta por óbito de BB, a quantia de €105.982,87, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação até integral pagamento.

Fundamentou a acção invocando essencialmente: - que o falecido BB foi cliente do Banco Português de Negócios (BPN), na agência de ..., como simples aforrador, aí mantendo uma conta de depósito a prazo; - ter aquele subscrito, em Outubro de 2004, seduzido pelos funcionários do banco, convencido de que se tratava de uma variante de um depósito a prazo, mas mais bem remunerado, duas Obrigações SLN 2004, no valor, cada uma, de €50.000,00, tendo, para o efeito, resgatado o depósito a prazo que ali detinha; - ter sido garantido ao referido BB o retorno das quantias investidas; - não ter sido restituído o montante investido na data do respectivo vencimento, ficando privado do mesmo; - se BB tivesse sido informado das características do produto, designadamente de que o capital não estava garantido, não teria feito tal subscrição.

  1. A Réu contestou, defendendo-se por excepção (invocando a ineptidão da petição, a ilegitimidade activa e a prescrição do direito do Autor) e por impugnação, concluindo pela improcedência da acção.

  2. Em resposta o Autor defendeu a improcedência das excepções.

  3. Foi proferido despacho convidando o Autor a fazer intervir os restantes herdeiros para prosseguirem os termos da acção, de harmonia com o artigo 311.º, do CPC, após o que CC e DD passaram a intervir nos autos.

  4. No saneador foi julgada improcedente a ineptidão da petição e relegado para final o conhecimento da prescrição. Foi fixado o objecto do litígio e os temas de prova.

  5. Realizado julgamento foi proferida sentença que julgou improcedente a acção.

  6. Os Autores interpuseram apelação impugnando a matéria de facto.

  7. O Tribunal da Relação de Lisboa, por maioria, proferiu acórdão que julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença.

  8. Inconformados os Autores interpuseram recurso de revista, concluindo nas suas alegações (transcrição): “A. A prolação do douto acórdão recorrido vai contra a jurisprudência constante e quase uniforme do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, pelo menos, desde 19/09/2017, bem como deste Colendo Tribunal.

    1. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa prolatou, entre muitos outros, desde 19/09/2017, um grande conjunto de acórdãos em sentido completamente oposto ao agora professado, em causas da mesma natureza e basicamente com os mesmos intervenientes.

    2. Também este Colendo Tribunal tem decidido em sentido literalmente oposto ao agora professado pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, nomeadamente, nos acórdãos de 25.10.2018 (José Manuel Bernardo Domingos), proferido no processo n.º 2581/16.8T8LRAC2.S1, de 18/09/2018 (Maria Olinda Garcia), proferido no âmbito do processo n.º 20.403/16.8T8LSB.L1.S1, de 18/09/2018 (Salreta Pereira), proferido no âmbito do processo n.º 20.329/16.5T8LSB.L1.S1, e de 26/03/2019 (Alexandre Reis), proferido no âmbito do processo n.º 2.259/17.5T8LRA.C1.S1.

    3. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa faz “tábua rasa” à violação do dever de informação pelo Banco réu, plenamente demonstrado e provado.

    4. Ainda que, em 2004, não se entrevisse o futuro financeiro da entidade emitente das obrigações dos autos, sempre seria de crucial importância que não tivesse sido prestada ao falecido pai do autor falsa informação sobre as ditas obrigações, nomeadamente, que as mesmas eram produtos seguros, equivalentes a um depósito a prazo, com risco igual ao do Banco e que poderiam ser resgatadas a qualquer altura, com o que apenas sofreria uma penalização nos juros.

    5. A representação, razoavelmente feita pelo falecido pai do autor, de que o produto financeiro era seguro, com risco igual ao do Banco réu, e que poderia ser resgatado a qualquer altura, resultou de falsa informação prestada pelo Banco réu, que violou o dever de informação leal e verdadeira, não correspondendo aos “ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência”, assinalados no n.º 1 do artigo 304.º do C.V.M..

    6. Ao contrário do entendido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, no caso dos autos, foi omitida relevante informação que os factos demonstraram ser crucial: o produto não era seguro, nem o Banco réu, ante a insolvência da SLN, reembolsou o falecido pai do autor, que perdeu o valor investido, o que exprime o prejuízo sofrido de €100.000,00.

    7. Quanto à responsabilização do Banco réu, na qualidade de intermediário financeiro, pela violação dos deveres de informação, incorreu o douto acórdão recorrido em manifesta e ostensiva contradição com o entendimento professado pela jurisprudência dos tribunais superiores.

      I. Numa situação de tipo obrigacional, a mera falta de informação do beneficiário responsabiliza, automaticamente, o obrigado. Na situação em apreço, para além da ilicitude e da culpa do réu, verifica-se também o nexo de causalidade adequada entre a atuação do réu e o não reembolso, na maturidade, do capital investido, ou seja, verifica-se a ilicitude, por violação do dever de informação, a culpa, que se presume e o nexo entre o facto e o dano, que também se considera abrangida pela presunção do n.º 1 do art. 799º do C. Civil.

    8. Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade. A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.

    9. A relação contratual obrigacional que se estabelece entre o cliente e o intermediário financeiro exige deste um elevado padrão de conduta, com lealdade e rigor informativo pré-contratual e contratual: informação completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, tendo em conta que, entre clientes não qualificados, a avaliação do risco não é tão informada quanto a contraparte.

      L. Na presença de um acordo entre o banqueiro e o seu cliente, a falta do resultado normativamente prefigurado implica presunções de culpa, de ilicitude e de causalidade. Assim, numa situação de tipo obrigacional, a mera falta de informação do beneficiário responsabiliza, automaticamente, o obrigado.

    10. Tendo o Banco réu violado o dever de prestar ao falecido pai do autor a informação completa, leal e diligente – que os seus deveres profissionais impunham – é ele responsável pela obrigação de indemnizar o prejuízo causado; não só o réu não ilidiu a presunção de culpa que sobre si impendia, nos termos do...

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