Acórdão nº 2/21.3T8VFL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução10 de Julho de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório AA, e marido, BB, instauraram a presente ação declarativa comum contra 1.

Banco 1..., C.R.L, e 2.

CC, pedindo a condenação destes a pagar à autora, a título de indemnização: «O montante de 25.943,38€ a título de capital dos AA se não fosse a atuação ilícita do segundo R. encontrava-se na Primeira R.

- Os juros a apurar em execução de sentença, que se não fosse a atuação ilícita do segundo R teriam direito os AA, pois o seu capital encontrava-se na primeira R.

- Pagar aos autores a quantia de 4.000,00€ referente a uma indemnização por danos não patrimoniais pela atuação ilícita provocada».

Para o efeito alegaram, em suma, que a autora é cliente da ré Banco 1... C.R.L (Banco 1...), há mais de 20 anos; reside habitualmente no ... só se encontrando nos meses de verão em Portugal; que foi ao longo da vida colocando as suas poupanças numa conta à ordem que tinha na primeira ré e ia transferindo valores para a sua conta poupança e fazendo investimentos; que em 11-10-2013 constituiu um depósito a prazo no valor de 19.500,00€; que nunca movimentava a sua conta poupança a não ser para fazer as suas aplicações financeiras que findo o prazo de aplicação constituía novo depósito a prazo ou o capital ali permanecia; a autora só movimentava a conta à ordem onde efetuava os pagamentos das suas despesas correntes; nunca efetuou qualquer levantamento da conta poupança nem o autorizou; que foram dadas várias ordens de levantamento sem o conhecimento, desconhecendo quem deu essas ordens de levantamento bem como o paradeiro do seu dinheiro; que a autora sempre confiou na primeira ré, confiando assim nos seus funcionários e gerentes da instituição; que era aliciada pelo funcionário, segundo réu, que prometia juros mais elevados por ser funcionário; que o segundo réu entregou à autora, após os valores serem aplicados em depósitos a prazo, conforme lhes era transmitido, o documento comprovativo dos valores em depósito a prazo; findo o prazo desse depósitos, o valor dos respetivos juros líquidos eram-lhe creditados em conta, pelo que a mesma fazia absoluta fé que o seu capital se encontrava investido na 1.ª ré; e como era portadora do documento, muitas vezes, dado o êxito do juro, efetuava novo depósito a prazo e era entregue nova promissória à aqui autora, da qual é portadora, no valor de 25.943,38€ entregue no balcão da 1.ª ré pelo seu funcionário, ora 2.º réu; o 2.º réu procedeu à liquidação dos depósitos a prazo e à sua movimentação e levantamento, sem autorização e conhecimento da autora; que o segundo réu se apropriou de mais quantias para além da constante na promissória; que o segundo réu atuava no exercício das suas funções e sob responsabilidade de vigilância da primeira ré e que por via disso recai sobre esta a obrigação de ressarcir a autora dos prejuízos sofridos pela atuação ilícita do 2.º réu; a autora é pessoa honesta e trabalhadora que acreditou na primeira ré a quem confiou todas as economias e poupanças de toda a vida; que desde junho vive na incerteza, envergonhada, revoltada, frustrada e com receio da atuação da primeira ré; que dada a atuação ilícita do segundo réu a autora encontra-se numa grave situação de fragilidade económica; sentindo um enorme abalo psicológico, transtorno, desgosto, desânimo e tristeza.

Regularmente citado, o 2.º réu não contestou nem juntou procuração outorgada a favor de mandatário judicial.

A 1.ª ré deduziu contestação, pedindo a improcedência da ação e a consequente absolvição do pedido. Impugnou a matéria de facto alegada, sustentando que a autora assinou todas as ordens de levantamento e teve conhecimento de todos os movimentos através da consulta ao extrato da conta à ordem; a ré não reconhece qualquer valor e impugna o documento n.º ...0 constante de fls. 20; alega que a autora recebeu os capitais investidos e respetivos juros na sua conta de depósitos à ordem, dando-lhe o uso e o destino que entendeu; que a autora teve conhecimento de todos os reembolsos e pagamentos efetuados por crédito na sua conta de depósitos à ordem, quer através de caderneta, quer através de documentação que lhe foi entregue e por ela recebida; a ré Banco 1... apenas tem registo de, em nome da autora, terem sido celebrados os depósitos a prazo DP ...58, em 09-10-2012 e vencimento em 9/04/2013 com o capital de 3.000,00€ e ...76, em 11/10/2013 e vencimento em 11/10/2014, com o capital de 19.500,00€ relativamente aos quais a autora recebeu da ré os documentos n.ºs ... e ... juntos com a contestação, não recebendo a autora qualquer outro documento, muito menos o impugnado documento n.º ...0 - constante de fls. 20 - que a ré não reconhece como sendo por si entregue à autora ou sequer alguma vez comercializado nos seus estabelecimentos/balcões; a ré acredita que a autora entregou quantias ao 2.º réu a troco de uma remuneração (juros) mais elevada do que a praticada pela Banco 1..., sendo esse o argumento utilizado pelo ora 2.º réu para aliciar as pessoas a emprestarem-lhe dinheiro, ou seja, que lhes pagava um juro mais alto do que o pago pela Banco 1..., utilizando documentos semelhantes ao que a autora juntou como documento n.º ...0 da p.i. para “titular” os empréstimos e ter forma de controlar os reembolsos e remunerações (pagamento de juros) que lhe eram efetuados, sendo tais documentos meras simulações de depósitos a prazo, manipuladas, forjadas e falsificadas para que adotassem a forma e a aparência de “promissórias”; o 2.º réu realizava simulações de depósitos a prazo no sistema informático da Banco 1..., que depois imprimia, retirando as menções à simulação de depósito a prazo, mas deixando o timbre da Banco 1... e incluindo o nome e morada dos clientes, o valor do capital investido, o prazo e a taxa de juro aplicável; a ré Banco 1... tem razões para acreditar que muitos, ou quase todos estes documentos denominados “promissórias falsas”, foram entregues pelo réu CC, àqueles que lhe emprestaram dinheiro, já depois de ter sido “descoberto” e “desmascarado” neste esquema; como forma de envolver a ré Banco 1... e de a obrigar a pagar as quantias que o co-réu não tivesse capacidade financeira de pagar àqueles que lhe emprestaram o dinheiro; e também como forma de garantir aqueles que o pressionavam depois de saberem que o “esquema” tinha sido descoberto; a ré acredita que a autora “embarcou” neste esquema de emprestar dinheiro ao 2.º réu, bem sabendo o que faziam e como faziam, e também tendo perfeito conhecimento que tal empréstimo nada tinha a ver com a Instituição para a qual aquele trabalhava, antes sendo negócio celebrado à parte e “nas costas” da 1.ª ré; que a autora tem culpa na produção dos danos que alegam ter sofrido, porquanto um homem médio perceberia a diferença existente entre títulos representativos de depósitos a prazo, alegadamente emitidos pela mesma instituição bancária, mas com imagens e aparências tão diferentes; que um homem médio não entregaria dinheiro vivo, de considerável valor, sem um documento que titulasse essas entregas e sem o ver refletido nos extratos das contas bancárias; que um homem médio recusar-se-ia a emprestar dinheiro a um funcionário de uma instituição de crédito por, no mínimo, tal atitude ser imoral e censurável; acresce que também não se verifica uma aparência de confiança e boa-fé que tenha sido criada na autora pelo 2.º réu, pois aquela tinha perfeito conhecimento e consciência de que o mesmo réu lhe estava a pedir dinheiro emprestado e a remunerar esse empréstimo, a título pessoal e extravasando o exercício das suas funções na ré Banco 1....

Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença a julgar a ação parcialmente procedente, a qual se transcreve na parte dispositiva: «Pelo exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, decide-se: - Condenar os réus Banco 1..., CRL. e CC a pagar à autora AA, da quantia de € 25 943,38, a título de danos patrimoniais, acrescida dos juros legais, à taxa legal de 4%, desde a data da consumação do facto ilícito, 04-12-2019, até efetivo e integral pagamento.

- Condenar os réus Banco 1..., CRL. e CC a pagar à autora AA a quantia de € 1 750,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros legais, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da prolação da presente decisão, até efetivo e integral pagamento.

- Absolve-se os réus do demais peticionado.

- Condenar autor e réus no pagamento das custas da ação, nas proporções dos respetivos vencimentos, por referência ao valor do pedido, fixando-se em 92,5% para os réus e de 7,5% para a autora».

Inconformada, veio a ré interpor recurso da sentença proferida, terminando as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): « A - Incidente de Impugnação da falsidade do documento n.º ...0: 1.º O tribunal “a quo” julgou improcedente a arguida falsidade do documento n.º ...0 junto pela autora/recorrida, uma vez que a primeira ré/recorrente não alegou quaisquer factos que permitam perceber se o que pretende é ver declarada a falsidade material ou a falsidade ideológica do documento.

  1. Ora, nos artigos 53º, 55º, 56º, 69º, 70º e 71º da Contestação a ré alega factos que permitem ao tribunal perceber que a falsidade pretendida é a material e não a ideológica.

  2. No ponto 30 dos factos provados consta, ainda: “O documento descrito em 18. foi fabricado pelo segundo réu que imprimiu uma simulação de um depósito a prazo, depois eliminou as menções à simulação de depósito a prazo e manteve o timbre da primeira ré e incluiu o nome e morada da autora, o valor do capital investido, o prazo e a taxa de juro aplicável.

    ” 4.º Impunha-se, assim, perante a factualidade alegada e provada (ponto 30), decidir sobre a questão suscitada, que era a da impugnação de tal documento (n.º 10 junto com a petição inicial).

    B - Impugnação da matéria de facto: 5.º Os pontos 7, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 17, 18 e 19 da matéria de facto provada e a alínea i. da matéria de facto não...

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