Acórdão nº 0400/15.1BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Setembro de 2023

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução07 de Setembro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção de contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1.

RELATÓRIO 1.1. (1) BB, (2) CC, (3) DD, (4) EE, (5) AA (6) FF, (7) GG, (8) HH, (9) II, (10) JJ, (11) KK, (12) LL, (13) MM, (14) NN, melhor identificados nos autos, intentaram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a presente ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO COM PEDIDO DE CONDENAÇÃO contra a ORDEM DOS NUTRICIONISTAS, com sede na Rua do Pinheiro Manso, 174, 4100-409 Porto, pedindo (i) a nulidade ou anulabilidade da deliberação, de 31-01-2015, da DIRECÇÃO DA ORDEM DOS NUTRICIONISTAS que decidiu pelo indeferimento do pedido de inscrição naquela Ordem de cada um dos Autores, (ii) bem como a condenação na inscrição dos mesmos, como seus membros.

1.2. Por decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, de 3 de Junho de 2020, a presente acção foi julgada improcedente e, em consequência, absolvida a Entidade Demandada dos pedidos formulados.

1.3. Os Autores apelaram para o Tribunal Central Administrativo Norte.

1.3.1. Por despacho de 24 de Abril de 2016 foi julgada extinta instância, relativamente à co-autora OO, por desistência do pedido.

1.3.2. Em 29 de Maio de 2020, foi proferido acórdão que concedeu provimento ao recurso e declarou a nulidade de cada um dos actos impugnados.

1.4. A ORDEM DOS NUTRICIONISTAS, inconformada com a decisão do TCA Norte interpôs o presente recurso de revista, tendo nas alegações formulado as seguintes conclusões (quanto ao mérito): “(…) H) Neste processo está em causa, tão-somente, a interpretação da alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas.

  1. A questão fundamental a analisar, e cuja resposta determinou o sucesso do presente processo em segunda instância, é apenas uma mas foi indevidamente analisada pela sentença em crise: se a licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar pela escola Superior de Educação Jean Piaget, em Viseu, se enquadra na habilitação exigida pela alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas.

  2. Como se verifica, o artigo 61.º do Estatuto estabelece, de forma taxativa, quais são as licenciaturas que permitem a inscrição na Ordem dos Nutricionistas – sendo manifesto que a licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar não tem enquadramento nesta disposição.

  3. Seguindo assim a interpretação histórica e teológica dos requisitos para o exercício da profissão.

  4. Já o artigo 61.º, n.º 2, do Estatuto, na sua versão original, referia que “Todos os que possuam os requisitos para o exercício da profissão na área das ciências da nutrição e ou dietética nos termos do número anterior e não estejam impedidos de a exercer, bem como aqueles que legalmente já exerçam essa profissão à data da criação da Ordem, têm direito à inscrição na Ordem”.

  5. Quando o legislador criou a Ordem dos Nutricionistas e passou a exigir determinadas licenciaturas para a inscrição nesta associação pública profissional, teve em consideração que, ao longo dos anos, diversos profissionais vinham exercendo a profissão de forma legalmente enquadrada, ainda que não tivessem as licenciaturas que o artigo 61.º da versão original do Estatuto veio impor.

  6. Começa o Tribunal a quo por defender que a licenciatura em questão enquadra-se nas Ciências da Nutrição e que as matérias lecionadas no curso são todas direcionadas para as ciências, concluindo assim que a Licenciatura Nutrição Humana, Social e Escolar pela escola Superior de Educação Jean Piaget, em Viseu, enquadra-se na habilitação exigida pela alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas.

  7. No entanto, destaca-se que a licenciatura em “Ciências da Nutrição” é o requisito para o ingresso na Carreira dos TSS, do Ramo de Nutrição, de acordo com o Decreto-Lei n.º 414/91, de 22 de outubro (regime legal da carreira dos Técnicos Superiores de Saúde dos serviços e estabelecimentos do Ministério da Saúde e da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa).

  8. Pelo que, até à data de constituição da Ordem, o único local onde a mesma era regulamentada – no Estado – sempre impediria os Recorridos de exercer por falta de título académico habilitante. Ou seja, os Recorridos, ao contrário do afirmado, nem sequer exerciam legalmente a profissão até á criação da Ordem dos Nutricionistas.

  9. Em suma, não é possível a inscrição de um licenciado em curso de Nutrição, Humana, Social e Escolar, por tal curso não poder ser enquadrado nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas.

  10. Considerou ainda o Tribunal Central Administrativo Norte que, da alínea a), do n.º 3, do artigo 2.º do Regulamento de Inscrição na Ordem dos Nutricionistas é ilegal, devido ao direito fundamental estabelecido no artigo 47.º da CRP, que estipula a liberdade de escolha da profissão.

  11. Traduzindo assim este o segundo vício no raciocínio do Tribunal a quo, o ato administrativo negativo, de não inscrição dos Recorridos na Ordem Recorrente, limita-se à falta de habilitação legal, pelo facto, de a Licenciatura Nutrição Humana, Social e Escolar pela escola Superior de Educação Jean Piaget, em Viseu, não ser considerada uma Ciência da Nutrição, com base na alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas.

  12. Veja-se, se não existisse qualquer norma que regulasse quem podia exercer – fora do contexto do serviço nacional de saúde ou do sistema de atribuição de carteiras aos dietistas – a profissão de nutricionista/dietista, a detenção da licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar era tão habilitante como qualquer outra, fosse Direito, Medicina, Arquitetura ou Psicologia.

  13. Termos em que o Tribunal Central Administrativo interpretou indevidamente o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, retirando conclusão contrária à que resulta da norma.» 1.5. O mandatário dos Autores (Dr. PP) renunciou aos ao mandato.

1.5.1. As autoras BB, EE, AA, GG E NN, constituíram novo mandatário e contra alegaram concluindo, quanto ao mérito: “(…) 2. Quanto ao mérito do recurso: H.

Uma decisão em sentido contrário à do TCA Norte, como a proferida pela primeira instância, seria profundamente injusta por impedir de forma desproporcional (artigo 18.º, n.º 2 da CRP) o acesso das Recorridas à profissão de nutricionista (artigo 47.º da CRP), sem justificação materialmente admissível para o efeito.

I.

O Tribunal a quo fez uma correta interpretação do artigo 61.º, n.º 1 alínea a) do Estatuto da Ordem dos Nutricionistas, na redação vigente à data dos pedidos de inscrição das Recorridas na Ordem dos Nutricionistas.

J.

A licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar, de que todas as Autoras/Recorridas são titulares, caracteriza-se, para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º da Lei n.º 51/2010, como uma licenciatura numa área das ciências da nutrição e ou dietética.

K.

Devendo a Ordem dos Nutricionistas aceitar a inscrição das Autoras/Recorridas.

L.

Pelo que, bem andou o Tribunal a quo ao revogar a sentença proferida pela primeira instância, declarando nulo cada um dos atos impugnados.

Sem conceder: M.

As Autoras/Recorridas ao terem frequentado a licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar, licenciatura essa aprovada nos termos legais, fizeram-no na legítima expectativa de vir a exercer a profissão de nutricionistas, pelo que o ato administrativo que indefere a inscrição na Ordem dos Nutricionistas viola o princípio da proteção da confiança ínsito no artigo 2.º da Constituição.» 1.5.2. Por despacho de 26 de Janeiro de 2021 foi suspensa a instância relativamente às Autoras DD e FF, uma vez que foram notificadas da renúncia do seu advogado e não constituíram novo mandatário.

1.6. O “recurso de revista” foi admitido por acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo, pela formação a que alude o nº 5 do artº 150º do CPTA, proferido em 25 de Fevereiro de 2021.

1.7. A Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, neste Supremo Tribunal, notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos artºs 146º, do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento à revista. Mantendo-se integralmente o douto acórdão recorrido.

1.8. A recorrente respondeu ao referido parecer mantendo a posição antes assumida.

1.9. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento da questão de saber se a “licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar, de que todas as Autoras/Recorridas são titulares, caracteriza-se, para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 61.º da Lei n.º 51/2010, como uma licenciatura numa área das ciências da nutrição e ou dietética”.

  1. FUNDAMENTAÇÃO 2.1.

    MATÉRIA DE FACTO O Acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto: 1) A primeira autora (BB), concluiu, em 6 de Outubro de 2011, o Curso de Licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar, na Escola Superior de Educação Jean Piaget de Almada – documento n.º ... junto com o requerimento inicial da providência cautelar apensa.

    2) Em 28/11/2014, requereu à Ordem dos Nutricionistas a sua inscrição como nutricionista – documento n.º ...2.

    3) Por ofício referência ...42, datado de 4/02/2015, foi-lhe comunicado que tal inscrição havia sido negada por deliberação da Direção de 31/01/2015, com o seguinte fundamento: “... a licenciatura que possui, não se tratando de licenciatura em Ciências da Nutrição, Dietética e Nutrição ou Dietética, e não sendo licenciatura que se enquadre na área das Ciências da Nutrição, não confere os requisitos necessários para inscrição da Ordem dos Nutricionistas, sendo-lhe, por conseguinte, vedado o exercício profissional como nutricionista ou como dietista” – documento n.º ...3.

    4) A segunda autora (CC), concluiu, em 10 de Fevereiro de 2010, o Curso de Licenciatura em Nutrição Humana, Social e Escolar, na Escola Superior de Educação Jean Piaget de Almada – documento n.º ...4.

    5) Em 28/11/2014, requereu à Ordem dos Nutricionistas a sua inscrição como...

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