Acórdão nº 01795/22.6BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Julho de 2023
Magistrado Responsável | GUSTAVO LOPES COURINHA |
Data da Resolução | 13 de Julho de 2023 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – RELATÓRIO I.1 - Alegações AA, melhor identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a qual julgou improcedente a reclamação interposta contra o despacho de indeferimento do pedido de anulação das certidões de dívida que deram origem aos processos de execução fiscal n.º ...40 e ...57, que correm termos no Serviço de Finanças de Vila Nova de Cerveira, para cobrança coerciva de IRS referente aos anos de 2016 e 2017, no valor global de 8.931,42 €.
Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões a fls. 172 a 185 do SITAF.
1 – O recorrente foi declarado insolvente, tendo, no âmbito do respectivo processo de insolvência e da liquidação do activo integrante da massa insolvente, sido vendidos activos imobiliários apreendidos a favor daquela massa insolvente.
2 - A venda foi feita pela administradora de insolvência no âmbito de mandato que lhe foi conferido pela sua nomeação no processo de insolvência do recorrente que correu termos no Juiz 1 do Juízo de Comércio de Santo Tirso sob o n° 3828/15.3T8STS.
3 – O produto da venda de tais activos imobiliários reverteu na íntegra para a massa insolvente, tendo sido distribuído de acordo com o determinado no processo de insolvência do recorrente.
4 – No processo de insolvência do recorrente, a Fazenda Nacional reclamou créditos do valor de 1 739,79 euros, nada mais tendo reclamado, nem requerido qualquer crédito adicional, nem requereu qualquer verificação ulterior de créditos.
5 - Durante o processo de insolvência e apesar dessa pendência, a Fazenda Nacional endereçou citações e notificações processuais ao insolvente aqui recorrente.
6 – O recorrente não obteve qualquer rendimento ou vantagem de tais actos.
7 – A eventual inviabilidade da Fazenda Nacional cobrar o imposto em causa nos autos só à própria Fazenda Nacional se deve e à sua inacção, nomeadamente ao não ter apresentado pedido de verificação ulterior de créditos.
8 – As execuções fiscais instauradas foram instauradas em 2019, a entrega do mod. 3 de IRS ocorreu em Janeiro de 2018 e a declaração oficiosa/DC modelo 3 de IRS foi efectuada em Janeiro de 2019, ou seja, tudo em momento posterior à actual redacção do citado n° 1 do art. 268 CIRE.
9 – Tendo o processo de insolvência do recorrente terminado a sua tramitação em 2022, a suposta citação para as mencionadas execuções fiscais e as notificações da aludida declaração oficiosa deveriam ter sido feitas na pessoa da administradora de insolvência do recorrente, o que não sucedeu, gerando nulidade insanável (invocável a todo o tempo e por qualquer meio, podendo e devendo até ser declarada oficiosamente) e devendo gerar a consequente extinção das aludidas execuções fiscais.
10 – Acresce que as execuções deveriam ter sido instauradas contra a massa insolvente (representada pela respectiva administradora), pelo facto de se tratar claramente de uma dívida da massa.
11 – Verifica-se ainda que a decisão do fisco é nula por omissão de pronúncia, porquanto nem sequer aborda a verdadeira questão que é suscitada.
12 – De facto, o que se suscita consiste no apuramento da beneficiária do rendimento em causa (in casu, a massa insolvente) e nunca a questão (meramente formal e irrelevante para os presentes autos) da propriedade dos imóveis (que, face à insolvência, já estava fortemente limitada, considerando a apreensão a favor da massa insolvente).
13 – Acresce que, ao contrário do que a Fazenda Nacional pretende afirmar, o que se tributa, em sede de IRS, é o rendimento e não a propriedade, pelo que, também por aqui, a posição do fisco carece de qualquer sustentação.
14 – A douta jurisprudência supra-citada sustenta in totum a posição pugnada pelo recorrente, que não visa mais senão uma solução/decisão justa e equilibrada.
15 - A sentença recorrida enferma de insanável contradição entre os fundamentos e o sentido da decisão, pois começa por descrever as questões a decidir e termina afirmando apenas que, com os fundamentos invocados, não é possível obter o efeito pretendido.
16 - Ocorre, pois, nulidade da sentença recorrida, pois, para além da dita contradição, também se verifica omissão de pronúncia, porquanto a sentença recorrida não tem em consideração que a impugnação judicial e a oposição à execução apenas poderiam ser deduzidas pelo administrador de insolvência, considerando a data dos factos dos autos.
17 – Assim, o que verdadeiramente está aqui em causa é a denegação ao recorrente do direito de poder discutir o que só pôde fazer após o encerramento do processo de insolvência e o direito de evitar ser tributado por uma receita que não auferiu e por uma opção (a graduação de créditos) para a qual nada contribuiu, para além da omissão juridicamente relevante da Fazenda Nacional de não suscitar qualquer verificação ulterior de créditos.
18 - E não se diga que os fundamentos invocados não colhem por supostamente terem de ser suscitados noutra sede, porquanto o resultado manifestamente desconforme inerente à posição da Fazenda Nacional impõe até que, mesmo oficiosamente, fosse decretada a nulidade das liquidações posta sem crise nos presentes autos.
19 - Não pode o tribunal considerar que, durante a pendência de um processo de insolvência, o insolvente está na posse dos seus plenos direitos, uma vez que, como é público e notório, um insolvente só readquire o status quo ante à sua declaração de insolvência após o encerramento do respectivo processo, sendo até caso para se pôr em crise as plenas validade e eficácia das citações e notificações fiscais feitas directamente a um insolvente durante a pendência de um processo de insolvência, o que, por si só, já é mais do que suficiente para considerar que a reclamação dos autos e o meio próprio para o recorrente reagir e para serem obtidas as anulações das ilícitas liquidações fiscais dos autos.
20 - Por último, importa destacar que a própria Fazenda Nacional afirma, na notificação da decisão que proferiu quanto à pretensão de anulação das liquidações, que o modo para reagir é a reclamação que o recorrente apresentou e que deu origem aos presentes...
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