Acórdão nº 00421/14.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução14 de Julho de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO [SCom01...], Lda. instaurou acção administrativa especial contra o Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, IP (IMTT, IP), ambos melhor identificados nos autos, formulando os seguintes pedidos:

  1. A declaração de nulidade e/ou inexistência do acto administrativo produzido, em 28.11.13, pelo Conselho Directivo do IMTT, IP, por violação do disposto na alínea d) do nº 2, do artº 133º do C.P.A.; ou, caso assim se não entenda, b) A anulação daquele mesmo acto administrativo, por vício de violação de lei, designadamente dos 3º, 5º, 6º, 6ºA, 9º, 100º, 107º, 124º, nº 1, al. a) e c) e 125º do CPA, 1º, 2º, 13º, 266º e 268º da CRP; c) A declaração de nulidade e/ou inexistência do acto administrativo proferido em 28.01.95, pelo Sr. Director-geral de Viação, ao abrigo do disposto na alínea d) do nº 2 do art. 133º do CPA, por o mesmo ofender gravemente o conteúdo essencial dos direitos fundamentais da Igualdade, da Justiça e da Boa-fé e os princípios gerais da legalidade, da justiça, da igualdade e da imparcialidade e da boa-fé, consagrados nos artºs 13º e nº 2 do 266º e 268º da CRP e nos 3º, 5º, 6º e 6º A do CPA; d) A declaração de nulidade e/ou inexistência do acto administrativo produzido, em 28.11.13, pelo Conselho Directivo do IMTT, IP, por violação do disposto na alínea d) do n° 2, do art° 133° do C.P.A.; ou, caso assim se não entenda, e) A anulação daquele mesmo acto administrativo, por vício de violação de lei, designadamente dos 3°, 5°, 6°, 6°A, 9°, 100°, 107°, 124°, n° 1, al. a) e c) e 125° do CPA, 1°, 2°, 13°, 266° e 268° da CRP; f) A declaração de nulidade e/ou inexistência do acto administrativo proferido em 28.01.95, pelo Sr. Director-geral de Viação, ao abrigo do disposto na alínea d) do n° 2 do art. 133° do CPA, por o mesmo ofender gravemente o conteúdo essencial dos direitos fundamentais da Igualdade, da Justiça e da Boa-fé e os princípios gerais da legalidade, da justiça, da igualdade e da imparcialidade e da boa-fé, consagrados nos art°s 13° e n° 2 do 266° e 268° da CRP e nos 3°, 5°, 6° e 6° A do CPA; Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção.

    Desta vem interposto recurso.

    Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: Quanto à falta de acatamento do acórdão do TCAN: A. A douta sentença ora recorrida surge em consequência do acórdão do TCAN, de 05/02/2021, que decidiu pela improcedência do caso julgado, tendo os autos baixado à primeira instância para apreciação dos vícios do ato impugnado, nomeadamente, falta de fundamentação, preterição da audiência prévia e violação do princípio da igualda.

    B. Pelo que, o Tribunal a quo teria de apreciar se o dever de fundamentação foi cumprido, a preterição da audiência prévia e a violação do princípio da igualdade - o que não sucedeu, não tendo aquele Tribunal acatado o acórdão do TCAN.

    C. Salvo melhor opinião, considerar inoperante o princípio da igualdade e reduzir a preterição da audiência prévia a uma formalidade não essencial, com o fundamento de que o acto não poderia ser outro, face ao acórdão do STA, é uma forma de atingir os mesmos efeitos do caso julgado, quando o TCAN decidiu pela sua inexistência.

    D. Dito de outra forma, o TCAN considerou não existir a exceção de caso julgado, mas o tribunal a quo, de forma indireta conseguiu manter os mesmos efeitos daquela exceção, não apreciando o mérito sobre a existência ou não dos vícios do ato em causa. - em violação do nº 1 do artº 11º do ETAF e artº 4º da Lei nº 62/2013 de 26 de Agosto - Lei da Organização do Sistema Judiciário.

    Quanto à violação da tutela jurisdicional efetiva: E. O acórdão do TCAN que antecede a sentença que ora se recorre, diz o seguinte: "(...) o eventual reconhecimento da violação do princípio da igualdade poderá ser causa de revogação do ato proferido aos 28.01.1995, conforme requerido em 03.05.2007 e poderá, ainda, ser gerador de responsabilidade civil pela prática de factos ilícitos. (...) Assim, tal como foi configurada a petição inicial, a concreta pretensão consiste em obrigar a Entidade Demandada a apreciar o requerimento de 03.05.2007 e, em específico, a verificar a existência ou não de tratamento desigual, mas que, previamente, permita à Recorrente o exercício de audiência prévia e que a decisão final seja devidamente fundamentada, ou seja, que explique com factos devidamente comprovados que os centros de inspeções mencionados em 26, 29 e 104 da petição inicial estavam ou não nas mesmas condições do centro da aqui Recorrente e em caso afirmativo, porque foi autorizado o início da atividade daqueles quando o da Recorrente foi indeferido. Como também invocado, a concretização de tal pretensão revela-se essencial para o cumprimento da tutela jurisdicional efetiva e que consiste no direito da Recorrente ter um procedimento justo, ou seja, o direito a ser tratada de forma igual aos demais interessados e no direito de exercer o contraditório e a obter uma decisão, devidamente, fundamentada. (...) não há caso jugado, sob pena de a questão da preterição da audiência prévia e da violação do princípio da igualdade jamais ser apreciada e decidida, impedindo o ressarcimento dos prejuízos sofridos pela Recorrente (...).” F. A interpretação que o Tribunal a quo fez conduz ao resultado prático de cercear a tutela jurisdicional efetiva da recorrente, impedindo a emissão de um juízo sobre o mérito da pretensão anulatória, pelo que, a douta sentença viola o princípio da tutela jurisdicional efetiva, constitucionalmente consagrado (artigo 20º da CRP e 7º do CPTA) - o que gera a sua nulidade - artigo 615º nº 1 al. b) do CPC.

    Quanto aos vícios do ato impugnado: G. O ato impugnado (Deliberação de 28 de novembro de 2013) padece dos seguintes vícios: falta de fundamentação; preterição de audiência prévia; violação do princípio da igualdade.

    1) Quanto à falta de fundamentação: H. Tal ato é o culminar do pedido de revogação apresentado pelo ora recorrente em 03 de maio de 2007 - vide facto J I. Tal pedido foi objeto de apreciação jurídica (fato K), no sentido de o ato praticado em 28 de janeiro de 1995 ser violador do princípio da igualdade, na medida em que, em situações similares à da ora recorrente, o recorrido concedeu autorização para o início da atividade.

    J. Conforme consta do douto parecer jurídico, o indeferimento do início da atividade da recorrente “é tratar de maneira diferenciada situações idênticas, ou seja, em violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade, plasmados nos artigos 5º e 6º do CPA - vide facto K.

    K. O ato ora impugnado fez tábua rasa sobre tal parecer e despacho de “concordo” nele aposto, ignorando-os completamente, sem que o decisor tivesse justificado ou explicado as razões que o fizeram decidir em sentido contrário a tal parecer jurídico, tendo optado por aderir a uma informação completamente contrária, diga-se, sem a devida fundamentação quer de facto quer de direito.

    L. Qualquer pessoa ou destinatário normal não percebe o iter cogniscitivo constante do ato recorrido, ficando sem condições de saber quais os motivos porque se decidiu num sentido e não noutro. Em concreto, não se sabe e nem se consegue saber, porque é que o recorrido não considerou o parecer jurídico de 26 de outubro de 2007. E nem se percebe a razão pela qual teve necessidade de pedir mais informações técnicas quando o processo estava devidamente instruído e informado.

    M. Decorre do artigo 124º, nº 1, alínea c) do CPA (antigo) que “os atos administrativos devem ser fundamentados quando decidam em contrário de parecer ou informação”.

    N. É entendimento da jurisprudência que, quando tal sucede, há um dever especial acrescido de fundamentação, no sentido de que o autor do ato deve explicar a razão pela qual não concorda com as posições anteriormente expressas pelos serviços, neste caso, serviços jurídicos.

    O. Assim sendo, com o devido respeito e salvo melhor opinião, o Tribunal fez errada apreciação da matéria de facto, pois não considerou os factos provados em J. e K. e bem como fez uma errada aplicação do direito, uma vez que não considerou o disposto no artigo 124º, nº 1, alínea c) do CPA (antigo), o qual deve ser interpretado no sentido de que, face a informações ou pareceres jurídicos divergentes, recai sobre a entidade decisora um dever especial acrescido de fundamentação sobre os motivos da escolha de um em detrimento de outro na tomada de decisão.

    P. Pelo que, salvo melhor opinião, o ato impugnado padece de vício de forma (falta de fundamentação) - o que gera a sua anulabilidade (arts.123º, nº1, alínea d), 124º, nº1, alíneas a) e c), 125º e 135º, todos do CPA (antigo).

    2) Quanto à violação do princípio da igualdade: Q. A atuação do recorrido não decorre do exercício de poderes vinculados, até porque existem pareceres jurídicos em sentidos divergentes, sendo que, conforme resulta da matéria provada na douta sentença transcrita no facto L, foi proferida informação no âmbito da qual foram sugeridos dois “caminhos”: a convalidação temporal do ato ou a revogação do ato proferido em janeiro de 1995 ao abrigo do artigo 140º do CPA (antigo), ou seja, são os próprios serviços jurídicos do recorrido que reconhecem a existência de uma ampla discricionariedade, não estando, por isso, a atuação do Recorrido dependente de poderes vinculados.

    R. Tendo em conta que os serviços jurídicos do recorrido reconheceram expressamente a violação do princípio da igualdade (facto K), deveria o Tribunal ter apreciado e concluído pela violação do referido princípio.

    S. Sempre deveria ter chegado a tal conclusão, pela repartição do ónus da prova, pois que, é entendimento dominante, quer da jurisprudência, quer da doutrina, que tal ónus cabe à entidade decisória, - vide, neste sentido, AROSO DE ALMEIDA E CADILHA que sustentam, em anotação ao art. 90º do CPTA: A propósito da impugnação de actos praticados no uso de poderes...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT