Acórdão nº 00773/13.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Junho de 2023
Magistrado Responsável | Rogério Paulo da Costa Martins |
Data da Resolução | 30 de Junho de 2023 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: «AA» e «BB» interpuseram RECURSO JURISDICIONAL DA SENTENÇA do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 30.07.2020 na parte em que julgou totalmente improcedente o pedido indemnizatório que deduziram contra a [SCom01...] S. A.
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Invocaram para tanto, em síntese, que a decisão recorrida errou ao considerar ilidida a presunção de culpa a onerar a Recorrida pelo que deveria ter condenado em vez de absolver do pedido indemnizatório; acrescentaram que a Ré não considerou como provados, e tinha documentação bastante para o fazer, os vencimentos que os Autores auferiam como feirantes.
A [SCom01...] contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.
O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.
* Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1ª Com a matéria de facto dada como provada a Ré tinha que ter sido condenada.
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Uma correta interpretação da presunção legal estatuída no art. 12º, nº 1, al. a), da Lei 24/2007, de 18 de julho, deveria ter levado o Tribunal a condenar a Ré Concessionária e, bem assim, a interveniente [SCom02...] 3ª Está provado que o A. seguia naquela auto-estrada (facto A e B), que era noite cerrada e não havia iluminação (facto C e D) e que foi surpreendido pelo um tronco /rolo de eucalipto com 2 metros no qual embateu e por força desse embate entrou em despiste (facto E a H).
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Também está provado que a GNR esteve no local e comprovou a existência do dito rolo (facto I e J).
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Dúvidas não restam que o A. que conduzia o veículo não teve qualquer responsabilidade no presente sinistro, sendo que nada poderia ter feito para evitar este grave acidente que se deu, única e exclusivamente, pela presença do tronco de eucalipto na auto-estrada.
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Existindo presunção de culpa, cabia à Ré ilidir a mesma - o que não logrou fazer.
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A questão central no presente recurso é saber se a factualidade assente sob as alíneas OO), PP) e QQ) são suficientes para afastar a responsabilidade da Ré e consequentemente da interveniente Companhia de Seguros, deixando, como diz o povo “a culpa morrer solteira”.
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A acima alegada factualidade dada como provada não é suficiente para afastar a responsabilidade da concessionária.
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A prova feita pela Ré tem por base registos de passagens que são transmitidos via rádio pelos funcionários da Ré e registados pela central no qual se acredita na palavra do “patrulheiro” (Cfr. depoimento da testemunha Engª «CC» - gravação do dia 28.11.2018, entre as 02h:14m:00s até 02h:15m:57s).
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Aos AA. é absolutamente impossível provar que tais registos não são verdadeiros.
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A [SCom01...] parte do princípio que os seus “patrulheiros” falam a verdade quando dizem que passaram em determinado troço, a Ré, se tiver dúvidas se tal é verdade, pode tentar apurar com recurso ao sistema de vídeo vigilância (Cfr. depoimento da testemunha Engª «CC» - gravação do dia 28.11.2018, entre as 02h:14m:00s até 02h:15m:57s).
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Logo, com base em registos internos seria extremamente fácil à Ré afastar a responsabilidade neste tipo de sinistros, juntando registos nos quais constavam passagens com 5, 10 ou 15 minutos antes dos sinistros.
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O objetivo da consagração da presunção de ilicitude e culpa constante do art. 12º, nº 1, al. a), da Lei 24/2007, de 18 de julho, vai no sentido de proteger os utilizadores das auto-estradas e de diminuir a desigualdade de armas entre as partes (AA. e Ré concessionária).
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Por outro lado, nos últimos anos temos vindo a assistir a uma maior socialização do risco com a inerente protecção dos usuários da estrada que se encontram mais desprotegidos, em consonância com os propósitos das Directivas Europeias sobre Seguro Automóvel.
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Como se sabe, a Ré tem seguro para proteger para este tipo de situações e, por isso, teve intervenção nos presentes autos a [SCom02...] 16ª A questão central é perceber que tipo de prova teria de produzir a Ré para afastar a responsabilidade e consequentemente deixar os AA. (gravemente lesados) sem direito a qualquer indemnização - pese embora nada tenham contribuído para o grave acidente dos presentes autos (que como se sabe se deveu, única e exclusivamente, à presença de um tronco de eucalipto na estrada).
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Serão os registos de passagens suficientes para ilidir a presunção? Não teria a Ré obrigação de apurar, em concreto, de que forma aquele objeto foi ali parar? Se veio da berma por mão humana; se veio por efeito do vento; - se caiu de um pesado ou de um ligeiro etc...
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Se a Ré dispõe de câmaras de vídeo vigilância (como referiu a sua testemunha Engª. «CC» na passagem acima referida) porque não tentou identificar qual foi o veículo a largar o tronco de eucalipto? 19ª Se o fizesse, aí sim, afastava a responsabilidade por um lado e, por outro, permitia aos AA. demandar os efetivos responsáveis.
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Nada de concreto se provou quanto à real causa do aparecimento do objecto na via. À Ré incumbia, para ilidir a presunção de culpa que sobre si incidia, provar que, neste concreto caso, o objecto foi ali parar vindo de um pesado (e qual esse pesado em concreto, identificando a matrícula) ou, por outro lado, que lá foi colocado por determinado terceiro, propositada ou negligentemente, ou que veio por efeito do vento.
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Nada disto provado.
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Afastar a responsabilidade com base em meros registos de passagem, registos estes que assentam no princípio da boa verdade como referiu a Engª é subverter a ratio subjacente à presunção legal estatuída na norma acima identificada.
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Para afastar a referida presunção de culpa a Ré teria de provar que a existência do tronco de madeira no pavimento da autoestrada que determinou o acidente, surgiu de forma inopinada ou foi colocado de forma intencional ou negligente, por outrem.
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Veja-se o Acórdão do Tribunal...
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